32X: o infame acessório 32 bits do Mega Drive completa 30 anos

Contando com uma biblioteca fraca e pouco suporte das desenvolvedoras, a plataforma se mostrou uma péssima ideia rapidamente.

em 19/10/2024
Em uma época mais experimental para os videogames, diversos acessórios curiosos eram lançados para as plataformas. Alguns eram mais simples, como controles com funções turbo, enquanto outros traziam ideias mais ousadas, como os óculos 3D do Master System e o controle U-Force para o Nintendinho.


Havia também acessórios que aumentavam o poder dos consoles ou introduziam novas formas de mídia, como os cartuchos de RAM para o Nintendo 64 e o Sega Saturn, assim como o PC Engine CD, que dava um drive de disco óptico para o PCE. Nessa categoria entra o 32X, o curioso add-on que prometia dar o poder dos 32 bits ao já veterano Mega Drive e que acabou se tornando mais um dos tiros no pé da Sega.

Tapando buracos rasos

A criação do 32X foi um dos catalisadores da relação conturbada entre a Sega japonesa e a americana. O Mega Drive estava indo muito bem no ocidente, conseguindo competir com a Nintendo e recebendo uma quantidade significativa de jogos de qualidade. Entretanto, no Japão, o 16 bits sofria com vendas baixas, ficando atrás não apenas da Nintendo, como também da NEC com o PC Engine.

Em 1993, a iminência da quinta geração de consoles já era visível, impulsionada pela divisão japonesa, que queria aposentar o Mega Drive e tentar novamente com um novo sistema. Essa mudança, é claro, afetaria o mercado americano, levando a uma conversa entre os chefes da Sega do Japão e Tom Kalinske, o ex-CEO da Sega da América e uma das figuras principais por trás do sucesso do Mega Drive nos Estados Unidos.

De acordo com uma entrevista à revista Retro Gamer, Kalinske se viu em uma situação complicada. Ele acreditava que o Mega Drive ainda tinha longevidade e pediu mais um ano para continuar capitalizando seu sucesso. No entanto, a divisão japonesa não aceitou a proposta e exigiu que algo fosse criado para preencher a lacuna até o lançamento do Sega Saturn. Sem alternativas, começou o planejamento para um sistema intermediário entre 16 e 32 bits.

Hayao Nakayama, ex-presidente da Sega, solicitou à divisão americana o desenvolvimento de um console de 32 bits que rodasse cartuchos, oferecendo uma evolução direta do Mega Drive com mais capacidade de cores e a habilidade de gerar polígonos 3D simples. A ideia foi recusada pelo principal responsável pelo hardware, Joe Miller, que argumentou que essa abordagem alienaria a base instalada do próprio Mega Drive.

A equipe seguiu com a criação de um acessório para o Mega Drive, que seria acoplado à entrada de cartucho do console, aprimorando suas capacidades técnicas sem descartar a plataforma original. O projeto foi então nomeado Project Mars, e sua arquitetura apresentava dois dos processadores presentes no Sega Saturn, rodando em menor velocidade de processamento. O 32X chegou ao mercado em novembro de 1994.


Lançado por US$ 159,99, o 32X enfrentou problemas logo de início devido à falta de jogos — apenas Star Wars Arcade, Doom e Virtua Racing Deluxe estavam disponíveis no lançamento —, o que não justificava o valor cobrado. Os primeiros meses também não foram favoráveis devido ao pouco apoio das third parties, que estavam mais focadas no Saturn e no PlayStation.

No Brasil, o 32X foi lançado pela Tec Toy por R$ 299, em uma época em que o salário mínimo não ultrapassava os R$ 200. Curiosamente, o mercado brasileiro recebeu um título exclusivo: Surgical Strike, que utilizava o combo do 32X com o Sega CD — que falarei mais abaixo. Assim como em outros mercados, o acessório teve baixíssima adesão por aqui.

O console era chamado de Mega 32X por aqui.

32 bits com alma de 16

O 32X e o Mega Drive trabalham juntos para rodar os jogos. O acessório aumenta significativamente as capacidades de cores, saindo das limitadas 512 cores totais (com apenas 64 reproduzidas ao mesmo tempo) para 32.768 cores simultâneas.

Certos elementos visuais são distribuídos entre os dois sistemas. Por exemplo, em Mortal Kombat II, apenas os personagens e a interface são renderizados pelo 32X, enquanto o Mega Drive lida com os cenários. Isso pode parecer estranho, dadas as limitações de cores do Mega Drive, mas, ao não precisar renderizar os sprites, o 16 bits tinha mais liberdade para trabalhar os cenários.

No entanto, o potencial poligonal do 32X não era tão promissor quanto parecia. Pouquíssimos games 3D em sua biblioteca apresentavam técnicas de texturização nos polígonos, optando por modelos simples e sem textura para melhorar o desempenho.

Em compensação, as capacidades 2D do 32X foram o ponto alto de seu catálogo, já que o hardware podia realizar efeitos de escalonamento de sprites. Isso possibilitou ports de alta qualidade como After Burner e Space Harrier, que eram as versões mais próximas dos fliperamas em ambiente doméstico.

Ainda assim, a biblioteca do 32X consistia principalmente em ports aprimorados de produções de Mega Drive, versões curtas de jogos de arcade e contava com um fraco suporte das desenvolvedoras japonesas. Para piorar, os lançamentos do final da vida do Super Nintendo, como Donkey Kong Country, pareciam mais atraentes e tecnicamente impressionantes do que qualquer coisa do 32X. No fim, apenas 40 jogos foram lançados para o acessório, a maioria pela própria Sega.

Uma característica curiosa do 32X era sua possibilidade de conexão com o Sega CD, formando um verdadeiro 'megazord' de hardwares. Cinco títulos, todos de Full Motion Video (incluindo Night Trap), foram lançados para aproveitar essa combinação, visando melhorar a qualidade de imagem com o poder dos 32 bits.

Vamos passar por alguns dos títulos lançados para o 32X. Não necessariamente os melhores, mas aqueles que entregaram algo a mais, mesmo com qualidade bem duvidosa:

Virtua Racing Deluxe: um dos títulos de lançamento do 32X e uma evolução significativa do port do Mega Drive. Rodando com uma taxa de FPS maior, renderizando mais elementos na tela e com um ganho perceptível nas cores, esta versão se destaca por oferecer mais conteúdo do que o arcade original, adicionando dois carros e duas pistas extras;

Doom: desenvolvido às pressas para o lançamento do 32X, o clássico do PC recebeu uma conversão fiel no aspecto visual graças ao poder de renderização 2D do add-on. No entanto, perdeu sete fases e a trilha sonora ficou bem abaixo do esperado, prejudicando a imersão na caçada ao inferno em Marte;

Metal Head: um dos poucos jogos do 32X que apresenta modelos texturizados. Metal Head oferece batalhas de mechas em missões localizadas em ambientes abertos. É um dos títulos mais impressionantes do 32X, tanto pelo visual, com gráficos próximos à primeira geração de games de PS1 e Saturn, quanto pelo áudio, que conta com diálogos dublados;

Mortal Kombat II: considerado por muitos como a melhor versão doméstica de MKII, este port apresenta uma melhoria gráfica significativa em relação à versão decepcionante do Mega Drive. Não fosse o fato de ser desenvolvido pela Probe, poderia ser ainda melhor, pois conseguiria competir de igual para igual com a versão do Super Nintendo;

Cosmic Carnage: apesar de ser um dos piores jogos de luta já lançados, merece destaque por sua conquista gráfica. Alienígenas insetos lutam em diferentes planetas e, para auxiliá-los, usam armaduras que são destruídas durante as lutas. Os personagens são construídos em múltiplos sprites, com rotação de pixels, mostrando o potencial que o jogo poderia ter atingido;

Tempo: um jogo de plataforma extremamente carismático e esquisito. Controlamos o pequeno Tempo em fases abstratas com um foco musical. O tema de introdução lembra os desenhos animados dos anos 90, e o visual, apesar de sobrecarregado, exibe uma riqueza de cores e detalhes que o Mega Drive não conseguiria reproduzir;

After Burner e Space Harrier: ambos desenvolvidos pela AM2 sob a direção de Yu Suzuki, utilizam a tecnologia de Super Scaling para simular espaços tridimensionais de forma impressionante. Mesmo com menor resolução e rodando a 30 FPS em vez de 60, são essenciais na biblioteca do 32X para quem quer a melhor experiência arcade possível em casa;

Knuckles' Chaotix: a aventura estrelada por Knuckles introduz Espio, Vector e Charmy ao universo de Sonic. Dois personagens são conectados por anéis eletrostáticos, e a jogabilidade segue um estilo familiar ao de outros jogos da franquia. Embora a trilha sonora e os gráficos sejam excelentes, o level design confuso e pouco inspirado prejudica a experiência;

Kolibri: criado pela mesma equipe de Ecco the Dolphin, controlamos um beija-flor que combate criaturas estranhas para salvar a Terra, em um estilo próximo de um shoot 'em up. O visual impressiona pelo detalhamento das cores, trazendo uma estética que lembra pinturas. Embora seja um jogo complicado de jogar, é visualmente interessante;

Virtua Fighter: o primeiro jogo de luta 3D teve sua chance no 32X, e o resultado foi tão bom que superou a versão do Sega Saturn. Com animações fluidas, todos os personagens e cenários do original e uma jogabilidade fiel, é obrigatório para quem quer explorar o potencial do acessório.

Um legado infame e curioso

Com o tenebroso Spider-Man: Web of Fire como seu último jogo, o 32X teve seu suporte encerrado em 1996, vendendo apenas 600 mil unidades. Apesar do potencial do acessório e de alguns títulos interessantes, nenhum justificou o investimento, tornando seu lançamento uma das piores decisões administrativas da Sega.

Revisão: Alessandra Ribeiro

Estudante de enfermagem de 25 anos, está nesse mundo dos joguinhos desde criança. Fã de games com vibe mais arcade e arqueólogo de velharias, mas não abandona experiências mais atuais. Acompanha a mídia de podcasts, dublagem e ouvinte assíduo de VGM. Pode ser encontrado como @AlecFull e semelhantes por aí.
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