Análise: The Alchemist & His Battle-Scarred Homunculus: uma fábula sombria sobre redenção e alquimia

Mesmo com suas limitações, esta visual novel se sobressai pela narrativa e pelo bom desenvolvimento de seus personagens principais.

em 08/02/2025

The Alchemist & His Battle-Scarred Homunculus
, desenvolvido pela Waffle em 2022 e publicado em inglês pela MangaGamer neste início de 2025, é um jogo que nos leva a um mundo de fantasia no qual cicatrizes do passado, tanto físicas quanto emocionais, vêm à tona. Embora traga falhas técnicas, a visual novel cumpre com sua função de apresentar uma narrativa que explora o impacto das relações humanas.

Cicatrizes que contam histórias

O protagonista, Rakels, é um alquimista que, após ser traído por seu parceiro e ver suas criações transformadas em armas de guerra, se exila em uma vila de pescadores. Seu passado é manchado pela culpa e pela desesperança e seu contato com o mundo exterior se resume a interações frias e mecânicas.

Isso muda quando ele encontra Melpomene — à qual o alquimista e todos os moradores da vila se referem por Mel —, uma homúnculo abandonada e coberta de cicatrizes, fruto de experimentos anteriores relacionados à guerra. Diferentemente de Rakels, que optou pelo isolamento, a moça não teve escolha: foi descartada e deixada para morrer.


A relação entre os dois se desenrola de maneira gradual e sensível, conforme aprendem a confiar um no outro, enfrentando traumas profundos de seus passados e encontrando novos propósitos. Desse modo, uma das grandes qualidades da narrativa é a maneira como as cicatrizes físicas de Mel são um reflexo direto de seu estado emocional: inicialmente, ela é arisca, desconfiada e sempre pronta para fugir, mas, conforme a história avança, seus momentos de vulnerabilidade dão lugar a uma confiança crescente.

Rakels, por sua vez, precisa lidar com seu próprio passado e aceitar que sua redenção não virá do isolamento, mas sim daquilo que pode construir junto a Mel. Será que, ao lado da homúnculo, ele conseguirá se reconectar com as pessoas ao seu redor?

Uma narrativa que conquista pela melancolia

O ponto forte do jogo é, sem dúvidas, seu roteiro. A história se desenvolve de maneira orgânica, sem apressar o vínculo entre os protagonistas, passando a ser uma fábula sobre redenção e aceitação de si mesmo.

Ao longo da leitura, acompanhamos Rakels e Mel em um ciclo de dor e esperança, com diálogos cuidadosamente escritos e cenas que conseguem nos fisgar onde mais dói. A trama, embora carregada de emoção, não se torna excessivamente melodramática, algo comumente explorado em outras histórias do gênero.


Infelizmente, enquanto o desenvolvimento dos protagonistas é feito com todo o cuidado possível, os personagens secundários acabam não possuindo tanto destaque. Algumas figuras poderiam ter sido mais aprofundadas, já que, por meio de seus diálogos, oferecem um contexto interessante sobre o mundo e sobre Rakels.

Igualmente pouco aproveitada é a ambientação: apesar de a vila ser um cenário interessante, não temos acesso a muitas interações fora do círculo de Rakels e Mel. Ao menos, em alguns trechos nos são apresentadas escolhas que podem nos levar para um final bom ou ruim; embora poucas, elas até ajudam a dar uma sobrevida ao jogo, garantindo um pequeno fator de rejogabilidade.

Visual belo, mas limitado, compensado por uma UI competente

Decerto, a arte também é um ponto positivo, mas com ressalvas. Os designs são bem-trabalhados, embora contem com um estilo que remeta ao “padrão eroge”, porém o mesmo não pode ser dito dos cenários: grande parte da história ocorre sempre nos mesmos locais, deixando tudo muito repetitivo. 

Além disso, senti falta de maior expressividade nos sprites dos personagens. As expressões faciais, embora bem-desenhadas, poderiam ser mais variadas para refletir melhor a intensidade emocional dos diálogos. Um adendo que quero fazer aqui é que podemos escolher, a qualquer momento durante a leitura, tanto a versão original das ilustrações quanto uma remasterizada, com cores mais vibrantes.


Outro ponto que preciso criticar é a trilha sonora, que é competente, mas não memorável, com as mesmas faixas sendo repetidas inúmeras vezes ao longo da leitura. Os tons melancólicos ajudam a complementar a narrativa, criando uma atmosfera imersiva, mas faltam faixas que realmente se destaquem; por outro lado, a dublagem é de qualidade, com atuações convincentes, embora caiamos no mal do personagem principal sem rosto e sem voz.

Na minha opinião, para um jogo que aposta tanto em ambientação e emoção, uma direção audiovisual mais diversificada faria uma diferença significativa na experiência. O jogo se beneficia daquilo que constrói, mas poderia explorar melhor variações musicais e faciais para diferenciar melhor as cenas introspectivas das mais dramáticas.


A interface do jogo é bem projetada e oferece diversas ferramentas de qualidade de vida para facilitar a leitura, a começar pelo fato de que ela só aparece durante a campanha quando movemos o mouse pela tela. Como em toda visual novel que se preze, podemos ajustar a velocidade do texto, habilitar leitura automática e configurar o volume das vozes dos personagens de forma individual.

Além disso, há um log para reler passagens e diálogos passados, e as configurações também nos permitem escolher a opacidade da janela de conversa. Opções de quick save/load também estão presentes, facilitando na hora de refazer as escolhas.

Conteúdo adulto não opcional

Como uma faca de dois gumes, The Alchemist & His Battle-Scarred Homunculus é uma das poucas visual novels disponíveis no Steam sem censura. Ou seja, o jogo apresenta na íntegra cenas explícitas que são integradas à narrativa.

No entanto, assim como abordei em The Restless Sheep & The Lone Wolf e Ego’s Spark, as interações íntimas às vezes saem de linha e se tornam “sexo pelo sexo”. Embora algumas passagens no título da Waffle explorem tanto os traumas do passado quanto a vulnerabilidade de Rakels e Mel, tornando-se um elemento orgânico da construção da relação, elas acabam se tornando excessivas (e mais longas do que deveriam) e, por consequência, quebram o ritmo da narrativa.

Para quem prefere evitar esse tipo de conteúdo, o jogo infelizmente não oferece a opção de censurá-lo. Sendo assim, considero a visual novel como mais um caso de “seria melhor se tivesse censura”.

Um conto de redenção

The Alchemist & His Battle-Scarred Homunculus é uma visual novel que se destaca pela qualidade da escrita e pelo desenvolvimento dos personagens. É um jogo que trata de temas sérios de maneira respeitosa e bem-executada, sem apelar para o drama excessivo. 

Apesar de alguns problemas técnicos, como a falta de variedade de cenários e uma trilha sonora pouco marcante, a relação entre Rakels e Mel vale a pena ser conhecida por quem gosta de romances do tipo slice of life com um toque de fantasia.

Prós

  • Interface intuitiva e diversas ferramentas de qualidade de vida que facilitam a leitura;
  • Narrativa bem trabalhada, explorando temas de trauma e redenção de forma convincente, com desenvolvimento gradual e orgânico dos protagonistas;
  • Personagens bem-construídos e interações realistas, tanto entre Rakels e Mel quanto entre os secundários;
  • Possibilidade de jogar com as ilustrações originais de 2022 ou com as remasterizadas;
  • As escolhas ao longo da leitura ajudam a garantir um pequeno fator de rejogabilidade, embora só existam dois finais;
  • Ótima dublagem em japonês.

Contras

  • A direção audiovisual deixa a desejar um pouco, sobretudo na pouca variação de faixas musicais, sprites de personagens e cenários, passando a sensação de repetição;
  • Personagens secundários, bem como a própria ambientação do jogo pouco explorados;
  • Mais um caso de protagonista sem rosto ou voz, típico de eroges;
  • As cenas adultas, além de longas, por vezes quebram o ritmo e a imersão da narrativa.
The Alchemist & His Battle-Scarred Homunculus — PC — Nota: 7.5
Revisão: Davi Sousa
Capa: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida por MangaGamer
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Juliana Paiva Zapparoli
Também conhecida como Lilac, é jornalista e atualmente trabalha com assessoria de imprensa. Fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas.
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