Análise: Shikhondo: Youkai Rampage (PC): balas e assombrações

Nova edição do bullet hell coreano é uma sólida adição ao gênero, embora não se arrisque.

em 19/04/2024
Desenvolvido pela Deer Farm, Shikhondo: Youkai Rampage é uma nova edição do shoot’em up Shikhondo, que havia sido lançado originalmente em 2017 com o subtítulo Soul Eater. Com um estilo bullet hell e uma dificuldade alta, a obra entrega o que geralmente se espera do gênero dentro de uma estética oriental curiosa inspirada em contos coreanos.

Um shoot’em up em um mundo místico

Shikhondo é um shoot’em up vertical no qual as laterais da tela ficam cobertas e temos que lidar com as ondas de inimigos que geralmente surgem do topo e descem rumo ao canto inferior da tela. Podemos movimentar nosso personagem livremente por toda a tela e é basicamente aconselhável manter o botão de ataque pressionado o tempo todo para evitar surpresas desagradáveis.

Podemos controlar duas personagens, cada uma com padrões diferentes de ataque. De um lado, temos uma rapariga desmemoriada cujos ataques são focados diretamente à sua frente. Do outro, temos uma ceifadora de almas que atira em padrão “spread”, dispersando seus golpes para atingir uma área horizontal maior.

Um detalhe curioso sobre o jogo é que ele apela para um aspecto de ambientação oriental de uma forma um tanto confusa. Embora seja uma obra coreana e aborde lendas locais, os espíritos mitológicos que enfrentamos são chamados de youkais coreanos na descrição e o alfabeto de apresentação do nome dos personagens é o kanji japonês em vez do hangul coreano.

Honestamente, não consegui entender qual é a lógica desse sincretismo mitológico para além da questão de tentar apelar para fãs do gênero mais habituados com obras japonesas. Na prática, embora seja um tanto confusa a mistura, a atmosfera do jogo é bem interessante e chama a atenção.

Temos ilustrações que remetem a estilos de pintura antigos bastante adornados e músicas que soam esotéricas, mas, infelizmente, a própria história é subaproveitada. Mesmo para a descrição rápida do nome das personagens neste texto, precisei pesquisar por fora, já que os nomes delas estão apenas em japonês dentro do jogo.

Também é interessante destacar que as chefes de fim de fase são todas do sexo feminino e os seus corpos são bastante detalhados. Há elementos grotescos, como partes de inseto ou um inimigo que parece um corpo de uma mulher seminua sendo devorado por um tigre. Se nudez for um aspecto inconveniente para o jogador, algumas dessas chefonas podem extrapolar o ponto do razoável, mas são designs interessantes dentro da proposta sobrenatural.

A trilha sonora também é um pouco limitada, repetindo a música de boss de uma forma que acaba se tornando incômoda. Isso não chega a ser um grave problema, até porque cada música individualmente é agradável e essa em particular é uma das que mais se encaixam no jogo, com um toque esotérico que remete a um contexto de espiritualidade em seus vocais.

Dificuldade de entrada

Quando falamos de bullet hell, a alta dificuldade é geralmente considerada uma forte barreira de entrada. Afinal, há muitas balas na tela e desviar delas demanda uma grande compreensão do espaço ao redor do personagem, além de bons reflexos. O esforço para chegar ao final e conseguir altas pontuações envolve um grande processo de aprendizagem.

Tendo isso em mente, Shikhondo possui uma dificuldade especial chamada Story. Nela, o jogador simplesmente não toma dano nenhum. Para quem quer uma experiência totalmente casual, essa é uma forma de passar por todas as fases sem problemas e entender como cada uma funciona. Porém, a pontuação também não é considerada.

Essa escolha é interessante, mas vale destacar que, em um jogo desta natureza, perder é um processo importante. Tentar várias vezes e se esforçar para melhorar pouco a pouco é uma etapa fundamental do aprendizado. Assim, a dificuldade Story é como andar de bicicleta de rodinhas: depois de tirar, ainda é provável cair várias vezes até se habituar.

Fora ela, temos quatro outras dificuldades: Easy, Normal, Hard e Extreme. Além de alterar os padrões dos inimigos, esses níveis afetam a pontuação com diferenças grandes de pontuação. Todas as dificuldades são contabilizadas juntas na mesma pontuação de um modo específico, mas esses bônus significam que uma boa performance no Extreme vale mais do que uma no Easy.

Diversificando os modos

Além das dificuldades, vale a pena destacar que Shikhondo possui seis modos: Arcade, Dual, Boss Rush, Novice, Hard Core e Customize. O primeiro é a sequência básica de fases tratada como padrão, enquanto os outros trazem algumas variações.

No Dual, escolhemos uma das personagens e o botão de arma secundária acessa o tiro daquela que não foi escolhida. Os diálogos das fases são alterados para acompanhar os eventos que acontecem ao jogar em co-op. Tentei inclusive achar algum modo de jogar com mais pessoas, mas esse elemento parece ter sido excluído do relançamento.

Em Boss Rush, enfrentamos apenas os chefes em sequência em vez de ter que explorar as fases uma por uma. No Novice, após passar de fase, ganhamos uma vida e uma bomba espiritual (em comparação com ter que escolher entre essas recompensas nos outros modos).

No Hard Core, morremos em um único ataque, forçando o jogador a realizar o que é chamado de 1CC (one credit clear), ou seja, de fato terminar as fases sem utilizar vários continues. Em compensação, enchemos a barra de Soul Collect mais rápido do que o normal, o que torna o sistema ainda mais arriscado de se explorar.

Por fim, temos também o Customize, que permite escolher detalhadamente a nossa preferência, combinando detalhes dos modos. Por exemplo, podemos fazer um Boss Battle com os efeitos do Hard Core e do Dual. Outro elemento customizável é que podemos alterar o método do Soul Collect para encher com os ataques em vez do Graze.

De forma geral, mesmo que as diferenças sejam aspectos bem técnicos, elas impactam significativamente a gameplay. Embora nada aqui seja algo particularmente inédito no gênero, temos uma boa diversidade de opções para explorar o jogo e dominar as suas mecânicas. Porém, é uma pena que o modo co-op e rankings globais não estão inclusos no pacote.

Um shoot’em up sólido

Com boa variedade de modos, uma gameplay sólida e uma atmosfera curiosa de elementos sobrenaturais asiáticos, Shikhondo: Youkai Rampage é um bom exemplar do que os bullet hells têm a oferecer. Os sistemas não trazem novidades para o gênero, mas a execução é boa o suficiente para valer várias jogatinas.

Prós

  • Atmosfera sobrenatural oriental curiosa que chama a atenção;
  • Boa variedade de modos de gameplay;
  • Os múltiplos níveis de dificuldade ajudam jogadores novatos e veteranos a encontrarem o seu modo ideal de encarar os desafios;
  • Sistema de Soul Collect baseado em graze incentiva jogadas arriscadas.

Contras

  • Não traz nenhuma novidade em particular para o gênero;
  • As possibilidades narrativas da ambientação são subexploradas e até o nome das personagens é mostrado apenas em japonês independente da língua selecionada;
  • A trilha sonora é um pouco repetitiva demais e acaba cansando;
  • Ausência de rankings globais.

Shikhondo: Youkai Rampage — PC — Nota: 8.0

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela CFK


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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