Análise: Biomutant (Multi) é um convite à aventura por um mundo fantástico

Com destaque em exploração e combates, seu brilho é ofuscado por detalhes técnicos e uma performance questionável nos consoles atuais.

em 24/05/2021

Jogos de aventura em mundo aberto são um dos meus gêneros atuais favoritos. O chamado da aventura sempre foi um tema que me motivou no cinema, nos livros e também nos games. Considero esse mote um clichê para servir de pontapé para as mais diversas histórias, mas o que me cativa é até onde se pode chegar a partir de um convite para partir rumo a algum lugar. E quando isso é o motivador para esse gênero de jogo, considere o convite imediatamente aceito por mim.


Em Biomutant temos isso a todo momento, esse chamado ao desconhecido em um mundo que acabou e que agora luta para não ver um novo fim para seus habitantes. Na análise de hoje vamos conhecer criaturas fantásticas que, no fim das contas, só querem continuar vivendo suas vidinhas medíocres em paz pelo tempo que for necessário. Há os que não querem que isso aconteça, e é aí que nosso herói entra em cena para unir, ou dividir mais ainda, esse mundo.

A jornada

O mundo como conhecemos hoje já não existe há muitos anos. A poluição causada por uma megacorporação chamada Toxanol poluiu o ar, as águas e o solo do planeta, culminando na inevitável extinção da raça humana. Mas a natureza sempre encontra um meio, e depois de muitos anos criaturas mutantes começaram a se desenvolver, recriando sociedades, costumes e meios para que a vida no planeta continuasse.
A poluição na Terra chegou a proporções catastróficas
Em meio a isso surgiu uma grandiosa e majestosa árvore, imponente, no centro do mundo, espalhando suas raízes pela terra e garantindo a sustentação da vida do planeta que quase morreu. A Árvore da Vida, como é chamada por todos, é considerada uma divindade, e agora está ameaçada por causa de gigantescas, grosseiras e violentas criaturas chamadas de Devoradores. Cada uma delas está matando a árvore em uma das pontas de sua colossal raíz, que literalmente abraça o planeta. A morte da árvore significa o mesmo destino para toda a vida na Terra.
A majestosa Árvore da Vida corre perigo
Nosso herói é uma criatura aparentemente comum, se comparada aos demais habitantes do mundo. Seu destino começou a ser escrito muitos anos antes, ainda criança, quando sua mãe deu a vida para defendê-lo de um tirano ser chamado Lupa-Lupin. Agora adulto, a criatura que aprendeu com sua matriarca uma curiosa arte marcial chamada de Wung Fu está mais forte, astuta e em busca de vingança contra o vilão.
Depois de muitos anos, o reencontro com Lupa-Lupin é inevitável
Mas o caminho até cumprir seu destino será tempestuoso, pois, ao retornar de uma jornada de autoconhecimento, ele se depara com a ameaça dos Devoradores e se vê em uma complicada tarefa para que possa concluir sua missão: derrotar os colossais seres e então encontrar Lupa-Lupin.

A jornada já se mostra bastante épica apenas por essa premissa, mas em Biomutant temos um questionamento sobre os ideais de nosso herói acerca de toda essa situação. Será que nosso destino está realmente decidido ou cabe apenas a nós fazer com que ele se cumpra? Salvar o mundo? Cumprir sua vingança? Ser um herói? E se nossa resposta para algumas dessas perguntas for ‘não’?

A viagem

Biomutant é um RPG de ação em mundo aberto onde assumimos o papel de uma criatura habilidosa no Wung Fu, uma arte marcial que mistura ataques corpo a corpo com armas brancas, malabarismo e armas de fogo. O objetivo do jogo é guiar o “herói sem nome” por um vasto mundo que nasceu depois que a humanidade foi extinta por causa da poluição. Suas companhias são um autômato com formato de gafanhoto e o narrador, que faz as vezes de intérprete das criaturas do mundo.

Nossas escolhas nos principais momentos do jogo influenciam diretamente o rumo da história, culminando em diferentes resoluções para alguns personagens e finais. Essas escolhas já começam no momento em que iniciamos o game, pois temos que criar um personagem para a história. Além da raça e de outros detalhes visuais, uma entre cinco classes deve ser selecionada para ser a base do herói. Cada uma tem suas particularidades únicas que podem ser determinantes no desempenho do jogador durante as horas iniciais da campanha, além de um visual que realça sua característica pessoal.
Quem é você em Biomutant?
O Pistoleiro é habilidoso com armas e é a escolha mais recomendada por ser a mais equilibrada. O Soldado possui mais poder de fogo, o Psicodoido é habilidoso nas técnicas especiais, o Sabotador usa a agilidade a seu favor e o Sentinela é o que aguenta mais dano. Além dessas características base, cada uma possui sua coleção de habilidades passivas que podem ser desbloqueadas no decorrer do jogo ao custo de pontos obtidos ao subir de nível. Fora isso, todas as classes compartilham das mesmas mutações, poderes especiais chamados de biogenéticas e habilidades com armas que adicionam uma variada gama de ataques e movimentos especiais, tornando o combate mais caótico e único.

A viagem pelo vasto mundo de Biomutant tem início quando você se envolve em uma guerra entre as diferentes tribos que se estabeleceram pelo mundo. Seu papel no meio dessa história é lutar para unir todas elas, ou não. É aí que os rumos da narrativa começam a moldar o destino que você quer que a história tenha. Você pode se unir a uma tribo mais pacífica, lutar para unificar todas por um bem comum ou se juntar à tribo mais radical para aniquilar as demais. Em determinado momento é possível decidir se a Guerra Tribal deve continuar ou não.
Um conflito para unir ou conquistar as tribos?
Essa opção de ser ou não o mocinho da história foi algo que achei bem interessante, tirando a obrigação de ter que ser sempre o herói que salva o dia. E se eu não estiver a fim ou não for com a cara do chefe tribal? Eu quero mesmo é meter o louco — mas como eu sou um bom rapaz, eu preferi unir todo mundo mesmo e ver como a história ia andar nessa linha que escolhi.

Em uma possível segunda campanha pretendo fazer escolhas totalmente diferentes. Um modo Novo Jogo+ é habilitado e nos estimula a fazer justamente isso após a conclusão da história pela primeira vez. Essas escolhas definem também seu alinhamento com os demais personagens de Biomutant. Dependendo de seu karma, habilidades específicas ficam disponíveis para serem desbloqueadas e usadas durante o jogo se você estiver mais alinhado com a luz ou com a escuridão de seu espírito, aqui chamado de Sistema Aura.
Se liga no tamanho do trabuco desse cara!
É possível ter todas? Sim. Dá trabalho? Sim. Isso chega a ser um problema? Não. O jogo é amigável em permitir que o jogador não se sinta prejudicado por ter escolhido determinadas habilidades em vez de outras. Claro que, por motivos óbvios, você acabará tendo que jogar mais para ter condições de obter todas as habilidades, mas enfim... Em determinado momento é possível até mudar alguns atributos base do herói, mas apenas após boas horas de jogo. Já deixo o aviso de que, se não gostar de determinada classe, o melhor mesmo é recomeçar a história logo.

Outro ponto que estimula nossa viagem pelo mundo de Biomutant é a obtenção de equipamentos. É uma das características mais viciantes e divertidas que temos aqui. Ao contrário de outros jogos do gênero, você não obtém itens prontos. Com exceção dos consumíveis como itens de cura e recuperação de energia, o que coletamos pelo mundo são sukatas — sim, com ‘K’.

Todos os equipamentos do jogo são baseados em peças e objetos como britadeiras, marretas, lanternas, escovas de dente, lâminas, cabos de vassoura, canos, braço de violão, grades, tachinhas, desentupidores, louças e tudo o que puder imaginar. Qualquer objeto que para nós não passa de lixo aqui vale ouro, ou no caso, verdinhas. Combinando diferentes peças é possível criar vários tipos de armas brancas e de fogo, como espadas, foices, maças, pistolas, espingardas e rifles.
Acredite! Isso é uma espada, e das boas!
Essas peças podem possuir propriedades especiais, como causar dano elemental ou ter um efeito benéfico à arma, como perfurar armaduras ou ter um alcance maior, por exemplo. E o mais interessante é que você pode usar, teoricamente, a mesma arma do começo ao fim do jogo, apenas trocando suas peças por outras de melhor qualidade. O mesmo se aplica às vestes do herói, que, por mais ridículas possam acabar ficando depois de montadas, o que realmente importa é quão benéficas serão para nosso personagem.

O mundo

Outro ponto forte em Biomutant é o mundo. Olhando para o mapa, é como se pudéssemos ouvi-lo nos chamando para explorar cada canto em busca de tudo o que há para se coletar. Admito, a vibe lembra The Legend of Zelda: Breath of the Wild, mas num escopo menos elaborado e menos detalhado que o jogo da Nintendo.

Além dos já citados equipamentos, estão espalhados artefatos e quebra-cabeças do Velho Mundo por todos os cantos, e a andar por locais facilmente reconhecidos como usinas, prédios e áreas residenciais nos faz imaginar como era a vida ali antes de os humanos terem sido extintos.
Do mundo que conhecemos, só restaram ruínas e lendas.
Graficamente não é excelente para os padrões atuais, mas a direção de arte proporciona momentos que compensam ser registrados usando o simplório modo foto do jogo. Algumas das imagens que vocês estão conferindo nesta análise foram feitas usando essa funcionalidade. Jogadores mais exigentes irão notar que a iluminação é um dos pontos fracos, não colaborando para deixar o jogo mais bonito; mas horroroso ele também não é. Alguns modelos de personagens com acabamento ruim também escancaram que nem tudo são flores em Biomutant.

O mapa está dividido em diferentes biomas que podem limitar nossa exploração pela falta de equipamentos para viajar pelo local. A área do Surfipélago possui diversos cursos d’água impossíveis de serem atravessados a nado, seja pela falta de habilidade em nadar — sim, nosso herói não sabe nadar direito — ou pelo fato de a água ser tóxica, exigindo que usemos um veículo aquático.
Rasgando a tranquilidade das águas
Os Campos Responsivos são uma área central de pradaria a perder de vista, ótimo para galopar com um Mjut. uma criatura com características de cavalo. Pedra Grossa é uma região de vales que rende ótimos pontos para sair voando — ou caindo — com nosso planador, e a Mata Apetigrossa é uma área de selva a oeste com árvores gigantescas e inimigos traiçoeiros. Essas e várias outras regiões estão apenas esperando para serem exploradas e ter seus inúmeros espólios e objetos do Velho Mundo coletados.
Cortando caminho pelos céus
As ações do passado pela Toxanol continuam causando problemas, com áreas contaminadas por gases tóxicos ou radiação, além de outras que sofreram algum tipo de anomalia climática, sendo necessário o uso de trajes especiais que nos permitam entrar nesses locais sem sofrer danos. As piores são as áreas que ficaram tão poluídas que não é possível nem mesmo respirar nelas.
Pronto para encarar uma região tomada por radiação
Felizmente, nosso herói tem à sua disposição vários seres que o ajudarão de alguma forma a obter os recursos necessários para lidar com a ameaça dos Devoradores, fornecendo equipamentos, veículos e itens para sua jornada. Essas atividades rendem várias missões secundárias que estendem, e muito, nosso tempo de jogo em Biomutant. Mesmo deixando várias para trás, minha aventura durou em torno de 30 horas. Acredito que, com tudo que ainda tenho para fazer, devo aumentar esse tempo em cerca de 15 horas para encontrar tudo o que o jogo tem a oferecer. Talvez mais, pois sempre acabo fazendo mais coisas nesse tipo de jogo.
São muitos os que surgem em nosso caminho para ajudar

O desafio

Um de meus maiores desafios com Biomutant não foi relacionado à história ou à exploração, mas ao combate propriamente dito. Destacado como uma das principais mecânicas do jogo, esse foi um ponto que me deu alguns problemas nas primeiras horas da campanha por não ser tão bom quanto aparenta.

Minhas primeiras impressões das mecânicas de combate não foram boas, com comandos um tanto imprecisos, principalmente no combate com as armas brancas. Levei um tempo para me acostumar com golpes que não acertavam direito os inimigos, agravados nos momentos em que multidões me atacaram ao mesmo tempo.

Mesmo sendo frenético, o combate é um pouco desengonçado, e isso sempre acarretava golpes acertando o vento quando o sistema de mira, que foca em um inimigo próximo, trocava de alvo repentinamente quando dava um golpe. Não há um sistema de trava, como em Zelda, God of War ou outros jogos com esse tipo de combate em áreas abertas. É algo que julgo precisar de alguns ajustes para que eu considere ideal.
O combate é divertido e frenético, mas ainda não é o ideal
Jogos como os da série Arkham, do Batman, funcionam bem dessa forma, mas aqui, mesmo tendo leves inspirações, ele te deixa várias vezes à mercê quando está enfrentando muitos inimigos de uma vez. O jeito foi me adaptar, o que levou um tempinho, e a partir daí o combate deixou de ser tão problemático, mas ainda longe do ideal. A câmera, que às vezes assumia uns ângulos bem ruins, e o desempenho abaixo do esperado passaram a ser o problema a partir daí.

Durante o período em que estive jogando e produzindo esta análise, também cobri algumas notícias sobre Biomutant. Em vídeos publicados em seu canal oficial, a THQ Nordic revelou as metas de performance do jogo nas plataformas em que foi lançado, e o PC é o que apresenta os melhores resultados.


Tudo bem que a taxa de atualização nos consoles base é menor (30fps), mas, por não se manter constante, isso causou incômodo, principalmente em combates contra muitos inimigos e em locais mais elaborados, como áreas abertas com muitos detalhes como árvores ou destroços e outros locais mais fechados, como bunkers e áreas subterrâneas. A queda de quadros tirava muito o tesão dos combates mais intensos e, quando estive viajando pelo mundo, tive como companhia constantes “engasgos” causados pelo carregamento de conteúdo.


Somando-se negativamente a isso, algo que me preocupou mesmo foi o fato de o jogo ter fechado sozinho várias vezes, mostrando que essa má otimização de Biomutant estava prejudicando bastante a performance do jogo no PS4, onde joguei. Pelo fato de o jogo realizar salvamentos automáticos recorrentes, pelo menos nisso eu não tive prejuízo, reiniciando o jogo praticamente no mesmo local onde ele “crashou”. Como recebi o jogo com muita antecedência, acredito que isso seja corrigido antes do lançamento, mas é algo ainda preocupante caso não seja sanado a tempo.

A gestão do inventário foi outro ponto que também não me agradou tanto. Os menus são divididos em abas que ajudam a organizar o que você quer ver, seja os atributos do personagem, seja o inventário; e é na gestão dos itens que eu constantemente me perdia, em meio a uma interface que várias vezes me “trollou”.
Verdinhas são usadas para comprar novas peças de equipamento
Quando achava que estava montando um item novo, na verdade eu estava equipando. E quando estava vendendo itens para fazer uma grana, acabei vendendo uma calça boa porque o ícone que indicava que ele estava equipado simplesmente sumiu e não percebi. Pobre calça, vítima de um menu confuso. Outra coisa que não gostei foi o fato de não poder usar todos os tipos de montaria/veículos em qualquer lugar. Meu senso de aventura foi ferido por me limitar nisso também.

A conclusão

Biomutant é uma divertida e recompensadora experiência para quem gosta de desbravar mundos em busca de itens enquanto se envolve numa boa história de aventura. De seus principais destaques, a exploração é excelente, e o combate tem seus problemas que podem ser driblados com uma dedicação extra e possíveis atualizações futuras, podendo enfim somar a esta criativa experiência. Um convite à aventura que vale a pena ser aceito, apesar de uma performance questionável nos consoles atuais e outros detalhes de caráter mais técnico.
Fora de moda, mas pronto para qualquer desafio!

Prós

  • Mundo imenso cheio de histórias, ambientes, personagens carismáticos e segredos para conhecer e descobrir;
  • As classes de personagem e as escolhas que definem a resolução da história adicionam um forte fator replay;
  • Coleta, criação de equipamentos e exploração estimulam a jogatina;
  • Localização em português traz ótimas adaptações das nomenclaturas inventadas para as localidades e os objetos.

Contras

  • Combate impreciso e desengonçado, chegando a ser problemático contra grupos com muitos oponentes;
  • Direção de arte prejudicada por problemas de iluminação e modelos de personagens mal acabados;
  • Performance questionável na versão base do PS4, com taxa de quadros instável na maior parte do tempo e crashes;
  • Interface do inventário, câmera e mecânicas de uso de montarias/veículos carecem de ajustes.
Biomutant – PC/PS4/XBO – Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PS4
Revisão: Ives Boitano
Análise feita com cópia digital cedida pela THQ Nordic

Fã de Castlevania, Tetris e jogos de tabuleiro. Entusiasta da era 16-bit e joga PlayStation 2 até hoje. Jogador casual de muitos e hardcore em poucos. Nas redes sociais é conhecido como @XelaoHerege
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