Pivot of Hearts: entrevista com o pessoal do Dragonroll Studio, desenvolvedores do jogo

Conversamos com os criadores de Pivot of Hearts, visual novel brasileira sobre afeto, RPG e juventude em São Paulo.

em 31/03/2025

“Queremos que o jogador se reconheça nos personagens, nos lugares e nas relações”. É assim que Wilson Kazuo Mizutani (roteiro e programação) descreve Pivot of Hearts, uma visual novel brasileira desenvolvida pelo Dragonroll Studio, ao lado de Livia Maki Yoshikawa (direção de arte e trilha sonora) e Lívia Amaral Santos (ilustração).


Na trama, acompanhamos a história de Wén Xiàn, um desenvolvedor de jogos taiwanês-brasileiro que, após um período de isolamento, tenta reconstruir laços afetivos enquanto revisita seu passado. Situado em uma São Paulo vibrante e real, o jogo oferece aproximadamente oito horas de narrativa e aposta em escolhas emocionais e um sistema de cartas baseado no tarô para nos conduzir por caminhos de amizade, amor e amadurecimento.

Tivemos a oportunidade de conversar com o trio para entender as inspirações por trás do jogo, os desafios da produção e o carinho envolvido na criação desse retrato contemporâneo, diverso e sensível da juventude urbana. Confira a seguir a entrevista exclusiva.

GameBlast: Como o projeto começou? Qual a origem do estúdio?

Wilson Kazuo Mizutani: A gente se conheceu na USP, dois a dois, em momentos diferentes. A Lívia Maki e a Lívia Santos se conheceram primeiro, em um festival de curtas na ECA. Eu conheci a Maki depois, no coletivo USP Game Dev, que ajudei a fundar no Instituto de Matemática. Esse coletivo promove cursos, game jams e oficinas, e foi ali que começamos a trabalhar juntos. Com o tempo, vimos que a parceria funcionava e decidimos criar um estúdio para fazer um jogo completo.

GB: Como foi o processo de definição do estilo e do escopo do jogo?

WKM: A escolha da visual novel veio por uma questão prática. Era um formato acessível que nos permitia desenvolver algo mesmo com poucos recursos. Usamos o Ren‘Py, a mesma engine da primeira versão de Doki Doki Literature Club. A Maki ficou responsável pelo design e trilha, e isso permitiu que ela tocasse o projeto sem depender tanto da programação. Chamamos a Lívia Santos para cuidar da arte.

GB: Como foi o desenvolvimento inicial?

WKM: A pandemia uniu as peças. Estávamos saindo de relações e encerrando ciclos de estudo. A Maki tinha acabado a graduação em música, eu tinha terminado a pós, e decidimos transformar nossas experiências em algo concreto. Começamos a desenvolver um protótipo e submetemos ao edital de incubação da SPCine, que nos concedeu R$ 50 mil. Graças ao programa de incubação desse edital, durante um ano, participamos de mentorias, eventos e atividades que nos ajudaram a entender o mercado. Com essa verba, lançamos a primeira demo do jogo, em 2022.


GB: Pivot of Hearts tem um pano de fundo muito específico, a cidade de São Paulo, e personagens millennials, otakus, artistas, devs. Como chegaram a essa abordagem?

WKM: Transformamos nossas limitações em uma oportunidade. Fizemos um jogo sobre o que conhecemos bem: cotidiano, cultura pop, relações modernas. O protagonista é um dev, a heroína tem banda e ambos jogam RPG. Referências como Cavaleiros do Zodíaco, Evangelion, Sakura Card Captors aparecem ao longo da trama. A história se passa em locais reais de São Paulo como a Liberdade, a Paulista e o Centro Cultural São Paulo. Tiramos fotos e contratamos artistas para transformá-los em cenários ilustrados. Queremos que as pessoas se reconheçam nesses espaços.

GB: O jogo aborda de forma direta o tema da não monogamia. Como foi trazer isso para o universo da visual novel?

WKM: Já que muitas visual novels abordam romance, quisemos explorar o tema de forma realista. Em vez de haréns clichês, tratamos da não monogamia como ela é na vida real: complexa, atravessada por afetos, empatia e honestidade. Pivot of Hearts mostra relações que se entrelaçam, com personagens que precisam lidar com históricos emocionais, reconexões e traumas. O protagonista, Wén Xiàn, vivencia tudo isso enquanto tenta se reerguer após um relacionamento complicado.

GB: Como o enredo está estruturado?

WKM: São quatro capítulos. Os três primeiros são comuns para todos os personagens, com pequenas variações em cenas, mas o quarto capítulo é completamente distinto dependendo das escolhas feitas. Temos cinco finais diferentes. A história gira em torno da reconexão de Wén Xiàn com Etsuko (uma amiga importante do passado) e com Cauã (um novo colega de trabalho com quem forma um laço inesperado). Conforme avança por campanhas de RPG de mesa, sonhos de garoto mágico e shows de power metal, ele precisa rever suas noções de amor e aprender a jogar bem suas cartas para alcançar a felicidade.


GB: Vocês mencionaram uma mecânica de cartas. Como ela funciona?

WKM: Ao longo da história, o jogador acumula pontos nos quatro naipes do baralho — copas, ouros, paus e espadas —, associados a aspectos da psique: empatia, esforço, criatividade e lógica. Certas escolhas fazem você ganhar ou gastar esses pontos. As decisões mais complexas exigem que você use esses recursos emocionais, enquanto outras podem ser evitadas se o jogador não quiser (ou não puder) investir energia nelas. É um sistema inspirado no tarô que reflete o peso emocional de enfrentar determinadas situações.

GB: E quanto à trilha sonora?

WKM: A trilha é original, composta pela Maki, e vai de city pop japonês dos anos 80 a gêneros bem brasileiros. Tem pisadinha, forró, bossa nova, até uma paródia de certa música sertaneja famosa. Também tem metal, funk carioca e marcha rancho. A galera costuma gostar especialmente da música que toca no escritório do Wén, que é uma bossa nova cantada pela própria Maki. A ideia era trazer diversidade emocional e musical para acompanhar as cenas cotidianas do jogo.

GB: O jogo estará disponível em quais idiomas e plataformas?

WKM: Vai sair em português e inglês, com lançamento previsto ainda para o primeiro semestre de 2025. A gente escreve primeiro em inglês para garantir fluidez no mercado internacional, depois traduz para o português. A versão final será lançada no Steam e no itch.io — inclusive, incentivamos as pessoas a comprarem pelo itch.io, porque a porcentagem de repasse é melhor para desenvolvedores indie. Se o retorno for bom, temos planos de levar para consoles e traduzir para outros idiomas também. Já recebemos interesse em espanhol e turco, por exemplo.


GB: E quanto à acessibilidade?

WKM: Graças ao edital da Lei Paulo Gustavo, a gente tem recursos para implementar várias features de acessibilidade: audionarração, legendas ocultas, resumos de cena, auto save, personalização de controles e revisão do design visual para melhorar a legibilidade. Algumas dessas opções estarão disponíveis no lançamento e outras virão em atualizações.

GB: Por fim, o que você gostaria que as pessoas soubessem?

WKM: Pivot of Hearts é uma história sobre reconexão, amadurecimento e afeto, ambientada numa São Paulo que poucos jogos mostram. É sobre gente real, com problemas reais, vivendo amores possíveis. Se você curte visual novels, histórias emocionais e cultura pop brasileira, coloca na sua lista. A demo já está disponível no Steam e mostra bem o que o jogo tem a oferecer.

Se você curtiu a entrevista, não deixe de colocar Pivot of Hearts na sua lista de desejos no Steam e jogar a demo — e, claro, seguir Dragonroll Studio no BlueSky


Revisão: Ives Boitano
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Juliana Paiva Zapparoli
Também conhecida como Lilac, é jornalista e atualmente trabalha com assessoria de imprensa. Fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas.
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