Clair Obscur: Expedition 33 resgata conceitos de JRPGs e os aplica em um fascinante universo de fantasia inspirado na Belle Époque francesa. O primeiro trabalho da Sandfall Interactive, estúdio francófono composto de ex-funcionários da Ubisoft, aposta na modernização de mecânicas do gênero, com um combate por turnos com vários elementos de ação, em um universo pitoresco. Com lançamento previsto para abril, tive a oportunidade de jogar três horas da aventura e a experiência foi bastante positiva.
Tentando interromper a pintura da morte
O mundo de Clair Obscur é constantemente assolado pela tragédia. Uma vez por ano, uma entidade conhecida como Artífice pinta um número em um monólito e todas as pessoas com aquela idade desaparecem como cinzas levadas pelo vento. A humanidade tentou impedir esse infortúnio inúmeras vezes enviando grupos até o Continente, mas nenhum deles teve sucesso.Com a redução do número, chegou a vez de quem tem 33 anos desaparecer. Diante desse destino iminente, Gustave e Maelle se unem a outros guerreiros na Expedição 33, determinada a derrotar a Artífice e pôr fim ao seu reinado de terror. O futuro é incerto e desesperador, mas o grupo fará de tudo para sobreviver, utilizando os rastros deixados pelas expedições anteriores para ter alguma chance.
A demonstração ocorre após o prólogo e revela que a Expedição 33 foi dizimada por um ataque-surpresa de um misterioso homem de cabelos brancos logo ao chegar no Continente. Nesse contexto, acompanhamos os sobreviventes Gustave e Lune, que saem em busca de Maelle enquanto tentam encontrar uma maneira de completar sua missão.
Apesar de começar em um ponto mais avançado da história, é perfeitamente possível sentir o tom melancólico da trama, afinal os heróis estão praticamente sozinhos e têm pela frente uma tarefa que se tornou mais complicada depois do revés inicial. Mesmo com a sobriedade, há carisma explorado em conversas entre os personagens, com direito a leve humor. Particularmente, apreciei o tom sério e com protagonistas mais velhos, e os elementos de magia e sobrenatural trazem um ar de realismo fantástico ao mundo.
Em batalhas ágeis focadas em reações
Na essência, Clair Obscur: Expedition 33 segue a estrutura clássica dos JRPGs, alternando entre exploração e batalhas estratégicas. O sistema de batalha por turnos se destaca ao incluir mecânicas em tempo real que trazem dinamismo, como mirar e atirar para acertar pontos fracos dos inimigos, reforçar ataques ao apertar botões no momento certo ou evitar dano com esquivas precisas.Observar e reagir corretamente é altamente incentivado. Esquivar no momento perfeito dá pontos de ação adicionais, que são utilizados para ativar habilidades especiais; aparar sequências de investidas resulta em um contra-ataque poderoso, às vezes desferido por todo o grupo de heróis. Até mesmo os inimigos básicos são poderosos e a cura é escassa, então dominar essas técnicas para receber menos dano e poder ativar habilidades poderosas com mais frequência se torna essencial.
Essa abordagem traz um dinamismo único ao combate, em uma ótima mescla entre estratégia e reflexos. No começo eu esquivava de qualquer jeito, mas com o tempo passei a prestar atenção nos inimigos e consegui aparar sequências para ganhar pontos de ação e ativar contra-ataques — claro, até errar por um triz e ter meu grupo destruído. Há opções para aqueles que não gostam de apertar botões na hora certa, tornando a experiência mais acessível.
Cada herói tem um arquétipo próprio. Gustave é um lutador balanceado e capaz de desferir um golpe finalizador após algumas ações; os feitiços de Lune criam manchas elementais que podem ser consumidas para fortalecer suas habilidades; já Maelle alterna entre diferentes posturas defensivas e ofensivas. Apesar dos estilos individuais, há muitas opções de sinergia e é possível customizar os personagens com habilidades diversas por meio de itens chamados Pictos.
Nas duas áreas presentes na demonstração, encontrei uma infinidade de inimigos, cada qual exigindo uma estratégia única para ser derrotado. Os monstros comuns não deram tanto trabalho, mas os chefes e batalhas opcionais foram um grande desafio, sendo necessário testar diferentes estratégias e memorizar seus movimentos para sair vitorioso. A diversidade e o ritmo intenso do combate impressionam, abrindo caminho para inúmeras possibilidades no jogo completo.
Exploração que foca no básico
Fora dos combates, exploramos o Continente em áreas diversas. As localidades têm bifurcações e caminhos alternativos que guardam itens e desafios opcionais, nos incentivando a explorar todos os cantos. A progressão é majoritariamente direta, com alguns pontos de verticalidade, como paredes escaláveis ou pontos distantes que exigem usar um gancho para serem alcançados.Nesse ponto, Clair Obscur: Expedition 33 é um pouco tradicional demais. A exploração se resume a andar de um lugar para o outro, sendo que durante a demonstração eu encontrei um único e simples puzzle de atirar em orbes para abrir um baú. Outro ponto que incomoda é a facilidade de se perder nos cenários: apesar de belos, eles têm poucos elementos topográficos marcantes, então muitas vezes fiquei girando em círculos. Um mapa ajudaria bastante, mas parece que eles não existem nos calabouços.
De qualquer maneira, alguns sinais apontam para um universo mais expansivo. O jogo conta com um mapa-múndi que eu pude explorar brevemente e que parece contar com muitas áreas opcionais. Há também vários outros sistemas, como melhoria de armas, missões paralelas e desafios em lojas, que foram brevemente mencionados na prévia. Sendo assim, é capaz que a aventura seja mais elaborada do que parece.
Perdendo-se em um “beau monde”
Clair Obscur: Expedition 33 aposta em uma ambientação única, combinando fantasia com elementos contemporâneos. Sua principal inspiração é a Belle Époque francesa, período marcado pelo impressionismo e a art nouveau. Com isso, o mundo do jogo apresenta localidades belas e surreais, como a cidade Lumiere e sua torre Eiffel distorcida ou a região de Águas Flutuantes, que lembra o fundo do mar, apesar de estar na superfície.Uma trilha sonora belíssima, que usa vocais, cordas e piano, complementa a atmosfera melancólica e aventureira de forma magistral. Destaco o uso de acordeão, de violino e de cello nas composições, pois eles trazem um tom francês à música. Dublagem em francês e inglês estão disponíveis, sendo que esta última conta com nomes de peso e com interpretações que reforçam as origens da ambientação, com o uso de alguns termos da língua original.
O uso do motor gráfico Unreal Engine 5 resulta em visuais impressionantes e repletos de detalhes, em especial os cenários com flora e topologia bem elaborados. Testei o jogo no PC em uma configuração próxima da recomendada e a experiência foi estável, inclusive nas cenas com muitos elementos. O único porém é o equilíbrio entre claro e escuro, especialmente em momentos de contraste: a iluminação fica ora clara demais, ora escura demais, a ponto de dificultar a exploração, então torço para que isso esteja melhor na versão final.
Uma ambição que parece ser fortuita
Clair Obscur: Expedition 33 equilibra narrativa envolvente e combate estratégico, oferecendo uma experiência moderna sem perder a essência dos JRPGs. O destaque é o combate reativo, que exige precisão e estratégia para maximizar ataques e defesas. Além disso, a ambientação inspirada na Belle Époque e os personagens carismáticos fortalecem sua identidade.Embora a exploração dos cenários pareça limitada, o visual impressionante e a trilha sonora marcante compensam. A demonstração deu um ótimo vislumbre da aventura, e se a versão final expandir os elementos de exploração e ajustar o equilíbrio visual, Clair Obscur tem potencial para ser um dos grandes destaques do gênero.
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Texto de impressões produzido com cópia de preview cedida pela Kepler Interactive
Texto de impressões produzido com cópia de preview cedida pela Kepler Interactive