Retornando ao mundo além do espelho
Os episódios de Taisho x Alice contam a história de uma garota que acorda em um mundo sombrio e recebe o nome “Arisu” ao conversar com um rapaz chamado “Alice”. Os dois vagam pela escuridão até encontrar um conjunto de espelhos e, a partir daí, Arisu vai para o mundo de Looking-Glass, um lugar em que os contos de fada são distorcidos e as princesas e outras protagonistas dessas histórias são na verdade rapazes. Com isso, temos versões masculinas de Chapeuzinho Vermelho, Branca de Neve, Cinderela, entre outros.
Em um primeiro momento, isso tudo pode soar como apenas mais uma proposta de obra fanservice igual a títulos que criam versões femininas de navios e tanques, porém a verdade é um tanto mais profunda. Conforme o jogador avança pela narrativa, Taisho x Alice não apenas se mostra mais pesado do que pode parecer a princípio, como também a verdade sobre esse mundo todo vem à tona. Nada aqui é por acaso, e há detalhes estranhos desde o início que podem ser percebidos por jogadores mais atentos.
A Heads traz o contexto mais típico de um fandisc. Dividida em rotas para cada personagem, ela mostra um pouco de suas aflições após os eventos do epílogo. Além de mostrar como eles ainda têm algumas pontas soltas que não foram resolvidas, a obra consegue trazer aqui uma reflexão sobre os eventos passados. Particularmente, um dos melhores exemplos disso é a rota do Wizard, que mostra uma grande evolução e amadurecimento do personagem após os eventos originais.
A hora dos secundários brilharem
Já do outro lado da moeda, as histórias de Woolfe e Ryoushi são um conteúdo que os fãs desses personagens não tiveram acesso na obra original de nenhuma forma. Infelizmente, ambos são apenas secundários que auxiliam no avanço da narrativa. A protagonista Yurika Arisu não tem interesse neles para além de amizade, o que não deu margem para um destaque significativo deles anteriormente.
Pessoalmente, destaco aqui a rota do Woolfe por mostrar mais a fundo como esse personagem que parece ser apenas uma piada tem muito mais por trás das suas ações. Ele é um rapaz patético, pervertido e que está sempre fazendo piadas, mas também um amigo sensível que está sempre dando o seu melhor pelos amigos. Por conta disso, a rota acaba trabalhando um difícil equilíbrio entre uma alta dose de brincadeira e a perspectiva psicológica de dúvida, apreensão e anseios desse carismático palhaço.
Uma academia de excessos
Por fim, a Arisu Academy é uma ideia interessante de universo alternativo. A obra transpõe os personagens para um contexto escolar e brinca com clichês de shoujo, deixando isso até claro de uma perspectiva metanarrativa. Cabe ao jogador interagir com os personagens da forma que preferir, tendo a possibilidade de se aproximar de um deles. Aqui temos todos os “príncipes de contos de fada” da história original como opção, novamente relegando Woolfe e Ryoushi a papéis secundários como esperado.
De forma geral, esse conteúdo adicional é o de menor relevância do pacote, mas traz um respiro para a experiência, tendo em vista que evita os elementos mais sombrios da obra. Ver os personagens coexistindo de forma harmoniosa em um contexto tão simples de excessos cômicos é um complemento que os fãs que gostariam muito de rever os personagens e vê-los felizes provavelmente irão se divertir jogando.
Uma obra tratada com carinho
A narrativa geral de Taisho x Alice foi muito bem projetada por Fujifumi, também conhecida por ter escrito o clássico Shinigami to Shoujo, lançado exclusivamente no Japão pela Takuyo. A obra consegue amarrar muito bem as suas pontas e todos os elementos estão bem conectados para formar uma trama complexa, mas bem escrita. Justamente por conta disso, jogar apenas uma parte ou começar em um trecho que não foi projetado para ser o início da narrativa torna a experiência mais fraca.
Em particular, como já fiz nas outras análises sobre Taisho x Alice, gostaria de destacar a qualidade do texto em inglês. A tradutora Molly Lee fez um trabalho primoroso na escolha de frases e no tratamento das nuances das cenas. Todos os eventos possuem o peso adequado, trabalhando tanto os aspectos emocionais das cenas quanto os mais cômicos e caricatos. Como resultado, a experiência final consegue mexer com o leitor consideravelmente, algo que seria muito mais difícil com um texto quebrado e de difícil entendimento.
Para os fãs, com amor
Taisho x Alice: Heads & Tails é uma excelente adição para a narrativa e complementa bem a visual novel original. Com um texto em inglês de alta qualidade, é fácil rir e se sentir verdadeiramente envolvido na leitura. A obra é facilmente recomendável para quem já jogou os episódios principais da série e, para quem ainda não teve essa experiência, fica a sugestão de mergulhar nesse conto de fadas desde o início.
Prós
- Excelente tradução para o inglês que consegue trabalhar bem as emoções das cenas;
- A perspectiva dos personagens secundários durante os eventos e dos principais após o final verdadeiro ajudam a dar mais vida e nuance aos eventos da obra original;
- Personagens carismáticos e bem trabalhados;
- Piadas com timing excelente que ajudam a aliviar um pouco da tensão dos eventos mais sérios que continuam fazendo parte da história;
- Modo Arisu Academy brinca com clichês de shoujo para oferecer uma experiência alternativa engraçada e mais exagerada.
Contras
- Devido aos spoilers da história original e sua natureza como um “complemento”, não é razoável jogá-la sem passar por todos os outros episódios.
Taisho x Alice: Heads & Tails – PC – Nota: 9
Revisão: Thais Santos
Análise produzida com cópia digital cedida pela Primula