Controle Arcade Made in Brazil: entrevistamos Edy Arqueman e Flavio Ambrozio da 2nd Impact

Empresários falaram sobre a criação e o funcionamento da empresa que se consolidou no cenário dos jogos de luta do Brasil.

em 17/08/2020

Começo essa matéria fazendo um mea culpa: sim, eu sou uma fraude! Só recentemente descobri que os Arcade Stick 2nd Impact — marca que eu já havia visto diversas vezes estampando camisetas, controles e banners de eventos — são, na verdade, genuinamente brasileiros!


Confesso que não sou um grande conhecedor do mundo dos jogos de luta. Também não acompanho o vibrante cenário competitivo que é o verdadeiro coração pulsante deste estilo que se mantém firme e forte desde sua ascensão, no início dos anos 90. Meu conhecimento nessa área segue o mesmo daquele moleque que jogava Street Fighter 2 nos fliperamas lá em 1992 com um brilho nos olhos.

Mas para quem acompanha esse universo, a 2nd Impact é quase onipresente: a empresa criada pelos paranaenses Flavio Ambrozio e Edy Arqueman já está há mais de 5 anos marcando presença na cena dos fighting games, com participação constante nas principais competições nacionais e firmando parcerias com grandes nomes dos eSports do país, como Didimokof e Brolynho.

Então, se você é um nostálgico dos fliperamas como eu, ou um verdadeiro entusiasta dos jogos de luta, confere aí o papo que batemos com o Flavio e o Edy. Falamos sobre o início da 2nd Impact, o processo de produção dos Arcade Sticks no Brasil, a relação deles com o cenário competitivo e muito mais!
Edy (esquerda) entrega o prêmio para Coil (direita), vencedor da categoria Guilty Gear Xrd REV 2 no TRT 2017

Game Blast: Como começou a história de vocês com esse mundo dos arcades e dos jogos de luta?

Flavio Ambrozio: Eu trabalho com arcades, nessa área dos jogos de luta e criando "sticks", já faz 18 anos. Quando eu tinha lá uns 15 ou 16 anos comecei a mexer com isso e sempre tive o sonho de fabricar essas peças, porque via muita coisa importada da China. Só que para produzir essas coisas no Brasil é muita grana, tem que ter muito conhecimento. Sempre fui levando por hobby. Um pouco antes de montar a 2nd, eu e o Rafael trabalhamos juntos e montamos a eFighters, só que não produzíamos praticamente nada, só a caixa e a personalização, as peças a gente importava praticamente tudo. Depois de quatro anos (na eFighters) saí, fiquei um tempo fora e abri a 2nd. O Edy já estava começando e saiu do trabalho também, aí montamos a 2nd que está até hoje aí.

GB: Hoje se dedicam somente à 2nd Impact, em tempo integral?

Flavio: Sim, o Edy com a esposa dele, eu também trabalho junto com a minha esposa. Meus dois irmãos também trabalham junto e a gente vive disso. Graças a Deus virou uma empresa e cada ano que passa está crescendo bastante.
Edy Arqueman (centro), com Flavio Ambrozio preparando um golpe especial atrás da cadeira
GB: São só os dois como sócios e a família trabalhando junto?

Flavio: Só eu e o Edy mesmo. E a nossa sociedade é engraçada, a gente não "reparte os lucros", vamos dizer assim. A gente dividiu: o Edy cuida de uma parte dos produtos e eu cuido de outra. Então eu trato com os meus clientes e o Edy também direto com os clientes dele. É legal isso porque cada um tem a sua forma de trabalhar. Lógico que a gente trata os clientes da mesma forma, mas o Edy trabalha mais na parte gráfica, por isso ele que pegou essa parte dos (controles) personalizados. E já tem a maneira de tratar com o cliente sobre arte, cores, essas coisas. Os controles de acrílico, mais customizados, ele que faz.

Edy Arqueman: Nós temos uma divisão fácil de entender. O Flavio fabrica e vende as peças avulsas, como manches, botões etc. A gente começou, na verdade, atendendo só um público que queria um arcade mais personalizado, um produto de acordo com o que o cliente queria. Mas fomos chegando num patamar, e sendo reconhecidos pela comunidade, que o pessoal que queria um arcade mais básico falava "mesmo que seja um arcade mais barato e sem customização, façam porque a qualidade é boa e a comunidade quer". E realmente a comunidade aderiu. Então ficou assim: o Flavio faz os arcades que têm a pronta entrega, com algumas opções de arte e cores de botões, e a parte do personalizado aí é comigo.
Um dos modelos personalizados da 2nd Impact
GB: E como é o processo de produção dos arcade sticks? As peças também são produzidas por vocês?

Flavio: Hoje a gente tem mais ou menos uns 90% de peças que a gente fabrica aqui mesmo no Brasil. Algumas coisas não tem como, é impossível a gente fabricar. Por exemplo, componentes como resistores, leds, essas coisas são comuns virem da China. Mas manche, botões, placa zero delay, a gente faz aqui mesmo. As partes dos manches como cotonete, bolinha, restritores, é tudo injetado aqui. Não tem como dizer exato, mas mais uns dois anos, a nossa vontade é não depender nada da China, tentar produzir 100% no Brasil. É um sonho ainda porque infelizmente muita coisa é difícil de fabricar aqui.

Vou dar um exemplo que não tem como fugir: os leds do manche óptico, não tem como fugir, só existe uma empresa que faz no mundo, que é na China. Lógico que existem outros modelos, mas não queremos ficar pulando de galho em galho, tem que focar num modelo e fazer. Então isso aí é um obstáculo que a gente tem, a gente depende daquela empresa.

GB: Como são as opções de customização? Vocês fazem hitbox (controle apenas com botões, sem manche) também, não é?

Edy: Nos arcades personalizados eu faço também hitbox, com o layout que o cliente quiser. Existe o layout padrão americano, tem gente que gosta do "AWSD", outros gostam dos direcionais no lado direito, que a gente chama de hitbox canhoto. Enfim, a parte de controles personalizados a gente faz ao gosto do cliente: com seis botões, com os botões mais para cima, com os botões mais separados... então a parte de personalizado fazemos ao gosto do cliente mesmo. E hitbox também.
Hitbox especial para canhotos
GB: Vocês também fizeram controles personalizados para o Brolynho e outros jogadores profissionais. Como é essa relação de vocês com o cenário competitivo?

Edy: Com o Brolynho foi bem interessante. A comunidade profissional de jogos de luta começou a procurar a gente porque queria controles, ficaram sabendo da qualidade. Sempre que possível a gente apoia a cena de Fighting Games. E o Brolynho, especificamente, veio para comprar um controle com a gente e escolheu um modelo que a gente tinha. Depois ele veio conversar porque queria mais um e a gente achou que seria legal ter um controle personalizado com a assinatura dele. A gente conversou sobre o jeito que ele queria o controle, os tipos de peça que ele gostava, com o peso e tamanho que ele gostava. Então passamos a fazer o arcade dele e, em contrapartida, ele levava o nosso nome. Foi bom para ambas as partes.

Depois disso teve mais alguns jogadores que acabaram procurando a gente, e teve alguns jogadores que a gente procurou. Foi o caso do Didi (o jogador Didimokov), que na época estava indo para os Estados Unidos. O nosso patrocínio é assim: a gente dá o arcade para o nosso parceiro com toda a parte de manutenção e troca de peças. A gente não paga um valor em dinheiro, mas o arcade fica à disposição dele, se quiser trocar o arcade ou a placa etc. E, em contrapartida, ele leva o nosso arcade para o mundo. É uma troca sadia.
Flavio Ambrozio (direita) e Brolynho (esquerda), vencedor do TRT 2017 na categoria Street Fighter V
GB: E a pandemia do Coronavírus, afetou de alguma forma a produção ou a procura pelos arcade sticks?

Flavio: Quando começou essa pandemia eu sinceramente fiquei um pouco preocupado: "caramba, vai baixar a produção, diminuir as vendas...". Eu vendo bastante peças para lojistas também, pessoal que monta compra 100, 200 manches comigo. A gente achou que ia dar uma baixada, mas não imaginávamos que com essa pandemia o pessoal ia ficar em casa e ter mais tempo para jogar. Então, pelo contrário, não sei exato, mas pode-se dizer que a gente vendeu três vezes mais que o normal. Mas caímos em outra situação: algumas coisas que a gente pegava do nosso fornecedor da China, não veio mais nada. A China parou de enviar, então ficamos com bastante dificuldade de importar. Mas, no geral, a gente só aumentou as nossas vendas, não podemos reclamar.

GB: Já chegaram a vender para fora do Brasil?

Flavio: Chegamos a vender algumas coisas fora, sim. Mas é tudo muito burocrático, mesmo enviado com nota, tudo certinho. O Edy pegou um caso, se não me engano foi para Portugal, que mesmo com nota e pagando imposto, deu trabalho para liberar. Eu enviei alguns também para os Estados Unidos. Mas o problema maior é o frete. Eu lembro que tinha um pessoal que queria testar os manches quando a gente lançou, e um manche dava 50 dólares. Era o mínimo para enviar para fora. Então US$50 para eles, que estão acostumados a pagar US$19 em um manche Sanwa, é absurdo. Só de frete eles iam pagar três (Sanwa). Essas coisas dificultam a exportação.

GB: Quais são os layouts preferidos dos consumidores da 2nd Impact?

Edy: No caso dos personalizados, o desenho dos botões, é o Vewlix (botões em curva). Noventa e nove por cento das pessoas prefere o Vewlix, tanto que já é o nosso layout padrão dos controles de entrada e dos personalizados. Mas se tem algum jogador das antigas que estava acostumado a jogar nos fliperamas nos anos 90, está querendo voltar agora e prefere os botões retos ou mais separados, nada impede. Mas a grande maioria prefere o layout Vewlix, manche óptico, com bolinha e restritor octogonal. Esse é o mais vendido, é o controle da casa, digamos assim.
Esse balltop é a cara do Ryu
GB: Me surpreende o mais vendido ser o bolinha, sempre achei que o cotonete era mais popular…

Flavio: No meu caso, que vendo mais os modelos de entrada, pego um público que está às vezes saindo de um pad ou que faz um tempo que não joga e quer testar um arcade, eles pegam cotonete. Eu vendo mais ou menos 80% dos controles com cotonete. E restritor octogonal é tipo 98%; o quadrado, no Brasil, não dá 1%, é bem raro quem gosta de quadrado.

GB: E as artes, quais são as que o pessoal pede mais?

Flavio: Essa que você tem aí é uma (N. da R.: trata-se de uma imagem do personagem Ryu, de Street Fighter V), ela e a do Akuma preta são as campeãs. Recentemente coloquei umas artes novas para tentar dar uma variada, porque ultimamente a gente só tem injetado botão preto e vermelho, que são os que saem. Então lançamos uns modelos novos para ver se saem umas coisas diferentes. Tem uma do Iori que é azul e vermelha, ou roxa e vermelha, para tentar mudar um pouco porque às vezes o pessoal enjoa.

(Sobre a diferença de preço do modelo de entrada para os customizados)

Flavio: Não muda muito, se não for competitivo. Uma coisa que vai dar uma diferença boa de valor é placa nativa de PS4. Para quem não joga competitivo, para que colocar uma placa original? Não vale a pena. É só para quem joga e não quer ficar no modo Legacy, que é um pouco mais chato na hora de campeonato.
Um dos modelos 2nd Impact de entrada mais requisitados
GB: Onde o pessoal pode encontrar a 2nd Impact?

Flavio: Hoje a gente vende os personalizados pelo Facebook. A gente chegou a fazer site, mas no final das contas vimos que não valia a pena. A gente gosta de conversar diretamente com o cliente, tirar as dúvidas, e o site acabaria dificultando, geraria um atraso a mais. Então, hoje, o personalizado somente pelo Facebook e os modelos de entrada somente pelo Mercado Livre.

Edy: O pessoal às vezes pergunta por que não vendemos por um site. É justamente por causa disso. A primeira coisa que a gente faz é desenvolver a arte dentro do que o cliente pediu, aí a gente elabora e envia para o cliente, que aprova. Vai para o próximo passo que é mandar para a gráfica. Depois, o próximo passo é se o cliente quer um corte especial no arcade ou algum outro tipo de layout. É feito do zero para o cliente, então atendemos pelo Facebook por causa dessa aproximação. A ideia é o produto ficar com a cara do cliente.
Você pode encontrar a 2nd Impact na página oficial da marca no Facebook e na sua loja oficial no Mercado Livre.
Revisão: Davi Sousa

Comunicador e colecionador. Já foi Sega kid e Nintendo kid, agora é retro "kid". Está no Twitter em @carloscirne e faz vídeos no YouTube no canal CirneStuff.
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