Análise: Dragon Quest XI S: Echoes of an Elusive Age – Definitive Edition (Multi) enaltece o gênero JRPG

O 11º episódio da franquia traz uma experiência que se mantém fiel a suas origens com uma aventura excepcional, emocionante e tecnicamente perfeita.

em 04/12/2020

Franquias realmente precisam se reinventar para se manter relevantes com o passar do tempo? Se sim, o quanto precisam mudar para se manter valiosas no mercado e interessantes para os jogadores? Temos vários exemplos de séries que mudaram com o passar dos anos para se adaptar a novos tempos, novas audiências, e novos jogadores. Como exemplo temos Resident Evil, Sonic e até mesmo The Legend of Zelda, que precisavam sair um pouco da sua zona de conforto e se jogar em um estilo de jogo totalmente novo para seus padrões. Alguns para bem, outros para mal, mas essas e muitas outras passaram ou passarão por isso um dia.



Dentro do gênero RPG Japonês, o JRPG, temos como principal exemplo dessa metamorfose a mundialmente famosa e aclamada série Final Fantasy, com diversas abordagens nos jogos de sua série principal, sempre experimentando algo novo. E temos Dragon Quest, que também passou por várias abordagens diferentes no universo criado por Yuji Horii em 1986. Juntamente com o genial, porém controverso, compositor Koichi Sugiyama, e com a arte de Akira Toriyama, a mesma tríade que deu vida ao primeiro título, temos em 2020 Dragon Quest XI S: Echoes of an Elusive Age – Definitive Edition.



Originalmente lançado no Japão em 2017 para o PS4 e 3DS, e em 2018 para PS4 e PC no restante do mundo, DQXI recebeu uma versão definitiva em 2019, mas apenas para o Nintendo Switch, o que deixou os jogadores da primeira versão nas outras plataformas deveras chateados – incluindo este que vos escreve. Felizmente, a versão definitiva desta verdadeira obra-prima chegou no fim deste ano para os demais sistemas onde foi inicialmente lançado, com a adição do console da Microsoft, inclusive no catálogo do serviço Game Pass.

Com diversas melhorias e correções, vamos ver nesta análise o motivo de DQXI S ser uma verdadeira carta de amor para os entusiastas dos antigos JRPGs da época dos saudosos Super Nintendo e PlayStation, principais consoles que nos trouxeram diversas aventuras dentro deste gênero que, por mais que sempre procure se reinventar, nada será capaz de superar a magia de uma boa e velha história envolvendo um grupo de heróis e seu objetivo, que geralmente é salvar o mundo das forças do mal.

A reencarnação do herói lendário

Nossa aventura acontece no continente de Erdrea, tendo início no magnífico reino de Dundrasil. Os monarcas foram recentemente abençoados com o nascimento de uma criança mais que especial, pois conta com a marca da Luz em sua mão. Segundo a profecia, a marca indica que o bebê é a reencarnação do Luminary, um herói lendário escolhido pela Yggdrasil, a grande árvore divina que traz equilíbrio para a vida no mundo de Erdrea, para proteger o mundo da ameaça de uma terrível entidade das trevas.



Sabendo do nascimento da criança, as forças do mal lançam um ataque fulminante no reino, fazendo com que a rainha realize uma fuga desesperada para salvar o bebê. A monarca morre para proteger a criança, que se perde na floresta. O reino de Dundrasil, considerado o maior e mais próspero de Erdrea, se vê reduzido a cinzas e escombros.

A criança então é encontrada por um ancião, habitante de uma vila escondida entre as montanhas. Ao perceber quem é o infante em suas mãos, o velho sabe a importância de cuidar e criar o pequeno até que a hora de cumprir seu destino chegue. Os anos se passam, e o jovem, que podemos chamar de Hero ou nomeá-lo como quisermos, chega à idade adulta e a roda do destino começa a girar com mais intensidade, fazendo-o deixar sua pacata e amorosa vila para cumprir seu papel como o Luminary, o Herói da Luz escolhido pela Árvore do Mundo.

A caravana da esperança

Um dos pontos altos de DQXI são os personagens que compõem nosso grupo. Cada um deles com personalidades e características envolventes, que até nos colocam em uma saia justa se precisarmos escolher nossos favoritos. O ladrão Erik, as gêmeas magas Serena e Veronica, o artista circense Sylvando, a implacável Jade e o sábio Rab. Cada um com seu momento de destaque quando surgem no caminho do Herói e depois se juntando à caravana para ajudá-lo a cumprir a difícil missão de proteger o mundo.



A construção de cada personagem tem como destaque suas habilidades com diferentes armas ou técnicas, que são desbloqueadas conforme subimos de nível e alocamos os pontos que recebemos para cada um. A exemplo tomaremos nosso protagonista, que pode lutar com uma combinação de espada e escudo, ou uma espada longa de duas mãos, além das técnicas que são possíveis graças ao poder do Luminary.

Uma vez usados, o jogador pode realocar os pontos ao custo de moedas de ouro para remontar a build de seu personagem. Isso é bem legal pois, digamos que você não goste das habilidades de Erik ao lutar usando facas e prefere investir nas habilidades com bumerangue. Interaja com as estátuas de salvamento ou sacerdotes nas igrejas para comprar de volta estes pontos e os coloque em que achar melhor. Investir em um determinado caminho para um personagem proporciona a liberação de técnicas, algumas exclusivas, para ele. Fica a critério do jogador como evoluir cada membro do grupo durante a aventura.



Ao desbloquear determinadas técnicas, alguns ataques em conjunto são habilitados, tornando possível a execução de magias e técnicas poderosíssimas durante as batalhas e podendo dar uma grande vantagem para o grupo, além de proporcionar apresentações muito divertidas de se ver. Isso estimula o jogador a desbloquear diversas habilidades de todos os personagens para ver todas as técnicas especiais disponíveis.



O mundo de Erdrea é vasto, com diferentes localidades, cada qual com histórias que mexem com as emoções do jogador. Algumas bem divertidas como a do príncipe medroso de Gallopolis, que pede ajuda ao nosso herói para que seus súditos não descubram que ele é um farsante na arte da cavalaria, ou a emocionante história da sereia que está aguardando a anos pelo retorno do humano pelo qual jurou amor eterno. Cada reino conta com suas particularidades e pessoas para conversar e conhecer um pouco da história do lugar.

As viagens por várias localidades do continente estimulam a exploração, que recompensa o jogador com materiais usados na Fun-Size Forge, uma espécie de forja portátil que permite criar qualquer equipamento no jogo. O item vem para substituir o Alchemy Pot de jogos anteriores, em que apenas adicionamos os materiais e torcíamos para dar certo.

Com a pequena forja a dinâmica é bem mais elaborada, exigindo não apenas que você saiba a receita e possua os materiais, mas que também capriche nas marteladas para produzir equipamentos de qualidade que pode ser superior à da receita original. São centenas de itens para produzir, e o jogador terá muito tempo para procurar pelas receitas e materiais se quiser as melhores espadas, lanças, bumerangues, machados, escudos e muitos outros itens do arsenal do game.



As tradicionais batalhas em turnos seguem a mesma receita dos jogos anteriores, com embates alternados contra diversos inimigos de uma só vez. Temos a comodidade de alterar o equipamento e a composição do grupo no meio da batalha, dando um dinamismo que tira a desvantagem de entrar em um embate usando personagens ou armamentos pouco eficientes para a ocasião. A opção de câmera livre adiciona apenas uma característica visual, sem alterar em nada no âmbito tático da batalha, como a eficiência de uma magia ou a taxa de acerto de um ataque. Recomendo deixar a câmera tradicional, por questões de praticidade.

O que torna esta versão definitiva?

A edição definitiva de DQXI traz várias melhorias e adições ao jogo original, e já quero destacar aqui um dos principais motivos que me afastou do primeiro lançamento do game, que foi a música. As composições de Koichi Sugiyama na Definitive Edition contam com os arranjos originais orquestrados, magistralmente executados pela Orquestra Sinfônica Metropolitana de Tóquio.

O tom épico que apenas essa mudança na trilha sonora faz adiciona um valor extremamente significativo ao título. Há a opção de ouvir a trilha sintetizada da primeira versão mas, sinceramente, não sei se você terá a audácia de mudar essa opção após experimentar a trilha orquestrada. Há também a opção de ativar a música de DQVIII, outro favorito pessoal meu, para tocar durante locais selecionados, como no mapa do mundo.



Mas caso você opte por jogar o game totalmente em 2D, eu aceito que você escolha a trilha “pobre”. Ao conversar com uma das estátuas ou religiosos nas igrejas que proporcionam o salvamento do jogo, é possível selecionar o modo 2D, no qual todo o jogo pode ser jogado desse modo, remetendo fielmente – nas devidas proporções, claro – aos jogos da época do Super Nintendo. Por não contar com as cutscenes elaboradas e a dublagem, o ritmo de jogo nesse modo é bem mais rápido.

A única coisa que não curti muito nesse modo, mas que é compreensível se formos analisar a proposta, é que o progresso no modo 2D não acompanha paralelamente o modo 3D, ou seja, você não tem a liberdade de ficar mudando de modo o tempo todo, tipo para ver como aquela parte em que você está no game é em pixel art, ou vice-versa. Tanto que, para jogar esse modo você precisa criar um novo log de aventura e jogá-lo em separado da versão moderna de DQXI S.



Um detalhe que precisa ser enfatizado é que para entrar no modo “nostálgico” você precisa já ter um jogo salvo, e todos seus itens, equipamentos e níveis dos personagens são transportados para o mundo em 16-bit. Sendo assim, jogar esse modo se mostra bem mais interessante quando você já está bem avançado no modo principal ou já tenha pelo menos terminado a história uma primeira vez.

Outra adição interessante é o Draconian Quest – o modo difícil, por assim dizer – em que você pode ajustar alguns detalhes para deixar o jogo mais desafiador. Algumas das opções incluem a redução de pontos de experiência de inimigos mais fracos, a derrota em uma batalha caso o protagonista morra, o banimento das lojas que faz você ficar totalmente dependente apenas dos itens que encontrar em baús e em drops de monstros, e até mesmo fazer com que os NPCs mintam para o jogador, como informar locais errados de itens e levando-o para armadilhas. Esse último é um golpe baixo, convenhamos!



A ativação das opções draconianas fazem o jogo ficar bem mais interessante, tornando as conhecidas práticas de grinding mais necessárias para o jogador que deseja um desafio formidável. Mas atenção! Ao contrário de várias outras opções no jogo, você só pode acionar as funções do Draconian Quest antes de começar a campanha, podendo desativá-las gradualmente caso esteja tendo muitas dificuldades, mas sem opção de reativá-las posteriormente. Uma dica interessante para quem quer experimentar o modo é ativar todas as opções que achar interessante e desativar apenas as que realmente estão te dando dor de cabeça. Se quiser reativar algo, só começando um novo jogo.

Jogar com essas opções desativadas torna o jogo relativamente bem mais fácil. Experimentei algumas no início da minha campanha para sentir a diferença e o desafio fica realmente formidável, principalmente para quem é "jogador raiz" desse gênero. Recomendo experimentar.

A história também recebeu alguns capítulos extras, focados em cada um dos membros do grupo. Eles ocorrem após um momento decisivo da história e deixam o ritmo um pouco mais lento para que você jogue os capítulos novos, mas com histórias que vão te fazer até ter um apreço maior por cada um deles. Eu quero destacar a do Sylvando pois ele, pra mim, é o personagem mais legal que já vi na franquia. Ele é muito amor, gente!



Outra adição interessante foi a da dublagem em japonês, que pessoalmente prefiro por ser menos incômoda que a americana. Apesar das discrepâncias de nomes e palavras – não manjo muito de japonês, mas algumas coisas são facilmente perceptíveis, como os nomes de locais e personagens – eu acho a interpretação dos atores japoneses bem mais convincente. A dublagem em inglês tem diversos sotaques que não me agradam muito, apesar de alguns serem bem característicos dos locais que visitamos.

Mas em todo caso tudo isso pode ser alterado a qualquer momento pelo jogador. Acredito que por uma questão de ordem criativa, este seja um jogo que não conta com localização, pelo menos dos menus e legendas, para nosso idioma. Além do fato de Dragon Quest não ser tão popular no Brasil como seu "rival" Final Fantasy.

Tudo isso faz com que nossa experiência no jogo possa ser muito bem aproveitada tanto na história principal quanto no grande conteúdo pós-jogo, proporcionando facilmente algo em torno de 100 horas de jogatina. Um prato cheio para quem gosta de explorar cada canto do game em busca de segredos e materiais para criar os equipamentos mais poderosos ou completar as listas de itens e o bestiário.



Um ponto relevante sobre esta nova versão do game é o fato de não oferecer uma opção para upgrade para quem já possui o jogo original. Por um lado, quem jogou o título no PS4 ou no PC, tem como desmotivação ao jogar a edição definitiva o fato de não conseguir migrar seu progresso. Como dito logo acima, é um título que rende muitas horas de investimento para quem quer coletar tudo o que o RPG tem a oferecer.

O jogador que estiver disposto a passar por tudo isso de novo tem como única opção comprar a nova edição e começar uma nova jornada. Felizmente, a Square Enix teve a decência de, pelo menos, oferecer a Definitive Edition por um preço menor que os habituais US$60 pedidos no lançamento da versão original, podendo ser comprado por US$40. Os valores são refletidos de forma proporcional no Brasil.

Um título para enaltecer o legado de Dragon Quest

Bebendo da mesma fonte que originou os jogos anteriores, Dragon Quest XI S: Echoes of an Elusive Age – Definitive Edition é um título obrigatório para qualquer fã de JRPG, especialmente para os que apreciam a franquia. Ao mesmo tempo que consegue ser nostálgico nos detalhes, é moderno onde realmente precisa ser, principalmente no departamento artístico e na jogabilidade, que mesmo mantendo muito da sua originalidade permite algumas alterações que não deixam o título seguir à risca a receita de bolo dos jogos anteriores e parecer que parou no tempo ou se manteve conservador demais.



Para quem tem interesse ou curiosidade em conhecer o game, uma versão de demonstração está disponível gratuitamente nas lojas digitais, permitindo que você experimente uma boa dose de DQXI S. A demo tem duração de aproximadamente 8 horas e todo o progresso obtido pode ser transportado para o jogo completo caso você queira continuar sua aventura.

Com uma história cheia de reviravoltas, até esperadas para os veteranos da franquia, temos um roteiro bem escrito e executado que faz deste um dos três melhores jogos da série principal pra mim, junto com o Hand of the Heavenly Bride (V) e Journey of the Cursed King (VIII). Não estando mais limitado ao Switch, os jogadores nas demais plataformas agora tem à sua disposição um JRPG digno de representar este gênero da melhor forma que sabe: sendo autêntico.

Prós

  • Campanha épica estrelada por um grupo de heróis com muita personalidade e carisma em um mundo repleto de histórias que divertem, emocionam e estimulam nossa viagem por Erdrea;
  • Sistema de combate em turnos simples e dinâmico;
  • Construção da build de cada personagem é bastante maleável;
  • Trilha sonora orquestrada de qualidade excepcional;
  • Direção de arte e características técnicas como gameplay e navegação de menus permanecem fiéis aos demais jogos da série principal;
  • Modo 2D adiciona um forte fator replay, e nostálgico para veteranos do gênero JRPG;
  • Gigantesca quantidade de conteúdo que rende facilmente cerca de 100 horas de jogatina.

Contras

  • Sem opção para aproveitamento do progresso de quem possui a primeira versão do game;
  • Ativação das funções do Draconian Quest se fazem necessárias para ter uma melhor experiência.
Dragon Quest XI S: Echoes of an Elusive Age - Definitive Edition – PC/PS4/XBO/Switch – Nota: 10.0
Versão utilizada para análise: PS4
Revisão: José Carlos Alves
Análise feita com cópia digital cedida pela Square Enix

Fã de Castlevania, Tetris e jogos de tabuleiro. Entusiasta da era 16-bit e joga PlayStation 2 até hoje. Jogador casual de muitos e hardcore em poucos. Nas redes sociais é conhecido como @XelaoHerege
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