E deu! Em 2024, eu me tornei redatora do Blast, assim dando meu primeiro passo na carreira de jornalista de games! A jornada tem sido maravilhosa (apesar de dura, às vezes, não vou negar): fui à BGS pela primeira vez, saí na revista, fui jurada em uma banca de TCC, inspirei meu melhor amigo a escrever as próprias análises… e tive a oportunidade de jogar ótimos novos jogos.
Hoje, gostaria de trazer os seis melhores títulos lançados neste ano que passaram pelas minhas mãos, tanto como crítica quanto como jogadora em off (por coincidência ou não, todos são independentes; faltou cacife pros AAA porque eu torrei todo meu dinheiro em Yakuza) — além de discutir brevemente coisas de outros anos e o que eu mais quero ver em 2025. Bora!
Mouthwashing
Sabe aquelas coisas das quais você nunca ouviu falar, mas que, de repente, tomam toda rede social que você frequenta? Mouthwashing, um jogo curto de terror psicológico da desenvolvedora sueca Wrong Organ, foi isso para mim. Vou te falar: eu fui atrás do hype e não me arrependi em nenhum momento.
A história se passa dentro de uma nave espacial cargueira que se envolve em um grave acidente. Presa no meio do nada e desesperada atrás de suprimentos para seguir sobrevivendo, a tripulação — um copiloto mal-encarado, uma enfermeira ansiosa, um mecânico sem paciência e um estagiário inocente, além do que restou do capitão, que ficou seriamente ferido — transgride as regras da empresa que os contratou e abre o compartimento de carga… só para descobrir que está cheio de enxaguante bucal.
O que se segue são cerca de três horas de atmosfera pesada, personagens incrivelmente bem escritos e temas narrativos coesos. Mouthwashing é um daqueles jogos que precisa ser jogado mais de uma vez: cada cantinho da nave e cada palavra dita contêm inúmeros detalhes não só sobre o grande mistério, como também a reação de cada um às informações recebidas e suas personalidades e vidas fora do trabalho. Um estupendo trabalho de caracterização, onde cada partezinha faz a tragédia maior doer ainda mais — do exato jeito que a Wrong Organ espera que doa.
(Gostei tanto que estou preparando até cosplay. Meu Swansea será glorioso!)
Wilmot Works It Out
Anunciado de supetão na gamescom 2024, Wilmot Works It Out é a sequência que ninguém sabia que precisava ter na vida. Não há muito que eu possa dizer sobre esse charmoso homem-cubo montador de quebra-cabeças que eu já não tenha dito na minha análise, mas vou tentar mesmo assim.
Ao contrário da nossa entrada anterior (que eu joguei enquanto tentava balancear as aventuras do Wilmot e minha vida como bruxa alquimista em Potionomics: Masterwork Edition, veja bem), em vez de uma narrativa cheia de segredos e nuances, as coisas são o mais simples possível. Você é um quadrado sorridente que monta quebra-cabeças para relaxar, depois de tanto trabalho em um armazém. Sua amiga mais próxima é a carteira que traz esses quebra-cabeças toda semana. É isso — e é tudo de que o título precisa.
No absoluto caos do nosso mundo moderno, Wilmot nos lembra de parar e respirar, e não só pelo ato de se estar jogando um jogo estimulante. Todos os elementos (desde a música até a história, das imagens montadas ao clique gostoso de ouvir quando duas peças se encaixam) trabalham em serviço desse lembrete: estamos aqui, estamos vivos, não somos robôs. Como é bom poder sentir.
Fields of Mistria (acesso antecipado)
A princípio, eu encarei Fields of Mistria, o simulador de fazendinha do momento, do mesmo jeito que a maioria das pessoas: “tá bom, mas qual a diferença disso pra Stardew Valley?”. Umas trinta horas de acesso antecipado depois, reporto de volta: é bastante.Das mesmas mentes brilhantes que trouxeram ao mundo a gata Pusheen parte a terra encantada de Mistria, recentemente devastada por um terremoto. Você ficou sabendo que o governo local está oferecendo um pedaço de terra gratuito para quem se comprometer a ajudar na reconstrução e se mudou para cá. Sua nova vida na fazenda envolve todos os clássicos do gênero — cuidar de animais, explorar a mina local, talvez até namorar alguém — e, no momento, está no processo de revelação de grandes mistérios mágicos.
Fields of Mistria se inspira na estética de jogos do Game Boy Advance e é bem mais tranquilo do que seu maior ponto de comparação (confesso que eu passo raiva demais jogando Stardew para um jogo que supostamente é relaxante, mas enfim). Ainda há algumas coisinhas que precisam ser consertadas (e eu quero logo casar com a Valen), mas as bases lançadas pelo acesso antecipado são excelentes.
Thank Goodness You're Here!
“Amo esse jogo, queria que o Reino Unido fosse real”, eu escrevi, de brincadeira, depois de terminar Thank Goodness You’re Here!. É bem esse o sentimento. A tresloucada aventura de um pequenino vendedor pela cidade de Barnsworth é mais britânica do que fish and chips — mais especificamente, faz referência ao norte da Inglaterra.
Em pouco tempo de jogo, os blokes e lassies da Coal Supper montam um pequeno ecossistema de bizarrices, descrito pelo colega Alexandre Galvão como uma “sitcom interativa”. Cada personagem tem a própria gag que se desenvolve ao longo da história, às vezes até se amarrando com as de outros, numa demonstração de excelente design de nível e entendimento do poder da comédia. Caso a ideia inicial de passar três horas conhecendo o terrível destino de uma nave abandonada por Deus não seja muito atrativa para você, considere usar esse mesmo tempo para fazer uma visitinha aqui.
Caravan SandWitch
Depois de publicar minha análise de Caravan SandWitch neste humilde website, eu fui de curiosa ao OpenCritic para verificar o que meus colegas críticos de games acharam. Descobri que, apesar de o título ter me encantado a cada momento, grande parte da imprensa achou que, na média, ele só valeu uma nota 7. Para tentar retificar essa injustiça de vez, eu estou aqui, de novo, para falar do porquê desse mundinho aberto francês ser tão especial.
Caravan SandWitch, na minha humilde opinião, é um completo sucesso em tudo o que se propõe, principalmente nas discussões que convida a respeito do complexo tópico do colonialismo. Sem nunca tentar fazer mais do que consegue, a aventura da jovem Sauge de volta ao lar passeia por temas de família, comunidade e luto com uma leveza admirável — tudo isso enquanto nos leva por vários pequenos quebra-cabeças extremamente bem projetados, escondidos no meio de belíssimas paisagens. Dê uma chance!
O Escudeiro Valente (The Plucky Squire)
Minha maior honra do ano foi, com certeza, a de estar lá para o lançamento d’O Escudeiro Valente e opinar em primeira mão a seu respeito (talvez a análise mais difícil de sair do meu cérebro). Uma das mais aguardadas do ano, a aventura de Pontinho e amigos encanta a cada movimento, cada homenagem, cada saída da página.
A recepção do público geral e dos meus colegas críticos parece ter sido colorida por um desapontamento em face do que receberam — as expectativas eram as de que O Escudeiro Valente fosse ser muito mais ambicioso do que o produto final —, mas, pessoalmente, acredito que o título cumpriu quase tudo o que se propôs a fazer, e que a comunidade largou mão cedo demais. O maior charme de 2024 certamente está aqui.
Menções honrosas: não são deste ano, mas joguei este ano
Além das novidades, 2024 foi ano de lidar com o backlog (e de botar ainda mais coisas nele, mas disso a gente não fala). Eis aqui mais seis aventuras de outros carnavais que vivi nestes 366 dias:
- Judgment (2019) e seu novo olhar ao amado bairro de Kamurocho me fizeram voltar a jogar Yakuza. Adoro jogos de detetive com um mistério bem amarrado, e, assim como o fantástico PARANORMASIGHT: The Seven Mysteries of Honjo no ano passado, Judgment foi um game que joguei com um caderninho de anotações na mão. Destaca-se principalmente o elenco: a imensa maioria dos personagens relevantes é bem construída e eleva os temas narrativos, incluindo o antagonista principal Kyohei Hamura, o melhor que essa franquia já nos deu. Imperdível mesmo (e principalmente) para quem não faz nem ideia do que é um Kazuma Kiryu.
- Frog Detective: O Mistério Completo (2022), em contrapartida, é uma história de mistério muito menos pesada. Seguimos o titular Detetive Sapo por três aventuras curtas e muito bem traduzidas para o português, cujo estilo low poly e humor nonsense dão a ideia de um livro infantil em forma de jogo (de maneira menos literal do que com o Escudeiro acima). Para quem estiver procurando temas mais profundos, Frog Detective surpreendentemente os entrega também — mas sem spoilers!
- A série Butterfly Soup (2017 e 2022) é uma dupla de visual novels sobre quatro meninas estadunidenses de ascendência asiática, que exploram suas orientações sexuais, ancestralidades e preconceitos internos, tudo com muita leveza e naturalidade. Uma das leituras mais divertidas que tive em 2024, cheia de bom humor e ótima escrita de personagens. Os dois títulos são gratuitos e estão disponíveis em português, então ninguém aqui tem desculpa!
- Milk Inside a Bag of Milk Inside a Bag of Milk (2020) foi uma experiência curta que consegui de graça no itch.io este ano. É daqueles joguinhos indies minúsculos que transpiram o amor das pessoas que o desenvolveram. A premissa é simples: acompanhe uma menina emocionalmente instável enquanto ela vai comprar leite às ordens da mãe. O que se segue é um ótimo retrato da experiência neurodivergente (o jogo nunca especifica o que se passa com a protagonista, o que permite bastante projeção da audiência) que é melhor visto em pessoa do que pelo meu resumo intencionalmente vago. Também há uma sequência com um nome igualmente longo, mas essa não me pegou tanto quanto o original.
- Never7: The End of Infinity (2000), que receberá um relançamento em 2025, é um daqueles jogos horríveis de ruins que consegue se salvar nos 45 do segundo tempo. Foi uma bela jornada até entender por que eu sequer estava ali, mas valeu a pena. Recomendo a todos que gostem dos trabalhos de Kotaro Uchikoshi e consigam aguentar uma escrita bem datada — é o primeiro jogo que o autor assina (a não ser que você conte a modelagem 3D que ele fez em Pepsiman).
- Hatsune Miku Logic Paint S (2020). Sério. Peguei em promoção no Steam em agosto e assim lá se foram 45 horas do meu tempo livre. Não há muito o que ser dito aqui: é uma coleção de centenas de nonogramas (picross) centrados no universo Vocaloid, do qual conheço pouco, mas tenho afinidade suficiente. Para desestressar, é tiro e queda.
Mais aguardados de 2025
Já falamos de presente e de passado — agora, que tal olharmos para o futuro? Aqui vai uma listinha de jogos que eu quero nas minhas mãos o mais rápido possível:- Promise Mascot Agency me fez surtar quando foi anunciado, em abril deste ano. Criado pelo estúdio por trás de Paradise Killer, um de meus jogos favoritos, em colaboração com Ikumi Nakamura (que cheguei a conhecer durante a BGS!), esse joguinho esquisito é uma história de yakuza, um mundo aberto, um deckbuilder e um simulador de gerente regado a bichos bizarros, inspirados pela cultura de mascotes do Japão. O GOTY tem nome!
- Like a Dragon: Pirate Yakuza in Hawaii foi um dos jogos que tivemos a oportunidade de jogar durante a BGS — e está excelente. O que mais me chama a atenção não é sequer a ideia de Goro Majima virar um pirata: não, eu estou mesmo é de olho na Rainha Michele, que parece ser a vilã principal da história. A franquia Yakuza historicamente evita colocar mulheres no papel de antagonistas, e a única moça contra a qual os jogadores já puderam lutar foi uma treinadora no (horrendo) quarto jogo. Dedinhos cruzados para que a Rainha (ou sua guarda, a espadachim Naomi Rich) nos renda uma boa briga!
- The Hundred Line -Last Defense Academy-, por outro lado, é um jogo do qual que eu me aproximo com algum medo, justamente por conhecer tão bem a obra dos autores. O filho mais novo de Kotaro Uchikoshi e Kazutaka Kodaka, os respectivos criadores de Zero Escape e Danganronpa, é um RPG tático com cerca de 100 finais e muito, muito sangue, que se apresenta como a história mais ambiciosa que ambos já assinaram. Apesar do nervosismo para ver se vai dar certo ou não, pelo menos os designs de personagem já são ótimos: tem uma “samuraia”, um baixinho com jeito de sapo, um coitado que parece o Junpei de Persona 3, e até uma menina com cabeça de tomate verde!
- Wanderstop, do criador do excelente The Stanley Parable, se apresenta como uma desconstrução do cozy game — um gênero do qual gosto muito, mas que sempre acaba caindo na mesmice da fazendinha. Nossa protagonista é uma ex-lutadora completamente traumatizada que acaba dona de uma lojinha de chá na floresta e é arrastada aos berros para uma jornada até a superação de suas feridas emocionais. Com um escritor tão competente liderando o projeto, não tem como não ser bom!
- Não sabemos quase nada sobre Pokémon Legends Z-A além do fato de que ele existe e sairá no ano que vem, e é exatamente isso que atiça minha curiosidade. Kalos é a região de que menos gosto, mas, mesmo assim, consigo ver que a Game Freak não conseguiu realizar a visão completa de Pokémon X & Y lá em 2013. Agora, com um bom tempo de desenvolvimento e uma base mais sólida, imagino que o futuro nos traga coisas boas!
- Paralives, o mais esperado concorrente da franquia The Sims, sairá finalmente em acesso antecipado no ano que vem. Ando seguindo o projeto há algum tempo; muitas de suas mecânicas, por exemplo, foram desenvolvidas em resposta direta a reclamações feitas sobre The Sims 4. Uma delas é o fato de que o time promete que nunca lançará qualquer tipo de DLC pago — o que é muito significante quando se está contra um titã que cobra tão caro por pacotes de expansão. Fica aqui meu desejo de sucesso!
E você, caro leitor — como foi o seu ano? Assim como em todas as vezes que tomo o palco para falar de jogos, espero que minhas palavras o inspirem a conferir pelo menos um dos títulos que apresentei. Boas festas!
Revisão: Heloísa D'Assumpção Ballaminut