O relacionamento entre Cloud e Aerith em Final Fantasy VII foi construído permeado de simbolismos religiosos de renascimento e salvação, mas também de perda e sacrifício. Tais elementos não apenas conferem intensidade à relação entre os personagens da trama, como também geram um impacto que prende a atenção do público à sua narrativa.
Aerith, a redentora
Em Final Fantasy VII, Aerith é associada à pureza, inocência e sacrifício. Seu hábito de cultivar flores reforça essa ideia: no cenário devastado que é o setor 5 de Midgar, as flores simbolizam não só fragilidade, mas força e renovação, além de refletir sua missão quase instintiva de trazer vida a um mundo em colapso.
Sua súbita morte e seu papel com a última Ancient, ou Cetra, são claramente paralelos com o ideal de um salvador que se sacrifica por uma causa maior. Ela morre em Forgotten City, enquanto ora para utilizar os poderes da White Materia e invocar Holy, o único poder capaz de salvar o planeta da destruição pela Black Materia, que está nas mãos de Sephiroth. Esse ato de altruísmo simboliza sua conexão com uma força maior que ela própria e é peça-chave de seu caráter, que influencia como ela se relaciona não apenas com Cloud, mas com o grupo inteiro.
No entanto, o impacto é substancialmente maior em Cloud, que se vê atraído por tudo que Aerith representa e, no decorrer da história, passa a enxergar nela a esperança e a força interior que lhe faltam. Sua morte representa, mais do que o fracasso em protegê-la, uma perda pessoal que impulsiona seu arco de herói.
O Funeral na Água
A morte de Aerith ocorre em um templo sagrado, reforçando a ideia da jornada espiritual de sua história. Cloud carrega seu corpo e a coloca para repousar em um lago cristalino, que remete a rituais de purificação e renascimento como o batismo, sugerindo assim que Aerith permanece conectada ao planeta mesmo após sua morte.
Seu último sacrifício passa a mensagem de que a luta pela salvação do Planeta é mais importante do que sua mera existência mortal e ela continua lutando no Lifestream. O que reforça um dos temas principais do jogo: a luta e o sacrifício necessários para proteger aquilo que se ama.
A presença da ausência
A tragédia da morte de Aerith molda boa parte do desenvolvimento de Cloud e a mensagem aqui é clara: o amor entre Cloud e Aerith, independentemente das preferências do jogador, jamais teve a chance de florescer como as flores que ela cultivava no Setor 5. O peso emocional da perda é intensificado pela presença da ausência, o fim de tudo que poderia ou não acontecer, o “nunca”.
Aerith morre sem que seus sentimentos pudessem ser explorados em sua plenitude, fazendo com que se torne uma lembrança dolorosa para todo o grupo.
Referências ao cristianismo, xintoísmo e budismo
O cerne da história de Final Fantasy VII, especialmente no que toca a Aerith, engloba elementos de diversas vertentes religiosas. Sua conexão com o Planeta e com o Lifestream remetem ao budismo e ao xintoísmo, por tratarem do conceito de que tudo está ligado a um ciclo de vida e morte. Já seu sacrifício, como a salvação da desgraça iminente, traz consigo o peso de figuras cristãs como Jesus Cristo, que se sacrificou pela humanidade.
E ainda que ela não seja literalmente ressuscitada, sua essência permanece no Lifestream, sugerindo que ela continua viva e, de algum modo, guia seus companheiros em sua jornada. Essa continuidade vai ao encontro da ideia de que a morte, apesar de dolorosa, não representa o fim, mas uma transição para outro nível de existência.
A resiliência dos que ficam
O sacrifício de Aerith em Final Fantasy VII é um ponto de virada que desafia os personagens a encontrarem resiliência em meio à dor e superarem a perda, que representa muito mais que a perda de uma companheira, mas o impacto de lutar contra forças praticamente imbatíveis em prol do planeta.
Aerith se torna uma mártir, representando a esperança e a vida, mesmo em sua morte. Tal dicotomia acaba inspirando o grupo a lutar com ainda mais garra e serve para lembrar a todos de que salvar o planeta e aqueles que nele habitam é algo pelo qual vale a pena se sacrificar.
O relacionamento entre Cloud e Aerith é uma das partes mais poéticas de Final Fantasy VII e abre espaço para as interpretações pessoais dos jogadores sobre a existência ou não de um romance. É uma história de tragédia e esperança que mostra como as conexões que formamos, ainda que breves, moldam quem somos.
Revisão: Beatriz Castro
