Análise: Digimon World: Next Order (Multi) traz ao PC uma versão bugada de um simulador curioso

O jogo mais recente da linha Digimon World chega ao PC e ao Switch sem melhorias significativas.

em 13/03/2023
Originalmente lançado para PS Vita no Japão, Digimon World: Next Order é um jogo de simulação em que devemos criar duas criaturas simultaneamente. Cabe ao jogador gerenciar meticulosamente o ritmo de treinos desses Digimons para fortalecê-los e enfrentar os desafios da trama. Dentro dessa proposta, que segue a linha de Digimon World (PS), temos um título curioso que chega agora ao PC e ao Switch, mas a nova edição não se justifica para além de estar disponível em novas plataformas.

De volta ao Digimundo

Quando o primeiro Digimon World foi lançado no PlayStation em 1999, o jogo tinha como principal proposta pensar em como ampliar o modelo de simulador dos virtual pets da franquia para um mundo mais detalhado e orgânico. Embora a série tenha explorado vários outros estilos desde então, o produtor Kazamasa Habu e a Bandai decidiram reforçam a noção de que a marca teria duas linhas principais: os simuladores World e os RPGs baseados em turno Story.

A ideia veio com o lançamento de Digimon World Re:Digitize no PSP, em 2012, que tentava resgatar o modelo do primeiro World para um sistema mais moderno, embora não houvesse essa consistência anteriormente. Nessa mesma linha, a proposta de Next Order foi apelar para o fã nostálgico da primeira jornada, trazendo elementos facilmente reconhecíveis da franquia e especificamente do primeiro jogo.

A história não é o grande foco do jogo, que dá destaque para a exploração dos sistemas e do mundo, mas ainda é bem agradável para quem é fã de Digimon, especialmente quem gosta muito do Digimon World original. Até mesmo a escolha de criaturas para encontrar nas quests ajuda a manter a experiência nostálgica.

Curiosamente, enquanto a versão de PS4 foi lançada em inglês, Next Order inclui também a tradução para português como uma das novidades. Embora a tradução das cenas principais e alguns diálogos bem humorados das criaturas seja boa, o jogo sofre com uma qualidade abismal nos textos de sistema. Como um título em que as cenas da narrativa são bem esporádicas, essa falha acaba sendo um grande agravante, porque a maior parte da experiência são frases quebradas e bem abaixo do ideal.

O texto, que deveria ocupar toda essa caixa, pode ficar assim.
Outro problema bizarro que enfrentei é que as caixas de diálogo vão reduzindo de tamanho ao longo do tempo. Fechar o jogo e abri-lo novamente faz com que o tamanho volte ao normal, mas esse problema é um incômodo enorme para quem gostaria de apenas aproveitar o jogo, pois afeta interações essenciais do sistema, mesmo não fazendo diferença para alguns momentos da trama que possuem outro formato de caixa.

Mergulhando na vida de simulador

Digimon World: Next Order coloca o jogador na pele de um domador que precisa cuidar de duas criaturas ao mesmo tempo. Assim como no virtual pet, é necessário lidar com todas as necessidades delas: alimentação, idas ao banheiro, treinamento e cuidados com a saúde. Embora o jogo até simplifique um pouco o ritmo de vida das criaturas para que o jogador possa cuidar delas mais ou menos da mesma forma, tratá-las igualmente pode dar resultados bem diferentes.

Como um tamagotchi, os bichos possuem um limite de vida e é essencial ter um bom planejamento para poder mantê-los saudáveis e fortes por um longo tempo. Além disso, a forma como eles são treinados impacta diretamente nas suas evoluções ou na morte prematura de algum deles antes de alcançar um estágio mais avançado.

Já que o tempo de vida das criaturas é limitado, antes de sair explorando o mundo, é aconselhável ir para a academia local onde eles podem fortalecer todo tipo de atributo. Basta escolher uma opção no menu de treinamento e não é necessário que elas façam a mesma atividade, ou seja, você pode colocar um Agumon para treinar força e um Renamon para treinar sabedoria simultaneamente.

Os resultados desse treinamento são geralmente os fatores mais importantes para as evoluções, sendo necessário que os seus atributos estejam acima de um determinado valor. Porém, outros detalhes como o laço com o domador, o humor e a disciplina também podem ser relevantes, sendo possível ajustá-los de acordo com algumas interações de reforço. Assim como no adestramento de um animal, o ideal é que o jogador elogie uma atitude desejável e repreenda a indesejável, sendo possível escolher entre essas posturas de domador em momentos específicos, como após uma luta bem-sucedida ou quando a criatura reclama da comida.

Curiosamente, nesses momentos de “comunicação” com os parceiros, o jogador também desbloqueia um detalhamento de quais são os requisitos necessários para algumas evoluções. Além do que já foi mencionado acima, é possível ver que o número de vitórias obtidas e até mesmo o peso da criatura (que pode ser alterado de acordo com os alimentos selecionados) influenciam nas opções disponíveis. Ao todo, há mais de 200 criaturas e desbloquear as opções desejadas pode ser bem trabalhoso, mas recompensador.

Batalhas e experiência

Fora da cidade de Floatia, onde ficam os aspectos de gerenciador do jogo, é necessário explorar um mundo 3D com os dois parceiros. A exploração ocorre no ritmo do jogador, que pode escolher ir para onde quiser, mas terá o avanço por alguns lugares dificultado por inimigos mais poderosos. No caminho, também será necessário realizar pequenas missões para fazer com que certos Digimon venham morar em Floatia, aumentando os recursos de simulação que o jogador tem acesso.

As batalhas funcionam de forma automática, com aliados e inimigos agindo de acordo com uma inteligência artificial própria. Porém, o jogador pode intervir gastando “Pontos de Ordem” para comandar aquele parceiro a usar um ataque especial específico. Para conseguir mais pontos, é necessário torcer pelos aliados durante o combate automático, fazendo com que esses comandos sejam uma espécie de recurso adicional e o grosso da experiência seja automatizado, refletindo os resultados dos esforços do simulador.

Embora os aliados não tenham níveis e não ganhem experiência, as batalhas são uma forma de conseguir itens, dinheiro e um pouco de melhoria de atributos (bem menos que no treinamento). Elas também são uma das formas de ganhar experiência para o domador e o ganho de nível dele implica na obtenção de pontos de domador úteis para desbloquear novas habilidades passivas.

Com esses poderes em mãos, o jogador pode fazer com que os seus parceiros fiquem mais fortes mais rapidamente, aumentar o tempo de vida deles, melhorar os efeitos do treinamento, entre outras coisas. Dá até para melhorar mecânicas adicionais da simulação, como a extração de recursos que podem ser usados para melhorar os prédios de Floatia, pescaria e culinária ou para recuperar pontos de saúde explorando o mapa. Embora seja possível desbloquear todas essas opções ao chegar ao nível máximo, a ordem de obtenção dessas mecânicas pode impactar bastante a exploração e beneficiar o jogador de formas diferentes, da mesma forma que é aconselhável tentar encontrar todos os Digimon possíveis para expandir Floatia.

Qualidade de vida? É de comer?

Apesar das mecânicas interessantes do jogo e de ele ser realmente divertido para quem gosta de obras de gerenciamento, Next Order é abaixo do ideal em qualidade de vida. Vários menus são redundantes ou apresentam informações pouco claras e fragmentadas. 

Um bom exemplo disso é a forma como o jogo inutiliza o minimapa, não mostrando os ícones de transição de área, o que só pode ser visto em um mapa completo. Porém, utilizar o atalho de mapa só dá acesso à área atual com os indicadores de transição. Só abrindo o menu principal é que é possível acessar também um outro painel mais detalhado das conexões entre as áreas, uma escolha completamente ilógica e que existe em detrimento da experiência do usuário. A divisão entre Guia de Campo e digivoluções é outro exemplo de péssima disposição das informações.

Se tem essa caixa de texto, tem skip.
Além disso, apesar do jogo não ter foco na narrativa, há uma boa quantidade de diálogos. Piorando a situação, há uma inconsistência forte entre momentos de jogo que usam caixas de texto diferentes. Só é possível pular diálogos em um tipo específico de cena e não há log para rever as falas em caso de perda. O jogo também não indica nenhum botão do teclado, pressupondo que o jogador grave de cabeça a associação que foi feita com os botões equivalentes ao de um controle.

O relançamento seria uma boa oportunidade para melhorar um pouco os aspectos de qualidade de vida, mas se contenta em apenas adicionar uma opção de dificuldade menor e um botão de correr. Exceto pela tradução para o português (consideravelmente falha nos termos de sistema e menus importantes para a experiência), as adições são praticamente insignificantes.

Por fim, gostaria de destacar que o jogo conta com bugs visuais de menor relevância. Nada que quebre o jogo, mas é perceptível que às vezes as criaturas não estão animadas corretamente, isso já não levando em consideração que as texturas e modelos do jogo mereciam um tratamento melhor. Durante a live que gravei do jogo, um certo trecho ficou estranhamente borrado também.

Mais plataformas e nada mais

O relançamento de Digimon World: Next Order é uma bela chance para os fãs da série que não possuem um PlayStation aproveitarem o raising sim. Infelizmente, as vantagens param por aí. A qualidade da obra deixa muito a desejar e mesmo a tradução para o português, que era para ser um diferencial da nova versão, indica uma grande falta de cuidado da Bandai Namco com o que ela está oferecendo ao usuário final.

Prós

  • Gerenciar o seu tempo em prol de conseguir fazer criaturas fortes forma uma gameplay agradável;
  • Boa variedade de criaturas, sendo possível aprender os requisitos de evolução em interações com elas ao longo do tempo;
  • Sistema de nível de domador com habilidades desbloqueáveis impacta significativamente a evolução do jogo;
  • A trama pode ser curiosa para os fãs da franquia, aproveitando elementos do Digimon World original.

Contras

  • Tradução em português é frequentemente ruim;
  • O texto reduz de tamanho ao longo do tempo caso o jogador fique horas jogando;
  • Vários elementos do jogo precisavam oferecer mais qualidade de vida para o usuário;
  • As poucas adições em relação à versão de PS4 são quase insignificantes;
  • Bugs visuais que não quebram o jogo, como erros de animação.

Digimon World: Next Order — PC/PS4/Switch — Nota: 6.5
Versão utilizada para análise: PC

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Bandai Namco


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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