Análise: Rogue Legacy 2 (Multi) é um perfeito exemplar do legado dos roguelites

A sequência do clássico roguelite mostra toda a competência de sua desenvolvedora.

em 07/05/2022
Roguelikes e roguelites de ação são um formato bastante comum de jogo no mercado atual. Com a promessa de maior rejogabilidade, eles prometem experiências marcadas pela repetição, o que pode ser também seu grande ponto fraco. Afinal, se a campanha passa de cara a sensação de repetitividade, o jogador logo se cansa da proposta.
 
Dentro do gênero, um título de grande relevância é Rogue Legacy, que foi lançado em 2013 pela Cellar Door Games. Sua proposta era trazer o conceito de sucessão e legado conforme acompanhamos a expedição dos descendentes do herói. Esse conceito retorna em Rogue Legacy 2, que traz um exemplar perfeito das qualidades que os roguelites podem oferecer.

A construção gradual de um legado

Em Rogue Legacy 2, assumimos o controle de um herói ou heroína e depois os seus descendentes na luta para derrotar os temíveis estuários em nome do seu reino. Apesar do foco do jogo ser totalmente no gameplay, há vários textos espalhados pelas masmorras que explicam um pouco sobre as expedições de outras pessoas e até mesmo o passado desses inimigos.
Os textos são simples e muitos deles buscam adicionar uma pitada de humor à situação, mas sabem também apresentar bem as reviravoltas e adicionar outras nuances à jornada. Confesso que durante o meu tempo com o jogo fiquei bastante intrigado para saber mais sobre o que tinha acontecido no reino. A tradução para o português é bastante competente, transmitindo bem o estilo de escrita do jogo, tendo apenas alguns mínimos errinhos quase imperceptíveis devido a contextos específicos do gameplay.
 
Porém, o foco de Rogue Legacy 2 está no gameplay que possui um loop simples baseado no conceito de legado. Quando o personagem atual morre dentro da dungeon, o jogador deve escolher entre possíveis sucessores para assumir o seu lugar. Esses indivíduos possuem várias características específicas que ajudam a diferenciar um gameplay do próximo.

Em particular, destaca-se o sistema de traços que adicionam benefícios, malefícios e efeitos atípicos para o uso daquele personagem. As opções são bem variadas, indo de descontos em lojas a fazer qualquer golpe recebido se tornar fatal, passando por efeitos que distorcem os visuais das áreas e inimigos. Não é possível saber exatamente o efeito deles da primeira vez que aparecem, estando disponível apenas o nome e a imagem até a sua seleção.
 
O fim da vida do personagem também implica na manutenção do dinheiro obtido, que pode então ser investido de diversas formas, como comprar itens ou desbloquear novos recursos. Essas aquisições permanentes são essenciais para dar a sensação de progresso constante, algo que acompanha a evolução também do jogador para fazer a exploração e combate fluírem melhor a cada nova tentativa. Os desbloqueios incluem não apenas melhorias para os parâmetros dos personagens, como também novas lojas e classes adicionais que vão desde clássicos como o tradicional ranger (“mateiro” em português) até opções mais exóticas como cozinheiro.

O eterno retorno ao combate

Uma vez escolhido o personagem, o jogador precisa se livrar de qualquer dinheiro restante pagando o barqueiro para ir até a dungeon. Começando na cidadela Agartha, o herói ou heroína selecionado tem que enfrentar áreas geradas proceduralmente em um formato de metroidvania. Sem saber o mapa exato, é necessário explorar com cautela e todo recurso obtido pode ser importante mesmo que seu impacto venha na próxima geração.
 
Enquanto explora as áreas, o jogador irá encontrar alguns itens de herança que são necessários para progredir. Esses objetos ampliam as possibilidades de movimentação do jogador, adicionando pulo duplo, chutes contra objetos que ressoam, etc. Graças a eles, as áreas vão se tornando gradativamente mais complexas e ambiciosas, exigindo um esforço maior do jogador. Os chefes também servem como belos testes do aprendizado do jogador.

Um aspecto que chama atenção em Rogue Legacy 2 é que, apesar da aleatoriedade das áreas, as salas seguem designs bem pensados, valorizando a exploração de uma forma orgânica. Essa é uma diferença fundamental entre um roguelike de baixa qualidade e um que realmente sabe usar o sistema para oferecer variabilidade. Para o primeiro caso, é como se a geração procedural fosse uma muleta que não consegue disfarçar as fraquezas de uma experiência pouco polida.
 
Quanto ao desafio do jogo, vale destacar que ele oferece um sistema sólido de regras da casa. Em vez de selecionar “fácil”, “normal” e “difícil”, o jogador pode modular aquelas características do desafio que gostaria de alterar, como opções como a “saúde do inimigo” e o “dano do inimigo”. Também é possível retirar o dano de encostar nas criaturas, eliminar traços para o próximo descendente ou até se manter voando sem a relíquia correspondente. O resultado é um jogo cujas opções de dificuldade muito provavelmente incluirão uma experiência que melhor se encaixa ao que o jogador prefere.

O legado de um herói

Rogue Legacy 2 é um exemplo perfeito do que os roguelikes de ação podem oferecer. Com sistemas robustos de gameplay e uma proposta que não usa a geração procedural como muleta, é uma obra simplesmente imperdível.

Prós

  • Sistema de traços adiciona variabilidade a cada nova tentativa;
  • Expansões da mansão adicionam funcionalidades muito úteis como classes novas, serviços e melhorias permanentes;
  • Itens de herança obtidos obrigatoriamente nas fases mudam significativamente o gameplay;
  • Regras da casa permitem modular a dificuldade de forma exemplar;
  • Pequenos textos bem escritos que aguçam a curiosidade para saber mais da história;
  • De forma geral, uma boa tradução para o português.

Contras

  • Alguns pequenos errinhos na tradução advindos de contextos bem específicos do gameplay.
Rogue Legacy 2 — PC/XBO/XSX — Nota: 10
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Cellar Door Games

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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