Pac-Man (Multi): o famoso “come-come” completa 40 anos de muita diversão

Um dos mais icônicos arcades de todos os tempos chega à vida adulta com muita história para contar — da polêmica sobre seu nome no lançamento ocidental às suas inúmeras versões.

em 08/06/2020
Ah, os anos 1980! Já mencionei essa década maluca inúmeras vezes no GameBlast pelas mais diversas razões. No mundo dos games, consoles caseiros basicamente se limitavam ao Atari 2600 (antes do lançamento do NES), oportunizando que os arcades imperassem no quesito diversão eletrônica com poucos desafiantes.


Muitos clássicos surgiram na década anterior, como Pong, Boot Hill, Asteroids e Space Invaders (que fez um sucesso enorme no embalo de Star Wars, lançado um ano antes) e muitos outros se seguiriam, tais como Missile Command, Centipede e, consequentemente, Pac-Man. Muitos desses jogos receberam conversões para consoles caseiros, especialmente o Atari 2600, e, diante do iminente sucesso e popularidade, se arrastaram por diversos jogos nas mais diversas plataformas, inclusive nas atuais gerações, como é o caso de Pac-Man.

Histórias que rondam uma lenda dos jogos

Toru Iwatani.
Pac-Man, conhecido originalmente como Puckman no Japão, foi um jogo criado em 1980 por Toru Iwatani, então funcionário da Namco que, segundo as histórias que o rondam, teve a ideia do personagem após pedir uma pizza: a ausência de um dos pedaços daria a forma como o personagem é mundialmente conhecido. Três meses após, apresentou o design do personagem e o conceito do jogo.

Segundo o game designer, sua proposta buscaria integrar homens e mulheres ao entretenimento eletrônico, já que naquela época, os arcades eram povoados de “violência” e “guerras”, logo, um conceito universalmente aceitável (um personagem que “come”) seria recebido de bom grado por todos os públicos.

Como programador dos primeiros jogos da série, Iwatani trabalhou pela última vez em um jogo da franquia com Pac-Man Championship Edition, lançado em 2007 para X360. Após, abandonou a Namco e se dedicou a lecionar na Universidade Politécnica de Tóquio.
Pac-Man Championship Edition (X360).
Nos Estados Unidos, por outro lado, a Bally Midway atuou por muitos anos como uma das maiores publicadoras de arcades japoneses de sucesso em território ocidental e, diante da possibilidade de boa recepção de “Puckman” na América do Norte, o primeiro imbróglio que a empresa encontrou foi em decorrência da grafia asiática para a norte-americana: embora seja inquestionavelmente uma questão infantil, indivíduos mal intencionados poderiam “grafar” inconvenientemente as máquinas arcades de forma que o nome do personagem pareça um insulto.

A fim de contornar isso, a Bally Midway enviou uma dezena de nomes opcionais à Namco, que os recusou. A melhor opção, segundo a empresa japonesa, seria a grafia próxima ao traslado japonês (originalmente Pakkuman), concluindo, enfim, por Pac-Man em território ocidental — e com o sucesso comercial, esse nome foi empregado inclusive no Japão.

Labirintos, frutas, fantasmas, “bolinhas” e uma fome insaciável — inclusive por pontos

A ideia por trás de Pac-Man é bastante simples: no controle do famoso comilão amarelo, o jogador deve se esgueirar por uma série de labirintos engolindo uma série de “bolinhas” (ou “pílulas” para alguns jogadores, chamadas Pac-Dots). Ao se alimentar de todas, será levado para um novo labirinto. Seria terrivelmente fácil (e chato) caso não houvesse o desafio clássico: quatro fantasmas (Clyde, Inky, Pinky e Blinky) servem como obstáculo ao nosso herói nesse labirinto e, caso algum deles encoste em Pac-Man, uma vida é perdida.
A fim de oferecer meios para que o jogador consiga se defender, além das Pac-Dots e das “frutas” (alguns desses itens são sinos, chaves ou uma espaçonave que servem apenas para incrementar os pontos), também estão disponíveis quatro outras “bolinhas” maiores, chamadas Power Pellets, que não apenas oferecem invencibilidade temporária ao jogador, como permitem ao comilão de cara amarela engolir os próprios fantasmas — cujos olhos correrão até o centro do labirinto, surgindo um novo fantasma.

Com uma jogabilidade de fácil aprendizado, somada a uma inteligência artificial limitada e pré-orientada, Pac-Man se tornou um dos títulos arcade mais disputados no mundo. Como muitos devem saber, uma parte considerável dos charmes dos jogos da época era a possibilidade de registrar suas iniciais com a pontuação obtida, outorgando a um estranho qualquer, que se apresentasse na mesma máquina, “quebrar” recordes anteriormente registrados.

Assim como ocorreu com Space Invaders anos antes (o primeiro arcade no mundo a permitir registros de pontuação), Pac-Man se tornou uma febre entre competidores: alguns dos livros mais vendidos da época na categoria “populares” remetiam a estratégias em como obter as melhores pontuações, assim como nas rotas a serem seguidas para vencer os fantasmas em cada um dos labirintos.

Falar em competições de Pac-Man é o mesmo que falar em Billy Mitchell, o detentor do melhor (e perfeito) placar no título: 3.333.360 pontos. O feito foi obtido após seis horas de jogo contínuas em uma disputa contra o Canadá e tem seu recorde homologado pela Twin Galaxies, uma associação norte-americana criada em 1981, responsável por registrar placares em video games mundo afora.
Billy Mitchell.


Somado a isso, há uma curiosidade: o “nível perfeito” é considerado o 255º — após completar esse estágio, o jogo não consegue mais processar novos desafios. Inclusive, o 256º apresenta um lado esquerdo perfeito, no entanto, o lado direito apresenta glitches e mesmo algumas “pílulas” são impossíveis de serem absorvidas por Pac-Man.

Nenhuma jogada é impensada

Há pouco mencionei sobre as limitações da IA dos “antagonistas” de Pac-Man, mas qualquer pessoa que tenha ao menos experimentado o jogo sabe que um mínimo de estratégia e perspicácia são necessárias para desbravar seus labirintos.

Começando pelos fantasmas, que não agem de forma aleatória: Clyde (fantasma laranja) persegue Pac-Man quando está longe dele, mas geralmente se afasta quando ele se aproxima; Inky (fantasma “azul”) é programado para tentar cercar o jogador entre ele e Blinky (fantasma vermelho) que, por sua vez, persegue o protagonista de forma obstinada, ao passo que Pinky (fantasma rosa), flutua paralelamente ao jogador.
As Pac-Dots oferecem 10 pontos cada, enquanto as Power Pellets concedem 50 pontos (além de tornarem os fantasmas vulneráveis por alguns segundos). Além disso, as “frutas” (que incluem sinos e a aeronave de Galaxian) incrementam a pontuação. A ideia é traçar uma rota na qual seja possível “engolir” todos os “alimentos” disponíveis em situações em que as Power Pellets sejam consumidas em momentos críticos, seja para incrementar a pontuação ao se alimentar dos fantasmas vulneráveis (que concedem pontos) ou poupar uma vida.A cada 10 mil pontos, uma nova vida é concedida ao jogador, podendo variar de 15 mil a 20 mil pontos, a depender de como os circuitos internos do arcade original reagiam. Há registros em algumas das máquinas originais em que elas simplesmente deixavam de computar pontos para conceder novas vidas (embora os placares se mantivessem), sendo uma falha na programação.

Algo interessante que estava presente no jogo original eram os Coffee Breaks: um total de três animações que apareciam após os níveis 2, 5 e 9 — ao passo que a terceira animação aparecia várias vezes em níveis à frente —, que tinham a finalidade de que o jogador “relaxasse” um pouco durante as transições de estágios.

De que me adianta fazer tanto sucesso se minha família não me acompanhar?

Após o sucesso de Pac-Man, novos títulos e experimentações em outros estilos de jogos surgiram. Super Pac-Man, por exemplo, seguia algumas premissas do jogo original, incluindo fases bônus e a necessidade de utilização de chaves para a abertura de algumas portas. Mas outro arcade, lançado em 1982, apresentou aos jogadores um personagem quase tão icônico quanto: Ms. Pac-Man, que, curiosamente, foi lançado originalmente nos Estados Unidos, enquanto desembarcou no Japão somente em 1990, no Atari Lynx.
Ms. Pac-Man para SNES.


Inicialmente, Ms. Pac-Man não passava de um hack game desenvolvido pela General Computer sob a alcunha de Crazy Otto. A General Computer já havia sido processada pela Atari (que detinha os direitos sobre as versões caseiras de Pac-Man) em razão de outro hack (Missile Command) e, temendo uma nova demanda judicial, optou por oferecer o “novo personagem” (que possuía olhos azuis e pernas) à Bally Midway que, por sua vez, estava impaciente com a Namco que ainda desenvolvia Super Pac-Man.
Crazy Otto para Atari 7800.
Por iniciativa própria, a Bally Midway lançou o arcade Ms. Pac-Man, apresentando-a como a namorada do Pac-Man. A premissa do jogo era basicamente a mesma do original, senão por algumas mudanças estruturais na mecânica das frutas (que não mais ficavam “paradas” no cenário, podendo inclusive ser perdidas); os labirintos agora possuíam cores que se alternavam conforme os níveis; o jogo agora se dividia em “atos” (no lugar dos Coffee Breaks), que se iniciavam com a apresentação de como Pac e Ms. Pac se conheceram, passando pela perseguição de um ao outro pela tela, chegando ao ápice em como Ms. Pac-Man e o namorado aguardavam a chegada de “Junior”. Outra mudança significativa foi em relação aos fantasmas, que, além de Clyde (fantasma laranja) ser agora conhecido como Sue, agora possuíam orientação de “perseguição” diversa da original.

Após essa união amorosa, Pac-Man e Ms. Pac-Man tiveram dois filhos: Junior Pac-Man e Baby Pac-Man que, inevitavelmente, receberam seus próprios arcades — todos lançados pela Bally Midway. A estrutura básica dos jogos se manteve em relação aos originais, contudo, a sistemática de “atos” prosseguiu em Junior Pac-Man, que conta a história da relação entre Junior e Yum-Yum, filha do fantasma Blinky.

Resumidamente, os três atos relatam a aproximação, enquanto crianças, de Junior e Yum-Yum; no segundo ato, já no presente, Junior dá um balão de presente a Yum-Yum, sendo ambos espiados por Clyde; no terceiro ato, o fantasma tenta capturar Junior, que é protegido por Ms. Pac-Man, que enquanto despista Clyde, Junior e Yum-Yum podem se aproximar, com direito a corações apaixonados.
Junior Pac-Man e Yum-Yum.
Baby Pac-Man é, de longe, uma das máquinas mais disputadas entre colecionadores de pinballs e arcades justamente por ser ambas ao mesmo tempo. O jogador tem a opção de escolher entre o caminho de baixo e o de cima, com um labirinto equivalente aos demais jogos, deparando-se, no entanto, com os típicos fantasmas muito mais agressivos — e isso sem o auxílio das Power Pellets. O caminho “por baixo” o levará ao pinball físico (nas máquinas convencionais) ou virtual (nas conversões para consoles), onde, embora não perca vidas, não terá mais acesso ao labirinto senão ao perder a bola. Por sua vez, para poder novamente usufruir do pinball (tentando uma série de bônus), o jogador terá de perder uma vida ou concluir o labirinto convencional. Foi uma inovação à época ao explorar o melhor de dois mundos para os fãs de máquinas de jogos, reinventando o estilo Pac-Man.

Quando o arcade encontra a plataforma — assim como a tela de toque

Após uma certa “saturação” nas mecânicas dos jogos da série, a Namco e a Bally Midway arriscaram inserir o famoso personagem num gênero recém-inaugurado nos arcades: plataforma. Pac-Land foi a forma que ambas as empresas encontraram para tornar a marca relevante, sem desgastar (ainda mais) o gênero que definiu seu sucesso.
Pac-Man 2: The New Adventures


Observando a jogabilidade de Pac-Land, não é difícil concluir que se tornaria nada menos senão um jogo de aventura genérico que, embora inserisse novos elementos (como a tal “fada” que Pac-Man deveria proteger ao longo de sua jornada sob seu chapéu), apresentava em sua nova aventura muitos dos itens e inimigos icônicos, como as Power Pellets e os fantasmas.
Pac-Man World para PS.


Uma sequência canônica da série foi lançada décadas à frente para Nintendo DS, chamado Pac ‘n Roll, que faz uso constante da touch. O enredo tenta dar um ar de profundidade ao universo de Pac-Man, mostrando como foi seu treinamento quando garoto sob os cuidados de Pac-Master na busca por proteger Pac-Land.

Você não é mais um garoto — mas ainda diverte

Pac-Man é um jogo icônico: fez história nos arcades e, curiosamente, não saturou o mercado oferecendo “mais do mesmo”. A despeito de suas máquinas apresentarem premissas equivalentes, as estruturas dos labirintos e a inserção de “atos” com histórias divertidas apresentou aos jogadores caracteres que não existiam até então — isso sem mencionar a “loucura” que Baby Pac-Man foi na época de seu lançamento.
Ponta em Super Smash Bros. e...


Suas versões clássicas Pac-Man e Ms. Pac-Man, no entanto, estiveram em tantas plataformas quanto possível, passando pelo Atari 2600 e repousando no X360, como já mencionado. A própria Apple chegou ao ponto de criar um hack do jogo original — chamado Taxman — para seu Apple II.

Mesmo as bizarras experiências na forma de jogos de plataforma repousaram nos consoles caseiros, como o SNES e o Mega Drive com seus Pac-Man 2: The New Adventures ou mesmo o exclusivo Pac-In-Time (SNES), que embora trouxesse gráficos consideravelmente melhores, ainda era um jogo de plataforma bastante medíocre e de jogabilidade “travada”.
... "vilão" em Hollywood no longa Pixels.


Após 40 anos, não há dúvidas de que o Pac-Man original — e até mesmo suas sequências com namorada e filhos — são os títulos definitivos para quem pretenda um arcade desafiador e divertido. Ninguém superará Billy Mitchell em seu recorde. No entanto, para explorar as arenas de Pac-Man, tudo o que o leitor precisa é de um console e um joystick: a diversão virá por si mesma.

Revisão: Ives Boitano.

Mineiro, apaixonado por livros, música, filmes, discussões, Magic: The Gathering e, claro, jogos eletrônicos.
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