Já fazia um tempinho que um novo jogo da franquia Macross não dava as caras nos games. O último título da saga espacial foi lançado em 2017, e ainda assim tratava-se de um spin-off bem distante da sua raíz shoot ‘em up.
No ano passado, MACROSS -Shooting Insight- foi lançado exclusivamente no Japão e agora chegou a hora das aeronaves-robôs alçarem voos mais distantes para o restante do mundo. Mas, primeiro, você já ouviu falar em Macross?
Uma origem confusa
Antes de começar essa análise, é necessário saber qual a origem de Macross. Trata-se de um anime lançado em 1982 com o nome de Super Dimension Fortress Macross. Ele foi o ponto de partida para mais três séries de TV: Macross 7 (1994), Macross Frontier (2008) e Macross Delta (2016). Além disso, o universo da narrativa foi expandido com mais quatro filmes, seis OVAs, uma light novel e cinco séries de mangás.
Grande parte da série, bem como muitos dos seus mais de 40 jogos, lançados para diversas plataformas como MSX, PC Engine, MS-DOS, Super Famicon, Game Boy Color e a família PlayStation, ficou restrita ao Japão. E aqui faço minha mea culpa, pois mesmo como um apaixonado pelos jogos de navinha da época, nunca tinha ouvido falar na série até o presente momento. O que me despertou a curiosidade foi ver diferentes logos pela galeria, mas me aprofundarei nisso mais adiante.
Outro ponto curioso é que muitas pessoas podem sim já ter assistido ao anime original de Macross, mas com algumas mudanças em sua história por questões comerciais. Ainda na década de 80, mais precisamente em 1985, a empresa Harmony Gold adquiriu a licença de distribuição dos 36 episódios de Super Dimension Fortress Macross diretamente para o vídeo, mas as redes americanas só aceitavam séries com um mínimo de 85 episódios. A solução foi juntar com outras duas séries e realizar um processo de edição de cenas e regravação de falas para que elas fizessem sentido.
Assim nasceu Robotech, a versão estadunidense que, além de ter os episódios de Macross, trazia conteúdo de Super Dimensional Cavalry Southern Cross (23 episódios) e Genesis Climber Mospeada (25 episódios). Apesar da colcha de retalhos que fez com obras orientais, Robotech foi um dos principais difusores da cultura dos mechas de combate para o Ocidente.
Mesmo assim, esse produto “remendado” não conseguiu dar continuidade à história e suas tentativas de se manter em alta acabaram sendo engolidas, ainda mais com a chegada de outras obras com a mesma temática, como Evangelion e Mobile Suit Gundam Wing. Outro marco importante foi a chegada da internet, que possibilitou que muitas pessoas pudessem baixar toda a saga do Macross original e acompanhar todo material na íntegra com legendas. O mesmo vale para os emuladores e ROMs, que tornaram acessíveis, mesmo que de maneira clandestina, diversos títulos antes presos por barreiras culturais e mercadológicas.
Muitas maneiras de jogar e com direito a música tema
Agora, voltando a MACROSS -Shooting Insight-, temos um um tradicional shoot ‘em up, que tenta mesclar quatro tipos diferentes de perspectiva a todo momento: progressão horizontal (da esquerda para a direita); progressão vertical (de baixo para cima); cenário fechado com controle do veículo pelo espaço, usando as duas alavancas para pilotar e girar sua posição livremente; e uma perspectiva em terceira pessoa que lembra um rail shooter, como Space Harrier, mas apenas com o deslocamento lateral para combater inimigos que vêm na sua direção.
Podemos escolher entre cinco personagens, cada um com um papel de destaque na história original da série Macross. Eles possuem características distintas, como alcance e quantidade de projéteis, velocidade e força. Quanto mais disparos, menos força eles terão, então, pelo menos entre os pilotos, há um balanceamento bacana. A única coisa curiosa, e sem explicação aparente, é que a versão japonesa conta com um sexto personagem selecionável, mas ele foi cortado da versão americana.
Quanto aos estilos de jogabilidade, eles são consagrados de maneira geral, cada um à sua maneira, mas o jeito como a mistura foi feita não é agradável e não explora o principal da série, que são as transformações das naves. Elas podem ter três posições de combate, mas qual pilotaremos é uma incógnita. Podemos trocar várias vezes de forma, mas isso é regido automaticamente pela história, assim como a perspectiva de jogabilidade.
Seria muito mais efetivo deixar cada fase inteira sob um estilo de jogo e nos permitir alterar a forma do nosso mecha de combate de acordo com a disposição necessária, já que o modo de ataque não altera em nada a força do nosso equipamento, seja como nave ou como robô.
Toda essa bagunça é bastante incômoda, o que é uma pena já que a jogabilidade em si é simples e ótima. Temos nossos projéteis comuns, que variam de acordo com a nave que escolhemos; mísseis teleguiados, disparados automaticamente ao utilizarmos a mira com o analógico direito, mas ao usá-los não podemos usar os projéteis; uma rajada de mísseis de apoio, condicionada a uma barra na parte inferior da tela; e um botão para esquiva.
Existe mais uma coisa que poderia ser bem mais legal, só que também se torna estranha. Uma das características de Macross é a forte presença musical. Entre uma leva de naves inimigas e outra, aparecem satélites interruptores de sinal. Se destruímos eles, restabelecemos a conexão com algumas dessas estrelas, que começam a apresentar uma canção no meio da batalha. Elas não são à toa, pois elas afetam o campo de batalha com algum efeito único, deixando os projéteis que vem na nossa direção mais lentos, aumentando nossa resistência ou velocidade, por exemplo.
Entretanto, por todo o tempo que a canção tocar, a tela fica com um filtro rosa bastante estranho e brilhante, como se fosse um efeito estelar. Além de ser incômodo, ele cria pontos cegos nos cantos da tela, que acabam escondendo naves rivais ou movimentos dos chefes. A ideia da música animar os pilotos que controlamos é legal e as músicas são realmente boas, mas podia ter menos influência visual na hora da ação.
Fazendo jus ao material de origem em silêncio
Começamos apenas com o modo Story disponível e é necessário finalizá-lo para liberar os demais. Neste, cada protagonista tem sua trajetória e sequência de eventos. As partidas são intercaladas com cenas de diálogo, que infelizmente perdem o brilho por não ter nenhum tipo de dublagem. Cada personagem ao aparecer só solta um grunhido de reação enquanto a caixa de diálogo é preenchida longamente.
Levando em consideração que Macross tem um legado a ser respeitado, seria bacana ter vozes para todo esse elenco. Vale citar que outros jogos mais modestos do mesmo gênero, como Natsuki Chronicles por exemplo, traziam falas antes e durante as fases.
A conclusão do Story libera os seguintes modos: Arcade, que é basicamente a mesma coisa do anterior, só que sem as cenas de diálogo; Ace Battle, na qual escolhemos um dos pilotos inimigos para um duelo; Boss Rush, que te coloca para enfrentar os chefes diretamente, sem passar por preliminares; e Area Survey, que nos permite jogar qualquer estágio liberado previamente de maneira isolada.
No meio disso tudo, a Galeria traz elementos bem interessantes que justificam ter que passar por todos os modos de jogo. Podemos liberar itens que aparecem nas séries, além de cenas, artes conceituais, modelos virtuais das naves e memórias que explicam um pouco de cada arco. Os itens são coletados no meio dos estágios, enquanto as demais peças aparecem com a conclusão e desempenho em cada uma das modalidades, utilizando diferentes pilotos.
Ainda assim, a sensação de repetitividade causada pela sequência “atira, troca de forma, atira, toca música, próxima fase” pode cansar até mesmo os entusiastas do gênero ou da série animada. Como são diversos itens para serem liberados, serão necessárias muitas e muitas batalhas espaciais.
Com o nome ficou pesado…
MACROSS -Shooting Insight- tem boas ideias e falhas de execução, mas o fato de carregar o nome de uma franquia clássica acabou se tornando um fardo, mesmo com a Galeria repleta de colecionáveis bacanas, o principal, que era enfatizar o combate com as diferentes formas do mecha, acabou devendo e a troca constante de perspectivas é um exemplo de algo bom que foi usado de maneira ruim.
Prós
- O jogo utiliza quatro perspectivas diferentes, familiares para quem gosta de shoot ‘em ups;
- Há um balanceamento bem bacana entre os cinco pilotos selecionáveis;
- As músicas especiais que tocam no combate são muito boas;
- Galeria repleta de itens bacanas e memorabilia que ajuda quem não conhece a série Macross a conhecer melhor.
Contras
- A troca constante e aleatória de perspectivas e formas dos mechas queima a ideia de dinamismo e se torna incômoda, quebrando o ritmo da ação;
- O jogo se torna bastante repetitivo, mesmo com os diferentes modos;
- Uma dublagem, mesmo que em japonês, fez falta nas cenas de diálogo;
- Os momentos musicais deixam a tela muito poluída e criam pontos cegos nos cantos;
- A versão americana conta com um personagem selecionável a menos.
MACROSS -Shooting Insight- — PC/PS4/PS5/Switch — Nota: 7.0Versão utilizada para análise: PS5
Revisor: Beatriz Castro
Análise feita com cópia digital cedida pela Red Art Games