Como Kemono Heroes é um jogo bastante simples e direto ao ponto, penso que a análise também pode seguir por esse caminho. O resumo é o seguinte: trata-se de um platformer de ação em estilo arcade, muito bonito e divertido no seu multiplayer, mas com diversas limitações de escopo e conteúdo. Vamos por uma abordagem dualista: primeiro conferir o que tem de bom e, depois, o que tem de problemático.
O bom
Kemono Heroes não perde tempo e logo coloca até quatro jogadores no meio da ação. A essência da gameplay é de plataforma, com fases horizontais, verticais e até uma escalada diagonal pela encosta de uma montanha.
Após alguns níveis surgem os chefes e, ao vencê-los, são recebidas novas habilidades como recompensa, compartilhadas por todos os personagens. São coisas úteis, como um gancho para a movimentação e uma bomba para quebrar partes de cenários e atacar inimigos (tornou-se minha arma principal).
Além de ataques corpo a corpo, há kunais arremessadas de longe em oito direções. Essa arma dá ao jogo aspecto de run and gun, pois basta segurar o botão de tiro para liberar ataques incessantes, ainda que sejam mais fracos que outros. Outra característica bastante arcade é que não é possível retroceder a rolagem da tela, então só há um caminho a seguir: sempre em frente (ou para cima, a depender da fase).
Derrotar inimigos e abrir baús dá comida para recuperar saúde e muitas moedas. Estas não servem apenas para pontuação, mas para gastar na loja de melhorias para aumentar os cinco aspectos de ataque e saúde. Evoluir seu personagem é importante para a sobrevivência, o que se torna um bom incentivo para tentar pegar cada moeda que surgir pelo caminho.
O jogo usa um sistema de vidas, mas ele é bem generoso nesse lado, concedendo continues, salvando o progresso entre fases e oferecendo no início da campanha a opção entre três níveis básicos de dificuldade. Como joguei com meus filhos, inicialmente até pensei em escolher o mais fácil, mas jogamos no médio e achei que foi equilibrado, com desafios que podiam nos deixar por um triz, mas sem realmente impedir nosso progresso.
No multijogador, quando alguém morre é iniciada uma contagem regressiva. Se outra pessoa conseguir ajudar antes que o número chegue a zero, o personagem caído se levantará com uma parte da saúde recuperada, sem perder uma vida. Esse tipo de recurso dá uma boa dinâmica de equipe, pois a sobrevivência de um pode resultar no retorno de todos.
Quando alguém perde todas as vidas, continua na partida como um fantasma para executar ataques simples, mas incapaz de coletar moedas. Se alguém mais tiver vidas sobrando, pode compartilhar para que a companheira possa voltar à ação.
O multijogador, portanto, mantém todos juntos na ativa, seguindo em frente como um grupo que lutará melhor ao se comunicar, do tipo que leva à gritaria de “me salvem!”, “ei, não vá tão na frente!” e “a próxima comida é minha!”.
Assim como minha lembrança de arcades na infância, jogar com mais gente é grande parte da diversão, embora não anule o mérito de também poder seguir sozinho, uma vez que o funcionamento do jogo em si se mostra competente, com controles precisos e execução polida. Não tive qualquer problema técnico ou de gameplay.
O belo
Temos quatro personagens para escolher, todos de visual bem carismático e já dotados de pulo duplo, ataques corpo a corpo e de longa distância. Para diferenciá-los em gameplay, algumas particularidades entram em cena. A ninja esquilo-voador consegue planar, a ninja gata pode escalar paredes, o macaco pode se pendurar em alguns lugares. Para esses três, as variações não têm grande impacto, mas são bem-vindas.
O mais diferente é o espadachim raposa: com inspiração em seus correspondentes do folclore japonês, ele tem poderes de transformação. A versatilidade é grande, uma vez que pode ficar igual a qualquer inimigo do jogo que não seja um chefe e executar seus ataques. Isso vale até em nuvem de raios ou bola de gelo que rola montanha abaixo. Meu filho fez questão de testar e copiar toda criatura que aparecia pela frente e se divertiu muito com isso.
Um ponto muito positivo que já deve estar claro nas imagens desta análise é o visual em pixel art requintada. Tudo é bem detalhado, colorido e vívido, com movimentos nos cenários de fundo e animações fluidas para os personagens e inimigos.
A ambientação no folclore japonês é familiar e confortável, com cenários e criaturas bem conhecidas no mundo dos videogames, aqui sempre apresentadas com belos sprites. Kemono é uma palavra japonesa para representar animais antropomórficos, sejam youkais ou pessoas com orelhas de bichos.
Nessa fantasia nipônica povoada por bichos de formas humanas, a lua cheia se revela como um gigantesco olho que transforma em pedra todos que estiverem diante de sua visada. Os quatro herois somarão forças para chegar até o inimigo e salvar a população. Essa é basicamente toda a história silenciosa, que se vale apenas do charme para transmitir um senso de aventura enérgica.
O feio
O principal problema de Kemono Heroes é ser um jogo muito curto, oferecendo uma campanha que dura pouco mais de uma hora. Sendo visto como um copo meio cheio ou meio vazio, não evita ser um “meio-alguma-coisa”. Tanto a diversão multiplayer quanto a brevidade levam à sensação de “quero mais”.
Na verdade, o jogo é tão curto que certa escolha de design para aumentar sua duração artificialmente acaba reforçando essa sensação: após o que seria o confronto final, algo acontece e tudo volta ao começo, direto para o primeiro nível. Sim, como Ghouls’n Ghosts fez, décadas atrás.
A mudança está encaixada no enredo minimalista como uma continuidade, mas, na prática, é como um Novo Jogo+. Os personagens mantêm as melhorias, a paleta de cores deles e do cenário muda para algo mais sombrio e alguns pontos são diferentes. Infelizmente, certas diferenças são para menos, representando perdas justificadas pela história, mas que não deixam de revelar a ausência de surpresas significativas que legitimem a repetição da campanha.
Para ter uma ideia, na segunda vez uma fase do início perde sua mecânica única de se esconder e se torna um terreno sem obstáculos para atravessar e pronto. Outra fase perdeu o chefão e seu clímax, sem uma nova luta em seu lugar. Esses dois elementos retornaram em outros momentos, mas seus locais originais ficaram sem substitutos que representassem novidades. No fim das contas, essa mera repetição faz a diversão durar um tempo a mais, mas não tem qualquer valor além disso.
A campanha curta e repetida é o único conteúdo do jogo. Não há extras, como fases secretas ou arenas de batalhas cooperativas ou competitivas. Na verdade, não há nem mesmo algo básico como seleção de níveis já concluídos ou remapeamento dos comandos.
Até o visual, que elogiei acima, tem um ponto fraco: os ataques especiais que causam dano a todos os inimigos na tela consistem na aplicação de um mero filtro amarelado. É um efeito visual estranhamente inferior ao capricho empregado no restante da arte, desperdiçando a chance de elaborar animações únicas para o elenco que evocassem os especiais de clássicos dos arcades, daqueles que até paravam o tempo para enfatizar a força devastadora da técnica.
Junte sua equipe de heróis animais
Kemono Heroes anda na corda bamba ao entregar uma campanha que é tão divertida quanto curta. É a experiência de ação arcade em sua simplicidade imediata, feita para juntar o pessoal e sair detonando criaturas do folclore japonês em belo visual pixelado. A quantidade de conteúdo oferecido, porém, é mais apropriada para experiências retrô e pode ser insatisfatória para quem espera uma versatilidade moderna que aprofunde as coisas.
Prós
- Ação arcade para até quatro pessoas;
- Visuais de pixel art caprichados e vibrantes;
- Três opções de dificuldade;
- Sistema de melhoria de personagens incentivam a coletar moedas;
- As mecânicas de personagens levemente diferentes dão um pouco de variedade à gameplay.
Contras
- Campanha muito curta;
- O método de prolongamento artificial da campanha consiste em reiniciá-la, mas não acrescenta novidades na segunda jornada, chegando ao ponto de retirar alguns dos elementos que estavam na primeira;
- Não há seleção de níveis.
Kemono Heroes — PC/PS5/PS4/XSX/XBO/Switch — Nota: 7.0Versão utilizada para análise: PS5
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida pela Jandusoft