Ivanir Ignacchitti: Conta um pouco da experiência da Mad Mimic, da empresa e de vocês especificamente.
Luis: Eu sou o Luis Tashiro da Mad Mimic. A Mad Mimic foi fundada em 2017 e o nosso objetivo é fazer jogos autorais. Antes disso eu tinha uma outra empresa para fazer outsourcing, onde a gente começou com jogos educacionais, serviços de advergames, exportação de projetos e tudo mais, que foi iniciada em 2011, muito tempo atrás.
Então a gente pegou toda essa bagagem, só que a gente estava muito insatisfeito com as coisas que estávamos fazendo na época. Nosso sonho sempre foi fazer jogos autorais, então a partir daí a gente chegou num ponto e falou: "Cara, estamos felizes? Estamos contentes? Não!". Então sentei com meu sócio, a gente conversou muito e tomamos a decisão de correr atrás do nosso sonho.
A partir daí, a gente começou a fazer o nosso primeiro projeto que foi o No Heroes Here 1 no finalzinho de 2016 para 2017. E aí que a gente resolveu fundar a Mad Mimic. A gente falou "Cara, vamos quebrar essa barreira, ter a Mad Mimic como uma branding de jogos autorais" e aí começou todo o desenvolvimento.
Imagem do Steam de No Heroes Here |
Para a nossa sorte, o nosso primeiro projeto, o No Heroes Here, recebeu um aporte da Spcine, a gente passou em um edital e foi uma grande felicidade porque a gente falou "Cara, será que esse negócio vai dar dinheiro? Será que a gente vai conseguir ganhar pelo menos 1 real desenvolvendo jogos autorais?". Era uma sensação que a gente não tinha ideia se isso daria certo ou não, era muita incerteza.
É aquilo: quando você tem serviço, você sabe "ah, todo mês vai cair [o dinheiro]", você tem uma certa previsibilidade. Quando você vai para o autoral, você faz um baita investimento, esperando ter um retorno lá na frente, e, com o fato da gente ter ganhado um edital, a gente falou "cara, boa parte do risco já foi mitigado" e isso deu para a gente mais gás, mais energia e confiança para seguir com o nosso sonho.
Depois do No Heroes 1, a gente fechou uma parceria com o Maurício de Souza, lançamos o Mônica e a Guarda dos Coelhos e na sequência o Dandy Ace internacionalmente com uma publisher chamada Neowiz. Isso ajudou a gente também a ganhar muita visibilidade, entrar no Game Pass, e estreitar ainda mais a relação que a gente tem hoje com Microsoft, Sony. Enfim, deu muita visibilidade para o jogo e para a empresa principalmente.
Imagem da nossa review de Dandy Ace. |
Depois disso, a gente começou a fazer o desenvolvimento do Mark of the Deep, que é o nosso projeto mais ambicioso, e na sequência a gente foi para o No Heroes Here 2 também em uma produção paralela. A primeira vez na história da Mad que a gente arrisca fazer dois projetos simultâneos. A gente chegou no ponto que a gente já estava com uma equipe grande tanto de serviço como da parte de autoral, e o sonho de todo mundo que está aqui dentro é "vamos fazer jogo autoral?" e eu falei "vamos".
A gente está com um time legal, conversamos com o pessoal da Nonsense [Creations] e eles falaram "Acho que a gente pode correr esse risco juntos, então vamos apostar juntos para fazer o No Heroes 2". Então eu falei "beleza, vamos mitigar o risco a partir daí" e aí a gente começou essa relação também com o desenvolvimento do No Heroes Here 2.
Então, assim, fazendo uma breve história da trajetória da Mad Mimic e da produção dos nossos jogos, é isso.
Ivanir: Como é voltar pro No Heroes Here agora, trazer ele de volta com o know-how que vocês tem agora? O que que vocês acham que conseguiram agregar para esse novo projeto, [essa chance] de pensar nele novamente e trabalhar novas ideias?
Luis: A gente sempre costumava dar o pitch de que o No Heroes Here 1 era basicamente um Overcooked com tower defense e temática medieval, só que 2D plataforma. E, agora, a gente falou "cara, a gente já fez um roguelike, que foi o Dandy Ace, e se a gente pegasse os elementos de roguelike que a gente aprendeu a desenvolver — tem toda uma produção procedural e outras coisas — e a gente desse o próximo passo?".
A partir daí, a gente pensou em pegar o que a gente fez e agora realmente usar o gráfico [similar ao] do Overcooked, já que a gente já estava trabalhando com um gráfico 3D, Unreal e tudo mais. Já criamos uma pipeline, criamos uma baita expertise, sabemos fazer um jogo party game — todos os nosso party games foram muito bem aceitos —, então a gente falou "cara, vamos pegar toda essa experiência e juntar tudo."
Então, pegamos a câmera 3D isométrica que a gente usou no Mark of the Deep, adaptamos para uma visão muito mais próxima à do Overcooked, na sequência pegamos a temática que a gente já usava no No Heroes 1 (a temática medieval), e adicionamos uma pitada de elementos roguelike para dar esse dinamismo, tornando cada partida única, principalmente na parte de produção de armas, recursos que o jogador pode comprar e principalmente a sequência de inimigos que vão aparecendo a cada wave. Então, assim toda experiência vai ser única para o jogador.
Ivanir: E em relação ao Mark of the Deep, queria que você contasse um pouco mais do que ele é e porque você considera ele o mais ambicioso?
Luis: O Mark of the Deep eu considero o projeto mais ambicioso porque foi o primeiro projeto em que a gente fez a transição, a gente sempre trabalhava em Unity, mudamos para Unreal, começamos a adicionar muita narrativa. Antes tínhamos sempre um jogo direto e agora várias sidequests, múltiplos endings, então a gente falou "cara, esse escopo está gigante".
E antigamente, os nossos projetos duravam por volta de 1 ano e meio, no máximo 20 meses; esse aqui já vai para os três anos. A gente está contando com a colaboração de vários criadores de conteúdo, atores e tudo mais; eles emprestaram as vozes para a gente adicionar uma dublagem em português e também em inglês. Então, assim, o jogo está alcançando outro nível e também é aquilo: ele é um jogo de ação e aventura, com vários elementos de metroidvania e com combate de soulslike.
A gente trouxe aquele desafio que a gente tinha no Dandy Ace do combate dinâmico, mas [lá] era um roguelike, e agora adicionamos uma dificuldade a mais do soulslike. Ele é muito punitivo, mas a pessoa sabe: "se eu fizer uma cagada aqui, a culpa foi minha, eu estou pagando o preço", então isso e alguns elementos que a gente foi trazendo com a experiência que a gente teve em outros jogos e a gente foi adicionando agora no Mark.
Ivanir: Dá para notar que cada jogo de vocês sempre traz algo novo. Como é esse processo de escolher o próximo passo?
Luis: Como é o nosso processo de produção, né? A gente faz um post-mortem, entende tudo que deu errado em um projeto e tudo que deu certo, entendemos os pontos fortes e fracos da nossa produção. A gente fala "cara, o que é o nosso ponto forte? É isto. O que é o nosso ponto fraco? Como que melhoramos nosso ponto fraco para torná-lo um ponto forte?" e a partir daí a gente vai trabalhando em cima disso.
A gente faz um brainstorming, olha o que está dando certo no mercado, tenta entender os próximos passos e ver principalmente a parte de tendências — a gente faz uma pesquisa antes — e junta principalmente com jogos e gêneros que a gente tem o interesse em desenvolver. Então a gente pega, por exemplo, a câmera que a gente usou e aproveita, usa uma temática que a gente gostaria de desenvolver. Temática de pirata estava faltando no mercado, vamos usar isso aqui.
Agora, o que a gente pode trazer de diferente para o nosso próximo projeto? A gente fez um jogo muito focado em sistemas, agora o novo vamos tentar pegar tudo que a gente usou de sistema e adicionar isso e mais a narrativa, que é um elemento novo que a gente não tinha. Todo mundo falava "olha, o jogo de vocês se tivesse uma narrativa um pouco mais trabalhada, ficaria animal", então a gente começou a investir mais nisso, trabalhar mais na história, no enredo, ter um pouco mais de capilaridade e aprofundar muito mais os nossos projetos.
Ivanir: Passa a sensação de que vocês foram expandindo o escopo para uma coisa ainda mais internacional a cada passo. O que você considera que foram os maiores desafios que vocês tiveram no mercado nacional e internacional?
Luis: Eu acho que o principal ponto é tentar sempre alcançar o mercado internacional. A gente busca muito trabalhar com e reconhecer o mercado nacional — principalmente, porque a gente faz uma precificação local —, mas o nosso objetivo sempre é lançar globalmente os nossos jogos. Tanto é que a gente pensa "o que seria um jogo/uma temática que daria uma abrangência internacional?" e a partir disso, a gente fala "acho que faz sentido usar isso aqui", ter uma dublagem principalmente em inglês — a gente começa por aí e depois faz a localização para o português, o que é meio engraçado mesmo a gente sendo brasileiro.
O principal desafio é estar presente nas principais feiras, gerar um relacionamento, conversar com jornalistas, influencers e criar toda essa rede para que a gente seja presente e comece a fazer um burburinho lá fora e a partir daí a gente comece a ganhar um pouco mais de notoriedade — "olha, o jogo de vocês é o jogo da Mad Mimic" —, são pequenos passos que a gente vem dando e isso vem ajudando principalmente para a gente ser reconhecido lá fora. São eventos que a gente vai participando e batendo carteira ano após ano.
Ivanir: E quanto à experiência de trabalhar com publishers e publicar vocês mesmos os jogos?
Luis: A gente teve algumas experiências com publishers locais, aonde a gente entendeu muito bem a importância que uma publisher local tem, principalmente em localização, cultura e modificação, quais são os principais veículos de comunicação com os quais eles falam e entendemos quais são os limites que eles têm e qual o esforço que eles vão colocar dentro do projeto.
E quando a gente vai para uma publisher global, também tem o esforço que eles fazem, as modificações que eles pedem e principalmente as exigências. No projeto, a gente acaba tendo muito mais limitações quando a gente fala "temos uma publisher global", o investimento é maior, o investimento em marketing também. "Já que estamos investindo para ter um alcance internacional, por conta disso, queremos os principais influenciadores e, por conta disso, a gente quer esta mudança, esta e esta."
Enfim, tudo isso aí são pequenos pontos que vão sendo trabalhados. É difícil e muitas vezes a gente foi adiando o lançamento do nosso último jogo, por conta de expectativas que tinham que ser batidas e tudo mais. Agora a gente está indo para um caminho muito mais self-publishing que é pegar todo o conhecimento que a gente teve com as publishers locais e com a publisher global, fazer uma estratégia de marketing que a gente acredita que pode ser interessante, principalmente, para a gente lançar aqui no Brasil, América Latina e expandir isso para o mundo.
Fazer essa roda girar sem depender deles porque no final a principal comunidade fica com eles, os contatos ficam com eles, e para o desenvolvedor fica uma porcentagem do resultado do projeto. A gente queria estar criando uma comunidade e a gente está trabalhando com essa criação, principalmente essa fanbase que vem sendo trazida desde o No Heroes 1, Dandy Ace, Mônica, agora o Mark e o No Heroes 2. A gente já está com o nosso quinto jogo, está no momento de dar o próximo passo e começar a investir mais em marketing e ver quais vão ser os resultados. A gente acredita que podemos dar um próximo passo com uma certa firmeza, sem correr tantos riscos.
Ivanir: E, para terminar a entrevista, o que você gostaria de falar para os nossos leitores?
Luis: Primeiro, obrigado por acompanhar a entrevista. Joguem e testem os nossos jogos, eles estão disponíveis com versão demo. Mark of the Deep é um jogo que vai sair agora no próximo trimestre e o No Heroes Here 2 é um jogo que vai sair ainda este ano. Então, pessoal, apoiem a produção nacional, joguem, deem o seu suporte porque são itens muito importantes para a gente como desenvolvedor e principalmente para a gente começar a fomentar a nossa comunidade e a cultura de desenvolvimento local. Acho que são pontos muito essenciais e para isso a gente precisa do apoio da comunidade.