Entrevista

Minds Beneath Us: entrevistamos Ted, produtor no BearBone Studio

Conheça os motivos que levaram esta pequena desenvolvedora independente a criar um jogo tão pertinente à nossa realidade.

em 12/08/2024

Lançado em 31 de julho no Steam, Minds Beneath Us é um jogo único que tive a oportunidade de analisar para o site. Digo "único", pois, do meu ponto de vista, a mensagem transmitida ao longo da aventura ressoa de maneira diferente de pessoa para pessoa, dado o nível de imersão que o título de estreia do BearBone Studio proporciona.


Devido a isso, pedi para meu amigo e colega de Blast, Ivanir, me ajudar a fazer a ponte entre mim e o pessoal da desenvolvedora desse incrível jogo, porque eu realmente fiquei curiosa para entender os motivos por trás da criação de uma obra tão atual. O resultado da minha curiosidade é a entrevista com Ted, produtor de Minds Beneath Us, que você pode conferir a seguir.

Observação: as respostas foram editadas por motivos de clareza.

GameBlast: Para começar, vocês podem nos contar um pouco mais sobre BearBone Studio?

BearBone Studio: Somos um grupo formado por amigos de faculdade que se reuniram durante o projeto de graduação e decidiram criar um estúdio de jogos indie. Além do sonho de desenvolver nossos próprios jogos, vimos muitas oportunidades na época: Taiwan tinha algumas competições e instituições de investimento disponíveis a apoiar novas equipes, oferecendo não apenas financiamento, mas também orientação. Ainda, o incentivo de desenvolvedores experientes nos deu a confiança para começar nosso estúdio logo após a graduação. Somos muito gratos por todo o apoio que recebemos ao longo do caminho.

Embora tenhamos tido algumas mudanças na equipe, mantivemos um grupo de sete pessoas no total. Temos um engenheiro, um artista técnico, um modelador 3D, um designer de cenários, um animador de personagens, um designer de UI e personagens e um produtor-redator. Como podem ver, damos uma grande ênfase na apresentação visual, com cinco dos sete de nós trabalhando em funções relacionadas à arte. Nosso foco principal é expressar ideias por meio da narrativa, mas isso não se limita a um tipo específico de jogo. Pode ser uma aventura textual ou um jogo de ação.

GB: De onde veio a inspiração para criar Minds Beneath Us? Podem nos dizer mais sobre o processo criativo por trás do jogo?

BBS: A inspiração veio das minhas observações e decepções com a sociedade, o que me levou a expressar esses pensamentos por meio do jogo. Estamos vivendo em uma era complexa, onde os problemas da sociedade estão se tornando mais intrincados, mas ainda estamos acostumados a pensar em termos de derrubar uma única força opressora ou entidade maligna.

No passado, seja derrotando um ditador ou abolindo a escravidão, esses eram objetivos bastante diretos, embora desafiadores e exigissem muito esforço. Mas hoje, os problemas são mais complexos, como o quanto de privacidade devemos ceder às grandes empresas para que elas treinem seus modelos. Esse é um problema que requer pensamento coletivo, em vez de apenas lutar contra ou rejeitar totalmente a ideia.

A história central de Minds Beneath Us gira em torno de Nin Situ, uma personagem que fala de justiça, mas acaba cometendo o que parece ser uma traição. Espero que, ao final do jogo, os jogadores possam entender sua posição (mesmo que não concordem com ela). Para mim, isso representa a ideia de que às vezes pessoas que vacilam em suas posições ainda podem ser boas, e manter uma posição firme nem sempre é o melhor. Devemos abordar tudo com uma mentalidade mais aberta, em vez de sermos atacados por posições fixas.


GB: Recentemente, muito tem sido discutido sobre o uso da inteligência artificial (IA) generativa em diversos campos, gerando debates sobre se isso é legal ou não, e o desenvolvimento de jogos não é exceção. Porém, conforme eu jogava Minds Beneath Us, senti que o debate central gira em torno de IA x humanidade. Vocês podem nos contar mais sobre o porquê de terem escolhido falar sobre tecnologia e IA no jogo?

BBS: A tecnologia de IA me parecia inevitável (especialmente agora). Então, tive que discuti-la. Quando começamos a desenvolver Minds Beneath Us, a IA não era um tópico tão quente, mas eu achava que era um tema essencial a ser explorado na nossa história. No entanto, senti que não estava equipado para analisá-la profundamente, pois envolve complexidades sociais e técnicas.

Então, no jogo, apenas tentamos levantar questões e deixar os jogadores imaginarem os problemas potenciais que podemos enfrentar no futuro. Não tenho todas as respostas. O que realmente queríamos explorar era o dilema ético que surge à medida que a tecnologia avança. Eventualmente, os recursos humanos podem se tornar menos valiosos comercialmente, especialmente devido à IA.

Seremos forçados a responder à questão de o que fazer com pessoas que não têm mais valor comercial. Dado que ainda medimos o valor com base na produtividade, esse será um desafio difícil. Em Minds Beneath Us, as pessoas usam medidas extremas para objetificar os humanos para resolver o problema, o que claramente não é uma boa abordagem, mas é inesperadamente razoável. Esperamos que possamos evitar um futuro assim.

GB: O jogo tem uma história muito envolvente, e eu senti que cada personagem tem seus próprios motivos e personalidades. Como vocês conseguiram alcançar tal feito em um jogo onde todos não têm rostos?

BBS: Ao escrever, tento imaginar várias perspectivas e pontos de vista de pessoas que podem ter opiniões diferentes das minhas. Embora raramente percebamos, a maioria das pessoas que encontramos na vida tem formas de ver as coisas muito diferentes. Então, uso essas diferentes perspectivas para criar personagens fictícios. Acredito que o que distingue as pessoas são seus pensamentos.

Tento entender bem os outros, então, ao criar personagens, imagino-os como indivíduos completos, não apenas rótulos como “pessoa ambientalmente consciente” ou “pessoa impulsiva”, mas mais como “alguém reservado devido a uma criação desafiadora”. Com tal persona, posso então pensar em como eles podem reagir a diferentes problemas!


GB: Falando nisso, por que você escolheu esse estilo de arte específico para o jogo? Foi intencional ou apenas uma questão de gosto?

BBS: Se você está perguntando por que os personagens não têm rostos, há três motivos principais: 

1. Custo: não ter rostos nos permitiu criar mais animações dentro do nosso orçamento;
2. Estética: isso se encaixa na atmosfera que queríamos para Minds Beneath Us;
3. Experimento de design: notei que discussões sobre as aparências dos personagens em jogos se tornaram muito proeminentes nos últimos anos. Isso me fez perceber que muitas vezes gostamos dos personagens por causa de sua aparência, então queria tentar criar uma conexão com os jogadores que não se baseasse em aparência. No entanto, essa abordagem foi arriscada, e talvez eu não a use novamente no futuro!

Quanto ao estilo de arte 2.5D geral, é bastante simples: é o que sabemos fazer e em que confiamos para executar. Cenas 3D ajudam com iluminação e trabalho de câmera para criar uma sensação de qualidade, enquanto personagens 2D permitem animações mais expressivas.

GB: Em uma era onde as pessoas têm escolhido jogos mais rápidos, foi sua intenção que Minds Beneath Us fosse uma aventura textual?

BBS: Em termos de resultado, Minds Beneath Us é de fato um jogo de aventura textual, mas essa não foi nossa primeira escolha. Optamos por esse tipo de jogo principalmente devido às nossas limitações técnicas na época. Não estávamos certos sobre como lidar com mecânicas [de jogo] mais complexas, então escolhemos um tipo de jogo que fosse mais viável de implementar. Estamos empolgados para tentar outros tipos de jogos no futuro, mas ainda colocaremos uma forte ênfase na narrativa.


GB: Você esperava que o jogo recebesse críticas tão positivas, antes (por exemplo, com a demo) e após o lançamento completo? Como você se sentiu em relação a essa receptividade, considerando que Minds Beneath Us é seu projeto de estreia?

BBS: Ficamos aliviados ao ver as respostas positivas. Sabíamos que Minds Beneath Us era um jogo um tanto de nicho, então tentamos incluir elementos atraentes, especialmente no estilo visual e na apresentação. No entanto, sua história não é muito direta, então, se os jogadores não conseguissem se imergir e pensar profundamente sobre os personagens, o jogo poderia ter falhado.

Ver as reações positivas dos jogadores nos deixou muito felizes e validou que nossos esforços foram compreendidos. É realmente uma das melhores experiências para os criadores, e somos incrivelmente gratos pelo apoio!

GB: No momento, o jogo está disponível apenas para PC (Steam). Você pretende portá-lo para consoles? Se sim, em quais plataformas? Você acha que veremos esse lançamento em breve?

BBS: Se a situação permitir, definitivamente pretendemos lançar em tantas plataformas quanto possível. Atualmente, estamos focados na versão para Switch e já começamos a pesquisa sobre isso. No entanto, ainda não há uma data de lançamento definitiva para as versões portadas.


GB: Após sua grande estreia com Minds Beneath Us, quais são seus planos como desenvolvedor de jogos?

BBS: Honestamente, temos muitas ideias e histórias que queremos explorar, mas precisamos observar o desempenho de vendas do jogo, pois isso influenciará muito nossos próximos passos. Pelo menos, posso dizer que nosso próximo jogo terá mais elementos de ação, em vez de se concentrar principalmente em texto.

GB: Para encerrar esta entrevista, você gostaria de deixar alguma mensagem para nossos leitores?

BBS: Minds Beneath Us é um jogo sobre comunicação e compreensão. Esperamos ter um diálogo com os jogadores através deste jogo. Não pretendemos persuadir ninguém de nada, apenas encorajar conversas. Esperamos que o jogo alcance esse objetivo!

E se você gostou de Minds Beneath Us, por favor, ajude-nos a divulgar o jogo! Precisamos muito desse apoio. Obrigado a todos!


Agora, conte para nós: curtiu a entrevista com Ted, do BearBone Studio? Ficou com curiosidade de jogar Minds Beneath Us? E, claro, não deixe de seguir as novidades da desenvolvedora em seu perfil no X (antigo Twitter), no Facebook e no Discord.

Revisão: Davi Sousa
Imagens: cortesia de BearBone Studio

Também conhecida como Lilac, é fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por 0range0ceans
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