Análise: Sludge Life 2 (PC): vida louca em um mundo em ruínas

A segunda dose do jogo de vida marginal traz um cenário interessante para explorar em meio a questões sociais curiosas.

em 06/07/2023
Desenvolvido pelo brasileiro Terri Vellmann em parceria com o rapper norteamericano Doseone, Sludge Life 2 nos leva novamente a um mundo de marginalidade e poluição. Confesso que não havia jogado o antecessor, mas a experiência não exige nenhum tipo de conhecimento prévio. A única coisa necessária para aproveitá-lo é mergulhar fundo na sua proposta de mundo.

Sabe aqueles dias que tu acorda de ressaca?

Tudo começa com o nosso personagem acordando em seu quarto em um hotel luxuoso de Ciggy City. Algo aconteceu na noite anterior e o Big Mud sumiu na véspera da gravação de um novo sucesso no Azulverso. Agora cabe a você procurar por ele.
Apesar desse objetivo aparentemente concreto e simples, Sludge Life 2 é um jogo de aventura de mundo aberto e faz questão de dar ao jogador muita liberdade na exploração. Não há indicadores na interface para mostrar aonde ir, nem outros tipos de auxílios modernos para deixar a experiência mais palatável.

O resultado dessa escolha de design é a sensação de um mundo caótico em que estamos ao mesmo tempo livres para ir aonde quisermos e não temos um senso claro do nosso objetivo e posição no mundo. De certa forma, ficar perdido e sem rumo parece um elemento simbólico em que, como a vida, essa experiência só terá rumo certo se o próprio jogador assim desejar, embora só algumas ações possíveis estejam programadas.
De forma geral, a ideia básica de gameplay é realmente simples: sair por aí interagindo com objetos e pessoas para ver como eles se comportam. Em determinados pontos do mapa, é possível encontrar latas de tinta que podem ser usadas para pichar paredes e deixar a sua marca nas áreas, que se restringe ao próprio nome (Ghost) ou a ilustrações gosmentas, sem que tenhamos liberdade para escolher o que desenhar.

Outras formas de interação podem ser desbloqueadas encontrando itens especiais, como uma câmera para tirar fotografias a qualquer momento e um planador que pode ser ativado para não recebermos dano ao cair. A variedade é muito boa e, curiosamente, não é preciso fazer quase nada para obter um final na campanha, sendo muito mais interessante explorar ao máximo do que focar apenas em encontrar Big Mud, que é apenas um dos possíveis encerramentos.

Um mundo esquisito e interessante

Honestamente falando, o que considero mais interessante em Sludge Life 2 é a sua construção de mundo. A obra se passa em um futuro no qual a poluição chegou a níveis catastróficos visíveis e a sociedade tem atitudes chocantes para os nossos padrões. Por exemplo: cigarros sendo vendidos para crianças é algo considerado normal e ainda incluem mensagens de que agora eles têm vitaminas como incentivo.

De forma geral, trata-se de uma realidade apresentada através de piadas excessivas que, embora possam parecer bobas em um primeiro momento, são críticas sociais bem interessantes. Nesse sentido, o texto em português chama a atenção por ser bem fluido, usando gírias e expressões que soam realistas e adequadas ao contexto e porte dos personagens, embora haja algumas raras ocasiões de termos estranhos.
Por conta dessa atmosfera, explorar o mundo de Sludge Life 2 e conhecer mais pessoas e localidades exóticas é bem agradável. Mesmo sem um indicador de itens importantes nos ambientes, um minimapa moderno ou outras funcionalidades que são geralmente consideradas o estilo atual de game design, o que temos são ambientes e personagens curiosos e uma jornada cujo valor varia totalmente de acordo com o engajamento do jogador com os pequenos detalhes da aventura.

Em termos técnicos, porém, gostaria de destacar a movimentação um tanto irritante em alguns momentos. Os pulos são bem imprecisos e as plataformas às vezes são finas demais, dando uma sensação desconfortável de escorregar e cair, perdendo o posicionamento e altura que seriam necessários para a exploração vertical demandada para alcançar certas localidades.

Outro elemento que chama a atenção em Sludge Life 2 é o seu estilo artístico inspirado em fitas VHS, usando artefatos e distorções para dar um tom retrô e único à experiência. Caso você tenha dificuldade de lidar com isso, é possível utilizar o menu de configurações para fazer ajustes, como remover esse filtro. As opções também incluem retirar o dano de queda ou até definir se o seu personagem é vegano e gosta de cachorros, coisas que interferem em algumas interações entre personagens.

A vida de ser uma gosma à margem

Sludge Life 2
é uma aventura bem interessante por um futuro moralmente questionável. Sua tendência à liberdade total para exploração é uma faca de dois gumes, já que também leva o jogador a ficar perdido até mesmo na hora de perceber o que é interativo ou não. Porém, mesmo assim a obra traz uma interessante perspectiva social marcada por “viver à margem” em uma sociedade que ironicamente apenas segue em frente mesmo em ruínas.

Prós

  • Um mundo estranho muito gostoso de explorar;
  • Boa maleabilidade da gameplay, com o jogador sendo capaz de pichar paredes específicas, tirar fotos, usar um planador, etc;
  • O texto em português é majoritariamente bem escrito, com uma boa pitada de ironia e tom descontraído condizente com o contexto;
  • O menu de configuração inclui ajustes visuais que podem ajudar jogadores que tenham algum problema com o estilo artístico proposto.

Contras

  • A movimentação e o pulo acabam sendo um pouco imprecisos, com uma proposta de plataforma 3D ocasionalmente irritante;
  • Falha em indicar itens importantes nos ambientes.
Sludge Life 2 — PC — Nota: 8.0
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Devolver Digital


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.