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Análise: The Legend of Heroes: Trails from Zero (Multi): superando barreiras em prol de um futuro melhor

O primeiro jogo da duologia Crossbell finalmente chega ao Ocidente de forma oficial após 12 anos do seu lançamento japonês.

A franquia Trails é um caso curioso entre os JRPGs; afinal, sua insistência em manter a continuidade leva a tramas cheias de referências a eventos passados e uma apresentação até intimidadora para quem nunca experimentou nenhum dos jogos.

Iniciada em 2004 no Japão com Trails in the Sky (PC, com port posterior para PSP), a franquia já lançou até mesmo a nona entrada da saga, Trails of Cold Steel IV (PC/PS4/Switch), no Ocidente, mas dois títulos muito importantes acabaram ficando para trás.

The Legend of Heroes: Trails from Zero é o primeiro jogo da duologia Crossbell e foi originalmente lançado para PSP no Japão em 2010. Anteriormente, o RPG estava disponível em inglês apenas por traduções de fãs, fazendo com que oficialmente os jogadores que não sabiam japonês tivessem que receber spoilers variados das sequências ou evitar avançar após Trails in the Sky the 3rd (PC).

Com o lançamento da sequência, Trails to Azure (PC/PS4/Switch), previsto para 2023, a publisher NIS America busca finalmente fechar o caminho até Trails into Reverie (PC/PS4/Switch) de forma oficial no Ocidente. Em particular, as versões de PC e Switch contam com o apoio técnico da PH3 sob a gerência de projeto de Peter "Durante" Thoman, conhecido por seus longos anos de trabalho em mods. O resultado é mais uma edição de alta qualidade para a franquia de JRPGs.

Bem-vindos à SSS

Trails from Zero conta a história de um jovem chamado Lloyd Bannings. Nascido na cidade-estado de Crossbell, o rapaz passou alguns anos treinando para se tornar um grande investigador do Departamento de Polícia local. Um dia, Lloyd recebe um convite para se juntar à força policial, mas ele não imaginaria as especificidades de seu novo trabalho.

Recém-formado da Academia de Polícia de Crossbell, Lloyd foi chamado a fazer parte de uma nova força-tarefa, a Special Support Section (SSS). Com a missão de realizar várias tarefas para auxiliar a população e melhorar a reputação do governo, a verdade é que se esperava muito pouco do grupo recrutado há tão pouco tempo, que além de Lloyd, inclui: a jovem nobre Elie Macdowell; o ex-membro da Crossbell Guardian Force, Randy Orlando; e a enviada especial da Epstein Foundation, Tio Plato.

Essa equipe fará várias amizades ao longo da jornada, completando uma variedade de tarefas para a população, e gradualmente se envolverá em tramas sinistras que ameaçam a paz da região. Assim como é o caso de todos os títulos da série, essas missões se parecem muito com o tipo de serviço prestado pelos Bracers de Trails in the Sky. Concluí-las é opcional, mas rende mais pontos para o relatório policial, o que retorna em dinheiro e itens para o jogador.

Vale destacar também que há um limite de tempo para realizá-las, sendo possível perder totalmente o prazo das missões opcionais. Há uma indicação de prazo (Short, Medium, Long) para que o jogador tenha uma noção de prioridade e evite avançar na narrativa principal.

Porém, nem todas as missões são apresentadas de forma clara, havendo sempre tarefas escondidas que dependem da interação com os NPCs. Também há várias cenas opcionais que servem para melhorar o relacionamento entre os personagens, mas esse elemento é praticamente invisibilizado no jogo, já que não há nenhum indicativo claro como o Bond System da quadrilogia Cold Steel.

Ainda assim, de forma geral, foi mantida a tradicional valorização das falas dos NPCs, fazendo com que o mundo esteja em constante transformação e reflita alguns avanços da narrativa. Com isso, a ideia é realmente tentar valorizar o jogador que explora todos os cantinhos, conversando com todo mundo. Mesmo sem indicações claras, as pessoas que têm esse hábito podem encontrar os detalhes escondidos.

SSS-Break

Trails from Zero é um RPG baseado em turnos que segue os moldes de Trails in the Sky e Trails of Cold Steel. Durante a sua vez de agir, os personagens podem atacar inimigos dentro da área de alcance, utilizar Arts (magias) que variam de acordo com os Quartz equipados, ativar Crafts (golpes especiais) caso tenham pontos suficientes, consumir itens ou se movimentar pelo grid quadriculado.

No canto superior esquerdo da tela, é possível acompanhar a ordem de turnos, vendo quanto tempo demora para o personagem voltar a agir após selecionar uma determinada ação. Além disso, os turnos podem implicar em certos benefícios, como recuperação de vida, e malefícios, como ter os seus ataques negados. Ambos podem afetar tanto aliados quanto inimigos.

Para manipular esses elementos a seu favor, o jogador deve planejar bem a sua movimentação durante as batalhas. Uma boa dica é quebrar a ordem natural dos turnos usando o que é chamado de S-Break, um Craft especial que consome toda a barra de CP (craft points), mas pode mudar o rumo da batalha se ativado no momento certo.

Enquanto os elementos acima já estavam presentes nos títulos anteriores, as mecânicas de combate também receberam algumas adições em comparação com a trilogia Trails in the Sky. Chama a atenção o sistema de Counter, que permite aos aliados contra-atacar golpes dos quais desviaram; e a possibilidade de utilizar Combo Crafts (ataques em equipe), que são únicos para cada dupla. Além disso, há vários bônus de turno novos, incluindo um Team Rush em que todos os quatro personagens atacam juntos.

Além do combate em si, é bastante importante customizar seus personagens para garantir um melhor aproveitamento do seu potencial de cada um. Além de alterar armas, roupas e equipamentos secundários (que podem ser bem úteis para modificar os atributos ou prevenir efeitos como envenenamento), o jogador precisa customizar os Quartz (um sistema similar à Materia de Final Fantasy VII) equipados.

Inicialmente, cada personagem possui apenas uma vaga para Quartz, sendo necessário gastar os cristais Sepith obtidos em batalha para desbloquear mais espaços. Os custos associados e as restrições variam, mas é graças a esse sistema que o jogador pode customizar as Arts às quais cada personagem tem acesso.

Além de trazer benefícios específicos para o personagem, cada Quartz está associado a uma certa quantidade de cristais elementais, que em conjunto podem desbloquear as magias existentes conforme uma extensa tabela de valores. O resultado é uma grande variedade de opções estratégicas que vale a pena explorar, especialmente se a dificuldade apertar um pouco e parecer que não há nenhuma forma de prosseguir.

A melhor versão

Um detalhe importante a se ter em mente em relação a Trails from Zero é que há uma variedade de versões. O título foi originalmente lançado no PSP, depois teve um port chinês para PC, uma edição especial no PS Vita chamada Zero no Kiseki Evolution e, mais recentemente, Zero no Kiseki Kai no PlayStation 4. Infelizmente, a última versão utilizava um upsample do lançamento original, deixando texturas e modelos abaixo da média e alguns elementos borrados na interface.

Enquanto a versão de PS4 traduzida e lançada no Ocidente segue com exatidão o Kai japonês, a edição para PC e Switch é um novo port cujos elementos técnicos sofreram várias alterações. Assim como foi o caso para outros jogos da série, eles contaram com o apoio técnico da PH3, uma empresa cujo chefe técnico, Durante, foi responsável por vários mods que melhoraram o desempenho de títulos como Dark Souls e o software GeDoSaTo.

Em particular, é notável como os modelos ganharam bastante detalhamento, evitando uma forte sensação de defasagem ao jogá-lo em alta resolução. Trails from Zero também conta com um menu bastante detalhado com configurações de fácil ajuste, tudo isso integrado internamente, fazendo com que não seja necessário fechar o jogo para melhorar o desempenho gráfico. A única coisa da qual senti falta foi a possibilidade de ajustar a câmera, já que ela pode ser ocasionalmente inconveniente e esse ajuste era uma opção presente na trilogia Trails in the Sky.

Além das questões visuais, há várias adições de qualidade de vida. Como se trata de um jogo com grandes quantidades de texto, a opção de log presente na edição de PC e Switch é perfeita para rever as falas recentes. Além disso, é especialmente útil o modo turbo, que permite acelerar em até seis vezes o combate e a navegação pelo mapa, assim como eventos de história caso o jogador queira passar mais rapidamente por eles ao rejogá-los. Outra adição que eu particularmente aprecio bastante é o indicador de trilha sonora, que informa no canto superior esquerdo qual música está sendo tocada e a sua posição na lista de faixas dos CDs do jogo.

Todos esses elementos fazem de Trails from Zero para PC e Switch uma edição definitiva da obra que vale muito a pena experimentar. Porém, gostaria de ressaltar que no momento da redação desta análise, observei alguns errinhos de tradução e escrita. Não é nada que quebre profundamente a experiência, apenas alguns incômodos pontuais.

Uma edição definitiva

The Legend of Heroes: Trails from Zero finalmente chega ao Ocidente em uma edição caprichada que os fãs que acompanharam a série até aqui poderão aproveitar bastante. Infelizmente, a edição de PS4 não conta com os mesmos benefícios das versões PC e Switch, mas para quem é fã de JRPGs e pode ter acesso às plataformas que não são da Sony, o título é uma excelente pedida. Fica a expectativa para que Trails to Azure conte também com um port de alta qualidade em 2023.

Prós

  • Sistema intrincado de combate em turnos, no qual o jogador deve planejar bem as ordens de ataque de aliados e inimigos;
  • O sistema de Quartz permite maleabilidade de build para customizar a equipe;
  • A edição de PC e Switch conta com elementos visuais de alta resolução e facilidade de ajuste no menu integrado do PC;
  • A edição de PC e Switch inclui vários elementos de qualidade de vida, como um log e a possibilidade de acelerar em até seis vezes o combate e a navegação;
  • Mundo curioso projetado para refletir as mudanças da história ao longo do tempo através dos diálogos com NPCs.

Contras

  • Esconde várias quests e cenas que podem ser totalmente perdidas se o jogador avançar para a próxima parte da história;
  • A câmera limitada acaba dificultando a visualização em alguns momentos mais breves;
  • Alguns errinhos de tradução e escrita.

The Legend of Heroes: Trails from Zero — PC/PS4/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela NIS America


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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