Silent Hill: Downpour — o odiado que se tornou clássico cult

Em uma cidade onde a chuva nunca para de cair, um homem solitário precisa enfrentar seus medos mais obscuros.

em 07/09/2024



Apesar de ter se afastado um pouco dos holofotes nas últimas décadas, com apenas alguns aparecimentos bem tímidos vez ou outra, Silent Hill é uma das poucas franquias que têm o poder de continuar cultivando fãs mesmo sem novos jogos sendo lançados. Com o anúncio do remake de Silent Hill 2, muitas pessoas retornaram para os melhores da franquia para reviver as boas memórias.

Apesar de Silent Hill: Downpour não ser um dos mais aclamados, hoje em dia, 12 anos depois do seu lançamento, está conseguindo um canto especial no coração dos fãs.

Eram outros tempos

Lançado em 2012 para Xbox 360 e PlayStation 3, Downpour é um daqueles casos de jogos que foram extremamente odiados em seu lançamento, mas que aos poucos começou a ser olhado de uma forma diferente, principalmente pelos fãs. Muitos fatores foram responsáveis por isso, incluindo o seu desenvolvimento conturbado.

Desenvolvido pela Vatra Games, o estúdio estreante situado na Tchecoslováquia tinha uma importante e difícil (talvez quase impossível) tarefa nas mãos: criar um Silent Hill que estivesse à altura da época de ouro da franquia. Mesmo com a inexperiência do estúdio, que só havia desenvolvido um jogo até então, eles conseguiram criar algo especial.


A visão que a Konami — empresa detentora dos direitos da franquia e que produziu os primeiros jogos — tinha uma década atrás era bem diferente do que vemos hoje em dia da gigante japonesa. O que mais importava nessa época não era a qualidade de cada jogo, e sim quem cobraria mais barato para desenvolvê-lo e qual a margem de lucro que ganhariam em cima disso.

É difícil dizer quais foram os motivos que levaram à escolha da Vatra para tocar o projeto, tendo em vista que mesmo na época havia estúdios bem mais capacitados para isso, mas um dos motivos sem dúvidas foi o preço. Distribuir suas propriedades intelectuais para vários estúdios em volta do mundo até pode gerar um lucro imediato, porém deixa sequelas na série, como Silent Hill: Book of Memories e Silent Hill: Homecoming.

Alguns podem dizer que o barato saiu caro, já outros afirmam que foi um investimento na compra de um bom vinho que envelheceu por 12 anos.

Bem-vindo de volta a Silent Hill


Uma das características mais presentes na série é a singularidade dos jogos. Cada um deles conta uma história diferente com seus próprios personagens e enredo, não sendo necessário conhecer os títulos anteriores e podendo apreciá-los de forma isolada; em Downpour, isso não é diferente.

Dessa vez, seremos colocados na pele do presidiário Murphy Pendleton, que foi detido por roubar uma viatura e cruzar o país em uma perseguição que durou quase 10 horas. Murphy sempre foi um bom e típico cidadão americano, nunca transparecendo nenhum tipo de intenção criminosa, o que sempre deixou os policiais muito intrigados por ele ter feito o que fez sem mais nem menos, mas será que existem outras razões por trás disso? (música_de_mistério.mp3).

O jogo começa com Murphy sendo transferido em um ônibus para uma prisão de segurança média por conta do seu bom comportamento. O que ele não sabia é que para chegar lá o ônibus precisaria passar pela cidade das colinas silenciosas. Em um momento de descuido, o motorista acaba perdendo o controle e caindo ribanceira abaixo, dando início ao pior e mais longo dia da vida de Murphy. 

Quando finalmente acorda, todos ao seu redor haviam sumido e agora ele precisa encontrar um jeito de sair da cidade antes que os policiais o encontrem.


Seu pior inimigo, a jogabilidade

Como já é de costume na franquia, a jogabilidade é propositalmente ruim para desincentivar o combate. Na maioria das vezes, fugir e economizar meia dúzia de balas é mais inteligente. Em sua base, Downpour pode ser descrito como um jogo de exploração e resolução de quebra-cabeças com alguns momentos de combate (talvez mais momentos do que deveria).

Aqui, Murphy não é um soldado, não sabe lutar e não maneja armas muito bem, fazendo o jogador lutar mais contra os comandos do que contra os monstros. É quase como se o personagem tivesse vontade própria e decidisse quando obedecer ou não aos comandos do jogador.

Não dá para dizer ao certo quanto disso é proposital e quanto é falta de polimento da jogabilidade, mas ambos os casos contribuem para a atmosfera de tensão constante. Nunca dá para saber o que haverá atrás da porta e se você terá sequer uma chance de fugir.



O nome do jogo também não é por acaso. Um dos fatores mais presentes durante a campanha é a chuva, que, além de dificultar a visibilidade em conjunto com a névoa constante,  deixa os monstros mais fortes.

E falando em monstros, aqui eles estão mais feios e perigosos do que nunca, com cada um deles representando um aspecto diferente da psique de Murphy.

Um mundo aberto?

O aspecto que mais diferencia Downpour dos demais é o seu “foco” na exploração. Nunca antes a cidade esteve tão aberta à disposição do jogador.

Quando Murphy finalmente acorda do acidente de ônibus no começo do jogo, ele precisa explorar o entorno da cidade, conhecido como Devil’s Pit, e as antigas minas até finalmente conseguir entrar em Silent Hill. Quase todo o mapa está liberado desde o começo para o jogador explorar a vontade, encontrar missões secundárias e desvendar segredos.

Em teoria essa é uma ideia interessante, se não fosse a pior parte do jogo. As missões secundárias são extremamente chatas, cansativas e não oferecem nenhuma recompensa ao jogador além da satisfação própria de exploração. 



Essas missões secundárias podem ir de entrar em um apartamento e devolver alguns itens que foram roubados para seus donos a consertar um projetor de cinema para descobrir um segredo escondido no filme. O estranho é que toda essa “parte extra” pode ser simplesmente ignorada pelo jogador, transformando um jogo de “mundo aberto” em algo linear, em que você só segue as tarefas principais e acompanha a história.

E falando em história, esse também é um ponto que divide a opinião dos fãs. Particularmente, ela é uma das minhas histórias favoritas dos videogames, mas entendo que o aspecto propositalmente interpretativo e confuso pode afastar algumas pessoas, porém, recomendo que permaneçam firmes para tentar entender um pouco mais da cabeça do nosso protagonista.

Os motivos que levaram Murphy a fazer o que fez são muito mais complexos do que parecem, muitas coisas só serão entendidas ao final do jogo e os outros personagens que cruzam o seu caminho durante a história deixarão as coisas cada vez mais macabras. Cabe a você enxergar além da ponta do iceberg.

Ainda vale a pena se molhar nessa chuva?


Apesar de ter a sua meia dúzia de fãs espalhados pelo mundo (incluindo eu), é fato que Silent Hill: Downpour nunca será o favorito da maioria, não porque ele seja um jogo ruim, mas sim porque está muito abaixo dos que estão no pódio. Por nunca ter sido lançado para computadores, o título  continua preso na sétima geração de consoles, nunca recebendo nenhum tipo de relançamento ou remasterização. 

Contudo, se por algum acaso você ainda tiver um Xbox 360 ou PS3 pegando poeira aí no armário e nunca ouviu o som dessa chuva, vale a pena se molhar um pouquinho.

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli

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Um “arqueólogo de games” que adora falar das gemas ocultas do mundo dos jogos, tem o PS3 como console favorito e ama um bom hack and slash. Mesmo apreciando os jogos modernos, não dispensa uma boa velharia obscura do tempo que videogame era movido à lenha. Segue o pai.
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