Reconstruir o passado para visar um novo futuro parece uma ideia genial, e Mortal Kombat 1 trouxe isso tanto no seu modo História quanto no seu funcionamento de maneira geral. O objetivo de revitalizar a lore da franquia foi alcançado de maneira quase perfeita, com alguns leves tropeços.
Chegou a hora de recomeçar
Desde que a franquia passou por um reboot com o Mortal Kombat de 2011, também chamado de MK9 pelos fãs, houve um foco maior na narrativa geral do torneio de artes marciais entre os reinos da Terra (Earthrealm) e da Exoterra (Outworld). Não querendo desmerecer tudo o que foi mostrado entre o primeiro Mortal Kombat e o Armageddon, mas foi a partir daí que relações mais densas foram construídas, a ponto de influenciar os títulos seguintes.
Voltando aos fatos ocorridos em MK11, Liu Kang, agora Deus do Fogo e do Trovão, primeiro combate Kronika e depois Shang Tsung — incluindo o narrado na expansão Aftermath — e se torna o Guardião do Tempo. Sabendo de todos os perigos e armadilhas que esse cargo contém, Liu Kang reconstrói a linha do tempo para que todos vivam em paz e harmonia e passa a tarefa de guardar o tempo para Geras, enquanto ele se encarrega de ser apenas o protetor do plano terreno.
Algumas diferenças notáveis nesta realidade são:
- Sub-Zero e Scorpion são os irmãos Bi-Han e Kuai Liang, integrantes do clã Lin Kuei, que ainda conta com membros como Smoke e os apenas citados Sektor e Cyrax;
- A Exoterra é governada pacificamente por Sindel, que conta com o apoio das suas filhas: Kitana e a princesa herdeira Milleena;
- General Shao é o líder das tropas da Exoterra, tendo Reiko como seu braço-direito;
- Raiden e Kung Lao são apenas dois jovens que trabalham em uma lavoura, mas que dominam as artes marciais e são observados de perto por Liu Kang.
Não entrarei em maiores detalhes para não dar spoilers que podem estragar a surpresa de quem vai jogar, mas por mais que a ideia da história seja muito boa, ela perde força no final e acaba ficando um pouco clichê.
Dos 15 capítulos que tive que concluir, fiquei surpreso com o enfoque, mesmo que curto, dado a alguns personagens, como Li Mei e Baraka, que conseguem ter uma importância justa para o tamanho deles na série. Vale ressaltar que, exceto pelo último MK, que nos permite escolher qualquer lutador do elenco, todos os outros têm um protagonista definido.
Por outro lado, outros nomes fatalmente acabam fazendo apenas figuração, como é o caso de Nitara, Havik, Tanya e Smoke, este último sendo um dos mais celebrados ao ser anunciado. Cito ainda dois nomes que poderiam — e até deveriam — ter ganhado mais destaque: Kitana e Geras. Enquanto a ninja ficou relegada a um papel de apoio para Mileena, o novo Senhor do Tempo simplesmente tem conversas pontuais com Liu Kang.
Outro ponto um tanto curioso é que, no desfecho da campanha, temos que enfrentar algumas amálgamas dos lutadores da série — e não, não vou entregar o contexto disso —, como misturas de Scorpion com Kung Lao, ou Mileena com Havik, por exemplo. Isso me levou a questionar o porquê de não incluírem um modo de criação de personagens, como o presente em MK: Armageddon. Mas isso é mais um devaneio da minha parte do que um defeito de fato.
O longo caminho entre os reinos
Além do modo História e das tradicionais Torres, que sempre funcionaram como o Arcade de Mortal Kombat, a novidade fica por conta do modo Invasão, que é o “minigame” da vez no lugar da Krypta. Nele, percorremos mesas que simbolizam cenários específicos, em uma mistura de jogo de tabuleiro com RPG.
É possível trocar de personagem a qualquer momento, e todos eles contam com atributos diferentes, tanto de valores quanto de propriedades elementais. Há até uma tabela explicativa que ilustra as vantagens e desvantagens de cada um. Também estão de volta os itens consumíveis, que nos dão vantagem em uma luta, e os modificadores, que alteram as condições da batalha, como bolas de fogo que voam pelo cenário, partes do chão que explodem, etc. Basicamente, é a mesma coisa das Torres de MK11, só que em um tabuleiro.
A ideia de fazer o jogador andar por esse mapa é interessante, mas concluir esse modo se torna uma tarefa bastante cansativa. O número de batalhas por mapa pode passar de 30 nas oito áreas disponíveis. Além disso, cada uma conta com um chefe que usa poderes e armaduras para alongar as lutas. Elas não são difíceis, mas a minha paciência esgotou-se após concluir duas mesas seguidas.
Outro empecilho está na impossibilidade de controlar a câmera totalmente. Nossa visão é limitada ao ponto em que estamos e ao caminho à nossa frente. Se vamos para os lados, aí sim ela rotaciona, mas não temos liberdade alguma de explorar o cenário todo, para explorar quais os caminhos disponíveis ou o local dos baús e do chefe.
Há diversas recompensas, como itens cosméticos e trajes, tanto para os lutadores principais quanto para as parcerias, mas realmente é um esforço que não vale a pena ser feito de uma vez. Dependendo do seu humor, compensa mais gastar moedas no Santuário em uma recompensa aleatória; pelo menos é mais rápido.
MK1 também conta com modos online, com partidas casuais e ranqueadas, além da Liga de Kombate, que traz diversos prêmios para quem bater algumas metas. A fluidez da conexão é louvável, uma vez que a busca por oponentes não é demorada e as lutas em rede contam com a mesma rapidez das realizadas em modo local
O modo online foi ajustado após o recebimento do código para análise, o que resultou em diversas dificuldades de conexão, que só foram ajustadas após um patch de correção. Infelizmente, esse update não trouxe a possibilidade de realizar duelos entre jogadores de diferentes plataformas, algo que foi prometido anteriormente.
O que era bom ficou violentamente melhor
No que diz respeito à jogabilidade, a excelência de Mortal Kombat 1 é indiscutível. A barra dividida entre ataque e defesa de MK11 foi extinguida e a barra simples tripartida, aquela mesma de MK9, voltou, e essa foi uma decisão acertadíssima. Ela tem um manuseio mais simples e objetivo, com o uso de um segmento para melhorar os golpes especiais e dois para interromper um combo do oponente.
Por falar em combos, a execução de comandos e combinações continua muito boa e com respostas rápidas. Os veteranos vão se sentir em casa, e os novatos não se sentirão excluídos, pois a lista de tutoriais é extensa e cobre quaisquer situações que possam aparecer. Até o complexo entendimento de frame data está explicado de maneira simplificada.
O principal atrativo são os Kameo Fighters, chamados em português de Parcerias. Ao todo são 15 combatentes que podem ser usados como uma espécie de assistente no meio da partida. Todos eles têm pelo menos três comandos, que podem variar entre ajudar a estender um combo ou finalizá-lo; manter o oponente no ar; nos salvar de uma situação de pressão com um teleporte ou puxão; e até anular uma investida rival prendendo o adversário. As combinações possíveis entre o elenco principal e o pessoal de apoio são inúmeras e vale a pena passar um tempo conferindo cada uma.
Outro ponto bacana é que as Parcerias também possuem fatalities e brutalities, que fazem referências às suas primeiras aparições. Um easter egg mais discreto do que estamos acostumados da série, mas ainda assim bastante válido e divertido.
Por fim, um aspecto que tinha me deixado meio com o pé atrás eram os itens cosméticos, pois tinha toda aquela coisa de ficar conseguindo milhares de variações de cores para um mesmo traje separadamente, e outras três peças de vestuário para mudar alguns atributos no lutador escolhido. Isso foi suavizado, em partes.
Cada personagem ainda conta com o desbloqueio de uma cor por vez de cada vestimenta, mas agora só há um item para ser adquirido de cada um, e nada disso influencia nos valores dos combatentes, o que é um alívio. O desbloqueio é feito por diversas formas: subindo nosso nível de maestria com um personagem nos baús prêmios da Invasão; comprando na loja com moedas de temporada, também conseguidas em grandes quantidades no modo Invasão; na loja temporária com Cristais do Dragão; e com as moedas douradas conseguidas após cada luta no Santuário.
Ainda está longe de ser o ideal, até porque não é mais possível ver quais os acessórios e trajes que um lutador tem, mas conseguir tudo ficou um pouco mais fácil, mesmo que de maneira aleatória. Seria muito bom mesmo se fosse possível juntar a quantidade necessária para comprar um determinado acessório da nossa escolha, mas aí eu já estaria pedindo muito, não é mesmo?
Um passado glorioso que levará a um futuro promissor
Mortal Kombat 1 não traz uma evolução que o distancie do seu antecessor, e talvez ele nem tenha essa intenção. A questão é que o principal foi mantido: jogabilidade afiada e visuais dignos da geração atual de consoles. A História e a Invasão foram ótimas ideias que podem ter dado suas derrapadas, mas ainda assim não dá para esconder a curiosidade que fica sobre os novos rumos que essa jornada pode tomar.
Prós
- Os controles mantêm a característica da franquia, com combos de fácil execução;
- As Parcerias adicionam uma nova camada de estratégia e criam inúmeras combinações;
- A História reescreveu diversas interações clássicas de maneira interessante e criativa;
- Visuais muito bonitos, principalmente nas cenas do modo História e nos fatalities;
- Desbloquear itens cosméticos exige menos tempo e as moedas para isso são bem acessíveis.
Contras
- O ritmo do modo História cai da metade para o final e diversos personagens importantes viraram meros figurantes;
- Crossplay online indisponível no lançamento;
- Percorrer todos os mapas das Invasões consome tempo demais e a lutas contra os chefes são desnecessariamente demoradas;
- Não é possível controlar a câmera ou visualizar o tabuleiro inteiro no modo Invasão;
- Ainda temos que lidar com o desbloqueio aleatório de itens.
Mortal Kombat 1 — PC/PS5/Switch/XSX — Nota: 9.0Versão utilizada para análise: PS5
Revisão: Davi Sousa
Análise feita com cópia cedida pela WB Games