Análise: Prune (Mobile) é uma poética analogia sobre a vida humana com árvores

Cultive e dê forma à sua árvore em direção à luz do sol enquanto evita os perigos de um mundo hostil.

em 30/08/2020
Quando me deparei com Prune na Play Store logo me apaixonei por seu conceito artístico que, apesar de simples, é profundamente belo. No entanto, a premissa que constava na descrição não me animou, pois sugeria ser um daqueles títulos de simulação que não sou adepto, como o popular Talking Tom, só que aqui cultivando uma árvore de bolso digital.

Foi então que digitei seu nome no Google e acabei achando um vídeo de gameplay, que me surpreendeu imediatamente; Prune é, na verdade, um jogo de quebra-cabeças minimalista disponível para dispositivos móveis e desenvolvido pela Polyculture, um estúdio independente e fundado em 2014 pelo game designer Joel McDonald, que até então trabalhava na Raven Software com jogos da série Call of Duty (Multi). Joel define seu primeiro jogo como uma carta de amor às árvores, onde plantar e cultivar é a única forma de descobrir uma história oculta nas profundezas da terra.

Cultivando árvores em um mundo hostil

Prune apresenta 48 fases divididas em cinco capítulos com diferentes paisagens misteriosas e o principal objetivo do jogador é plantar e podar uma árvore em constante crescimento, a fim de permitir que ela chegue até a luz do sol para florescer. O grande problema, no entanto, é a existência de uma série de obstáculos pelo caminho, como orbes negras e vermelhas que, por sua vez, interrompem o progresso da planta; enquanto que as esferas negras quebram os brotos, as vermelhas envenenam os galhos e, se estes não forem cortados imediatamente, a planta morre.


No início, tudo é tecnicamente fácil, mas no decorrer das fases novos desafios são introduzidos, tornando a experiência mais provocadora e interessante. Por exemplo: no capítulo 3 existe um novo orbe que pode ser movimentado e funciona como um imã, atraindo os galhos das árvores para oferecer novas possibilidades de resolver os quebra-cabeças.

O título também garante outras variedades de situações que farão o jogador refletir e elaborar estratégias. Em fases mais longas, por exemplo, existem espécies de checkpoints, que no jogo são representados através do processo de polinização das plantas. Ao chegar próximo de um desses locais, a planta expele grãos de pólen que permitem plantar outra árvore e assim subir mais.

Além disso, após finalizar algumas fases, os ícones ficam com a coloração azul e apresentam um novo desafio ao jogador, no qual o objetivo se concentra em podar a árvore de maneira que ela chegue até uma flor azul e floresça de outra forma. Aqui as fases empregam uma perspectiva diferenciada em relação aos quebra-cabeças originais e, em algumas situações é preciso de inúmeras tentativas para concluir.
O Desafio da Flor Azul é liberado depois de completar a campanha principal.
O Desafio da Flor Azul é uma ótima opção para quem já terminou a campanha principal que, embora consiga transmitir tudo o que deseja em aproximadamente duas horas e ensine que menos pode significar mais, deve frustrar aqueles que esperam por mais longevidade. É óbvio que o jogo poderia ser ampliado com fases bônus para explorar com mais profundidade sua premissa e seu minimalismo criativo, mas Joel e sua equipe de desenvolvimento quiseram criar algo que fugisse de um mundo dominado por jogos AAA cada vez mais complexos.

Corte o que não é essencial

O título está disponível para smartphones e tablets e para jogar é necessário utilizar a tela sensível ao toque. Com o dedo, o jogador deve fazer rápidos movimentos em várias direções para plantar e cortar os galhos da árvore. Quanto maior for o número de ramos da planta, mais devagar ela cresce e mais rápido sua energia se esgota, impedindo que chegue à luz solar. Guiar os ramos em torno das armadilhas e cortar aqueles galhos que ficam nas sombras ou que crescem em direções opostas à luz é uma ótima estratégia.

Entretanto, duas árvores nunca crescerão da mesma forma e, com isso, a experiência se tornará mais imersiva, não como um programa de computador, seguindo uma sequência de passos lógicos. Ao plantar a árvore você terá que fazer seu melhor para ajudá-la a prosperar e protegê-la dos perigos do mundo e quando você falhar, significa que não cumpriu sua missão como guardião.

A estrutura do jogo não é típica de um videogame, ou seja, não há uma interface com pontuações, uma marca a ser batida ou qualquer forma de avaliar o desempenho do jogador. Ele tem um conceito simples com controles limitados, mas é feito sob medida para os desafios e se você tiver problemas em concluir determinadas fases, o título ainda oferece a possibilidade de passar para o próximo nível - que é mais difícil, mas pode lhe agradar mais. No final das contas, Prune não quer sobrecarregar o jogador com frustrações e é isso que torna o jogo perfeito.

Apesar de oferecer controles extremamente simples e intuitivos, Prune pode acabar sendo uma experiência mais adequada para tablets do que em smartphones, devido às telas maiores. Utilizei um celular e percebi que a tela acaba sendo um pouco problemática em momentos de cortes precisos e rápidos ou com a necessidade de dar zoom e arrastar a tela; quando o cenário complementa toda a tela, a árvore é minúscula e difícil de cortar; por outro lado, quando é utilizado o zoom para focar na árvore, é preciso movimentar a câmera para os lados, a fim de guiar seu crescimento e ver se tudo está bem encaminhado.

Músicas relaxantes entrelaçadas a um visual minimalista

A trilha sonora de Prune foi composta por Kyle Preston, um compositor contemporâneo e novato no mundo dos videogames, mas que entregou um material precioso e genuíno. Com um toque de músicas que remetem a yoga e a meditação, o jogador atinge um estado mental de total imersão e extrai emoções poderosas e relaxantes. Os efeitos sonoros também encantam e tudo é muito bem relacionado. O crescimento das árvores e o desabrochar das flores em sua superfície ao tocar a luz do sol é uma das características emocionais mais marcantes e transcendem o belo a um novo nível de apreciação.

Os visuais minimalistas desenhados exclusivamente para maravilhar os olhos do jogador estão intrinsecamente ligados à trilha sonora, à jogabilidade e a sua narrativa abstrata. A paleta de cores mescla tonalidades neutras com alguns tons de cores quentes e frias, principalmente nos momentos mais sutis como no desabrochar das flores na superfície das árvores. O mundo e a ambientação recebem cores sombrias, remetendo aos perigos dos locais por onde as árvores devem florescer.

A qualidade e o cuidado com que seu design foi projetado realmente encanta quem estiver jogando e, muitas vezes, a simples ação de contemplar as paisagens de Prune é uma das coisas mais satisfatórias e inspiradoras que o momento exige.

Um jogo sobre a beleza e a alegria de cultivar e florescer

Prune é uma experiência abstrata, na qual cada jogador poderá interpretar de diferentes formas os significados que correm por suas paisagens e pelo florescimento das árvores. Não existe certo ou errado, apenas use a sua imaginação e crie a sua própria teoria sobre a real intenção do desenvolvedor em contar esta simples história.

Particularmente, ao jogar este título muitas coisas vieram à minha cabeça e criei muitas analogias sobre a vida humana. Uma delas, relacionada a um livro recente que li, chamado O Momento de Voar. Nele a autora Melinda Gates fala um pouco sobre o processo de florescimento, ascensão e prosperidade humana, que é semelhantes às árvores representadas no jogo, em que é preciso cuidar e cortar o que não é essencial para progredir, superar as dificuldades e conseguir alcançar o que deseja.

Assim como no livro de Antoine de Saint-Exupéry, Prune remete à sua frase de maior impacto: "o essencial é invisível aos olhos". Isso significa que as coisas mais importantes da vida são simbólicas e emocionais como a liberdade, bons relacionamentos, amor próprios e várias outras questões. É necessário podar coisas que não agregam valor às nossas vidas e ficar com pessoas e sentimentos que realmente farão algo por nós para chegar no topo e florescer.
Prune e O Pequeno Princípe apresentam temáticas totalmente diferentes, mas trazem reflexões semelhantes sobre a vida humana.
De acordo com o criador do jogo, Prune é uma carta de amor às árvores, mas é difícil saber a verdadeira motivação do designer em contar esta história. O que nos resta é tentar entendê-la com os elementos que nos foram dados, como as paisagens sombrias e misteriosas que, para mim, remetem um pouco à degradação ambiental. Mas, independentemente das opiniões e ideias que presumi com a experiência, cada pessoa que jogar vai criar suas próprias interpretações e é exatamente isso que torna Prune tão único e especial.

Uma poesia digital simples, mas profundamente criativa e reconfortante

Prune é uma experiência serena, delicada no design e na composição musical, verdadeiramente desenvolvida para relaxar, surpreender e aguçar a imaginação. É uma viagem graciosa por um mundo lindo e desolado e uma poesia digital abstrata que estimula mil interpretações e reflexões sobre a vida humana. Embora tenha breves problemas de jogabilidade em pequenas telas e possa frustrar jogadores que esperam por mais longevidade, Prune é um jogo profundamente reconfortante e um dos títulos de videogames mais criativos e originais dessa geração para dispositivos móveis, mostrando que boas doses de simplicidade podem criar experiências inovadoras e universais.

Prós

  • Experiência agradável, criativa e original;
  • Comandos simples e intuitivos;
  • Puzzles e desafios interessantes e inovadores;
  • Visual minimalista, belo e contemplativo;
  • Trilha sonora relaxante e envolvente;
  • História abstrata para diferentes interpretações e reflexões sobre a vida.

Contras

  • Tamanho da tela de alguns dispositivos pode trazer breves problemas de jogabilidade.
Prune — Mobile — Nota: 9.5
Revisão: José Carlos Alves
Análise produzida com cópia digital adquirida pelo próprio redator.

é entusiasta e apreciador de jogos com conceito artístico minimalista e narrativas de significado profundo. Acredita na potencialidade de cada experiência interativa e tenta extrair delas sentimentos humanos e existenciais. No GameBlast também escreve notícias, análises e especiais; no tempo livre produz roteiros autorais de séries e filmes. Criatividade, imaginação e curiosidade são algumas de suas características marcantes.
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