Jogamos

Análise: Sylvio: Black Waters é o verdadeiro significado de retrocesso

Nove anos após sua primeira aventura, Juliette retorna ao parque abandonado para continuar falando com os espíritos.

em 24/08/2024

Em meados de 2015, o pequeno estúdio sueco Stroboskop decidiu se aventurar na febre do terror independente da época, lançando seu primeiro e mais famoso jogo: Sylvio. Com o sucesso de crítica e uma legião de fãs, era de se esperar que seus próximos projetos fossem ainda melhores, porém Sylvio: Black Waters é um ótimo exemplo de uma sequência que ninguém pediu e que funciona mais como um desserviço ao que tornou o primeiro jogo da série tão especial outrora.

Um retorno tímido

Em Black Waters, o jogador retorna ao mundo de Juliette Waters, a protagonista do primeiro jogo, uma especialista em gravações de áudio paranormal. A história continua sua jornada em um novo setor do parque de diversões abandonado, onde os eventos do primeiro jogo se desenrolaram. A premissa de explorar um ambiente desolado e cheio de histórias ocultas é, sem dúvida, intrigante. No entanto, enquanto o primeiro Sylvio conseguia manter a tensão e a curiosidade através de um mistério bem construído, Black Waters falha em entregar uma narrativa igualmente cativante.

A ambientação, que antes era um dos grandes destaques, aqui parece menos impactante. Embora o design do mundo ainda seja sombrio e atmosférico, há uma sensação de repetição e uma falta de novidade. Mesmo com novos locais para explorar, o jogo parece estar preso ao estilo visual e à paleta de cores do original, sem oferecer variação suficiente para manter o interesse do jogador a longo prazo.

Inovação estagnada

O aspecto mais marcante da série Sylvio sempre foi a mecânica de gravação e análise de áudios paranormais. No jogo original, essa era uma ideia fresca, que, apesar de algumas falhas na execução, trouxe uma nova dimensão ao gênero de terror. No entanto, em Black Waters, essa mecânica começa a mostrar sinais de desgaste, oferecendo mais do mesmo, mas sem a sensação de descoberta que fazia parte do encanto inicial.


O processo de coletar e analisar áudios ainda é central, porém a repetitividade dessa tarefa se torna evidente rapidamente. O jogo parece não saber como evoluir essa mecânica de forma significativa, resultando em uma experiência que se torna mais um trabalho árduo do que um envolvimento misterioso. Enquanto o primeiro jogo podia ser perdoado por alguns de seus tropeços devido à novidade, Black Waters não tem a mesma margem para erros.

Além disso, os quebra-cabeças, que eram uma parte importante do jogo original, aqui parecem menos inspirados e, muitas vezes, frustrantes. A dificuldade não vem da complexidade intelectual, mas sim da confusão causada por instruções pouco claras e uma interface que, embora funcional, é longe de ser intuitiva. Essa falta de refinamento contribui para uma experiência que frequentemente tira o jogador da imersão, em vez de reforçá-la.

A importância do som

O áudio sempre foi a alma da série Sylvio, e Black Waters não é exceção. A qualidade do design sonoro permanece alta, com uma atmosfera que é cuidadosamente construída através de efeitos de som sutis e a sempre presente trilha sonora minimalista. No entanto, mesmo aqui, há um sentimento de oportunidade perdida.

O primeiro jogo fez um excelente trabalho ao usar o áudio para criar uma sensação de paranoia e medo do desconhecido. Cada sussurro, cada estática no gravador, tinha o potencial de ser algo mais, algo ameaçador. Em Black Waters, essa magia não é tão potente. O resultado é que o som, embora ainda tecnicamente competente, perde parte de seu impacto psicológico.

Um retrocesso perceptível

Se o primeiro Sylvio era uma obra de paixão que conseguia compensar suas limitações técnicas com um design estilizado e atmosférico, Black Waters não tem a mesma desculpa. Graficamente não apresenta melhorias significativas em relação ao original. De fato, em alguns aspectos, parece até mesmo um retrocesso.

O jogo sofre com texturas pouco detalhadas e modelos de personagens que parecem antiquados até mesmo para os padrões de jogos indie de alguns anos atrás. A iluminação, que era uma das maiores forças do jogo original, aqui parece menos intencional, resultando em cenários que não têm o mesmo impacto visual. Além disso, a performance é problemática, com travamentos constantes, independente da configuração do seu computador.

Além dos problemas gráficos, o jogador terá que lidar com os inúmeros bugs e glitches que, eventualmente, podem acabar comprometendo seu avanço. Em minha experiência pessoal, a protagonista não parava de agarrar nos cantos do cenário, além de ter meu save corrompido três vezes.

Um Potencial Desperdiçado




O aspecto mais decepcionante de Black Waters é, sem dúvida, sua narrativa. Enquanto o primeiro jogo conseguia criar uma história envolvente e cheia de nuances, essa sequência parece se contentar com uma trama superficial que não faz jus ao potencial de seu universo.

A história tenta continuar os temas de isolamento, loucura e comunicação com os mortos, mas o faz de maneira desinspirada. Em vez de explorar novas profundidades na psique da protagonista ou revelar segredos mais sombrios sobre o parque abandonado, Black Waters oferece uma narrativa que parece mais uma nota de rodapé do que uma continuação robusta.

A interação de Juliette com os espíritos, que no primeiro jogo era carregada de tensão e mistério, aqui se torna quase rotineira. As novas revelações são previsíveis e, muitas vezes, baseiam-se em clichês do gênero que já foram explorados de forma mais eficaz em outros jogos e mídias.

A triste realidade de uma sequência frustrante

Sylvio: Black Waters é uma sequência que, apesar de suas boas intenções, falha em capturar o que tornou o jogo original especial. Enquanto o primeiro jogo era uma experiência que, mesmo com suas falhas, conseguia se destacar no gênero de terror, Black Waters parece um esforço sem paixão, que não consegue justificar sua existência.

Aqueles que foram cativados pelo original podem encontrar algum valor em retornar ao mundo de Juliette Waters, mas esse valor será rapidamente ofuscado pela frustração de uma jogabilidade estagnada, uma narrativa sem brilho e uma apresentação gráfica desatualizada. Black Waters é um exemplo clássico de como uma sequência pode, ao invés de construir sobre o sucesso de seu antecessor, acabar enfraquecendo a memória de tudo o que veio antes.

Este é um lembrete de que, no mundo dos jogos, nem sempre é suficiente apenas repetir uma fórmula que funcionou no passado. A inovação, a paixão e a atenção aos detalhes são essenciais para manter a chama acesa e, infelizmente, esses elementos não existem em Black Waters.

Prós

  • Áudio Imersivo: bom design de som, que cria uma atmosfera tensa e envolvente;
  • Continuidade da História: dá aos fãs do original a chance de explorar mais sobre o enredo, a protagonista e o universo.

Contras

  • Jogabilidade Repetitiva: a mecânica central não se sustenta e rapidamente se torna chata e enjoativa;
  • Problemas visuais e de performance: bugs e travamentos constantes dificultam a imersão na obra, prejudicando a experiência.

Sylvio: Black Waters — PC — Nota: 1.0

Revisão: Alessandra Ribeiro
Análise produzida com cópia digital cedida pela DreadXP



Um “arqueólogo de games” que adora falar das gemas ocultas do mundo dos jogos, tem o PS3 como console favorito e ama um bom hack and slash. Mesmo apreciando os jogos modernos, não dispensa uma boa velharia obscura do tempo que videogame era movido à lenha. Segue o pai.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.