NieR: Replicant, desenvolvido pela Toylogic Inc. e lançado em 2021 pela Square Enix, pode parecer bem diferente de Dark Souls, mas ambos os diretores das obras compartilham da mesma inspiração (como mostrado nesta entrevista, em que Miyazaki diz que busca ser mais fã de Fumito Ueda, do que Yoko Taro).
Céu cinzento e ''mundo morto''
Assim que comecei NieR, a primeira semelhança que vi foi na direção de arte. A paleta de cores escolhida é muito similar, pois se trata de cores frias, nada ali chama atenção. Ambos os jogos se passam e se tratam sobre mundos decadentes e isso é expressado de forma forte em NieR: Replicant.
Em relação à paleta de cores, é interessante como os jogos não deixam de saturar o verde (em florestas, por exemplo) quando estamos em ambientes mais naturais. Em NieR, o verde contrasta com os inimigos, enquanto em Dark Souls, a mesma cor pode ajudar a camuflá-los (a utilização dessa saturação varia entre as áreas).
Apesar do character design ser bem diferente, o figurino tem a mesma função. Nada de armaduras chamativas, douradas, heróicas, etc, o figurino busca representar a decadência do mundo e a situação dos personagens através de armaduras não-lustradas e roupas não-luxuosas.
Backtracking e a Firelink Shrine de NieR
A maior diferença no level design entre os dois jogos é que Dark Souls tem uma exploração mais vertical, enquanto NieR é bem mais horizontal. O backtracking é muito similar também. Durante todo o jogo, o protagonista tem que retornar à The Village (chamada de aldeia do ''nome que o jogador deu ao protagonista'', cujo nome canônico é Nier, mas eu não vou utilizá-lo a fim de evitar confusões com o nome do jogo), similar a Dark Souls, em que jogador sempre tem que retornar a Firelink Shrine.
Esse lobby serve ao jogador como um porto seguro, ambos os jogos os usam para desenvolver personagens e a história como um todo. Já que, em ambas as obras, acontecimentos importantes estão diretamente ligados a esses lobbies.
O desenrolar da história e dos personagens
Mesmo que Yoko Taro abandone boa parte do minimalismo presente no design por subtração de Fumito Ueda, na quest principal, eu senti que havia uma grande seletividade em quais personagens desenvolver. Miyazaki ainda abraça um pouco mais o minimalismo narrativo de Ueda, trazendo uma história bem menos intrusiva que Taro, mas não significa que Taro deixou de lado a narrativa de Ueda. Na verdade, ele me pareceu utilizar bem mais em NieR: Replicant do que em NieR: Automata, por exemplo. Em NieR, existem praticamente 5 personagens-chave:
- Protagonista;
- Yonah;
- Grimoire Weiss;
- Kaine;
- Emil;
- Devola / Popola.
E são esses os personagens que o jogador irá lidar do começo ao fim do jogo (alguns serão introduzidos pouco mais a frente, mas, eventualmente, esses são os que fazem a história andar). Claro que não estamos falando de um jogo de Fumito Ueda, e se até Dark Souls tem sidequests que desenvolvem personagens secundários, NieR faz o mesmo.
Porém, a questão é que eles preferem deixar o conteúdo secundário (não-vital para a quest principal) nas missões secundárias (escolha que deveria ser padrão, na minha opinião). Há alguns conteúdos importantes para a quest principal em ambos os jogos, mas eles são tratados como opcionais por não serem vitais para sua conclusão. Isso é uma seletividade semi-minimalista que vem da interpretação que esses diretores tiveram da forma como Fumito Ueda entende design narrativo.
Porém, a questão é que eles preferem deixar o conteúdo secundário (não-vital para a quest principal) nas missões secundárias (escolha que deveria ser padrão, na minha opinião). Há alguns conteúdos importantes para a quest principal em ambos os jogos, mas eles são tratados como opcionais por não serem vitais para sua conclusão. Isso é uma seletividade semi-minimalista que vem da interpretação que esses diretores tiveram da forma como Fumito Ueda entende design narrativo.
O mundo e a lore
Yoko Taro, como de costume, buscou uma história bem mais intrusiva em NieR, diferente de Miyazaki. Porém, os mistérios envolvendo o mundo são abordados de forma similar (não tão similar quanto os outros aspectos, pois conforme a história avança, alguns mistérios são abordados de forma mais direta). Ambos os jogos fazem uso de arquivos e de documentos para contar alguns detalhes sobre a lore, bem como de alguns personagens.
Como já citado acima, ambos se tratam de mundos, vidas, cidades, tudo é decadente. Ambos retratam mundos que passaram por uma catástrofe (que eu não vou entrar em detalhes para evitar spoilers e também porque esse não é o foco da matéria, o importante é a semelhança da origem desses mundos) e isso é representado de forma excelente em ambas as obras, cada uma contextualizando sua respectiva história. A tragédia presente na vida dos personagens e a ausência de finais felizes é algo comum e imprescindível também.
A melancólica trilha sonora
Motoi Sakuraba tem um estilo diferente de Keiichi Okabe, principalmente na utilização de vozes. Sakuraba prefere manter o instrumental na maioria das suas composições (Okabe mantém certa preferência por instrumentos de corda, enquanto Sakuraba, pelo piano), enquanto Okabe utiliza vozes até nas composições mais ''calmas'', a pedido de Yoko Taro, como apresentado nessa entrevista feita pelo NintendoBlast:
''YOKO-san pediu desde o início para incluir algum tipo de "voz" na música da série NieR.Seja um refrão, um vocal solo ou um sussurro, quase como uma respiração, há uma enorme variação de vozes que foi incorporada dependendo do que a música envolve.[Essa escolha] não é tanto para dar apenas uma impressão específica de humanidade ou familiaridade, mas uma impressão única, própria de NieR e seu mundo.''
Entretanto ambos os compositores conseguem realçar a condição dos personagens e do mundo através de suas obras. A maior diferença no design de som é na forma como é utilizada: a trilha sonora de Sakuraba dificilmente é utilizada para contrastar com o que o jogador está fazendo, já em NieR, diversas vezes nos deparamos com músicas calmas em momentos de tensão e músicas tensas em momentos mais calmos.
O caminho ''final''
Taro dispõe de uma estrutura narrativa bem diferente de Dark Souls, que consiste em seus jogos terem vários finais que não são necessariamente finais. Como se não bastasse o jogo inteiro com essa vibe de Dark Souls, o final A não desapontou nesse aspecto, pois tem um boss mudo que aparece do nada (dependendo do quanto o jogador está prestando atenção na história) e que o jogador apenas se aproxima, derrota-o e é isso, bem semelhante a Dark Souls mesmo (até Dark Souls III é assim também). Posteriormente, o jogador entende todo o contexto, mas até o cenário do último confronto lembra um pouco de uma das lutas mais emblemáticas de Dark Souls 1.
Uma ótima entrada para ''Fromfags''
Diferente de NieR: Automata, Replicant deve ser mais agradável e familiar para os fãs de Miyazaki. A maior ligação entre os dois diretores (a inspiração em Fumito Ueda) é latente em suas obras, formando uma tríade de Auteurs que ajudou a moldar os videogames como conhecemos hoje. Todas as referências a Berserk (1997), o caráter dark phantasy da narrativa e do mundo, o aspecto medieval da história, bem como todas as características citadas aqui e muitas outras, farão os jogadores de Souls se sentirem em casa. Talvez o aspecto que mais se diferencie (fora o sistema de combate) seja o design narrativo, pois como citado acima, NieR é bem mais intrusivo e foca muito no desenvolvimento dos personagens citados e, se o jogador desejar, desenvolve outros também nas quests secundárias.
NieR: Replicant foi uma experiência incrível para mim e me introduziu ao incrível estilo de direção de Yoko Taro, então foi impossível não comparar e não perceber as semelhanças com meu jogo favorito. Por estarmos em outubro, promoções de Black Friday e Natal vão ocorrer nos próximos meses, portanto, é provável que o jogo entre em alguma dessas promoções. O jogo está disponível para Playstation 4, Xbox One e PC (Steam).
Revisão: Heloísa D'Assumpção Ballaminut