Análise: Paradise (PC): liberdade, adversidade e as máscaras que caem

Visual novel BL da PIL/SLASH é mais um ótimo representante do seu gênero a encargo da JAST BLUE.

em 02/04/2024
Desenvolvido pela PIL/SLASH, Paradise é um jogo em estilo visual novel classificado como boys love (BL) por conter romance e conteúdo sexual referente a relacionamentos homossexuais entre homens. Com o conceito de um grupo de rapazes presos em uma ilha deserta, a obra explora de forma bem interessante o drama humano envolvido nessas circunstâncias.

Isolados

Paradise conta a história de Azuma, um jovem já habituado e entediado com o marasmo da vida adulta. Vivendo de um trabalho de meio-período que é apenas o suficiente para pagar suas contas no fim do mês, ele não tem ambições nem conquistas.

Um dia, como parte de uma promoção no centro comercial da cidade, o rapaz acaba ganhando um prêmio: uma viagem com tudo pago para uma ilha paradisíaca. Sem nem mesmo ler direito sobre o lugar, ele aceita a proposta e se organiza para poder deixar o emprego de lado por um tempo sem nenhuma complicação.
Ansioso, ele queria que essa viagem fosse uma espécie de guinada na sua vida, trazendo-lhe um novo ânimo. A verdade é que, apesar de agir como um indivíduo extremamente sociável, Azuma vive em amargura por conta das amarras do dia a dia e deseja que o mundo ao seu redor se exploda.

A ida a uma ilha totalmente isolada do resto da civilização é inicialmente algo que o incomoda, mas, ao ajustar as perspectivas, ele logo sente que essa é uma oportunidade de ouro. Trata-se de uma chance de viver em um paraíso sem tantas cobranças da sociedade.
Porém, isso não significa total isolamento para o rapaz. Ele será acompanhado por outros homens, todos de idades próximas, que decidiram também viajar para a ilha. Antes de embarcar, Azuma conhece alguns deles e em alguns dias de convívio o grupo começa a se enturmar de forma geral.

Infelizmente, em pouco tempo, a situação se torna drasticamente mais complexa. Sem uma forma de comunicação com o resto do mundo, o grupo precisa se organizar e se esforçar para sobreviver. A convivência e a incapacidade de suprir até mesmo as necessidades básicas dos homens isolados aos poucos se tornam motivo de atrito, levando a brigas feias e até a mortes misteriosas.

Um drama humano

Em resumo, temos aqui uma história sobre o drama humano do isolamento e as intrigas que essa situação gera. Grandes mistérios são levantados, deixando o jogador curioso para entender como tudo acontece. Nem todos os elementos são apresentados de uma forma convincente, tendo alguns pequenos detalhes da trama que acabam soando convenientes, mas não é nada que seja o suficiente para reduzir as boas qualidades da obra em si.

Em especial, há uma escrita que consegue ser surpreendentemente ágil sem que isso deixe de lado o desenvolvimento dos personagens e da narrativa de uma forma geral. A história está sempre em movimento, apresentando tanto eventos misteriosos quanto pequenos momentos de internalização do Azuma, ajudando a mostrá-lo como um personagem cheio de camadas e com o qual é fácil simpatizar.
O mesmo pode ser dito para os outros personagens. Conforme a trama avança, é possível notar como todos eles possuem dramas pessoais e nem sempre suas atitudes estão verdadeiramente adequadas ao que estão sentindo e pensando. Com o passar do tempo, é como se máscaras caíssem e víssemos o que eles podem fazer em situações de desespero.

Um ponto que pode ser potencialmente negativo para alguns leitores é a abordagem de tópicos problemáticos. Um bom exemplo disso é estupro, que chega a ser relativizado de uma forma que definitivamente deixará alguns leitores incomodados. Mesmo deixando claro os impactos psicológicos de tal ação no texto, a abordagem da trama definitivamente não é tão sensível ao tópico.

Condições de vida

Em termos da experiência de forma geral, temos aqui as mecânicas básicas necessárias para aproveitar uma visual novel, como log, auto e skip. Caso o jogador queira voltar a um diálogo recém-lido, é possível dar rewind, revendo as falas e elementos visuais daquele trecho. Da mesma forma, podemos pular diretamente para a próxima escolha para avançar rapidamente na busca pelos múltiplos finais do jogo.

Temos três interesses românticos, sendo um deles disponível apenas após obter o final bom dos outros. Nossas escolhas podem levar a finais ruins variados, mas temos indicações de quais são as melhores opções para agradar a um personagem e poder ser encaminhado para a sua rota e para o respectivo final bom.
Em termos técnicos, encontrei alguns erros de digitação no texto. Porém, confesso que todos os casos foram coisas banais, sendo fácil entender qual era a proposta original da escrita. A leitura do texto em inglês é bem fluida, com frases bem naturais para se ler em inglês e algumas piadinhas de duplo sentido aqui e ali.

Por fim, quero destacar também que as ilustrações de Youji Kotomi são de alta qualidade. Bastante detalhadas, elas reforçam os toques mais brutos das feições dos rapazes. Em alguns momentos, os traços acabam se distorcendo um pouco e parecendo desfigurados, mas, mesmo nessas situações, o alto detalhamento de músculos e roupas se sobressai aos pequenos defeitos e mantém os personagens atrativos de se olhar.

Além das máscaras da vida em sociedade

Paradise é uma visual novel BL bem construída que consegue apresentar dramas sensíveis e relevantes. Mesmo com alguns elementos mais controversos em seu roteiro que poderiam ser melhor trabalhados, trata-se de uma fácil recomendação para quem busca uma história envolvente.

Prós

  • Trama recheada de mistérios e intrigas instigantes;
  • A escrita é ágil sem deixar de lado o desenvolvimento da trama e dos personagens;
  • Indicativos de flags das escolhas ajudam a tornar a experiência mais confortável para quem quer focar nos finais bons dos personagens;
  • As ilustrações dos personagens são bastante detalhadas e atrativas.

Contras

  • Tópicos pesados como estupro podem incomodar alguns leitores pelo seu tratamento relativamente pouco sensível;
  • Algumas conveniências de roteiro não são tratadas de forma convincente;
  • Pequenos erros de digitação.
Paradise — PC — Nota: 9.0
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela JAST BLUE


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.