Com o avanço gradual da luta anticapacitista, as demandas das pessoas com deficiência estão sendo cada vez mais ouvidas nos últimos anos. Felizmente, o mercado de games parece seguir essa tendência, com discussões sobre recursos de acessibilidade em jogos se tornando mais comuns.
Microsoft e Sony já lançaram seus controles adaptáveis para Xbox e PlayStation, respectivamente, nivelando a experiência de games para pessoas com deficiências físicas. Agora, a filial brasileira de uma das ONGs que ajudou a criar esses controles, a AbleGamers Brasil, também tem um acessório para chamar de seu: o UMAGIC.
Apresentado durante a gamescom latam 2024, esse é um controle para PcDs que se propõe a ser altamente modular e universal. Tivemos a oportunidade de testar um protótipo do acessório por uma semana e, durante esse período, foi possível entender como essa criação nacional pode se destacar perante os hardwares estrangeiros.
Livre configuração
O diferencial do UMAGIC, que salta aos olhos de início, é sua possibilidade de customização. Basta ver as fotos desse texto. Possivelmente você notará que botões e analógicos estão em posições diferentes em cada imagem.
O uso desses acessórios não é novidade no meio da acessibilidade gamer. O Controle Adaptável de Xbox, por exemplo, possui entradas P2 similares ao acessório da AbleGamers Brasil, permitindo conectar diferentes tipos de botões e alavancas que correspondem a comandos distintos em um controle convencional. No entanto, enquanto esse recurso é um adicional no hardware da Microsoft, no UMAGIC é padrão.
Por meio de um sistema magnético, o usuário pode dispor os acessórios sobre a superfície do controle da maneira que preferir. Isso permite uma facilidade de acesso muito maior do que nos controles praticamente imutáveis das grandes fabricantes de consoles.
Em minha experiência, pude organizar os botões e analógicos de diferentes maneiras para gêneros de jogos diversos. Em games de tiro em primeira pessoa, coloquei os gatilhos bem ao lado dos analógicos, permitindo controlar personagem e mira com a ponta dos dedos e atirar usando o restante das mãos. Sem dúvidas, foi a maneira mais confortável que já joguei FPS em minha vida.
Já em jogos de plataforma, dispus as alavancas o mais longe possível dos botões, deixando meus braços mais distantes um do outro e diminuindo a sensação de aperto desconfortável. A natureza do controle fez com que adaptações como essas fossem muito mais fáceis de realizar do que com os controles oficiais de Xbox e PlayStation.
Com esses acessórios first-party, encontro um problema pessoal de ajuste do meu espaço de jogo. Tanto o Controle Access quanto o Controle Adaptável e seus possíveis periféricos exigem que sejam apoiados sobre uma plataforma para serem utilizados com as mãos. Para poder manuseá-los dessa forma, teria que remodelar meu setup, o que traz um desgaste desanimador.
Como os botões e analógicos do UMAGIC são atraídos magneticamente, o controle em si acaba funcionando como sua própria plataforma de apoio. Para mim, isso removeu uma barreira relevante. Bastou colocar o acessório sobre meu colo para aproveitá-lo. Os ímãs também são fortes o suficiente para deixar os periféricos firmes em seus lugares, mas suaves, permitindo seu deslocamento de maneira simples.
Testando o UMAGIC na gamescom latam 2024 antes de receber o acessório para esse texto. Foto: bleGamers Brasil |
Além disso, como o controle possui 3,5 kg, duas almofadas de diferentes tamanhos podem ser acopladas na parte de baixo do acessório via velcro, trazendo mais conforto para quem está com o hardware sobre as pernas. A única questão que tive nesse quesito é que o velcro estava muito duro, dificultando bastante a remoção da almofada para troca.
Um controle para todos
Outro destaque da criação da AbleGamers Brasil é sua universalidade entre plataformas. Por meio de uma conexão USB-C, o UMAGIC promete ser compatível com todos os hardwares de jogos atuais, como PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series X|S, PC e Nintendo Switch. Por meio de uma tela de toque na parte superior do controle, é possível alternar entre as plataformas.
Segundo o diretor executivo da ONG, Christian Bernauer, essa compatibilidade geral foi alcançada, pois o protótipo do acessório possui, literalmente, placas de controles de Xbox, PS5 e Switch em seu interior. Quando o usuário faz sua escolha na tela, o UMAGIC se conecta à placa correspondente como se fosse um seletor. Isso faz com que o tamanho do controle seja significativamente grande, mas é uma consequência suportável perante a possibilidade de usá-lo com qualquer hardware.
Como cada controle possui seu próprio esquema de botões, é preciso ficar atento ao conectar os acessórios nas entradas P2. Cada uma possui indicadores que mostram quais são seus inputs correspondentes e, em alguns casos, a mesma entrada representa botões distintos dependendo da plataforma utilizada.
Isso pode provocar um tira e põe dos plugs ao mudar de hardware. Como os botões e analógicos são conectados por fio, a parte traseira do UMAGIC pode se tornar um emaranhado de cabos após alguns momentos. Entretanto, novamente, é algo aceitável em troca da universalização do controle.
Contratempos
Por se tratar de um protótipo, houve alguns momentos durante os dias de teste em que o hardware da AbleGamers Brasil não funcionou exatamente como esperado.
Enquanto meu Nintendo Switch e meu Xbox Series S reconheceram o controle quase instantaneamente – com o console da Microsoft o identificando como um Controle Adaptável –, a mesma sorte não se repetiu com o PlayStation 5.
Foto: AbleGamers Brasil |
Outro ponto em que a experiência não foi completamente fluida foi com os analógicos desenhados para o UMAGIC. Apesar de funcionais, ao checá-los na opção de calibragem do Nintendo Switch, o console mostrou que, embora a alavanca estivesse totalmente inclinada, o sistema reconhecia como se ela estivesse somente na metade do input total.
Isso fez com que personagens se movessem muito devagar em alguns títulos ou até que ficassem parados independentemente dos comandos. Felizmente, outros analógicos P2, que não foram desenvolvidos especificamente para o protótipo, também foram enviados no conjunto de testes. Esses funcionaram normalmente, porém pecaram por não poderem ser acoplados à superfície do UMAGIC via imãs.
É importante lembrar que a versão do controle testado ainda está em desenvolvimento e aprimoramento. É bem provável que a AbleGamers Brasil aborde esses problemas em futuras revisões do acessório.
Futuro promissor
Em sua primeira exibição pública na gamescom latam 2024, o UMAGIC teve um uso muito interessante. Pessoas com deficiência podiam levá-lo para qualquer estande no evento e utilizá-lo nas estações de jogos de outras empresas, exemplificando como tecnologias de acessibilidade podem, de fato, integrar jogadores.
No entanto, o controle tem potencial não só nos pavilhões como também no setup de várias pessoas com deficiência. Sua alta possibilidade de customização eleva o nível de design de acessórios gamers PcD. Já a compatibilidade com todas as plataformas no mercado, apesar das falhas no meu teste, promete ser um diferencial que auxilia ainda mais na acessibilidade.
O projeto da AbleGamers será open source e busca investimentos e apoios de terceiros no momento. Futuramente, usuários poderão baixar o código-fonte, imprimir os acessórios 3D e personalizar ainda mais o hardware.
Saiba mais sobre o UMAGIC no site da AbleGamers Brasil.
Revisão: Alessandra Ribeiro