PS

30 anos do PlayStation: um console que abalou as estruturas da indústria dos games

A primeira aventura da Sony no novo mercado foi muito melhor que o esperado.

em 19/12/2024

Há 30 anos a Sony lançava o produto que marcou a década de 1990. Mais que isso, um eletrônico que define a empresa até os dias de hoje. Em 1994, chegou às prateleiras o primeiro videogame da gigante japonesa: o PlayStation.

O console foi desenvolvido principalmente por Ken Kutaragi, um executivo da Sony que comandava um dos setores de engenharia de hardware da empresa. O PlayStation foi lançado em 3 de dezembro de 1994 no Japão, em 9 de setembro de 1995 nos EUA e, três semanas depois, em 29 de setembro na Europa. Outras regiões seguiram após o lançamento no velho continente. Seus concorrentes foram o Nintendo 64 e o Sega Saturn. Foi oficialmente descontinuado em 23 de março de 2006, sendo um dos consoles mais longevos da história recente.


Inicialmente, o console era marcado como PSX, sendo depois abreviado como PS ou PS1 – especialmente depois do lançamento de suas “continuações”, como o PS2 ou PS3. O principal chamariz do PlayStation era a capacidade de renderizar polígonos em 3D e utilizar o CD-ROM como mídia, o que permitia o armazenamento de muito mais dados que os tradicionais cartuchos, além de ter uma interface sonora superior. O aparelho foi o primeiro videogame a passar da marca de 100 milhões de unidades vendidas.

Surgimento

O PlayStation possui uma das histórias de concepção mais marcantes de toda a indústria dos games. Ela remete à 1988, quando Sony, através de Kutaragi, se aproximava da Nintendo, até então a gigante dos games. A parceria entre as empresas rendeu frutos, como por exemplo o chip de som (SPC-700) fabricado pela Sony e que foi utilizado no Super Nintendo.

A relação ficou mais “íntima” com o passar dos anos e em 1991 as conversas estavam avançadas. A proposta seria inicialmente de um periférico que se encaixaria no SNES, permitindo o uso de CDs no sistema. No passo seguinte, a Sony ficaria responsável por fazer um sistema “tudo em um”, que aceitaria tanto os CDs, quanto os cartuchos do Super Nintendo. Seu nome já estava definido: seria PlayStation. O nome dado para a mídia em CD seria Super Disc.


O problema começou a surgir nesse quesito. A Sony garantiu que ela teria todos os direitos de licenciamento dos Super Discs. Ou seja, ela obteria o lucro na venda de cada título que o SNES CD-ROM vendesse. Isso não agradou o presidente da Nintendo, Hiroshi Yamauchi, que via a possibilidade de surgir uma rival no mercado de videogames, alimentada por sua própria empresa.

E foi na CES (Consumer Electronics Show) de 1991 que a bomba explodiu. A Sony se apresentou no primeiro dia, mostrando com detalhes os planos do periférico do SNES, bem como dos Super Discs e até do PlayStation. No dia seguinte, a Nintendo fez o seu movimento e anunciou o acordo com a Philips para esse add-on. Ao contrário do planejado, essa parceria rendeu um console totalmente novo, o Philips CD-i, que chegou a contar com alguns jogos licenciados pela Big N, como Mario e Zelda.


Essa história é bem conhecida, inclusive por ter surgido na internet recentemente um protótipo do console PlayStation que aceitaria cartuchos do SNES. Mas o que pouco se divulga são sobre os anos entre o rompimento do contrato e o lançamento do PlayStation que conhecemos.

O que fazer quando a empresa número um do ramo te esnoba e humilha publicamente? Acertou quem pensou em procurar a empresa número dois. Sony procurou a Sega dos EUA para uma parceria similar, conforme revelou o ex-presidente da Sega, Tom Kalinske, em uma entrevista ao site britânico MCV em 2013.

A Sony forneceu o seu estúdio em Santa Mônica (Imagesoft) que até então trabalhava somente no desenvolvimento de games para serem treinados pela Sega. A parceria gerou um pequeno grupo chamado Digital Pictures, que lançou jogos como Night Trap, Sewer Shark e Supreme Warrior para o Sega-CD. As empresas aproveitaram a experiência para criar as especificações do que seria o melhor hardware para um sistema que utilizaria CDs como mídia. A parceria, no entanto, esbarrou no presidente da Sega Japão, que não via benefício no contrato.

A partir disso, a Sony continuou com o projeto solo, muito impulsionado por Kutaragi. A Sony Computer Entertainment foi criada e em outubro de 1993 a empresa informou ao mundo que estaria entrando no mercado de videogames.

Por fim, o último acontecimento marcante antes do lançamento do console (pelo menos em terras estadunidenses) foi na E3 de 1995. A Sega anunciou a chegada de seu novo console, o Sega Saturn, com algumas unidades já disponíveis durante a feira. Na sequência, a Sony divulgou o valor do PlayStation, de US$ 299,00, sendo 100 dólares mais barato que o concorrente, o que ajudou muito nas vendas.

Casa de clássicos

Dado esse cenário, é fácil entender por que o PlayStation, ao contrário dos principais concorrentes, possuía diversos jogos que viraram clássicos e praticamente sinônimos com a marca, mesmo não sendo desenvolvidos pela Sony. Ora, a gigante japonesa tinha bastante experiência com a fabricação de eletrônicos (vide o sucesso do walkman), mas ainda pouca prática no desenvolvimento de jogos.


Isso se refletiu, inclusive, nos jogos mais vendidos do console. Do top 20, estão presentes dez franquias e destas a Sony possuía envolvimento em três delas (Crash Bandicoot, Spyro e Gran Turismo). A lista é completada por Final Fantasy, Tekken, Tomb Raider, Resident Evil, Metal Gear Solid, Dragon Quest e Harry Potter.

O PlayStation é marcado até hoje por muitos jogos third parties. Por exemplo, Final Fantasy VII que, além de ter virado um clássico quase que instantaneamente, trocou o console da Nintendo onde vinha sendo publicado, para explorar a mídia de CD-ROM, sendo inclusive um dos primeiros a trazer vários CDs para que o jogo pudesse ser finalizado.  O game é o segundo mais vendido do console, com mais de 10 milhões de unidades na conta, perdendo apenas para Gran Turismo 2.


Tekken era capaz de trazer quase todo o frenesi do arcade para dentro das casas dos jogadores. Isso era uma novidade muito impactante, pois as versões caseiras dos jogos de arcades tradicionalmente tinham vários cortes para rodar nos videogames de mesa. Outro game muito referenciado veio quase no fim da vida do console, Tony Hawk’s Pro Skater foi capaz de levar um esporte urbano e de nicho para o grande público, aproveitando demais da capacidade de áudio do PSX com músicas que marcaram uma geração.


Resident Evil estreou o gênero survival horror da Capcom e até hoje é apontado como um dos principais responsáveis a trazer os zombies de volta para a cultura pop. Metal Gear Solid trazia toda a genialidade de Hideo Kojima e que pela primeira vez poderia explorar um mundo em três dimensões.

Outros jogos como Driver, Dino Crisis, Yu-Gi-Oh! Forbidden Memories, Parasite Eve, Wipeout, Twisted Metal, Rayman, Silent Hill, PaRappa the Rapper, Medal of Honor, Final Fantasy Tactics, Chrono Cross entre vários outros merecem uma menção honrosa por fazerem parte dessa biblioteca que conta com milhares de games.

A batalha das “mascotes”

As gerações anteriores ao PlayStation foram muito marcadas pela disputa entre Nintendo e Sega. E ambas possuíam um personagem que representava a empresa, em que todos (mídia e público) já associavam diretamente às fabricantes de videogames. Mario e Sonic, respectivamente, tinham o peso de não apenas serem carros-chefes no quesito de games, mas também ganhavam importância dentro da cultura pop.


E, nesse cenário, surgiu rapidamente um concorrente à altura: Crash Bandicoot. Carismático, divertido, bobo e salvador do mundo, o marsupial da Naughty Dog tinha tudo o que era preciso para bater de frente com os dois ícones dos adversários.

Crash é um personagem que, assim como os rivais (pelo menos à época), não fala. Mesmo que outros personagens possam falar, o Bandicoot fica limitado às suas expressões e, por isso, elas precisam valer a pena e cativar o público. Outro ponto em comum é que os protagonistas são tão marcantes quanto seu principal vilão. Neo Cortex é equivalente a Bowser e Dr Robotnik, principalmente pelo jeito atrapalhado.

As propagandas para vender o game, pelo menos nos EUA, ficaram entre as melhores de jogos do PlayStation. Isso porque sabiam captar a irreverência do marsupial, sabiam ser divertidas, mesmo que pouco tivessem a ver com o game que era vendido.

Crash se tornou sinônimo de PlayStation para muitos. Mas a verdade é que ele nunca foi oficializado pela Sony, ou pela marca PlayStation, como uma mascote. Nunca foi usado para propagandas de consoles como Mario e Sonic (pelo menos não de maneira isolada). Isso aconteceu pelo fato que a empresa japonesa queria livrar os videogames do estigma de “brinquedo de criança” e, diante disso, focava mais em propagandas para um público adulto, fosse nas páginas de jornais e revistas ou em anúncios na televisão.

Se o console fosse ter alguma mascote, seria o Polygon Man. Ele foi desenvolvido com esse intuito, mas era uma cabeça roxa e flutuante, composta por diversos polígonos que representavam o potencial da plataforma. No entanto, mesmo aparecendo em alguns comerciais no Japão, ele não agradou nem mesmo dentro da empresa e logo foi escanteado. É possível ver ele no jogo PlayStation All Stars, de 2013, em uma participação no modo Battle Royale.


Davi x Golias

Apesar do começo conturbado, o PlayStation foi capaz de desbancar a empresa que liderava a indústria há praticamente uma década. Desde 1985, com o lançamento do NES (Nintendo Entertainment System, ou Nintendinho para os íntimos) nos EUA, a Big N não via ninguém à sua frente na disputa pelo mercado de games. Nem mesmo a rivalidade com a Sega chegou a tirar o posto dela.

Vários motivos fizeram com que a Sony ultrapassasse a Nintendo nessa briga.  A escolha por CDs foi o motivo mais óbvio, uma vez que se mostrava uma mídia superior aos cartuchos, por ter mais espaço de armazenamento e um controle sonoro de maior qualidade e mais fácil de operar. Essa, aliás, é uma das razões por que várias publishers trocaram a Big N pela Sony, havia mais liberdade para criar com mais espaço na mídia.


Ainda havia também menos controle por parte da fabricante sobre quais jogos seriam publicados ou não. A Nintendo tradicionalmente limitava a quantidade de jogos publicados, ou pediam ajustes (como a retirada do sangue na franquia Mortal Kombat), entre outras formas de controle.

O fato de o PlayStation ter sido lançado dois anos antes do Nintendo 64 também ajudou (considerando a primeira data de lançamento cada um, a japonesa). Afinal, fica difícil competir quando o concorrente já possui uma base considerável de usuários.

Quanto à competição com a Sega, a Sony se deu bem nos dois fronts: com desenvolvedores e público. Para os desenvolvedores, a programação no Sega Saturn era mais complexa e, mesmo o console sendo mais potente, exigia mais dedicação. Os kits de desenvolvimento do console também deixaram a desejar, tendo poucas ferramentas para uso.


Já para o público, o preço foi o fator principal. Os US$ 100 de diferença para o console da Sega foram brutais no impulsionamento de venda do PSX – uma tendência que vemos até os dias de hoje na indústria. Outro ponto importante foi a oferta de jogos. Não só em quantidade e variedade de títulos, mas também pelo motivo de quase nunca haver falta de jogos nas lojas, já que a Sony (ao menos no Japão) tinha fábricas de produção de CDs e conseguia suprir qualquer título rapidamente.

Legado

O PlayStation foi um console que marcou a segunda metade da década de 90. Ele quebrou paradigmas, inovou em diversos aspectos (até funcionando de ponta-cabeça) e mostrou que os videogames não eram apenas “coisas de criança”. O PlayStation nasceu de uma dupla rejeição, mas mostrou que a resiliência da Sony foi compensada, batendo diversos recordes ao longo da sua vida.

Quase qualquer pessoa que tenha jogado qualquer videogame há uns 20 anos pelo menos, tem alguma história com o console cinza. A relevância e o impacto do PlayStation foram tão grandes que o nome do console é carregado até hoje pela Sony, não se atrevendo a mudar o nome das plataformas seguintes.

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Jornalista, Técnico no papel, engenheiro não praticante e mestre Pokémon nas horas vagas. Passa 80% do tempo falando de games. Nos outros 20% torce para alguém falar sobre games, só para poder falar mais um pouco.
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