Análise: Micro Mages dá aula de como fazer um bom jogo de plataforma caber em um cartucho de 8-bits

Um platformer simples, direto e divertido, como nos velhos tempos.

em 04/11/2024

Sabemos que o lado independente da indústria de jogos adora incursões no túnel do tempo para maravilhosas experiências retrô. Os melhores entre eles sabem que é importante selecionar o que deve ser levado como legado e o que é preciso deixar para trás, dando espaço a modernizações bem-vindas. Eu, que vivi a era 8-bits, mas não sou saudosista dela, passei a gostar dessa abordagem a partir de joias como Shovel Knight, Minit, Axiom Verge e Odallus: The Dark Call.

Existe, porém, um nicho que dá um passo a mais em direção ao passado e cria jogos que são, de fato, retrô: eles funcionam plenamente em consoles antigos. A lista tem Pier Solar and the Great Archtects (Mega Drive, 2010), a série Sydney Hunter (Commodore 64, 2013) e Alwa’s Awakening (NES, 2017).


Outro representante desse meio é Micro Mages, lançado em 2019 para NES e PC, e que agora, em 2024, chega ao PS4 e PS5. Como acontece com os ancestrais que forneceram o DNA para a desenvolvedora Morphcats Games criar seu jogo, dá para explicá-lo em poucas palavras.

O pouco é a essência, a essência é o pouco

Micro Mages é um jogo de plataforma para até quatro jogadores, que controlam magos na ascensão por uma torre onde se encontra uma princesa dada como desaparecida. A tela rola verticalmente por 13 fases separadas em quatro áreas, cada uma delas dominada por um chefe em seu ápice.

Um botão permite aos diminutos encapuzados dar seus pulos, enquanto outro, lançar ataque mágico, que pode ser carregado ao segurar o botão. A habilidade de pular nas paredes garante a agilidade de movimento e há checkpoints ao longo das fases.



Ainda bem, pois basta ser atingido uma única vez para perder uma das míseras quatro vidas disponíveis. Ao perder todas, voltamos ao começo da área para tentar novamente. Para dar uma chance a mais, há upgrades que concedem um ponto de vida a mais.

O modo para multijogadores também contribui para o avanço, uma vez que a vida só é perdida quando todos morrem. Enquanto alguém permanecer vivo, os atingidos se tornam fantasmas que podem coletar pontos e usar magia para paralisar os inimigos e dar uma ajudinha aos companheiros restantes. Os vivos também podem se atrapalhar, colidindo uns com os outros em um caos intencional que pode exigir mais cuidado para vencer juntos ou apenas criar disputa pela maior pontuação.



Senti falta de opções de acessibilidade, embora entenda que interferir no design de dificuldade poderia tornar a experiência toda curta demais. Ainda acho, porém, que uma opção de dificuldade menor cairia bem, algo simples que desse mais vidas e pontos de saúde, como já visto na época que inspirou o jogo. Sem essa alternativa, a saída é perseverar pelas fases até aprendê-las suficientemente bem para passar do chefe e alcançar mais um passo no salvamento do progresso da campanha.

Quem busca algo mais desafiador, porém, vai encontrar conteúdo extra. Micro Mages vem com a Second Quest, isto é, o modo difícil, que é uma reimaginação das fases com mais obstáculos e perigos, funcionando realmente como uma segunda campanha. Se ainda não for o bastante para você, experimente o Hell Mode, uma versão turbo do difícil que sempre volta ao início após perder todas as vidas.



Cada conjunto de três fases leva a uma nova seção da torre, com seu próprio estilo visual, chefe e mecânicas de cenário, como vinhas para escalar, plataformas de pulo, encanamentos e lâminas nas paredes. Ou seja: a limitação não é usada como desculpa para uma mera repetição insossa, tirando o máximo possível dos recursos disponíveis para fazer bom jogo retrô de plataforma, que fica ainda melhor em grupo.

Joguei no PS5 e, é claro, nele a instalação não ocupa apenas 40kb. São 70mb, que contam com cenários para preencher as bordas da tela para o formato widescreen, dois filtros de tela (scanlines e CRT) e um manual digital em alta definição para aprofundar a experiência.



Pixel meio cheio ou meio vazio?

É especialmente interessante ver o hábil malabarismo para fazer um jogo caber dentro de 40kb, como explicado em vídeo da Morphcats Games. Uma comparação é que esse tamanho equivale a dois segundos de MP3. Empacotar um jogo inteiro nesse espaço, então, é realmente impressionante, principalmente por ser um trabalho que faz bom uso do pouco que tem.

É claro que, mesmo com os elogios merecidos, ainda estamos tratando de um jogo construído determinantemente em torno de restrições de escopo. Micro Mages é um bom jogo de plataforma, mas sua gameplay não tem intenção de inovar ou surpreender. As únicas fronteiras desafiadas são as da década de 1980, o que pode eliminar o apelo a quem não tem interesse em jogos retrô ou mesmo de plataforma.

Normalmente, não esperamos uma história elaborada para um jogo tão simples, mas acho que foi perdida a oportunidade de fazer algo que rendesse mais que uma mera página de manual de jogo. Um pouco mais de texto poderia dar mais personalidade ao jogo que, para além de sua notável história de bastidores que une engenharia de software e game design, não tem muito mais a oferecer a título de identidade.

Os micro magos e a torre retrô

Desenvolver uma obra a partir do conceito das limitações intencionais e intrínsecas é um belo experimento criativo, especialmente quando o resultado é eficiente e divertido como Micro Mages. A simplicidade de plataforma 2D pode ser destilada demais para quem deseja algo mais elaborado, mas a praticidade ágil, o desafio retrô e a diversão em até quatro pessoas podem ser atrativos suficientes para quem gostar do que vê.

Prós

  • Uma experiência autenticamente retrô que sabe usar com eficiência o potencial de suas limitações auto impostas;
  • Ainda que básicas, as fases provêm boa plataforma com movimento ágil e controles precisos;
  • Divertido modo cooperativo local para até quatro pessoas.

Contras

  • Há limites intrínsecos claros para o que pode ser feito com os parâmetros do projeto, então não espere gameplay inovadora;
  • Senti falta de uma opção de dificuldade mais baixa que oferecesse mais vidas ou salvamentos a cada fase, em vez de a cada trio de fases;
  • A história se resume a uma página do manual digital in-game, perdendo a chance de dar mais personalidade à apresentação do game.
Micro Mages — PC/PS4/PS5/NES —Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PS5

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Implicit Conversions

Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies.
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