Análise: Romancing SaGa 2: Revenge of the Seven eleva um RPG clássico a novos patamares

Remake do clássico de SNES consegue modernizar a experiência e lapidar o brilho único da obra original.

em 23/10/2024
Quando se fala de RPGs clássicos da Square Enix, os nomes Final Fantasy e Dragon Quest são os primeiros a vir à mente. Porém, a Squaresoft e a Enix tem uma vasta produção de títulos de qualidade no gênero. Entre eles, Romancing SaGa 2 é um jogo de Super Famicom (o SNES japonês) que teve um bom sucesso na época, mas infelizmente só foi chegar ao Ocidente em sua edição remasterizada nos consoles atuais quase 25 anos depois.

Agora, a empresa, em parceria com o estúdio Xeen de Trials of Mana, produziu também um remake 3D chamado Romancing SaGa 2: Revenge of the Seven para o PC, PS4, PS5 e Switch. Com uma riqueza de detalhes impressionante, a nova edição consegue dar mais vida à jornada da longa linhagem de imperadores e sua contenda contra os lendários sete heróis.

Uma história que atravessa gerações

Com uma narrativa independente dos outros títulos da franquia, Romancing SaGa 2 conta a história da família imperial de Varennes. No passado, sete heróis foram selados após se esforçar para salvar o mundo de uma grande ameaça, mas eles voltam ao mundo com sede de poder e desejo de vingança.

Após certos eventos iniciais da trama, logo nos vemos no controle dos imperadores e sua linhagem sucessória, tentando unir as várias regiões do continente. No caminho, será necessário enfrentar as calamidades que as assolam, muitas das quais acabam se associando com as figuras desses sete heróis.

Ao contrário do usual de RPGs japoneses, um ponto importante de SaGa é a sua estrutura não-linear. Em vez de seguirmos necessariamente a mesma lógica toda vez, é possível explorar as áreas em ordens diferentes e fazer escolhas que alteram a forma como a aventura se desenrola.

Por conta dessa liberdade, temos boas variações de como resolver os problemas do império, levando a múltiplas alternativas para rejogar. Tentar fazer caminhos diferentes é uma ótima motivação de replay e uma das coisas fascinantes da franquia, aqui plenamente representada.

Dominando os turnos

Romancing SaGa 2 é um RPG de turnos e a versão Revenge of the Seven traz uma grande atualização do formato de acordo com o formato mais recente da série. Desta vez, temos um esquema de timeline, mostrando a ordem de ação de aliados e inimigos no canto superior da tela. É possível observar até mesmo os próximos dois turnos se o jogador quiser ter um planejamento mais detalhado de quais inimigos eliminar primeiro para tomar menos dano futuramente.

Em vez de executarmos todos os ataques de uma vez só, como em SaGa Scarlet Grace e Emerald Beyond, temos que executar as ações de cada membro da equipe individualmente. Cada personagem pode equipar dois tipos de armas distintos e utilizar golpes especiais de ambos, mas também tem à disposição magias e itens consumíveis equipados como bálsamos restaurativos de HP.

Usar muito uma arma ou magia levará a nossa competência no uso dela a melhorar com níveis específicos para cada uma em vez de um “nível global de força”. Além disso, essas habilidades individuais são pré-requisitos para o Glimmer, uma inspiração em combate que permite que os personagens aprendam golpes especiais mais poderosos, especialmente durante batalhas mais estressantes contra inimigos poderosos.

Um detalhe interessante é que o jogo indica todas as fraquezas dos inimigos em pequenos ícones abaixo dos seus nomes. Vale a pena usar várias armas e magias para tentar descobrir todos os elementos que causam mais dano contra eles e explorar essa informação para conseguir mais pontos para o Overdrive.

Com a barra de Overdrive cheia no canto inferior da tela, o jogador pode fazer com que múltiplos personagens ataquem de forma consecutiva em combos bem mais poderosos do que os ataques seriam individualmente. Para usar a técnica, é necessário que haja um aliado que ainda não agiu este turno e que habilidades do atual e do próximo aliado tenham um combo específico.

Após um certo ponto do jogo, podemos liberar Overdrives com mais de dois personagens, mas é necessário fazer o combo de dupla primeiro em uma batalha. Por conta disso, é menos provável o uso de combos maiores contra inimigos mais fracos.

Os cuidados do combate

De forma geral, temos um combate bastante estratégico no qual temos muitos fatores para levar em conta e muitas oportunidades para aproveitar. Um bom exemplo disso é que fatores como afinidades elementais também podem ser explorados através do sistema de Ley Lines, que podem deixar os inimigos mais poderosos e difíceis de lidar, caso não exploremos o uso de técnicas de ataque e magia com o elemento oposto.

Cada personagem também possui em particular três pontos que precisamos ter em mente: HP, BP e LP. Os HP são os pontos de saúde de um aliado e o que o mantém de pé; caso eles cheguem a 0, o personagem desmaia. Porém, ao contrário de outros RPGs, isso não significa uma “morte”, bastando usar magias de cura comuns para trazê-los de volta à ativa.

Porém, chegar a 0 significa perder um ponto de LP, que é um elemento finito. O LP sim é a vida de um personagem, que pode ser levado a uma morte permanente se ficar sem esse recurso. Por conta disso, o domínio tático do combate e a cautela com jogadas mais arriscadas é ainda mais sensível em SaGa.

Além desses dois pontos, temos os BP (Battle Points), que são utilizados para ataques especiais e magias. Enquanto o HP é restaurado ao máximo ao final de cada combate, o BP é mantido como está. Isso significa que, a cada batalha que participamos, as nossas reservas vão se esgotando e é importante saber dosar o uso das habilidades mais poderosas para não encarar uma situação desastrosa contra a qual a sua equipe terá dificuldade por não poder usar um golpe mais poderoso. Felizmente, antes dos chefões há pontos de restauração de BP de uso único, dando ao jogador a chance de encarar os maiores desafios com o seu potencial máximo.

Na gerência de um império e de legados

Quando falamos de Romancing SaGa 2, um ponto importante da experiência envolve o legado deixado entre as gerações. Após o inicinho do jogo, em boa parte da jornada estamos seguindo novos imperadores que absorvem habilidades e memórias de seus antecessores, mas ainda possuem suas próprias classes e tendências de atributos.

Por exemplo, em uma geração podemos fazer uma ágil gatuna como “imperador”, depois mudar para um mago, e logo depois seguir com um personagem mais bruto que talvez não consiga aproveitar tanto o potencial mágico de seu antecessor. Também temos representantes dessas classes como aliados recrutáveis nas tavernas, podendo construir equipes mais habilidosas com armamentos físicos, magia ou com algum nível de equilíbrio entre as duas coisas.

É fundamental para o combate que o jogador consiga montar essas equipes e explorar formações diferentes. Com o tempo, podemos desbloquear novas opções, como ter um personagem que recebe todo o dano e protege outro mais fraco que fica na retaguarda ou focar bastante na magia.

Porém, além do combate, ser imperador também implica em um aspecto de construção do seu país. Conforme conquistamos mais territórios com as nossas intervenções, abrimos a possibilidade de desenvolver a indústria armamentícia (Smithy), desenvolver estudos mágicos, construir uma universidade e até mesmo um parque que aumenta a quantidade de recursos obtidos com o tempo.

Em comparação com jogos de simulação, o sistema de evolução do nosso império é bastante simplificado, não trazendo muita variedade de opções. Porém, ele é muito bem integrado com o resto do jogo, tendo em vista que é através dele que melhoramos nossas opções de equipamentos, magia, recebimento de dinheiro (que não vem dos inimigos e sim dos impostos coletados enquanto vivenciamos as nossas expedições) e outros fatores intimamente ligados à evolução do jogador.

Um vasto mundo para explorar


Apesar de tudo que comentei acima, o principal choque ao ver o Revenge of the Seven Heroes está definitivamente no bom aproveitamento da tridimensionalidade. Embora eu pessoalmente tenha uma predileção por gráficos 2D e ache que o jogo original continua bastante charmoso, temos uma evolução notável na capacidade de explorar ambientes e na direção narrativa.

Como comentei no nosso texto de impressões, já no início do jogo, é notável o quanto o título se esforça para expandir o que estava presente no original. As cenas aqui são muito mais detalhadas, dando mais imersão e vida aos contextos que vivenciamos e permitindo que o roteiro seja desenvolvido de forma mais clara do que no original.



Além disso, todo o mundo do jogo foi repensado para aproveitar as três dimensões. Com isso, as dungeons agora são ambientes nos quais podemos pular por plataformas e desviar de inimigos (visíveis na tela) ou tentar abordá-los de forma furtiva para ganhar iniciativa. A sensação que fica é a de que a equipe de desenvolvimento conseguiu de fato criar ambientes ricos em interação e que justificam muito a transição do 2D para o 3D.

Da mesma forma, também temos itens para encontrar nos caminhos, memórias dos antagonistas e um misterioso “Mr. S”, que está escondido em várias áreas e recompensa o jogador com recursos extras ao encontrar várias versões dele. Essas coisas valorizam a exploração ainda mais e fazem com que vasculhar todos os cantinhos do RPG seja um processo bastante prazeroso.

As pequenas imperfeições

Apesar de todos os pontos que levantei acima, gostaria de apontar alguns pequenos defeitos que podem atrapalhar um pouco a experiência com o jogo. Primeiramente, por ser um jogo bastante complexo, há momentos de decisão que podem ser difíceis de tomar, como, por exemplo, escolher quais golpes manter, já que há um limite máximo. Infelizmente, nessa situação, só temos a capacidade de ver quais golpes estão disponíveis e se eles terão Glimmers.

Quando eu estava usando um certo personagem, mudei de arma para tentar melhorar sua afinidade com outra opção e, quando chegava nesse menu, nunca me lembrava quais habilidades eu ainda tinha acesso. Ter uma simples possibilidade de consultar as armas que estão equipadas nessa tela seria uma ajuda imensa para essa avaliação. 

Da mesma forma, durante o combate, seria interessante poder ver mais detalhes sobre cada ataque, como os Glimmers, e sobre os atributos dos personagens. Ter acesso ao máximo possível de informação é uma ajuda considerável para tomada de decisão no jogo e, especialmente em alguns casos como os que citei, fica a sensação de que poderíamos ter opções para ver mais.



Nesse sentido, também temos aqui a ausência de um log de diálogos. Com tanto texto e especialmente com a passagem automática das falas, o entendimento de certas cenas pode ficar comprometido pela impossibilidade de reler o que aconteceu antes de avançar.

Por fim, ainda temos uma situação em que o botão de ação para atacar inimigos enquanto exploramos só funciona enquanto eles não viram o nosso personagem. Essa escolha é muito estranha e um tanto disfuncional, já que restringe bastante nossa capacidade de ativar essa vantagem. 

Além disso, nos dois PCs em que joguei, encarei um bug que fazia com que a movimentação travasse temporariamente de vez em quando. Ora se mantinha o personagem em movimento enquanto eu não estava pressionando nada, ora eu ficava impedido de apertar aquela direção por um tempo.

Nenhum desses elementos é o suficiente para diminuir as qualidades do jogo, que é um remake bastante competente e que consegue se destacar em meio a vários títulos de qualidade no gênero na atual geração.

Vingança para um clássico subestimado

Romancing SaGa 2: Revenge of the Seven é um remake que consegue transitar entre as qualidades do original e a modernidade esperada de um jogo atual, apresentando-se como uma experiência ousada e única no mercado de RPGs. Um testamento do esforço de experimentação da franquia ao longo de décadas, temos aqui um jogo que absolutamente todos os fãs do gênero, e até mesmo aqueles que querem se desafiar a ver RPGs sob um novo prisma, deveriam experimentar.

Prós

  • Opções estratégicas robustas para explorar durante o combate em turnos;
  • Liberdade de exploração permite desbravar a história de formas bem diversificadas, valendo a pena explorar outras ramificações no New Game+;
  • Ambientes ricos em detalhes e com elementos que incentivam vasculhar todos os cantos para conseguir itens e outros benefícios;
  • Sistema de gerenciamento de investimentos do império é simples de entender e uma forma interessante de desbloquear mais recursos.

Contras

  • A impossibilidade de atacar os inimigos no mapa após ser detectado é uma restrição muito inconveniente;
  • Nos dois PCs que usei, encarei um bug em que a movimentação às vezes travava temporariamente;
  • Alguns menus, como a tela de selamento de habilidades, poderiam ter informações mais completas para ajudar na tomada de decisões;
  • Ausência de log de diálogos.

Romancing SaGa 2: Revenge of the Seven  — PC/PS4/PS5/Switch — Nota: 9.5
Versão utilizada para análise: PC

 Imagens: Square Enix
Análise produzida com cópia digital cedida pela Square Enix

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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