De um a seis, temos dez jogos
Excetuando-se alguns spin-offs e duas versões alternativas, a franquia Mega Man Battle Network foi lançada em sua íntegra no Game Boy Advance. De 2001 até 2005, a série teve seis jogos numerados, começando a criar múltiplas versões (à la Pokémon) a partir do terceiro título (Battle Network 3: White e Blue).
Com isso, ao todo tivemos dez títulos principais no Game Boy Advance, os quais estão representados nesta coletânea. Vale destacar, porém, que ao longo dos anos tivemos também versões de DS para o quinto jogo (Megaman Battle Network 5: Double Team DS) e o primeiro (Rockman.EXE: Operate Shooting Star, lançada apenas no Japão com algumas melhorias e conteúdo adicional ligado à série Star Force).
Também foram criados vários spin-offs que alteravam significativamente o modelo de gameplay, como Mega Man Network Transmission (GC), Mega Man Battle Chip Challenge (GBA), Rockman.EXE 4.5: Real Operation (GBA), Rockman.EXE WS (WS) e jogos mobile e de arcade. Infelizmente, a coletânea não inclui nem os mais relevantes desses jogos alternativos nem as versões de DS mencionadas acima.
Apesar disso, a coletânea tem uma galeria bem completa com ilustrações promocionais até mesmo desses spin-offs menores, de piadas de primeiro de abril e da página oficial da equipe. Outro acervo importante que está incluso no pacote é um tocador de músicas com toda a trilha dos jogos incluídos na coletânea. É possível também alterar a música do menu para qualquer uma das que estão disponíveis.
Mas o que é Battle Network?
Embora Mega Man seja tradicionalmente uma franquia de jogos de plataforma, a subsérie Battle Network é composta prioritariamente de jogos de ação com um formato deckbuilder. Inicialmente, o jogador é limitado à movimentação em um grid 3x3 vermelho à esquerda da tela enquanto o grupo inimigo fica à direita com a mesma limitação.
Além de poder atirar em ataques rápidos mais fracos ou carregando o seu Buster, o jogador deve escolher chips que serão parte fundamental da sua estratégia. Como em outros jogos do formato deckbuilder, cabe ao jogador montar o seu baralho com canhões, espadas e habilidades variadas para ter um bom leque de ações possíveis.
A sua mão inicial é limitada, sendo possível pegar múltiplos chips desde que eles sejam o exato mesmo nível ou tenham a mesma letra, que é um elemento equivalente ao “naipe” de uma carta mas com todas as opções do alfabeto e o asterisco que funciona como coringa. Dependendo da combinação selecionada, é possível ativar Advanced Programs, que são técnicas especiais geralmente mais poderosas.
Por conta disso, é fundamental ter um baralho bem pensado em vez de simplesmente colocar qualquer coisa que pareça interessante. Boas combinações de chips aumentam a capacidade do jogador de realizar ataques consecutivos enquanto uma “sopa de letrinhas” pode deixá-lo com poucos recursos.
Além dos ataques e dos chips, o jogador pode se movimentar por todo grid que é considerado seu território, ou seja, os quadrados marcados de vermelho. É importante entender os padrões dos inimigos e desviar para evitar complicações. Com o tempo, uma barra de “Custom” no topo da tela é preenchida, liberando o envio de mais chips, mas a demora até que isso ocorra exige que o jogador no mínimo tenha bons reflexos para lidar com os ataques inimigos e continuar vivo até liberar essas novas opções de ação.
As batalhas também são marcadas por elementos bem específicos, como mudanças de território, seja com a destruição ou conquista de quadrados, a adição de obstáculos como pedras e quadrados imantados ou até mesmo a terrenos/painéis elementais como grama, gelo, lava, etc. Vale destacar que os jogos também possuem transformações que servem justamente para explorar essas variações elementais, mas também podem trazer outras alterações à performance do jogador.
Por que jogar todos?
Devido ao lançamento tão próximo entre os jogos na época do GBA, a série acabou tendo uma recepção decadente ao longo dos anos. As iterações continuavam a história, adicionavam novos inimigos e formas diferentes para o MegaMan.EXE e ajustavam questões de balanceamento, mas acabavam parecendo sempre “mais do mesmo” para muitos jogadores e para a crítica.
Pessoalmente, discordo dessa perspectiva, mas entendo que a estrutura de combate se mantém bem similar apesar dos ajustes serem especialmente significativos para quem mergulha mais fundo nos aspectos técnicos das experiências. Para mim, ainda considero que vale muito a pena explorar o mundo de Battle Network em cada jogo, vasculhando as localidades reais e a rede que conecta os computadores e notando o que se mantém da estrutura e o que muda nos ambientes e no gameplay.
Também sou especialmente fã das Liberation Missions do Battle Network 5, que adicionam um leve elemento tático a alguns enfrentamentos. Essas missões envolvem o uso de várias unidades (como, por exemplo, ProtoMan.EXE ou Colonel.EXE) e suas habilidades especiais para enfrentar os chefões e os pequenos monstros que os ajudam, sendo o jogador recompensado se eliminar o inimigo mais poderoso dentro de um certo número de turnos.
Ao mesmo tempo, acho a história do primeiro jogo fundamental para entender a ambientação e gosto de ver como cada jogo traz novos desafios para Lan e MegaMan.EXE. Em especial, há uma boa variedade de áreas ao longo de todos os jogos, cada uma com enigmas bem construídos que exigem um bom entendimento das características únicas dos ambientes. Por exemplo, uma área pode envolver deslizar em gelo enquanto outra exige completar palavras em uma espécie de charada movimentando blocos de letra com o seu personagem.
Mais do que jogos, preservando uma experiência e o seu legado
Um detalhe fundamental da experiência proposta por Battle Network é a conexão multiplayer. Os jogos originalmente utilizavam o cabo Link do GBA para permitir que os jogadores batalhassem e trocassem chips. Para a coletânea, isso foi adaptado para um modo online que permite sessões públicas (com seleção de região e uma opção Worldwide) ou privadas com amigos, mantendo esse aspecto vivo para uma nova geração de sistemas.Outro elemento preservado da experiência original são os patch cards. No Japão, era possível obter cartões físicos para usar no e-Reader do GBA. Infelizmente, como a tecnologia não era tão popular nos outros países, eles não chegaram a sair no Ocidente na época. A coletânea inclui 499 cartões, liberando chips adicionais, itens consumíveis e até modificações significativas como transformar o Buster em uma espada ou outro golpe. Vale destacar que os benefícios dos cartões geralmente acompanham alguma contrapartida.
Apesar do pacote ser bem recheado, gostaria de destacar que os scripts dos jogos preservam erros de digitação e ortografia assim como inconsistências entre os jogos e algumas abreviações que só existiam por limitações do console original e poderiam ter sido ajustadas no relançamento. As opções gráficas também são demasiadamente simples, tendo apenas a possibilidade de ajustar o tamanho e usar um filtro básico que deixa tudo borrado. Pessoalmente, prefiro desligar o filtro e ver os pixels em todos os seus detalhes. Também não há adições como save states, que seriam bem úteis para novatos que querem ter a experiência de tentar várias vezes lidar com os momentos de maior dificuldade do jogo. Por fim, no PC, mesmo utilizando o teclado, o jogo indica botões de controle, o que pode ser um pouco desorientador.
Um bom pacote
Mega Man Battle Network Legacy Collection é um pacote com dez jogos que foram alguns dos pioneiros no conceito de misturar ação e deckbuilding. Não apenas ele preserva os títulos e os reapresenta para sistemas modernos, como também se esforça em manter as qualidades da experiência original em uma nova roupagem com o modo online e os patch cards embutidos no sistema.
É uma coletânea que vale muito a pena não apenas para os fãs como também para quem gosta da proposta de gameplay, já apropriada por outros jogos mais atuais. Porém, mesmo com uma galeria farta e jogos de alta qualidade, a sensação que fica comparando com outros compilados similares é a de que a Capcom podia ter feito um pouco mais para deixar o pacote verdadeiramente perfeito.
Prós
- Conceito interessante de combate de ação com deckbuilding de chips, especialmente para o período;
- Áreas variadas com enigmas bem construídos para avançar;
- Adaptação para o online permite à coletânea manter o fator multiplayer que é muito importante para a experiência proposta;
- Possibilidade de ativar os patch cards é uma novidade bem vinda para o Ocidente e um fator bem conveniente para brincar com as possibilidades do jogo;
- As Liberation Missions do quinto jogo são especialmente agradáveis com sua exploração de elementos táticos e comando de outros personagens além do Megaman.EXE;
- Galeria bem completa de ilustrações e músicas, incluindo até mesmo imagens dos spin-offs que não estão presentes na coletânea.
Contras
- Ausência de alguns jogos e versões importantes como Operate Shooting Star, BN5: Double Team DS, Battle Chip Challenge e 4.5: Real Operation;
- Erros de digitação e ortografia persistem dos jogos originais, assim como abreviações que poderiam ter sido ajustadas para os novos dispositivos;
- Opções gráficas muito simples;
- Mesmo usando o teclado, o jogo só faz indicações de botões de controle.
Mega Man Battle Network Legacy Collection — PC/PS4/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida pela Capcom