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Análise: MARS 2120 é um metroidvania competente, mas um tanto desengonçado

Produção brasileira da QuByte, a aventura de Charlotte apresenta grandes momentos com ambições não alcançadas.

em 03/08/2024
Desenvolvido pela QuByte Interactive, MARS 2120 é mais um integrante da ampla gama de títulos metroidvania no mercado de jogos independentes. Após um período de acesso antecipado, podemos nos aprofundar na jornada de uma terráquea no desolado planeta Marte. Fortemente inspirado em obras de ficção científica, será que temos um bom jogo em um gênero tão explorado?

Os segredos coloniais de Marte

O começo de MARS 2120 é estranhamente imediato, mas conseguimos pegar algum contexto inicial logo no início. O jogo se passa em Marte, numa colônia humana que serviu de laboratório para experimentos suspeitos, que acabaram resultando em um desastre. A I. A. da base mandou pedidos de ajuda para a Terra, que enviou a sargento Anna “Thirteen” Charlotte para investigar o perímetro. Ao chegar, sua nave sofre avarias, a forçando a achar não só outra forma de voltar para casa, como a enfrentar o desconhecido.

MARS 2120 não ajuda muito a nos situar sobre a narrativa, além de alguns registros de áudio que achamos periodicamente. Boa parte deles são gravações de outros humanos que estavam presentes na colônia, registrando alguns horrores e testes que acabaram deixando a base desolada. Não poder ouvir os áudios novamente em um menu acaba sendo um grande problema para nos refrescar sobre o que está acontecendo

No controle da sargento, devemos explorar diversos cenários não-lineares como num metroidvania padrão. Nossa principal arma a longa distância começa fraca, mas logo somos apresentados ao sistema de elementos — eletricidade, gelo e fogo —, em que cada um faz nosso tiro básico agir de forma diferente. Enquanto os projéteis elétricos são como de uma metralhadora, a arma de gelo age como uma poderosa espingarda.

Vale lembrar que podemos atirar livremente com o segundo analógico como em Shadow Complex. Sou péssimo no manuseio de mira 360º em jogos 2D, mas o jogo oferece algumas ferramentas de acessibilidade bem-vindas não só para o mapa, como também reduzir o dano causado e recebido, além de mira automática para inimigos próximos, que usei desde o começo. Caso queira um desafio extra, é possível deixar Charlotte mais frágil e limitada também.

Limitações espaciais

Contudo, não somos totalmente dependentes de nosso armamento, pois Charlotte é uma exímia lutadora. Desde o começo, podemos desencadear socos e chutes, com direito a ataques especiais mediante comandos no direcional, tanto no chão quanto no ar.

O combate fica mais variado com algumas habilidades que encontramos no caminho, como um shoryuken de fogo e um muro de gelo, dependendo do elemento da arma equipado. Alguns movimentos são essenciais para chegar a locais inacessíveis, e fiquei surpreso que muitos deles casam bem tanto como utilidade de movimentação quanto de combate.

A mescla entre ambas as abordagens de combate funciona relativamente bem; é satisfatório jogar o inimigo no ar e finalizar com tiros antes de ele cair no chão. No entanto, a entrega visual não acompanha a jogabilidade. MARS 2120 sofre bastante com animações desengonçadas, com movimentações e cortes de ciclos pouco naturais e, às vezes, bem repentinos, prejudicando a sensação de impacto dos embates.

O bestiário também é um tanto decepcionante, pois estamos sempre enfrentando os mesmos robôs, humanos equipados, mutantes e outros inimigos do começo ao fim, apenas se diferenciando pela cor do elemento.

As batalhas contra chefes são um caso de erro e acerto, por diversas razões. Os bosses finais são divertidos de enfrentar, mas os iniciais são bem fáceis de derrotar, com exceção da criatura de lava que depende de padrões aleatórios para podermos atacar, sendo facilmente o pior encontro do jogo.

Por outro lado, a movimentação é extremamente satisfatória logo no início. Já começamos com acesso ao pulo duplo, e o nosso controle é bastante responsivo e ágil, deixando as sequências de plataforma e transição vertical nos ambientes sempre divertidas, algo necessário num gênero em que o elemento de vai e vem é central no design.

Nossa exploração pela colônia nos recompensa com as habilidades e armas já mencionadas, mas também com alguns aprimoramentos de atributos. Podemos encontrar melhorias como maior dano, alcance de tiros e vida naturalmente. No entanto, coletar tudo depende da nossa curiosidade para encontrar paredes danificadas ou lembrar de algumas barreiras que passamos no começo e não tínhamos como derrubá-las.

MARS 2120 é mais próximo da parte “metroid” do que “vania”, pois, mesmo que inimigos derrotados nos deem pontos de experiência, não há administração de equipamentos ou quaisquer elementos de RPG; servem apenas para ativar os upgrades encontrados.


A vastidão do 2.5D

Uma das coisas que mais gosto de ver em um metroidvania 2.5D são as possibilidades cinematográficas que isso dá, como troca de câmera e o uso do background para algumas batalhas. MARS 2120 explora isso para nos mostrar a vastidão do planeta vermelho em ambientes abertos e nos mostrar profundidade de áreas mais fechadas.

O título utiliza bastante de assets prontos, mas a mescla de elementos, ainda que não seja um destaque criativo, funciona bem o suficiente para uma produção indie. Nada se destaca tematicamente devido ao escopo de uma colônia espacial, então os ambientes se resumem aos clichês de cavernas de gelo, fábrica com lava e uma estufa com recursos naturais para os humanos que habitavam a base.

No entanto, pontos devem ser dados para a trilha sonora que nos climatiza com êxito nos corredores e plataformas que corremos. São atmosféricas, mas com motifs melódicos que dão destaque a algumas faixas. Os efeitos sonoros de ambientes também ajudam na sensação opressora da colônia.

Uma competente primeira tentativa que precisava de polimento

MARS 2120, apesar de seus percalços, é uma primeira tentativa válida do estúdio brasileiro, ainda que muito baseada em obras clássicas do passado. Apesar dos traços de inexperiência na parte de animação e do orçamento limitado para trazer ambientes mais diferenciados, o level design e a travessia suave mantêm a campanha minimamente engajante. Está longe de ser um grande destaque no mar de produções do nosso país, que está em uma alta bem interessante nos últimos anos, mas mostra o potencial de uma equipe promissora.

Prós:

  • A ambientação é imersiva, principalmente pela trilha sonora;
  • A movimentação é suave e dinâmica;
  • O mapa consegue mesclar bem o fator de exploração com momentos de linearidade;
  • Os momentos em que exploram os benefícios de um jogo tridimensional são sempre interessantes para uma jogabilidade 2.5D;
  • Ótimos recursos de acessibilidade são bem vindos.

Contras:

  • As animações desengonçadas prejudicam toda a sensação do combate corpo a corpo;
  • Pouca variedade de temáticas, devido à proposta de uma colônia terráquea em Marte;
  • Chefes iniciais desinteressantes;
  • O minimalismo da narrativa é levada de forma exagerada, prejudicando nossa compreensão sobre o que está acontecendo na história;
  • Bestiário pouco diverso.
MARS 2021 — PC/PS4/PS5/XBO/XSX/Switch — Nota: 6.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Beatriz Castro
Análise produzida com cópia digital cedida pela QuByte Interactive

Estudante de enfermagem de 25 anos, está nesse mundo dos joguinhos desde criança. Fã de games com vibe mais arcade e arqueólogo de velharias, mas não abandona experiências mais atuais. Acompanha a mídia de podcasts, dublagem e ouvinte assíduo de VGM. Pode ser encontrado como @AlecFull e semelhantes por aí.
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