Impressões: Enshrouded (PC) é um RPG que utiliza bem suas inspirações para criar algo único

Sobrevivência, RPG, criação, cooperativo, mundo aberto, Soulslike, Zeldalike. Existem tantas categorias que podem ser aplicadas para classificar Enshrouded, que pode até parecer que o game é um amálgama sem alma de diversas tendências de design da indústria nos últimos anos.

Entretanto, o novo projeto da Keen Games sabe muito bem a experiência que quer passar para os jogadores. Cada detalhe adicionado aqui constrói um jogo com base fundamental sólida ainda em seu período de acesso antecipado. O tripé exploração, construção e sobrevivência nunca esteve tão bem alinhado.

Envolto em sombras

Em Enshrouded você é o Porta-Chama, alguém que passou muito tempo adormecido e agora acorda para uma realidade aterrorizante: seus antepassados, consumidos pela ganância, fizeram o Vale da Brasa ser completamente envolto na Mortalha, uma névoa que mata e apodrece tudo que toca. Agora, você deve levar a chama contigo, extinguir esse mal e resgatar aqueles que ainda dormem. Surpreendentemente, a história, que é simples a princípio, tem bastantes paralelos com a nossa realidade, principalmente na figura do petróleo e como o ser humano pode trazer desgraças para sua comunidade com a ganância. 

O mundo é morto, completamente destruído, e os únicos sobreviventes são monstros da Mortalha e saqueadores chamados de Sanguinários, o que não impede de haver beleza nos visuais do Vale. Outra parte importante da lore é contada através de documentos e cartas, que mostram como era a vida no passado e dão mais detalhes dos locais que você visita. Cada cantinho tem uma história que explica como a catástrofe abalou seu povo.

Um sistema de missões robusto, que se divide em atividades principais, secundárias, de exploração ou de aprimoramento, torna cada sessão uma experiência diferente. A ideia de ter esses objetivos diversos no jogo ajuda para que o tédio não tome conta e o jogador fique por conta própria. Essas missões geralmente te direcionam para minibosses, equipamentos, sobreviventes ou locais escondidos.

Desbravando o Vale da Brasa

É possível que alguém chame o jogo de Zeldalike, ou até mesmo Souslike. Não é difícil ver inspirações que tiveram impacto diretamente nos componentes de Enshrouded. A presença do traje planador e do arpéu evoca a exploração de The Legend of Zelda, assim como o combate com mira travada, rolamento, parry e defesa referencia muito bem a elogiada fórmula da FromSoftware.

A parte interessante não é exatamente as mecânicas e de onde elas vêm, mas como elas se comportam dentro da premissa criada e do contexto do mundo de Enshrouded. É uma história sobre desbravamento e purificação da terra e também da moral do homem. O mapa tem cerca de 32 km² e com 20 horas de jogo você mal arranha a superfície de toda essa extensão. Com uma área tão grande para explorar, além de setores subterrâneos, cidades destruídas, porões e castelos, um sistema de locomoção eficiente é requisito básico.

A exploração em um mundo sem ameaças é quase nula. O jogo tem uma série de perigos que fazem a tomada de decisão do jogador ser rápida e crítica. Além dos inimigos, que variam em tamanho, quantidade e nível, dependendo da região, a Mortalha tem um tempo limite que mata qualquer um dentro de alguns minutos. Cair em uma região infestada por ela sem um local de fuga pode gerar situações de desespero crescente. Também existem animais selvagens e armadilhas que atentam contra a segurança e a calmaria constantemente.

Em muitos jogos de sobrevivência, o loop de gameplay fica resumido a um emulador de PowerPoint, no qual o jogador está sempre em busca de preencher as barrinhas correspondentes, seja a de alimentação, de sono ou de energia. Fica claro que os desenvolvedores da Keen Games não tinham nenhuma intenção de desviar a atenção do jogador da exploração e do combate. Os elementos de sobrevivência aqui são simplificados e mais acessíveis: comida e descanso servem apenas para buffs que dão mais gás à aventura.

Construir, construir, construir!

A construção é mais uma mecânica que poderia ser facilmente inserida para atrair uma parcela bem específica de jogadores da Steam, mas Enshrouded tem todos os meios necessários para fazer essa ideia florescer de maneiras interessantes. Seja na construção de vilas inteiras ou de um castelo fortificado para o seu protagonista.

Como já foi dito, o Vale da Brasa está consumido pela Mortalha. Como missão básica do seu personagem, espalhar a chama e extirpar a Mortalha demandam a criação de novos altares da chama; e com eles, novos assentamentos. É nesse contexto que a construção brilha, principalmente com os altares funcionando como pontos de viagem rápida. Com o sistema de voxels, você pode escavar qualquer terreno, modificando a área de construção como quiser, preparando o terreno para criar uma fazenda, uma fortaleza, um simples casebre confortável ou até mesmo recriar a infame Khazad-dûm de O Senhor dos Anéis.

Felizmente, para se alinhar com as outras mecânicas, a coleta de recursos aqui não é tão demandante quanto em outros jogos do gênero. Míseros 20 minutos de coleta me deram o suficiente para construir um castelo, ideal para quem não quer perder a diversão do mundo aberto passando o dia todo escavando. Cada novo local descoberto vem com a chance de descobrir novos minérios, matérias-primas etc. Cada componente descoberto libera uma série de novas receitas, o que deixa ainda mais progressiva a exploração.

Um caminho promissor

Enshrouded tem um começo forte para o seu acesso antecipado. A premissa casa perfeitamente com as mecânicas escolhidas para dar molde à experiência e ao loop de gameplay. Como um clássico acesso antecipado, existem diversos sistemas que devem ser polidos. A escalada ainda está truncada e faltam animações. A IA dos inimigos é quase nula, mas para um começo de desenvolvimento conjunto com a comunidade. 

Boa parte da base fundamental está recheada de ótimas ideias. Conteúdo também não falta: um mapa enorme, dezenas de missões, inimigos, biomas, equipamentos, receitas etc. Tudo pronto para uma jornada que pode culminar em um dos melhores do seu gênero.

Revisão: Ives Boitano

Texto de impressões produzido com cópia de preview cedida pela Keen Games