Um dos gêneros mais prolíficos no meio indie é o metroidvania, um subgênero dos jogos de ação e plataforma 2D que se destacou consideravelmente na última década. TEVI, desenvolvido pela taiwanesa CreSpirit, pode ser inicialmente interpretado como apenas mais um dentro desse gênero, mas acaba se revelando um título interessante e repleto de personalidade, o que o torna diferenciado.
Um mundo excêntrico
TEVI se desenrola no mundo de Az, uma terra que abriga pacificamente três espécies: os humanos; as criaturas híbridas de humano com animal conhecidas como beastkin; e os magitech, seres inicialmente mecânicos criados com o uso de mana, o principal recurso mágico deste universo.
Contudo, os magitech misteriosamente se rebelaram contra seus criadores, os humanos, desencadeando uma guerra de proporções gigantescas em Az. A situação foi parcialmente resolvida com a intervenção de uma heroína beastkin, mas a monarquia enfraqueceu consideravelmente após os eventos.
Trinta anos depois, em um mundo relativamente estável, assumimos o controle de Tevi, uma garota autoconfiante com orelhas de coelho que começa presa após ser pega tentando roubar um artefato conhecido como Astral Gear, objeto carregado de mana. Ela consegue se libertar facilmente do cárcere e, no meio do caminho, encontra dois magitech: Celia, um anjo do reino celestial de Valhalla que está conduzindo pesquisas em Az; e Sable, um jovem demônio com péssima noção geográfica, o que o fez ficar perdido.
Ambos acabam se unindo para escapar do local e, ao se conhecerem melhor, decidem se unir para perseguir seus objetivos, especialmente encontrar mais Astral Gears. No entanto, eles acabam se envolvendo em situações mais complexas do que inicialmente se imaginava sobre Az, enquanto desenvolvem um laço de amizade entre eles.
Combate diverso e customizável
TEVI é um metroidvania tradicional no qual exploramos diversos cenários divididos em blocos num mapa interligado. Os ambientes escondem segredos que precisam ser descobertos, seja quebrando partes específicas de paredes ou chão com bombas ou entrando em áreas escondidas.
Nos combates, Tevi utiliza uma adaga para ataques corpo a corpo, contando com o suporte de Celia e Sable para recursos à distância. A lista de movimentos da personagem oferece opções tanto no chão quanto no ar, e ela adquire novas habilidades conforme evolui. Quanto aos magitech, eles se transformam em orbes que nos seguem, desempenhando o papel de atiradores. Celia dispara tiros poderosos, enquanto Sable cria armadilhas com seus projéteis.
Para aprimorar a jogabilidade, TEVI introduz um sistema de sigils, itens equipáveis que modificam ou alteram detalhes tanto dos combates quanto da exploração. Esses sigils são categorizados por custos de EPs (de 1 a 9), pontos que limitam quantos deles podem ser equipados simultaneamente. Para aumentar esse limite, é necessário encontrar ou comprar poções específicas.
O jogo não adota um sistema de evolução baseado em pontos de experiência. A progressão de Tevi depende da porcentagem do mapa descoberto e da derrota de chefes, e ela ganha novas habilidades conforme avança. Isso não desvaloriza as batalhas contra inimigos comuns, pois eles podem soltar materiais utilizados no sistema de criação. Sigils, itens de cura e melhorias de equipamento requerem recursos específicos para serem construídos.
O ponto alto de TEVI reside nas batalhas contra chefes, que demandam habilidade e otimização em todos os sistemas para serem superadas. Nesses momentos, o elemento bullet hell se destaca, já que os chefes apresentam ataques capazes de encher a tela com dezenas ou centenas de projéteis. Apesar de parecer intimidador à primeira vista, a caixa de colisão de Tevi é pequena, com o projétil precisando atingir o centro dela para causar dano.
Entretanto, a dificuldade do jogo é notavelmente alta, especialmente na segunda metade da aventura. Os chefes exibem diversos padrões que precisam ser memorizados, e alguns inimigos do vasto bestiário podem exigir atenção extra. Felizmente, é possível ajustar a dificuldade visitando a casa da protagonista, tornando momentos de tensão mais suaves ou aumentando ainda mais o desafio, se desejar.
Vale lembrar que os controles são altamente responsivos, destacando-se especialmente o pulo, que atende às expectativas em todos os momentos. No entanto, algumas transições de tela podem ser um obstáculo, especialmente em situações que demandam pulos duplos já que a transição aplica um leve atraso de comando.
O design dos mapas é geralmente simples, apresentando corredores e áreas mais abertas interligada. Todas as missões são marcadas no mapa como um ponto de exclamação, uma característica que lembra Metroid: Zero Mission (GBA). Alcançar os objetivos dependerá da nossa capacidade de exploração, e raramente dá para se perder no caminho.
Não há muita variedade de jogabilidade entre a maioria das áreas, contando apenas com a parte visual para diferenciá-las, mas algumas regiões apresentam elementos como calor excessivo que diminui a vida gradativamente, locais aquáticos que influenciam na altura de pulos, entre outros.
Artisticamente divino e demoníaco
TEVI é um jogo 2D construído em pixel art, mas não se limita à estética de jogos antigos. Os fundos dos mapas são extraordinariamente belos, muitos deles incorporando efeitos de parallax, belo uso de cores e um notável nível de detalhamento. Ao chegar em uma das regiões, Valhalla, fui imediatamente impactado pela coloração vibrante da área e pelos diversos elementos utilizados para compor o local. Certamente, é um dos jogos indies mais bonitos de 2023.
O jogo adota a estética de anime para o design dos personagens, e as artes que aparecem em momentos de conversa não se distanciam muito do convencional, mas são belas e desempenham bem o seu papel. Os diálogos contam com uma ampla variedade de ilustrações para a maioria dos personagens, contribuindo significativamente para a narrativa.
TEVI destaca-se pela atuação de voz em japonês de alta qualidade em quase todos os diálogos durante a jogatina, contando com diversos dubladores conhecidos dos animes. Dada a enorme quantidade de conversas, é surpreendente a quantidade de áudio para um jogo indie, sendo um fator primordial para tornar os diálogos mais naturais. Infelizmente, o texto não é traduzido para o português, algo que certamente faz muita falta em um jogo carregado de história com esse.
Contudo, o ponto mais marcante de TEVI para mim está na trilha sonora, que apresenta dezenas de excelentes faixas, variando desde melodias agitadas até momentos calmos de músicas mais ambientais. Esta, sem dúvida, é a minha trilha sonora do ano, sendo uma grata surpresa.
Um dos melhores indies do ano
Apesar de aparentar ser apenas mais um metroidvania entre tantos, TEVI se destaca por um sistema de combate repleto de possibilidades e uma história envolvente com de personagens cativantes e chefes memoráveis. Alguns problemas relacionados à falta de variedade em determinadas regiões, momentos ocasionalmente frustrantes devido à dificuldade que afetam um pouco da experiência e uma leve arrastada no tempo de duração na reta final do jogo são problemas notáveis, mas certamente não apagam o brilho da aventura.
Prós:
- Sistema de combate diversificado por meio do sistema de sigils;
- Pixel art de alta qualidade, repleta de detalhes e cores;
- Trilha sonora diversificada e de altíssima qualidade;
- Apesar de um tanto clichê, a história é interessante, destacando-se principalmente pelos diversos personagens;
- Batalhas contra chefes são divertidas e catárticas;
- Dublagem em japonês com ótimas atuações.
Contras:
- Alguns momentos e chefes podem ser frustrantes devido à dificuldade;
- Boa parte das áreas carece de elementos únicos para a jogabilidade, apesar de serem visualmente diferentes;
- A reta final se estende mais do que deveria, especialmente considerando que o jogo já é naturalmente longo;
- Ausência de tradução em português.
TEVI — PS4/PS5/XBO/XSX/Switch/PC — Nota: 9.0Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Thais Santos
Análise produzida com cópia digital cedida pela CreSpirit