Análise: NEEDY STREAMER OVERLOAD: o lado B(rutal) das redes sociais

Entre a pressão pela perfeição e o desejo de conexão, o jogo entrega uma ótima experiência, mas difícil de digerir.

em 03/02/2025

Originalmente lançado em janeiro de 2022, NEEDY STREAMER OVERLOAD logo ganhou notoriedade por sua abordagem ousada e crítica à cultura da internet e à pressão psicológica sofrida por criadores de conteúdo, tornando-se relevante três meses após sua estreia. Com uma direção de arte chamativa e uma narrativa que mistura momentos tanto absurdos quanto de vulnerabilidade, o jogo é, ao mesmo tempo, fascinante e desconfortável.

Um olhar sobre a vida por trás das telas

No centro da trama, está Ame, uma jovem aspirante a streamer que almeja se tornar uma figura influente no mundo online como OMGkawaiiAngel. Nosso papel na história é o do parceiro de Ame, carinhosamente chamado de P-chan (uma referência a “producer”, como é chamado o produtor em séries como The Idolm@ster), e devemos auxiliá-la na jornada para aumentar sua popularidade e conquistar seguidores.

No entanto, a simplicidade aparente dessa premissa logo é dissolvida conforme o jogo revela sua verdadeira intenção: expor o custo emocional e psicológico de viver sob os holofotes virtuais. Ame é uma personagem complexa, oscilando entre momentos de autoconfiança e crises de ansiedade, então cabe a nós equilibrar sua saúde mental com o crescimento de sua carreira.


Ao longo da campanha, nossas escolhas afetam diretamente os rumos da história. Como a protagonista só vai ao vivo à noite, durante o dia e o anoitecer podemos selecionar algumas atividades específicas que avançam o tempo — às vezes, até o dia seguinte, o que faz com que Ame perca a transmissão. Ainda, essas escolhas podem ajudar nossa aspirante a streamer a desbloquear novas ideias para suas interações online, que afetam não apenas a influência sobre seus seguidores, como também sua saúde mental.

O cerne do desenvolvimento, no entanto, está nas mensagens que Ame troca com P-chan e em suas postagens na rede social fictícia, os únicos canais que temos para saber a quantas anda a menina. Às vezes, temos a opção de escolher uma resposta pré-definida, mas, na maioria dos casos, podemos simplesmente ignorá-la ou tentar uma comunicação por meio das figurinhas do bate-papo — ações estas que também influenciam no comportamento da garota.


De certo modo, para não entrar muito em spoilers, este simulador lembra um pouco o dia a dia com um tamagotchi, porém bem mais realista. As situações são repletas de humor ácido e melancolia, mas a forma como reagimos a certos desdobramentos varia de pessoa para pessoa.

Na minha opinião, o equilíbrio (ou a falta dele) entre o real e o virtual é o maior trunfo da narrativa, principalmente ao expor a superficialidade e as consequências disso na vida offline.

Personagens que são mais do que pixels

Apesar de seu comportamento muitas vezes errático (e irritante também) e suas demandas constantes por atenção, Ame é uma personagem incrivelmente palpável. Suas inseguranças, esperanças e medos são trabalhados de forma tão autêntica (chegando a assustar, no bom sentido, em alguns momentos) que é difícil não sentir empatia pela jovem streamer.

Outro aspecto interessante é como os seguidores de Ame são retratados. Enquanto alguns são carinhosos e incentivadores, outros personificam o lado mais sombrio das redes sociais, com cobranças exageradas e críticas destrutivas — dinâmica esta que não apenas reforça a pressão que Ame enfrenta, mas também levanta questões sobre o impacto que a interação online tem sobre a saúde mental de criadores de conteúdo.


No campo visual, NEEDY STREAMER OVERLOAD traz uma arte colorida em pixel art, mas que abusa de elementos psicodélicos; a interface, por sua vez, imita o caos de lidar com múltiplas janelas no computador. Essa escolha estilística não é por acaso e ajuda a captar ainda mais confusão e a pressão de viver no mundo digital.

A trilha sonora, embora enjoativa e repetitiva às vezes, também merece destaque, com músicas que, a depender do momento narrativo, variam entre tons descontraídos para momentos menos intensos e batidas mais agitadas para acompanhar ciclos mais enérgicos. Além disso, os efeitos sonoros ajudam a criar uma experiência mais imersiva, já que, entre os disponíveis no jogo, temos até mesmo notificações e mensagens que imitam as interações reais em redes sociais.

Nem tudo são flores no mundo digital

Embora NEEDY STREAMER OVERLOAD seja uma experiência curiosa, ela não é isenta de problemas. A curva de aprendizado pode ser confusa no início, com tantas opções e estatísticas para gerenciar que podem nos sobrecarregar; ainda, o ritmo da narrativa não é uniforme, com momentos que podem parecer arrastados ou repetitivos.

De modo geral, existe um fato de rejogabilidade, já que o jogo dispõe de 24 finais diferentes Infelizmente, não há indícios de qual “rota”, por assim dizer, estamos seguindo; apenas quando alcançamos um desses desfechos é que descobrimos que fim levou Ame, dificultando na hora de tentar reverter certas ações para seguir outro caminho sem recorrer a um novo save.

Até é possível voltar nos dias e refazer ações, mas, sem um indicativo como um fluxograma, logo a jogabilidade tende a cair facilmente na tentativa e erro. Outra questão a ser levada em conta é a acessibilidade visual: por se tratar de um jogo muito colorido e carregado de informações textuais e imagéticas, pode ser um pouco desconfortável passar horas lendo os textos de uma tela tão carregada — aqui, poderia ser de grande ajuda um modo de equilíbrio de cores para daltônicos, por exemplo.

Uma reflexão sobre o impacto de ser streamer

NEEDY STREAMER OVERLOAD nos convida a refletir sobre as pressões e as armadilhas do mundo digital. A história não tenta romantizar ou simplificar as experiências de Ame, mas as apresenta de forma honesta e crua. Para algumas pessoas, isso pode ser catártico; para outras, perturbador — mas, acima de tudo, é um lembrete de que a busca pela validação online pode ter um custo elevado para a nossa saúde mental.

Prós

  • Narrativa provocativa que aborda temas relevantes e atuais, especialmente em relação à pressão sofrida por criadores de conteúdo online;
  • A caracterização de Ame, combinada com a apresentação audiovisual, ajuda a reforçar a dependência tecnológica e digital e os impactos que isso traz para a vida real;
  • Sistema de escolhas que impacta diretamente o desenrolar da história;
  • Os 24 finais trazem, embora com ressalvas, um fator de rejogabilidade.

Contras

  • A curva de aprendizado confusa no início e o ritmo narrativo um tanto quanto inconsistente podem deixar o jogo repetitivo;
  • Sem o suporte de um indicador de rotas, rapidamente as escolhas passam a ser um sistema de tentativa e erro;
  • Devido à interface carregada de ícones, textos, cores e imagens e à falta de uma configuração que permita o ajuste de cores, uma jogatina prolongada pode cansar a vista facilmente.
NEEDY STREAMER OVERLOAD — PC/PS5/PS4/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Davi Sousa
Capa: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida por WSS Playground
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Juliana Paiva Zapparoli
Também conhecida como Lilac, é jornalista e atualmente trabalha com assessoria de imprensa. Fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas.
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