Análise: Everlasting Flowers nos mostra que, de fato, quando se há oportunidade, existe um caminho

A mensagem transmitida é poderosa, mas deve ressoar mais com pessoas que passaram pelas experiências descritas.

em 16/01/2025

Lançada em agosto de 2024, Everlasting Flowers é uma visual novel da demografia girls love (GL) que aposta no formato cinemático para contar sua história. Porém, diferentemente de outros títulos da desenvolvedora Sprite, como Aokana: Four Rhythms Across the Blue, temos aqui um jogo que se beneficia do estilo batizado de “cinematográfico” para contar uma poderosa história.

Um conto sobre as oportunidades da vida

A personagem principal da trama, Mina Sakashita, é uma adolescente de 17 anos que, teoricamente, deveria estar cursando o segundo ano do colegial. No entanto, ela foi vítima de bullying e isolamento social, o que a levou a desenvolver depressão e sofrer de todas as consequências do transtorno, em especial uma baixíssima autoestima e pouco valor de si mesma.

Graças a isso, ela desiste de frequentar a escola e passar a viver como uma hikikomori, isto é, uma pessoa que não busca nenhum tipo de convívio social, alheia do mundo ao seu redor. Tal decisão leva os pais de Mina a sugerir que ela vá trabalhar, durante o período de férias de verão (mês de agosto no Japão), em uma espécie de alojamento com restaurante chamado Rassembler.


A princípio, Mina não gosta da ideia, porém aproveita essa oportunidade para ir a um lugar onde ninguém a conhece. No entanto, o restaurante, gerido por Michiko Yanase, tem regras um tanto incomuns, sendo a primeira delas o confiscamento do celular, cortando Mina de qualquer contato com o mundo externo; além disso, todas as trabalhadoras do lugar precisam usar o uniforme de suas respectivas escolas.

Se essas condições já não fossem ruins o suficiente para a protagonista, ela precisa ainda conviver diariamente com Ran Seino, outra garota que decidiu passar suas férias de verão trabalhando no Rassembler. Para piorar a situação, ela parece ser o completo oposto de Mina: extrovertida, bonita, confiante e, acima de tudo, focada no futuro.


Desse modo, toda a trama de Everlasting Flowers, que é dividida em seis capítulos que totalizam aproximadamente dez horas de leitura (a depender da velocidade de leitura pessoal), gira em torno dos conflitos — intra e interpessoais — de Mina e Ran, mas com foco total no desenvolvimento da amizade entre as duas garotas. 

Além das protagonistas, as personagens de apoio — Himari Naruse, Sanami Tachibana e a própria Michiko —, embora não tenham tanto destaque, são extremamente críveis e bem-construídas. É curioso, inclusive, notar que todas elas carregam algum tipo de trauma em suas vidas, que também servem como combustível para impulsionar a trajetória de Mina e Ran.

Para finalizar este tópico e evitar spoilers, também quero comentar que nem todos os capítulos trazem o ponto de vista de Mina. Em alguns deles, podemos ver a história sob a ótica de Ran, algo que, na minha opinião, enriquece a experiência como um todo.

Mensagem poderosa contada por meio de flores

Como mencionado, a história de Everlasting Flowers traz temas sensíveis e cotidianos. Embora a escrita de Yohira seja leve, as questões levantadas ao longo da leitura estão longe de ser levianas — e, para a minha surpresa, me senti abraçada pela história em si.

Pude ver muito de mim especialmente em Mina, mas passei por situações descritas por Ran. Também entendo as dores de Himari, mesmo que abordadas quase no final do jogo, e consigo simpatizar com a situação em que Michiko está; ainda, estaria mentindo se eu dissesse que não consegui ver um pouco do meu modo de pensar no de Sanami.


Outro grande ponto forte, para mim, é o modo como Yohira conseguiu criar um contexto e personagens que se justificam com a própria temática floral, dos herbários que Himari usa para decorar o interior de Rassembler à efemeridade das flores. Até mesmo os nomes das personagens estão direta ou indiretamente ligados a essa simbologia — por exemplo: o kanji no nome de Ran significa “orquídea”, enquanto o nome “Himari” está associado ao girassol.

Claro, dado o teor da obra, a visual novel é carregada de drama e, quando pensamos em romance do ponto de vista amoroso, de fato, fica mais difícil entender a profunda ligação entre Mina e Ran. Desse modo, para quem não passou pelas situações descritas na trama, Everlasting Flowers pode parecer um produto queerbait extremamente dramático e superficial, mas a verdade é que essa percepção está longe de ser verdade — e muito disso é visto no crescimento das protagonistas.

Contudo, devido a essa impressão, acredito que vale o aviso para quem quer apenas um “romance colegial entre duas garotas”, porque não é esse o foco desta visual novel. Então, aqui reforço o que eu já disse em várias outras análises minhas, sobretudo de visual novels: é um produto que dialoga com um público-alvo específico, podendo não atender às expectativas de quem não está nessa seleção.

Tentei procurar defeitos, mas não encontrei

Everlasting Flowers, desde o início, chama a atenção por sua belíssima e altamente bem-executada apresentação audiovisual. Não apenas temos um apelo com as ilustrações (somadas, elas ultrapassam 700 CGs, mesmo que algumas sejam apenas variações), mas também uma trilha sonora carregada de emoções; fechando esse pacote, o elenco de dublagem (integral em japonês nos diálogos) conta com grandes nomes na indústria de animação, como Lynn (Miorine em Mobile Suit Gundam: The Witch from Mercury), Reina Ueda (Cha Hae-in em Solo Leveling) e Miyu Tomita (Riku em Made In Abyss).

Outro ponto de destaque é a interface limpa que prioriza a experiência de usuário, um ponto que, inclusive, me deixou curiosa para jogar a versão de Switch, de tão otimizada que é. A navegação é extremamente simplificada e não temos muitos botões na tela, muito menos uma caixa de diálogo, nos deixando livres para apreciar a leitura e as ilustrações sem poluição visual.


Além disso, estão presentes todas as ferramentas essenciais para um bom aproveitamento do jogo, como velocidade de leitura, texto automático e outras. De brinde, há ainda duas opções de fontes para escolher, e o texto em inglês traz uma qualidade ímpar; se existem erros de digitação ou espaçamento, realmente não fui capaz de percebê-los, de tão ínfimos que são.

Acredito que o único “defeito” são as conquistas presentes no Steam e PS4, que dão a entender erroneamente que existe um conteúdo pós-jogo, já que quatro deles estão relacionados à visitação da história. Porém, mais uma vez, é uma questão que não tira o valor da obra em questão.

Flores são bonitas porque morrem

Everlasting Flowers não é um projeto grande ou ambicioso, mas entrega com esmero e maestria tudo aquilo que propõe em sua sinopse. Baseando-se na transiência da vida, sobretudo a efemeridade das flores, temos aqui uma história profunda e tocante sobre a importância de procurar caminhos para superar nossos obstáculos.

Pode não ser um romance que muitas pessoas esperam, mas, com certeza, é uma poderosa mensagem para quem precisa de um empurrãozinho para seguir em frente. E, acima de tudo, um lembrete de que podemos aprender — e crescer — com nossas adversidades e experiências.

Prós

  • Excelente apresentação audiovisual, com músicas, cenários e artes muito bem-feitas e extremamente bonitas;
  • A dublagem integral em japonês conta com nomes de peso do ramo;
  • A história traz uma mensagem poderosa sobre enfrentar as adversidades da vida, sem fazer pouco caso de vítimas de bullying e depressão;
  • Todos os traumas apresentados na trama são verossímeis e bem-desenvolvidos sem leviandade;
  • Personagens bem-trabalhadas, com personalidades marcantes e palpáveis;
  • Presença de uma Interface de usuário que prioriza a experiência com o jogo, bem como de todas as ferramentas de qualidade de vida necessárias para um bom aproveitamento de visual novel.

Contras

  • As conquistas no Steam e PS4 dão a entender que há conteúdo pós-jogo, o que não é verdade;
  • Para quem não passou por situações similares às descritas ao longo da trama, o jogo pode dar a impressão de ser muito dramático e superficial.

Everlasting Flowers — PC/PS4/Switch — Nota: 10.0
Versão utilizada para análise: PC

Revisão: Davi Sousa
Capa: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital adquirida pela própria redatora
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Juliana Paiva Zapparoli
Também conhecida como Lilac, é jornalista e atualmente trabalha com assessoria de imprensa. Fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas.
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