Há exatos 30 anos, em 1995, era lançado um dos jogos mais polêmicos da maior franquia dos jogos de luta: Street Fighter: The Movie. Em março daquele ano chegava aos arcades, em agosto a versão para o Sega Saturn e em setembro o port para o PlayStation.
Desenvolvido pela Incredible Technologies, a intenção do jogo era essencialmente ter um Mortal Kombat do Street Fighter, mas sem a parte da violência, claro. Afinal, a principal diferença entre os dois maiores sucessos do gênero é que SF era um visual desenhado, mais puxado para o cômico até mesmo; enquanto MK trazia a captura de imagens de pessoas de verdade para fazer seus personagens.
Provavelmente “Street Fighter: The Movie The Game” — como é conhecido mundo afora, em uma clara piada com o nome do jogo, pois é um jogo baseado em um filme que por sua vez é baseado em um jogo — foi um dos tie-ins que iniciou uma prática que ficou comum no final da década de 1990 e nos anos 2000. Tie-in é quando um produto é feito associado a outro presente em outro meio, lançados ao mesmo tempo. Geralmente se trata de games aliados a filmes.
Elenco
Com o filme de base, foi fácil de se realizar as capturas de imagens, inclusive com alguns dos personagens utilizando as roupas usadas no filme, e boa parte deles são representados como na telona. Porém, o chefe final, M. Bison, foi realizado pelo dublê de Raul Julia, devido ao falecimento do ator em outubro de 1994.
Outro personagem que precisou de auxílio na produção foi Guile, representado por Jean-Claude van Damme. O ator era um astro em ascensão nos filmes de ação em Hollywood e disponibilizava apenas quatro horas para realizar as capturas de imagens, deixando o resto também para seu dublê.
Além dos dois, retornavam Ken, Ryu, Chun-Li, Cammy, Honda, Zangief, Balrog, Vega e Sagat. Dois personagens novos, que aparecem no filme sem nenhum destaque, também foram adicionados: Blade e Sawada. DeeJay e Blanka foram adicionados nos ports para os consoles de mesa. Por fim, uma tradição começava nos jogos da franquia: não é possível haver um Street Fighter sem um Akuma, portanto ele foi adicionado também.
Uma das curiosidades dos personagens é que os chefes Balrog, Vega e M. Bison pela primeira vez tiveram um jogo publicado no Japão com os seus nomes trocados, sendo como os conhecemos aqui no Ocidente.
Um Street Fighter diferente
Via de regra, jogos tie-in são problemáticos porque possuem pouquíssimo tempo para sua produção, resultando em games muito aquém do esperado. Imagine quando isso acontece com o próprio material fonte do jogo. Street Fighter: The Movie foi feito de maneira apressada, desde a elaboração do roteiro até as gravações e pós-produção. Obviamente, o jogo atrelado à marca também iria sofrer nesse caminho, mesmo sendo lançado três meses após a estreia nos cinemas.
A Capcom, que bancou boa parte dos custos do filme, contratou a Incredible Technologies para fazer o game. A empresa já estava presente na indústria por uns bons anos, desde meados da década de 1980, e tinha experiência com jogos de luta. Porém, ainda não tinham um grande nome para ser referência no projeto.
Alia-se a isso o fato de que os desenvolvedores, que ficavam em Chicago, nos EUA, tiveram que voar para a Austrália para fazer a captura de imagens dos atores no set de gravação. Ou seja, somente depois de terminar todas as sessões, que duravam de 6 a 8 horas em média cada uma, eles voltaram para a sede da empresa para programar. Fazer ajustes e adaptações nas imagens seria difícil, uma vez que nada do jogo existia ainda.
Por fim, outro grande problema foi justamente o uso dos atores nas capturas de imagens. A grande maioria não possuía experiência com lutas ou artes marciais, deixando pouco tempo para especialistas ensinarem a eles as poses corretas. Isso culminou em alguns movimentos estranhos ou bem diferentes do que o público estava acostumado.
Recepção
O jogo não só teve dificuldades de emplacar por causa dos seus próprios defeitos, mas também pela concorrência da época. Virtua Fighter, Mortal Kombat e Street Fighter Alpha foram lançados no mesmo período.
As versões do PSX e do Saturn tiveram um tratamento premium da Capcom, tentando melhorar o jogo e aproximá-lo das outras versões mais conhecidas. Regravação de vozes, adaptação dos sprites, personagens extra foram algumas das mudanças que a empresa colocou, mas, mesmo assim, não foi o suficiente para salvar o jogo.
Apesar de ter trazido algumas ideias que reapareceriam na franquia, como uma ação de “comeback”, que era habilitada quando sua barra de vida estivesse quase vazia — tal qual os Ultra Combos funcionam em Street Fighter IV —, o jogo ainda era esquisito e diferente demais para o público que amava Street Fighter II e suas variações. Novos golpes também causaram estranheza e, misturado a um jogo lento e com imagens e áudios que deixam a desejar, quase ninguém quis saber desse game.
Até os dias de hoje ele é um patinho feio da franquia, esquecido no fundo do baú da Capcom e que provavelmente jamais verá algum tipo de atualização para ser vendido nos consoles atuais.
Revisão: Ives Boitano.