Análise: Eternal Strands: magia, caos e muita história em um divertido RPG de ação que estica o fio além da conta

Oscilando entre suas ambições e limitações, Eternal Strands oferece ação divertida que se dilui na repetição desnecessária.

em 27/01/2025

Eternal Strands
anda na corda bamba entre a ambição e as limitações da produção. Balança, mas não cai, provendo uma aventura divertida de muitas qualidades, mas cujo principal problema é não conseguir escapar de seus ciclos repetitivos.

Tecendo a trama

Nesse mundo, a magia flui por fios. Os magos são os Tecelões, aqueles que sabem tecer esses fios arcanos em mantos que permitem usar tais poderes. Décadas atrás, os Tecelões fundaram uma grandiosa e utópica cidade no vale conhecido como Enclave, mas algo saiu errado e foi erguido o Véu, uma muralha ao redor do local que o isolou do restante do mundo, marcando o fim de uma civilização.



Agora, um bando de Tecelões viajantes resolve explorar o Véu para aprender algo mais sobre o mistério que circunda o Enclave, mas o perigo mágico dos Nós os cerca e, na fuga, eles encontram o meio de atravessar a barreira e adentrar a terra abandonada. Sem ter como voltar atrás, a única saída é vasculhar a grande cidade perdida de Dynevron e as áreas do entorno.

Jogamos com Brynn, a novata que precisa assumir o papel de ponta do bando, sendo como uma guerreira batedora que vasculha o terreno e protege o bando. Assim, é com ela que fazemos as principais ações da gameplay: combate, exploração e coleta.



O mundo é (mais ou menos) sua arma

O combate tem o básico do corpo a corpo, mas o maior diferencial são as magias. Brynn pode aprender magias de três tipos: gelo (pode congelar inimigos para deixá-los lentos e vulneráveis, além de fazer peso para derrubar criaturas voadoras), fogo (além de causar dano, cria incêndios, derrete gelo e refina minérios das rochas) e cinética (cria centros de atração e repulsão gravitacional, move e arremessa objetos com telecinese).

O leque de feitiços não é muito variado, mas seu caráter multiuso compensa ao se adequar ao combate e aos cenários quebráveis. Não podemos destruir tudo, é claro, mas muretas, pedras, árvores e pisos de madeira não resistem aos nossos ataques, gerando detritos que podem ser arremessados contra os oponentes ou mesmo destruir mais elementos do cenário.

Isso representa a promessa do slogan do jogo, “o mundo é sua arma”, e, mesmo sendo menos versátil do que a frase dá a entender, achei satisfatório. Os incêndios e destruição são componentes do caos que pode se instaurar na gameplay.



Sob a sombra dos colossos

Entre os inimigos, o grande destaque são os gigantes soltos pelo mundo. Em ação épica que lembra Shadow of the Colossus, Brynn terá que escalar esses titãs e quebrar os pontos frágeis que soltam as armaduras, expondo as partes vulneráveis para, enfim, descer a espada neles. Também há criaturas aladas para abatermos, como dragões e pássaros de gelo.

Assim como em combates normais, esses momentos podem ficar caóticos enquanto a câmera vai e vem com os movimentos bruscos dos gigantes, que se debatem para derrubar a pequena guerreira agarrada a eles.



Na verdade, não é grande a variedade de chefes, então os gigantes acabam sendo parecidos entre si, apesar de terem métodos de derrubada diferentes. Mecanicamente, esses encontros são um tanto simples e um pouco desajeitados, mas prazerosos pela sensação épica de lançar gelo nas asas de um dragão para derrubá-lo do ar, subir em suas costas e começar a quebrar as escamas com a espada enquanto ele alça voo novamente, levando-nos consigo, até finalmente despencar ao chão com um estrondo.

A primeira vez é ótima, mas, com o tempo, a adrenalina vai se perdendo e a ação épica fica mais parecida com uma tarefa, apenas mais um dia de trabalho de Brynn. Eternal Strands sofre de um problema estrutural de repetição, um assunto ao qual voltaremos mais à frente.



Uma tecelã por todos e todos por uma

Como não há níveis ou pontos de experiência, a principal recompensa por derrotar inimigos está nos materiais de confecção. O sistema de crafting é robusto no sentido de que há armas e armaduras para criar de forma versátil. Cada uma precisa de qualquer material de cada um dos quatro tipos. Os recursos escolhidos vão influenciar nos atributos dos equipamentos e também nas cores dos detalhes, permitindo uma boa variedade visual com um número pequeno de peças.

Além disso, os materiais podem ser convertidos em recursos da caravana para melhorar as estações de trabalho dos companheiros, o que aumenta o nível de melhorias da ferreira e do encantador do manto de magias, da bolsa de materiais e da quantidade de poções que Brynn pode carregar.

O bando de tecelões é um dos pontos altos de Eternal Strands. Mesmo que fiquem basicamente confinados ao acampamento que serve de hub, eles participam ativamente da história, ajudando Brynn a melhorar suas condições e a conduzi-la ao explorar as regiões do Enclave. É uma relação de união e espírito de corpo que faz parecer que realmente há uma equipe em ação, não apenas uma aventureira que sempre vai ao campo sozinha.



Os personagens que cercam Brynn são vívidos e bem representados pela grande quantidade de falas e a ótima dublagem em inglês, em diálogos que sabiamente preferem jogar seguro na apresentação e encenam esses eventos com belas ilustrações de personagens com algumas expressões faciais.

Foi uma escolha apropriada, considerando como as animações de cenas em tempo real podem ser rígidas para os parâmetros modernos. São coisas assim que nos lembram que, apesar de ensejar grandiosidade, Eternal Strands não é, de fato, uma produção AAA.



É bem claro o empenho em representar uma construção de mundo elaborada, cheia de detalhes sobre terras que nunca veremos no jogo. Parece até um manual de RPG de mesa, com numerosas descrições que retratam um quadro maior. É tanta informação que a coisa pode ficar um pouco confusa, mas o jogo nunca nos obriga a depender da lore para avançar. Tudo o que precisamos saber fica explicado no menu de missões.

Assim, quem quer se aprofundar nas histórias que rodeiam o Enclave e o bando de Tecelões terá muito a apreciar, enquanto os que preferem minimizar isso podem escolher ir direto ao assunto — mas ainda vai se deparar com bastante texto pela frente.



Um grande véu marcado por fios repetidos

Penso que Eternal Strands tem muito mais história do que o mundo de jogo consegue carregar. São muitas as missões principais e secundárias, mas o game design e o terreno não dão conta de individualizá-las da mesma forma que a narrativa, reduzindo quase tudo a buscar imateriais e itens-chave em uma dentre sete regiões abertas que vamos descobrindo ao longo da campanha.

Se no começo a exploração de escalada livre entre os belos e grandiosos cenários é atraente, ainda que um pouco confusa, e a alternância climática mágica entre calor, frio e miasma torna as coisas mais complexas. Com o tempo fui anestesiado pelas jornadas incessantes de vai e vem pelos mesmos lugares.



Esse esquema é intensificado na segunda metade da campanha, com missões que chegam a solicitar três itens de locais diferentes já visitados antes, apenas para se desdobrar em outra missão que requer quatro itens de locais diferentes, em uma cadeia lógica narrativa, mas de realização prática superficial.

Como a maior referência para as missões é o nome da região do mapa e muitas vezes a localização é pouco intuitiva, comecei a me ver simplesmente correndo pelos arredores da área até finalmente me deparar com o marcador que indica onde está meu objetivo de coleta, o que em mais de uma vez demorou muito mais do que eu gostaria.



Ou seja, nem mesmo a camada de verniz narrativo para essas missões foi suficiente para justificá-las e retirar a aparência de uma lista de tarefas que está ali apenas para adequar o tempo de jogo às expectativas de um RPG de ação.

Ainda assim, gostei bastante do meu tempo com Eternal Strands e, no final, os personagens me fizeram perseverar sobre o desapontamento da repetição, concluindo a campanha e todas as missões secundárias em minhas 27 horas comandando Brynn.



Divertido e repetitivo — qual adjetivo tem mais peso para você?

No fim das contas, Eternal Strands é um bom jogo dotado de boas ideias, mas que não possui a estrutura adequada para dispor de todo o potencial delas, esticando seu uso até cair em plena repetição e comprometendo a força de sua proposta de ação dinâmica com magias e física.

Enquanto a exploração de escalada livre, o caos das magias e o enfrentamento a inimigos colossais oferecem bastante diversão, especialmente a quem quer um RPG de ação que fuja à tendência soulslike, o que fará a diferença no longo prazo da campanha será o envolvimento com a narrativa de construção de mundo detalhada e a percepção de cada um sobre o impacto da repetição ao desfrutar do jogo.



Prós

  • O sistema de batalha pode ser desengonçado às vezes, mas há bastante diversão em meio ao caos elemental, cenários destrutíveis e à derrubada de inimigos colossais;
  • O sistema de crafting entrega versatilidade na customização das armaduras de várias cores; 
  • A história é elaborada, tanto nos diálogos quanto no background da construção de mundo, com muitos detalhes para ler e descobrir;
  • Mesmo que fiquem fora da ação prática, o bando de tecelões da heroína participa ativamente da história, contribuindo para dar sentido ao que fazemos e para o sentimento de equipe;
  • A dublagem inglesa é bem-feita e agradável de ouvir;
  • Textos em português brasileiro.

Contras

  • Algumas cenas de animação em gráficos de jogo mostram os limites técnicos da produção, com personagens de rostos rígidos;
  • A geografia baseada em regiões abertas pode ser confusa, especialmente com tanto vai e vem por elas para encontrar itens específicos;
  • A segunda metade da campanha se entrega a longas sequências de missões repetitivas, fazendo-nos retornar aos mesmos locais.
Eternal Strands — PC/PS5/XSX — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PS5
Revisão: Beatriz Castro
Análise produzida com cópia digital cedida pela Yellow Brick Games
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Victor Vitório
Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies. Veja minhas análises no OpenCritic.
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