O primeiro Virtua Fighter causou um enorme impacto tanto no público quanto na crítica. A AM2 conseguiu reproduzir humanos em 3D com a tecnologia limitada da época de maneira surpreendente, destacando-se não apenas na construção dos lutadores, mas também na qualidade das animações. Com a chegada da poderosa placa Model 2 e todo o potencial que ela prometia para as futuras produções de fliperamas da Sega, levou menos de um ano para os jogadores presenciarem a evolução natural daquele marco.
Lançado em 1994, Virtua Fighter 2 é um dos maiores exemplos de como a tecnologia avançava rapidamente nos anos 1990. Saíam de cena os lutadores sem texturas e os cenários simples, dando lugar a um vasto conjunto de recursos gráficos que trouxe o tempero definitivo aos combates técnicos da Sega.
A Model 2 e a ambição de Yu Suzuki
Apesar de impressionante, a Model 1 demonstrava limitações significativas devido à ausência de recursos mais avançados. O hardware desempenhava bem seu papel em títulos como Virtua Racing e Star Wars Arcade, mas apresentava restrições que dificultavam sua aplicação em outros gêneros — o que torna o feito do primeiro Virtua Fighter ainda mais surpreendente. Para superar essas barreiras, uma nova placa começou a ser desenvolvida, baseada nos fundamentos da Model 1. Lançada em 1993, a Model 2 já impressionava com o vislumbre de Daytona USA, deixando o público boquiaberto e se tornando uma máquina desejada nos fliperamas.
A Sega Model 2 foi projetada sob medida para atender às ambições da AM2, liderada por Yu Suzuki. O desenvolvimento do hardware contou não apenas com a perícia da Sega, mas também com a colaboração da GE Aerospace, uma divisão da General Electric (atualmente parte da Lockheed Martin), especializada em tecnologia militar e aplicações industriais. Essa parceria visava beneficiar não só o setor de entretenimento, mas também projetos militares e de simulação, como foi o caso de Desert Tank, um dos jogos influenciados por essa colaboração.
O grande avanço da Model 2 em relação à Model 1 estava na capacidade de mapeamento de texturas, eliminando os polígonos lisos e sem detalhes. O uso de imagens bitmap aplicadas aos modelos 3D, combinado com recursos como filtragem e anti-aliasing, proporcionava um visual mais realista e refinado.
Além disso, o hardware trazia inovações como Z-buffering para evitar texture wrapping, efeitos de iluminação em tempo real, transparências, maior capacidade poligonal, resolução aprimorada e poder de processamento suficiente para manter fluidos 60 fps. Já em 1993, a Model 2 rivalizava com as melhores placas gráficas para PCs do final da década de 1990 e superava amplamente qualquer console contemporâneo. Com todo esse poder à disposição, um Virtua Fighter 2 ainda mais ambicioso já estava no horizonte de Yu Suzuki e sua equipe.
Polígonos quadrados com retoques belíssimos
Virtua Fighter 2 mantém os pilares mecânicos do primeiro jogo: três botões de ação — soco, chute e defesa —, arenas quadradas com a possibilidade de ring out, ausência de elementos fantásticos, os pulos absurdos sem gravidade e um combate técnico e realista. Contudo, as animações e a fluidez das lutas foram significativamente aprimoradas, graças à maior taxa de quadros por segundo e à introdução de uma tecnologia de captura de movimento avançada, utilizada primariamente na indústria médica.
Para tornar o sistema de combate ainda mais satisfatório, todos os personagens receberam novos golpes e recursos. Akira, por exemplo, que no primeiro jogo contava com cerca de 15 movimentos, ganhou cerca de 40 novas habilidades em Virtua Fighter 2. Movimentos que dependem de situações específicas, como atacar enquanto se levanta ou quando está de costas para o oponente, adicionaram uma dinâmica inédita e maior imprevisibilidade às lutas.
O elenco também foi ampliado. Além dos oito lutadores originais, dois novos personagens se juntaram à luta: Leon Rafale, um francês que utiliza o estilo Touhou-Ken (conhecido como o Estilo do Louva-a-Deus), e Shun-Di, um mestre chinês do kung-fu especializado na arte dos Punhos Bêbados. Ambos trouxeram estilos de luta complexos e altamente expressivos, demonstrando o melhor que a tecnologia de captura de movimento da época podia oferecer.
Os personagens originais retornaram com designs renovados. Saíram de cena as limitações poligonais do primeiro jogo, dando lugar a modelos mais detalhados, com roupas elaboradas e acessórios que se movimentavam com naturalidade. Cada lutador ainda contava com uma segunda roupa, que realmente alterava o design. A jaqueta de couro preta de Jacky e a camisa azul curta de Sarah são exemplos emblemáticos da liberdade criativa proporcionada pelo hardware aprimorado.
Os cenários também foram significativamente melhorados. Estruturalmente, as arenas continuam quadradas e fixas, mas os ambientes ao redor receberam uma atenção muito maior. Elementos como as paredes de um coliseu na arena de Sarah, um templo chinês na fase de Pai e os prédios suburbanos na área de Jacky trouxeram um alto nível de detalhamento, mantendo estáveis 57,5 fps.
O destaque fica para o estágio de Shun Di, que simula uma barca navegando por um rio, passando sob uma ponte cuja sombra é projetada sobre os personagens e o ringue. Esse nível de interação visual era algo impensável em outros hardwares da época e se tornou um dos maiores exemplos do poder técnico da Sega Model 2.
O som também recebeu um ganho de qualidade notável, tanto na qualidade da instrumentação com sampling de alto nível quanto na composição, que já era ótima no primeiro. Algumas vozes também foram adicionadas, ajudando a dar um pouco mais de personalidade aos lutadores, tendo em vista que a história continua não sendo o ponto forte para dar contexto sobre cada um.
Superando limitações
Como mencionado anteriormente, Virtua Fighter 2 estava muito à frente de seu tempo, o que gerou uma grande incógnita sobre como realizar sua adaptação para outras plataformas. Após uma versão apressada do primeiro Virtua Fighter para o Sega Saturn, a própria AM2 assumiu a responsabilidade de criar um port do segundo jogo que fosse o mais fiel possível ao original. O resultado foi impressionante.
Claro, concessões gráficas precisaram ser feitas, como menor contagem poligonal nos personagens, texturas mais pixeladas e arenas simplificadas, que utilizavam imagens estáticas de fundo. Contudo, a equipe soube contornar as limitações do Saturn de maneira criativa, utilizando camadas de imagens para simular elementos tridimensionais nos cenários.
Apesar dessas limitações, o port manteve a fidelidade aos personagens do fliperama, preservando a qualidade das animações e rodando a fluidos 60 quadros por segundo. Além de contar com trilha sonora rearranjada, o jogo utilizava a resolução mais alta que o Saturn era capaz de suportar, tornando-se um dos maiores feitos técnicos do console no gênero de luta 3D. Essa versão também foi portada para PC, mantendo a mesma qualidade.
De maneira surpreendente, Virtua Fighter 2 também chegou ao Mega Drive em 1996, já no final da vida útil do console de 16 bits. Totalmente reconstruído com sprites, foi uma tentativa curiosa de traduzir um jogo essencialmente 3D para um formato 2D. A adaptação utilizava truques de parallax para criar a ilusão de profundidade nos cenários, mas apresentava muitas limitações. Os personagens Leon e Shun Di foram removidos, havia apenas quatro cenários e a lista de movimentos era bastante reduzida. Apesar disso, é uma peça interessante da história da série, mesmo que não faça jus ao original.
No PlayStation 2, Virtua Fighter 2 foi incluído na coleção Sega Ages 2500, com uma conversão quase perfeita do fliperama, exceto por cores ligeiramente desbotadas. Já no Xbox 360 e PS3, o jogo recebeu uma adaptação impecável, incluindo suporte a partidas online com um netcode competente para os padrões da época.
Estabelecendo um legado
Se o primeiro jogo de luta da AM2 já havia demonstrado que o time de desenvolvimento estava na vanguarda tecnológica, Virtua Fighter 2 consolidou essa posição. Mesmo após 30 anos de sua estreia, o título permanece como um exemplo notável de qualidade técnica e design que resiste ao teste do tempo. Com o sucesso do segundo torneio estrelado por Akira, Sarah e companhia, a franquia seguiu recebendo atenção nos anos seguintes, sempre ocupando um lugar de destaque na história dos jogos de luta.
Revisão: Davi Sousa