Análise: Young Souls (Multi) é um ágil híbrido de beat ‘em up e RPG

O trabalho de estreia do estúdio indie 1P2P mistura gêneros em um jogo divertido, mas também com vários problemas.

em 18/03/2022

Uma dupla de gêmeos enfrenta goblins e outros perigos em Young Souls. Este título indie combina beat ‘em up e RPG em combates frenéticos e desafiadores. Produzido por dois desenvolvedores, o jogo empolga com sua ação ininterrupta e uma ambientação bem trabalhada, em especial o belo visual. No entanto, problemas de balanceamento, diversidade limitada e sistemas subutilizados impedem que o título alcance todo o seu potencial.

Dois jovens enfrentando uma ameaça do subterrâneo

Os gêmeos Jenn e Tristan são órfãos desde muito jovens e nunca foram bem recebidos pelas pessoas. Para combater isso, os irmãos se tornaram hostis, afastando ainda mais os outros. Mesmo assim, a dupla é adotada por um excêntrico cientista conhecido como Professor, que os trata com carinho e afeto. Os jovens não admitem, mas a vida melhorou bastante depois que passaram a morar com o estudioso.


Um dia, Professor desaparece misteriosamente e os gêmeos decidem procurá-lo. Em sua busca no porão da mansão em que moram, eles encontram um portal que os leva para um mundo subterrâneo habitado por goblins. Depois de salvar um ancião, a dupla descobre fatos terríveis: Professor foi raptado e os goblins planejam invadir a superfície. Jenn e Tristan não hesitam nem por um segundo e decidem enfrentar os monstros e salvar seu pai adotivo.

Em suma, Young Souls é um beat ‘em up cujo objetivo é descer o sarrafo em todos os oponentes que aparecem pelo caminho. Além de atacar e fazer sequências com a arma principal, os gêmeos são capazes de rolar para evitar perigos, se defender com escudos e até mesmo aparar golpes dos oponentes. Técnicas especiais podem ser ativadas após preencher uma barra de mana, já os movimentos de esquiva consomem pontos de fôlego, ou seja, agir de qualquer jeito não é prudente. Controlamos somente um dos irmãos, mas é possível alternar entre eles com o toque de um botão. Há também a opção de jogar cooperativamente com outra pessoa no multiplayer local.


O jogo apresenta também vários aspectos de RPG. Para começar, os gêmeos podem equipar diferentes itens, como espadas, machados, facas, armaduras, escudos e tênis mágicos. Os equipamentos contam com características distintas e combinar certas peças ativa bônus especiais. Além disso, a dupla sobe de nível e às vezes podemos participar de um minigame em uma academia para aumentar os atributos dos heróis.

Quando não estamos nos calabouços, podemos passear pela cidade e visitar estabelecimentos. O local mais importante é a Rua dos Goblins, pois neste local é possível comprar armamentos, poções e itens de proteção. Ao custo de moedas e recursos, os lojistas conseguem melhorar os equipamentos, o que desbloqueia novas habilidades passivas. Fora isso, há um estabelecimento que vende calçados enfeitiçados e uma loja de roupas, cujo efeito é simplesmente cosmético.



Alternando entre os gêmeos na pancadaria

Como beat ‘em up, Young Souls não faz feio. Os combates são frenéticos e empolgantes, e há boas possibilidades na hora de enfrentar os perigos. Com movimentos bem pensados, é possível criar sequências elaboradas, com direito a lançar os oponentes no ar e depois continuar atacando. A diversidade de inimigos é boa e certas batalhas são mais estratégicas, com monstros que só abrem a guarda após terem seus ataques aparados — observação e reação rápida são essenciais nesses momentos.

A progressão é bem direta, com fases lineares constituídas de arenas em sequência. Às vezes uma ou outra sala apresenta armadilhas e em alguns trechos podemos montar em um pequeno dragão, o que ajuda a trazer alguma variedade. Além disso, a aventura conta com áreas opcionais com desafios maiores.


Vários tipos de armas oferecem diferentes estilos de jogo. As espadas curtas são balanceadas; facas permitem criar combos longos e rápidos ao custo de força reduzida; espadas longas e machados são lentos, porém têm alcance e poder maiores. Dentro de cada gênero, há variações de armamentos com técnicas especiais distintas: lâminas mágicas lançam feitiços elementais e certas armas permitem invocar aliados temporários. A dupla também encontra armas secundárias, como bombas e um gancho, o que expande ainda mais as possibilidades.

Um ponto notável é que cada gêmeo equipa um conjunto distinto de itens. Sendo assim, é possível montar personagens distintos, o que traz versatilidade. No meu caso, Jenn era o tanque com uma armadura pesada de alta defesa e uma espada longa poderosa, já Tristan era uma espécie de ladino com facas que o permitiam se mover rapidamente e feitiços no lugar das técnicas especiais. Com isso, fui capaz de adaptar rapidamente a minha estratégia ao trocar o herói ativo.


No nível de dificuldade recomendado, o desafio é alto: não prestar atenção e atacar de qualquer jeito, em especial nos chefes, resulta em derrota. Por sorte, o reinício é bem rápido e existe uma opção para ir diretamente para qualquer ponto do mapa já visitado. Mesmo assim, o jogo conta com vários recursos facilitadores, como alteração da velocidade, vida e ataque de heróis e inimigos, além de vários níveis de dificuldade. Essas opções tornam a experiência acessível para diferentes tipos de jogador.

Uma aventura com algumas decisões questionáveis

Young Souls é um beat ‘em up competente, mas vários problemas atrapalham bastante a experiência. Um deles é a dificuldade desbalanceada: alguns chefes e monstros são capazes de matar os personagens com poucos ataques, mesmo estando no nível recomendado e com bom equipamento. Para piorar, às vezes não há nem tempo de reagir, pois os heróis ficam presos nas sequências.

Mais para o final da jornada há um trecho enfurecedor em que somos forçados a usar armas amaldiçoadas que deixam os protagonistas com um único ponto de vida com a intenção de adicionar tensão, mas no fim é só irritante, pois a quantidade de inimigos é grande e é muito fácil ser derrotado. As opções de acessibilidade permitem contornar isso, mas acredito que o ideal seria um melhor balanceamento do desafio.


São raros os beat ‘em up que oferecem grande variedade, e Young Souls não é um desses. Depois das horas iniciais, os confrontos do jogo não mudam muito e há extensa repetição de inimigos e situações. Não só isso, na maior parte das vezes basta repetir a mesma estratégia para sair vitorioso. Até existe uma tentativa de trazer diversidade com as armas e alguns estágios opcionais mais difíceis, no entanto essas características não são suficientes para acabar com a sensação de repetição. Há também momentos com inúmeros oponentes que criam um desagradável caos visual.

Por fim, os sistemas de RPG são subutilizados e desenvolvidos. Na teoria, há muito o que testar com diferentes tipos de armas, melhoria de equipamentos e habilidades liberadas ao usar itens simultaneamente. Porém, na prática, esses elementos têm pouco impacto por questões de design. As armas, em grande maioria, são extremamente similares entre si. O sistema de raridade, por exemplo, não faz sentido, pois é comum armas simples serem muito mais poderosas que armamentos de raridade maior. Certos inimigos são capazes de infligir estados negativos, como congelado e queimado, e algumas armaduras oferecem proteção contra eles. No entanto, normalmente é mais vantajoso utilizar algo com defesa maior, já que as alterações duram pouco tempo.


No fim, para mim, bastou escolher os itens mais fortes e pronto, ignorar os sistemas de RPG não teve impacto algum. Por exemplo, na metade da jornada encontrei um conjunto de armadura e algumas armas extremamente poderosas. Era um conjunto tão forte que não precisei mexer mais nenhuma vez no equipamento até o final do jogo, fui capaz até mesmo de completar as áreas opcionais mais difíceis com facilidade.

Um universo elaborado, mas com personagens irritantes

Fora os combates, Young Souls acerta com sua ambientação que mistura 2D e 3D para criar um mundo bonito que lembra desenho animado. Os personagens, em especial os protagonistas, apresentam animações expressivas, o que torna as cenas não interativas bastante envolventes. É uma pena que as localidades não saem do lugar comum com calabouços e cavernas tomadas por lava, mas ao menos os cenários são bonitos e detalhados.


A trama, em um primeiro momento, instiga com cenas iniciais que mostram um ponto avançado dramático da aventura. Mas, infelizmente, a tensão se esvai rapidamente: entre as fases aparecem alguns poucos diálogos arrastados e cenas que mal desenvolvem os personagens ou a trama. A localização em português é notável, contando com trocadilhos e frases bem adaptadas.

Para piorar, os gêmeos são irritantes, tentando expor sua agressividade e rebeldia xingando o tempo todo sem motivo algum — entendo a intenção de usar isso como um recurso de personalidade dos heróis, que são adolescentes, mas o resultado é uma dupla nada carismática e desagradável. Há uma tentativa de trazer algum peso ao explorar reflexões morais, mas a execução rasa torna difícil se importar.



Luta divertida

Young Souls é um beat ‘em up ágil e com boas ideias. O combate empolga com confrontos frenéticos e com desafio intenso, e boas opções de customização dos personagens oferecem possibilidades na hora de lutar. Além disso, a ambientação impressiona com seu visual elaborado que mescla 2D e 3D. Elementos de RPG tentam trazer mais complexidade à jornada, porém a execução morna desses conceitos os tornam quase irrelevantes. No mais, Young Souls diverte e é uma ótima opção para quem procura um beat ‘em up um pouco mais complexo.

Prós

  • Combate ágil e com boas possibilidades de combos;
  • Boa variedade de equipamentos possibilitam diferentes estilos de jogo;
  • Ambientação interessante e com ótimo visual;
  • Presença de vastas opções de acessibilidade.

Contras

  • Pouca variedade estratégica entre os combates;
  • Sistemas de RPG e de equipamentos são subutilizados e subdesenvolvidos;
  • Dificuldade desbalanceada em muitos trechos;
  • Muita confusão visual em alguns momentos.
Young Souls — PC/PS4/XBO/Switch — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Heloísa D'Assumpção Ballaminut
Análise produzida com cópia digital cedida pela Arcade Crew

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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