Apesar do sucesso de audiência e da venda de brinquedos, a Disney não demonstrava interesse em Power Rangers desde a aquisição da Fox Kids, permitindo a continuidade do programa apenas por insistência da equipe responsável. Após o encerramento da 17ª temporada (RPM), a franquia retornou para as mãos da Saban, agora sob o nome de Saban Brands.
Em uma "nova" casa, os jogos de Power Rangers passaram por uma revitalização, sem o envolvimento direto da Natsume e com maior foco no mercado mobile. Apesar disso, o início dessa nova era recebeu alguma atenção no mundo dos videogames.
Samurai Forever!
Power Rangers Samurai marcou o início da nova era de forma mediana no gosto dos fãs, mas os dois jogos lançados foram minimamente decentes. O título para Wii, desenvolvido pela Inti Creates (de Mega Man Zero e Azure Striker Gunvolt), segue a direção esperada de um jogo de ação no estilo beat ‘em up. Nele, escolhemos um Ranger e avançamos por fases lineares, coletando itens e enfrentando monstros. Os controles de movimento não são invasivos, sendo utilizados apenas na hora de morfar desenhando kanjis no ar e nos ataques especiais finalizadores.
O sistema de combate é extremamente simples, exigindo apenas dois ataques básicos para derrotar a maioria dos inimigos comuns. Isso significa que não há um sistema efetivo de combos, geralmente sendo necessários dois ataques para derrotar um adversário mais fraco. Em compensação, cada herói possui ataques únicos, e o modo cooperativo para dois jogadores torna a experiência mais interessante.
A apresentação do jogo é decente, com cenas retiradas do programa de TV, uma história que conta com os atores da série na dublagem e uma trilha sonora surpreendentemente fantástica, repleta de melodias agitadas e muita guitarra.
Já a versão para Nintendo DS, também desenvolvida pela Inti Creates, segue o mesmo princípio, mas em 2D. Apesar de ser ainda mais simples que os jogos de GBA, ela entrega bons momentos, especialmente nas batalhas contra chefes. A tela de toque é utilizada tanto na morfagem quanto nas batalhas de Megazord, que desta vez ocorrem como minigames de acertar botões no momento certo em um sistema de turnos.
Somos os próprios Power Rangers… talvez?
A Saban adotou uma nova estratégia em suas produções de Power Rangers: cada grupo teria duas temporadas, reutilizando o mesmo tema por dois anos (sempre que possível) e mantendo os mesmos personagens, adicionando o prefixo “Super” à série. Com a chegada de Super Samurai, tivemos apenas um jogo exclusivo para o Xbox 360, que utilizava o Kinect como forma de controle — uma desculpa para tirar meu Kinect da caixa após tanto tempo guardado.
Power Rangers Super Samurai segue o padrão de muitos jogos de ação feitos para o periférico. O jogador enfrenta hordas de inimigos, movimentando-se para derrotar quem surgir pelo caminho, executando espadadas e chutes para lidar com as situações. Assim como nos títulos de Wii e DS, é necessário desenhar os kanjis na tela para morfar.
A imprecisão do sensor de movimento deixa as ações um pouco desengonçadas, mas é divertido ver a câmera registrando o jogador no próprio jogo, inclusive em algumas cutscenes e durante a transformação. Como a maioria dos títulos que utilizam o acessório, trata-se de um jogo de baixo orçamento, com visuais simplificados para não sobrecarregar o processador do Xbox 360. Ainda assim, os tempos de carregamento são muito longos, o que acaba quebrando o ritmo da aventura.
Apesar das limitações, é possível se divertir por alguns minutos, e consigo imaginar crianças da época ficando encantadas com a experiência.
As temporadas que todos odeiam, com jogos fáceis de odiar
Com a estreia da nova série em 2012, Power Rangers Megaforce contou com dois jogos, um para a primeira temporada e outro para Super Megaforce. Embora Samurai tenha dividido opiniões, poucos esperavam que a nova gestão da Saban entregasse o que muitos consideram as piores entradas da franquia. Ainda assim, eles se limitam a serem apenas medíocres.
Ambos os títulos são beat ‘em ups com visão lateral, seguindo o esquema clássico de derrotar tudo o que se move e coletar itens ao longo das missões. Os Rangers são alternados ocasionalmente, cada um com seu próprio conjunto de habilidades e armas. Apesar de os controles funcionarem durante os combates, os momentos de plataforma são frustrantes, devido ao movimento confuso da câmera e à imprecisão dos saltos.
Outro detalhe que irrita está nas falas dos Rangers que vão aparecendo literalmente o tempo todo. Como elas são dubladas, é impossível passar alguns segundos sem alguém falando “Good work!” ao pegar uma moeda, ou exclamando surpresa pelo jogador estar próximo a uma carta pela milionésima vez.
Uma curiosidade interessante é que Megaforce foi desenvolvido com base em Zyuden Sentai Kyoryuger: Game de Gaburincho!! (jogo da temporada que futuramente originaria Dino Charge), sendo praticamente uma espécie de ROM hack do game japonês. Essa adaptação explica o motivo da apresentação ser mais extravagante do que o habitual para um título de Power Rangers.
É praticamente o mesmo jogo trocando a história e os inimigos para cada série. |
O jogo de Super Megaforce tem uma proposta similar, mas com menos seções de plataforma e coleta, focando mais no combate, remetendo um pouco ao estilo de Samurai para Wii. O diferencial é que essa temporada celebra os 20 anos de Power Rangers, e no jogo é possível desbloquear alguns dos heróis clássicos cumprindo certos requisitos (desnecessariamente exigentes), cada um com seus próprios movimentos únicos.
Até havia algum potencial na ideia, mas a execução de Super Megaforce de 3DS chega a ser pior que a do antecessor. Apenas dois inimigos aparecem ao mesmo tempo na maior parte tempo, o combate é travado e as fases são longas demais para seu próprio bem. Em cinco minutos você já está cansado de tanto apertar botão sem nenhum desafio.
O fim dos jogos baseados nas séries nos consoles
Após Super Megaforce, a franquia não ganhou mais nenhum jogo baseado em temporadas da série de TV para consoles, focando nas experiências para celular, como um título baseado em Dino Charge. Apesar de a maioria desses jogos estar deslistada atualmente, alguns deles, como Legacy Wars e Mighty Force, continuam recebendo suporte até hoje.
Nos consoles, o destaque ficou por conta de Mighty Morphin Power Rangers: Mega Battle, um beat ‘em up baseado na série original, lançado em 2017 pela Bamtang (a mesma do problemático Avatar: The Last Airbender - Quest for Balance) para PlayStation 4 e Xbox One. Por questões de licenciamento, o título foi removido das lojas digitais.
Com uma jogabilidade no estilo arcade, Mega Battle traz uma nova história de Mighty Morphin em gráficos modernos, com personagens em um estilo cartunesco. A movimentação lembra os jogos em estilo flash ou Brawlhalla — algo que particularmente não aprecio —, mas a jogabilidade é ágil e inclui uma loja de melhorias, adicionando certa variedade.
Saindo do gênero beat ‘em up e retornando ao mundo dos jogos de luta, tivemos o lançamento de Power Rangers: Battle for the Grid em 2019 pela nWay, disponível para PS4, Xbox One, PC e Switch. O jogo reaproveita assets do já mencionado Legacy Wars, adotando um estilo 3 contra 3 claramente inspirado em Marvel vs. Capcom 2 e 3.
As mecânicas de combate seguem o esperado para o gênero, permitindo trocar de personagem durante as lutas, chamar assistências e executar combos devastadores. Battle for the Grid se destaca pela acessibilidade, sendo um dos primeiros jogos a adotar um esquema moderno de controles, em que especiais podem ser ativados com o simples pressionar de uma direção e um botão. Apesar dessa simplicidade inicial, o jogo apresenta uma curva de aprendizado desafiadora para a execução de combos avançados.
Tecnicamente, o jogo não impressiona, refletindo seu orçamento modesto. No entanto, fica evidente o carinho dedicado à sua concepção. O elenco é diversificado, abrangendo personagens clássicos e modernos, e ainda incluindo participações especiais de Ryu e Chun-Li, de Street Fighter. O modo história é inspirado nos quadrinhos, trazendo um enredo mais sério com algumas reviravoltas interessantes.
Finalmente, em 2024, tivemos outro jogo baseado em Mighty Morphin: Mighty Morphin Power Rangers: Rita’s Rewind. Fiz a análise dele para o GameBlast recentemente e minhas opiniões permanecem inalteradas após alguns updates. Trata-se de um jogo "ok", com uma apresentação visual sublime, mas que exemplifica como amor pelo material original nem sempre resulta em um produto final proporcionalmente bom.
Voltando ao outro lado do mundo
Os Super Sentai receberam mais atenção nos consoles portáteis durante a década de 2010 do que na de 2000. O DS recebeu um jogo de Gokaiger que combina minigames com elementos de dungeon crawler e caça ao tesouro, fortemente inspirado na temática de pirataria que definiu essa série.
Já o 3DS, além do mencionado jogo de Kyoryuger, ganhou Shuriken Sentai Ninninger (Aço Ninja), que trouxe uma leve mudança na jogabilidade, dessa vez focando em combos e hordas de inimigos. No entanto, o design de arte mais simplificado conferiu a essa entrada um visual menos atrativo.
Os jogos mais peculiares vieram de séries como Doubutsu Sentai Zyuohger, que se transformou em um jogo de combinar peças ao estilo Match 3 convencional, e Nari Kids Park: Kaitou Sentai Lupinranger VS Keisatsu Sentai Patranger, lançado para o Switch. Este último é uma coletânea de minigames educativos voltados para crianças e, até a data de publicação deste texto, é o último jogo de console baseado em Super Sentai.
Voltando ao Wii, vale mencionar Super Sentai Battle: Ranger Cross, um jogo musou lançado em 2011 como parte das comemorações dos 45 anos de Super Sentai. Baseado principalmente em Gokaiger, o jogo permite desbloquear equipes das quatro temporadas anteriores, além de contar com a participação especial dos cinco heróis de Himitsu Sentai Gorenger, o Super Sentai original de 1975.
O game é bastante repetitivo, pois toda fase é uma arena com dezenas de inimigos, enquanto o objetivo é coletar moedas para executar um ataque finalizador. Pelo fanservice de Super Sentai, vale dar uma olhada caso goste muito da franquia; entretanto, a barreira do idioma nipônico é considerável na navegação de menus.
Vale lembrar que a outra franquia dourada da Toei no universo dos tokusatsu, Kamen Rider, continua recebendo jogos para consoles até hoje. Enquanto os Super Sentai têm se limitado a lançamentos esporádicos e menores, os heróis insetos conquistaram fighting games e até RPGs consideravelmente divertidos. Esse contraste provavelmente se deve à faixa etária do público-alvo. Kamen Rider tradicionalmente apela a um público mais pré-adolescente do que Super Sentai.
Uma série de altos e baixos
E assim encerramos este especial sobre os jogos de Power Rangers, com uma conclusão mediana. É inegável que os títulos da era dos 16 bits merecem destaque, por conseguirem equilibrar melhor a premissa de uma boa aventura com o conceito de um produto licenciado. Embora existam algumas aventuras válidas após essa fase, raramente ultrapassam o patamar de medianos, com a maioria oscilando entre o fraco e o esquecível.
Ainda assim, há esperança. Torço para que a franquia receba algum jogo com maior investimento, que consiga se desprender da nostalgia de Mighty Morphin, um tema que tem dominado os últimos anos. Um título no estilo de Battle for the Grid, que respeite e celebre todo o legado de Power Rangers independente da era ou mídia, seria o ponto de partida ideal para atender às expectativas dos fãs mais dedicados, ou quem sabe um jogo com novos Rangers exclusivos para um game. Não custa sonhar.
Até lá, resta torcer para que tanto a parte ocidental — atualmente em hiato — quanto os Super Sentai continuem a nos brindar com boas produções e programas que entretêm. Que também não faltem brinquedos mirabolantes para despertar aquela vontade de deixar nossa criança interior sorrir.
Revisão: Heloísa D'Assumpção Ballaminut