Após os relatos do Frenesi dos Tìteres, a conspiração dos Alquimistas e os mistérios do passado e do futuro, ainda restam algumas histórias a serem contadas entre aquelas que narram a tragédia de Krat e a ascenção de P para se tornar uma nova forma de humano completo e eterno.
Após os relatos do Frenesi dos Títeres, a conspiração dos Alquimistas e os mistérios do passado e do futuro, ainda restam algumas histórias a serem contadas entre aquelas que narram a tragédia de Krat e a ascensão de P para se tornar uma nova forma de humano completo e eterno.
Em nossa parte final do relato de Lies of P, lançaremos as luzes sobre alguns dos principais elementos que circundam o imaginário da cidade, como os Espreitadores, o Hotel Krat, a Casa de Ópera Estella e os personagens que povoam as memórias da cidade. Uma série de textos que pretende entender toda a história de Lies of P não estaria completa sem se debruçar nas tramas que enredam suas vidas.
As mentiras dos Espreitadores
Diz-se que na antiga Krat o povo usava máscaras de animais em um ritual que celebrava as lutas contra lendários titãs de pedra. Na Krat moderna, os Espreitadores se apropriaram dessa lenda como sua tradição, sempre usando o rosto e o nome de um animal. Esses guerreiros formam milícias financiadas pelas elites de Krat e se dividem em duas facções rivais.
Há os Bastardos, compostos pelos indesejados das famílias antigas de Krat. Vestem-se de casaca e máscaras luxuosas, tentando manter em suas roupas a elegância orgulhosa de sua origem. No entanto, como indivíduos desligados de suas famílias, trabalham para os Alquimistas e a Oficina. A União da Oficina, entre outras coisas, criou os Braços Legionários usados por Espreitadores e até por operários de mineração.
Do outro lado, estão os Varredores. Vindos dos becos pobres da cidade, que não tiveram acesso à prosperidade trazida pelos grupos de Valentinus e Geppetto, eles compartilham do ressentimento e trabalham para as famílias antigas, que tentam reter o poder na disputa política com os recém-chegados.
O Frenesi dos Títeres desmantelou toda a organização de Krat, incluindo as famílias antigas e a Oficina. Aparentemente, a maior parte dos Espreitadores morreu em batalha contra os títeres, mas outros perderam a vida na queda da Torre da Oficina.
Não está claro se o desabamento foi consequência da rebelião dos autômatos, mas parece ser isso o que chamam de Batalha da Torre da Oficina. Em todo caso, muitos revelam surpresa ao ver P, supondo ser um Espreitador que teve a sorte de ainda estar vivo — ou seria azar?
As mentiras da raposa, do gato e das lebres
Entre os Bastardos está Claudia, conhecida como a Raposa Vermelha. Ela é filha renegada da família Volfe e obteve fama de ser boa conhecedora de equipamentos de qualidade. Há um tempo, a Raposa começou a andar com o Gato Preto, um membro dos Varredores, dizendo ser irmãos.
A Raposa sabe que o Gato mentiu para ela sobre ser seu parente bastardo, mas a relação que eles construíram importou mais que a verdade. O que mais importa a ambos é que o Gato Preto está perdendo a visão para a Doença da Petrificação, o que os coloca na trilha de dois sonhos: conseguir um pouco da mítica Fruta da Moeda de Ouro e achar uma maneira de fugir de Krat.
O primeiro item eles conseguem pela benevolência de P, mas o segundo foi prometido pelos Alquimistas em troca de seus serviços. Foi por isso que os dois participaram do ataque de Espreitadores ao Hotel Krat, culminando no rapto de Geppetto, que foi levado à Abadia Arche.
O ataque foi encabeçado pela Irmandade da Lebre Negra, um grupo de quatro Varredores criminosos. Assim como acontece com a Raposa e o Gato, a única lealdade das Lebres é de uns para com os outros, vivendo como irmãos em prol do objetivo de ir embora e deixar as desgraças de Krat para trás.
Após o surto da Doença da Petrificação e o Frenesi, os roedores se estabeleceram no Distrito de Malum, um bairro pobre de periferia. Eles expulsaram os ladrões que faziam ali sua casa e passaram a cobrar uma taxa obrigatória de “proteção” aos moradores e a qualquer um que passasse pelo território, sob pena de mentirosos, isto é, sonegadores, serem trancafiados no caixão que o enorme Irmão Mais Velho carrega nas costas.
É digno de nota que os títeres, abundantes em vários setores de Krat, são raros no Distrito de Malum, o que parece refletir o fato de que a riqueza da cidade se manteve nas regiões ligadas às famílias antigas. Com isso, as Carcaças proliferaram no bairro, tornando-o ainda mais perigoso. É lá que fica o Restaurante da Lagosta Vermelha, que serve comida tradicional de Krat e representa a origem humilde da cidade pescadora antes de se tornar um território de ricos Alquimistas.
Quando P passou por Malum, foi atacado pela Irmandade da Lebre Negra e matou o Irmão Mais Velho, causando a retirada dos demais e iniciando uma promessa de vingança. Os irmãos sobreviventes aceitaram servir aos Alquimistas no ataque ao Hotel Krat em troca de que o morto fosse ressuscitado pelo Ergo.
Os cientistas cumpriram sua parte do acordo, mas apenas para usar os Espreitadores como ferramentas, deixando-os de guarda na Relíquia de Trimegisto para impedir o caminho de P. O segundo encontro do títere com a Irmandade, a caminho do embate final na Ilha dos Alquimistas, terminou com a morte das quatro lebres.
Por outro lado, a Raposa e o Gato não nutriam ressentimentos de P. Eles só queriam enganá-lo para seus próprios interesses e ficaram surpresos quando receberam de boa vontade algumas Frutas da Moeda de Ouro para cuidar da Doença do mais novo, mesmo quando estava claro que eles haviam traído o protagonista.
Eles já estavam cansados de uma vida de sobrevivência à custa de violência e mentiras. Uma luta desnecessária foi evitada e os dois desertaram dos serviço dos Alquimistas. Não sei se tiveram seu final feliz, mas os dois irmãos abraçaram a chance de um recomeço.
As mentiras de Alidoro
Houve um Alquimista do extremo oriente que descobriu os experimentos conduzidos pelos Alquimistas de Krat. Perseguido, abandonou seu nome e passou a ser chamado de Alidoro, sempre escondendo o rosto na máscara de cão, uma vez que suas feições o destacavam em meio à população de Krat.
Tornou-se, então, um Espreitador, o maior herói entre eles, autor de várias façanhas famosas pela cidade enquanto ainda empunhava a arma que trouxe de sua terra, a Espada de Dois Dragões.
Alidoro tinha uma irmã menor que deixou aos cuidados dos técnicos da Torre da Oficina, aprendendo o ofício. Tida como órfã, foi chamada Eugénie e a única coisa que sabia de sua família é que era uma linhagem de artesãos armeiros. Por isso, fez dessa a sua especialidade, como um elo ancestral.
Quando houve o desastre da Torre da Oficina que deixou muitos técnicos soterrados por dias, Alidoro salvou sua irmã Eugénie dos escombros e perdeu um dedo durante o resgate, mas nunca se revelou como seu irmão, temendo torná-la um alvo para os Alquimistas. Ele apenas a observou de longe, protegendo-a, mas foi morto à traição pelo próprio parceiro, o Espreitador chamado Papagaio.
Eram incompatíveis: um altruísta e, o outro, ganancioso, que foi pego vendendo as antiguidades que eles encontravam em suas explorações. Alidoro cortou as relações, mas Papagaio achou mais lucrativo tomar a identidade do herói para usufruir da fama, mesmo que fosse um covarde sem talento.
Como o falso Alidoro atraiu P para o ninho do Monstro Verde do Pântano Inóspito, desejando recuperar a Espada de Dois Dragões que estava entre os tesouros da criatura, é possível que tenha sido ali que o verdadeiro Alidoro foi traído.
O farsante foi descoberto pela investigação conjunta de P, Eugénie e Hugo. Eugénie ficou desconfiada quando soube que seu presente para Alidoro, uma luva de quatro dedos, foi recusado pelo Espreitador. Hugo, um explorador amador que admira Alidoro e usa uma simpática máscara de cão, alertou P sobre contradições nas histórias e atitudes do suspeito.
No final, o falso Alidoro, que havia se refugiado no Hotel Krat a convite de P, atuou como o agente interno que sabotou as defesas do edifício para dar acesso aos Espreitadores que atacaram o local a mando dos Alquimistas. Ele pouco se importava com as vidas das pessoas no Hotel e foi convencido pela promessa de receber um meio de fugir de Krat, algo que ele confessou sem qualquer pudor. P deu-lhe a morte.
Após a paz ser restabelecida, Hugo resolveu fazer como Papagaio, mas com a intenção inversa: ele se apossou da identidade de Alidoro para limpar o nome do grande herói em meio aos sobreviventes de Krat, se empenhando para que aquele homem misterioso continuasse sendo fonte de inspiração e esperança para outros como havia sido para ele.
Eugénie ficou furiosa quando soube da verdade, com raiva do irmão paternalista que decidiu sozinho sobre o que pensava ser a proteção dela, mesmo ao custo de privá-la de uma família. Em outras variações temporais, P preferiu omitir a informação do parentesco, concedendo à grande armeira o conforto de saber que a memória do herói que salvou-lhe a vida permanecia imaculada.
As mentiras do Hotel Krat
Há uma lenda em Krat chamada A Balada do Cavaleiro, antiga ao ponto de não ter data para seus eventos nem nomes para seus personagens. Ela conta que havia um rei na região e um de seus cavaleiros encontrou uma árvore mágica que realiza desejos: a Árvore da Fruta da Moeda de Ouro, que literalmente dá moedas em seus galhos.
O cavaleiro ficou assombrado com o milagre e construiu um castelo ao redor dela, atraindo a inveja de seu soberano. Não temos detalhes, mas entendemos que, no fim, a ganância destruiu a ambos. Diz a lenda que a árvore só dá seu fruto mágico em tempo de pragas, como uma reação curativa ao mal infligido pelas doenças. Provavelmente, isso permitiu que a existência da árvore cruzasse os séculos em segredo, como se não passasse de uma fábula em que apenas as crianças e os tolos sonhadores acreditam.
Sophia revelou a P que a árvore foi feita por Alquimistas a partir de Ouvintes, pessoas como ela, capazes de captar o Ergo. Podemos mesmo ver a forma humana que os galhos sugerem, como uma mulher curvada para a frente e seus longos cabelos quase tocando o chão. A garota imagina se algum dia terá aquele destino de verter lágrimas de moedas de ouro de propriedades curativas, cobiçadas por qualquer um que as conheça.
O castelo passou por modificações ao longo dos anos e chegou a ser um hospital psiquiátrico, reforçando a aura sinistra que paira sobre ele. Na era dourada de Krat, em que a influência (e o dinheiro) dos Alquimistas trouxe prosperidade e crescimento, o edifício foi comprado por uma das damas mais respeitadas. Foi assim que Antonia Cerasani fundou o Hotel Krat, o estabelecimento mais luxuoso da cidade.
Antonia sabia da árvore que estava em um dos pátios do hotel e deixou-a escondida, longe das maquinações dos Alquimistas. Estes, porém, conseguiam as frutas por meio da Irmandade da Lebre Negra, pois há uma passagem que liga os fundos do Hotel ao Distrito de Malum, muito abaixo do penhasco, permitindo algumas incursões gatunas.
Por muito tempo, Antonia havia sido uma aliada da ordem, pois seu hotel fica em cima da principal fonte de Ergo, a Relíquia de Trimegisto, já mencionada na primeira parte desta série. A Relíquia ficou trancada até a chegada dos Alquimistas, que passaram a minerar no local. Naqueles subterrâneos, construíram um cais de onde partiam as embarcações até a Ilha dos Alquimistas.
Como queriam que a localização de sua fortaleza, a Abadia Arche, continuasse velada, encomendaram de Venigni um submarino para poderem fazer a travessia de Krat à Ilha de forma escondida dos olhos de todos. O submarino era movido por uma bateria do raro Ergo Dourado e foi batizado Pistris, em homenagem ao pai de Simon Manus, ou talvez à família como um todo.
Nem o próprio Venigni sabe onde fica a Ilha e apenas Antonia detém esse conhecimento. Quando cortou relações com os Alquimistas, ela trancou a entrada para a Relíquia de Trimegisto, que fica em uma passagem secreta atrás do seu enorme retrato que enfeita um dos salões do Hotel Krat.
Como seu último ato em defesa de sua cidade amada, ela abriu a passagem para que P impedisse os planos de Simon Manus. Nessa altura, ela estava curada da doença, mas ainda aguardava a morte.
Foi com as Frutas da Moeda de Ouro obtidas por P que Giangio, ou melhor, Paracelso, produziu para ele um elixir capaz de curar a Doença da Petrificação de Antonia. Ela ainda morreu dias depois, pois a cura impediu apenas a enfermidade, incapaz de reverter os danos já sofridos pelos órgãos internos no corpo da paciente. No entanto, morreu feliz.
Foi seu mordomo, o títere Polendina, que pediu a P para ministrar a cura à sua senhora. Ela a amava profundamente e ficou satisfeito que ela tenha encontrado paz em seus momentos finais, mas preferiu apagar seu ego, anular seu despertar e voltar a ser um títere servil, conforme sua programação original.
As mentiras das irmãs
Para nossa última história, veremos o conto das irmãs Corday. A mais velha, Adelina, tinha uma voz belíssima e ficou famosa como a Atriz Vermelha, a maior estrela da ópera de Krat. A mais nova, Patricia, também tinha grande talento e ficou conhecida como a Mulher de Branco.
As duas trocaram medalhões em que prometiam brilhar juntas no mesmo palco, mas, na verdade, Adelina ardia de inveja da caçula e decidiu destruir-lhe a voz antes que fosse ofuscada por ela, o que provavelmente fez com o uso de veneno. Patricia nunca soube que o acidente fora provocado por sua amada irmã e, dali em diante, dedicou-se a ser uma exímia Espreitadora.
Certa vez, Adelina apoiou um dramaturgo novato com uma peça aparentemente banal: A Princesa e a Torre da Bruxa, que, na verdade, operava de uma forma complexa na qual a atriz vivia os três papéis principais — a bruxa, a princesa e o cavaleiro — sem que o público soubesse, alcançando aclamação geral. Foi seu maior trabalho e também o último.
Tempos depois, talvez durante a tragédia de Krat, um Bastardo chamado Dr. Coruja arrumou um apartamento na Avenida Elysion onde ela poderia se refugiar. Houve um desencontro, pois o Espreitador foi levado como cobaia pelos Alquimistas para os quais trabalhava. Com a força de seu ofício, ele sobreviveu às experiências macabras, mas sua sanidade foi profundamente marcada.
De médico curador, ele passou a matar seus pacientes, acreditando que seria melhor que todos morressem como humanos em vez de como monstros transformados pela Doença da Petrificação.
Desamparada, Adelina seguiu os conselhos de um desconhecido que se comunicava por enigmas — era Arlecchino, o títere assassino — e tentou se esconder em um aposento da Casa de Ópera Estella, sem saber que estava sendo atraída para uma armadilha bem no seio de onde emanava a influência do Rei dos Títeres. Sem ter para onde fugir, ela definhou no local e morreu após encontrar-se com P e ganhar dele uma maçã. seu último prazer em vida.
Patricia achou que a irmã havia falecido durante o Frenesi dos Títeres e fez uma grande obra de vingança. Primeiro, montou um palco da peça no anfiteatro da cidade. Depois, aniquilou, esmagou e empalou qualquer títere que surgisse em sua frente, criando com eles uma espécie de violenta homenagem para a memória de Adelina, sem saber que a irmã ainda vivia. Também sua vida teve fim no encontro fortuito com P.
À espera de mais mentiras
Chegamos ao fim da série que contou em detalhes as muitas narrativas que fazem Lies of P. O jogo deixa pontos em aberto, como a Espreitadora Lendária, Paracelso e Dorothy. Creio que o próprio Gemini, um NPC que acompanha o protagonista por toda a duração do jogo, ainda seja um mistério — se há na história algo que o esclareça de forma concreta, não encontrei.
As lacunas dão espaço para expectativas de vermos mais histórias dessa Belle Époque distópica. De fato, o diretor Jiwon Choi disse que tem mais a revelar no futuro, o que me deixa animado para voltar a esse universo o quanto antes!
Sobre Lies of P
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- Análise: Lies of P transforma Pinóquio e a Belle Époque em um dos melhores soulslike
- Dicas para ajudar iniciantes a sobreviver aos suplícios de Krat — Parte 1
- Dicas para ajudar iniciantes a sobreviver aos suplícios de Krat — Parte 2
- Lies of P: entendendo toda a história — Parte 1: Krat e seus títeres
- Lies of P: entendendo toda a história — Parte 2: As ambições dos Alquimistas
- Lies of P: entendendo toda a história — Parte 3: As mentiras reveladas
- Lies of P: entendendo toda a história — Parte 4: As histórias paralelas
Revisão: Heloísa D’Assumpção Ballaminut