Dentre as diversas séries de mangá e anime que receberam adaptações para videogames, poucas foram agraciadas com um número tão alto de bons jogos quanto Naruto. O título que relembraremos desta vez é Naruto Shippuden: Ultimate Ninja Storm 2, lançado originalmente para PS3 e Xbox 360 em 2010 e, sem sombra de dúvidas, uma das melhores releituras que o universo de Masashi Kishimoto já recebeu.
I realize the screaming pain
Ultimate Ninja Storm 2 adapta o equivalente aos capítulos 245 a 450 do mangá e do primeiro ao 175° episódio do anime Naruto Shippuden, excluindo os fillers. Dessa forma, o jogo traz muitos dos pontos mais altos da segunda fase da obra de Kishimoto.
Nesse sentido, o título abrange ótimos arcos, como o resgate do Kazekage Gaara, o confronto com a maioria dos membros da Akatsuki, o embate entre os irmãos Uchiha e o adeus de personagens importantes como Jiraiya, Asuma e o próprio Itachi, culminando na luta do protagonista com o antagonista mais interessante da franquia: Pain.
Distanciando-se da abordagem do primeiro Ultimate Ninja Storm, que mesclava os eventos principais da história com diversas missões secundárias que na prática acabavam sendo obrigatórias, o modo História de Storm 2 é extremamente direto ao ponto e se concentra apenas na narrativa, mantendo as tarefas secundárias como de fato opcionais.
Além disso, o jogo não utiliza a técnica de preenchimento com flashbacks de eventos que aconteceram minutos atrás, como o anime frequentemente faz. Aqui, as lembranças são de acontecimentos que se posicionam na cronologia do primeiro Naruto Storm ou de algumas coisas do início da campanha mostradas novamente apenas no final. Como resultado, temos uma narrativa incrivelmente agradável de acompanhar.
Produzido com cuidado e carinho
Embora eu goste mais da abordagem mais característica de RPGs que a série Ultimate Ninja de PlayStation 2 apresentava, especialmente o quinto título, considero o modo História dessa entrada muito melhor que a fragmentação em missões do seu antecessor. Além dos objetivos principais, temos algumas tarefas secundárias que geralmente envolvem lutas ou coletar e entregar itens.
O mundo de Ultimate Ninja Storm 2 é dividido em diversas áreas interconectadas que replicam com muito carinho algumas regiões da obra principal, como as Aldeias da Folha, da Areia e da Chuva. No jogo, a campanha se divide em capítulos, com a progressão majoritariamente se resumindo a ir do ponto A ao ponto B, dialogar com personagens e enfrentar um ou mais chefes.
Apesar do vai e vem entre as áreas ficar um pouco cansativo em alguns momentos, o trabalho feito pela CyberConnect2, desenvolvedora responsável por esse e diversos outros bons games baseados em animes, para entregar uma experiência coesa e fiel ao material original é primoroso.
Ainda que nesse jogo alguns momentos de diálogos sejam um tanto engessados e de pouca variação de expressões por parte dos personagens, o elenco original de vozes em japonês está presente e faz um trabalho sensacional, além dos característicos visuais em cel-shading, que ajudam a reproduzir com fidelidade a essência dos cenários e indivíduos.
Nessa perspectiva, mesmo que uma pessoa não tenha conhecimento prévio sobre Naruto Shippuden, desde que tenha assistido à primeira fase da série ("Naruto Clássico”), ela receberá de Storm 2 uma releitura excelente sobre os arcos em que essa entrada se baseia.
Da mesma forma que acredito que, na maioria das vezes, consumir um mangá e um anime de uma mesma obra sejam experiências completamente distintas e não substituíveis entre si (independentemente do quão fiel o segundo é ao primeiro), creio que esse jogo também se sustenta muito bem sozinho e se apresenta como um produto imperdível sobre a jornada do ninja loiro.
Combates inesquecíveis
Se os momentos de navegação podem deixar um pouco a desejar em certas ocasiões, o mesmo não pode ser dito dos combates de Naruto Shippuden: Ultimate Ninja Storm 2, que, ouso dizer, conseguem ser mais impactantes que a animação em alguns casos. Aqui, como nos demais jogos da série, as batalhas ocorrem em cenários tridimensionais e utilizamos um personagem principal e mais de dois de apoio.
Além dos golpes padrão, que desencadeiam combos, temos esquiva, corrida, salto, arremesso de armas ninja, ataques especiais e o uso de itens que concedem bônus ou restauram saúde. Apesar das lutas terem ficado mais rápidas e trazido muito mais personagens em Storm 3 e 4, essa entrada foi certamente um avanço com respeito ao seu antecessor em questão de dinamicidade.
A despeito de todos os méritos já mencionados, o ponto que faz com que Naruto Ultimate Ninja Storm 2 seja tão especial diz respeito aos confrontos contra chefes, que não apenas replicam as situações originais, mas trazem maravilhosas sequências de ação desenroladas através de Quick-Time Events (QTEs).
A luta de Gaara contra Deidara, por exemplo, que ocorre já no início do game, traz um ponto no qual devemos apertar sequências de botões nos momentos corretos enquanto o Kazekage persegue o membro da Akatsuki. Nesse embate, o jogo demonstra de forma incrível todo o esforço e sacrifício que o (até então) jinchuuriki da besta de uma cauda empenhou para proteger a sua aldeia.
Durante as pelejas contra chefes, também temos algumas mecânicas distintas para cada tipo de inimigo, fazendo com que esses confrontos sejam bem diferentes dos tradicionais. Como exemplo, podemos mencionar o choque entre Sakura e Sasori, no qual devemos esquivar dos golpes à distância do mestre das marionetes enquanto tentamos nos aproximar para trazê-lo de volta ao chão.
Uma falha e um grande acerto
Todas as batalhas contra chefes em Naruto Ultimate Ninja Storm 2 são bem memoráveis, cheias de ação e carregadas de sentimento, com grande destaque para as disputas entre Jiraiya e Pain e entre Sasuke e Itachi, além das duas lutas que já foram mencionadas anteriormente.
Talvez o grande ponto negativo seja toda a questão que envolve a morte de Asuma e o sofrimento dos personagens ao seu redor, especialmente Shikamaru, que tem um arco de desenvolvimento bem impactante e emocionante no mangá, mas sobretudo no anime.
Infelizmente, todo esse arco acabou ficando sem muita profundidade no game; afinal, não temos nada parecido com o extraordinário episódio 82 de Naruto Shippuden, que, durante uma partida de shogi, nos apresenta muito sobre esse indivíduo, incluindo toda a dor que ele vem carregando e o incrível relacionamento com o seu pai.
Apesar dessa ressalva, há também o total oposto em Ultimate Ninja Storm 2, já que a parte final do confronto entre Naruto e Pain, que foi um verdadeiro show de horrores visuais no trágico episódio 167 do anime, recebeu nuances interessantes no game.
Nesse sentido, embora a primeira fase da luta nos dê o controle total do protagonista em seu modo Sábio, trazendo incríveis novos combos e habilidades ao personagem, a segunda etapa apresenta uma quebra positiva de expectativa. Isso porque, ao contrário do que se pode imaginar, usar Naruto com o manto de caudas (seis delas nessa ocasião) não é nada divertido.
No lugar dos golpes precisos do ninja loiro em seu modo Eremita, a segunda fase da batalha traz apenas caos, no qual qualquer botão que apertarmos desencadeará uma ação que é, sim, poderosa e destruidora, mas completamente imprecisa e fora de controle. Em Naruto Ultimate Ninja Storm 2, temos uma representação certeira e emocional desse embate, no qual, naquele momento, não controlamos mais um ninja com o sonho de ser Hokage, mas uma besta repleta de ódio e com potencial de destruir tudo à sua frente.
Uma adaptação incrível
Naruto Shippuden: Ultimate Ninja Storm 2 se destaca como uma das mais fiéis e emocionantes adaptações do universo criado por Masashi Kishimoto, capturando a essência dos arcos mais significativos de Naruto Shippuden e oferecendo uma narrativa coesa, além de trazer confrontos repletos de ação e emoção.
Não se trata de um produto que substitui a experiência de ler o mangá ou assistir ao anime, mas que se soma a eles, entregando uma dinâmica igualmente insubstituível de se acompanhar a jornada do ninja loiro. Nessa perspectiva, este é um jogo que consegue se sustentar sozinho (desde que haja conhecimento sobre o "Naruto Clássico"), mesmo para quem não consumiu previamente a segunda fase dos materiais originais.
Revisão: Davi Sousa