Análise: Those Who Remain (Multi) traz de volta seu medo de escuro com um enredo tenso e envolvente

Apesar de contar com uma ótima trama, algumas falhas comprometem a experiência.

em 11/06/2020

Todo mundo, quando criança, já deve ter sentido medo de escuro em algum momento, e trazer tal medo de volta é a proposta de Those Who Remain. O jogo, desenvolvido pela Camel 101, é um terror psicológico que tenta o tempo todo manter uma atmosfera de insegurança presente, mas acaba falhando ao cair na repetitividade. Confira em nossa análise os pontos fortes e fracos do título.


Um mistério em meio a escuridão


Em Those Who Remain, controlamos Edward, um homem que, após um acidente com sua família, tem problemas no casamento e vive um relacionamento extraconjugal. Ao receber uma ligação de sua amante para visitá-la em um motel em Dormond, Edward chega ao local para terminar a relação de uma vez por todas, mas logo nosso protagonista percebe que há algo de errado com o local.

O estabelecimento encontra-se completamente deserto e no quarto de sua amante o telefone toca, com uma voz de criança dizendo "Fique na luz". Ao ver que seu carro está sendo roubado, Edward corre até a estrada para procurar ajuda em Dormond. No caminho, e por toda a cidade, só o que ele encontra são vultos com olhos brilhantes e equipados com armas brancas, espreitando no escuro e esperando por uma oportunidade para atacá-lo no quando ficar fora de um ponto de luz.


Enquanto tenta iluminar seu caminho, por meio de puzzles, para escapar da "cidade-fantasma", Edward descobre que uma jovem garota chamada Annika, que havia se mudado para Dormond com a mãe, e sofria constrangimentos por parte de colegas de escola e acabou morrendo. Agora, nosso protagonista se vê no meio da resolução do que está acontecendo na cidade e da relação dos acontecimentos e aparições com a morte de Annika, enquanto tenta escapar do local.

O enredo é muito bem trabalhado e desenvolve-se de forma fluida, contando os fatos em um ritmo que prende sua atenção a cada novo detalhe apresentado. A atmosfera criada traz uma sensação de insegurança que funciona bem na primeira hora, te fazendo ter todo o cuidado ao abrir cada porta ou virar em algum corredor para não ser pego pelas entidades, mas que torna a experiência previsível e repetitiva bem rápido, facilmente deixando de lado o apelo do cuidado com o escuro.

Those Who Remain deixa no ar diversas possibilidades do que pode estar acontecendo em Dormond, mas a conclusão acaba sendo mais surpreendente do que os caminhos que o jogo te faz pensar que serão seguidos. As explicações e motivações de tudo que está acontecendo são satisfatórias, mas deixam alguns questionamentos em aberto ao apresentar elementos na história que não foram aprofundados ou sequer questionados pelo protagonista.


Perdoar ou condenar?

Focado na narrativa, Those Who Remain conta com um sistema de decisões, cujas combinações resultam em dois possíveis finais da campanha. A cada novo ambiente investigado, conhecemos a história de vida de pessoas envolvidas, direta ou indiretamente, na morte de Annika, como colegas de escola que a importunavam diariamente ou pessoas de grande importância na cidade que tentaram omitir ou acobertar os fatos.

Em certos momentos, Edward assume um papel de juiz, no qual deve decidir se determinadas pessoas que tiveram algum envolvimento com o caso da Annika devem ser perdoadas ou condenadas ao Inferno, fazendo de Dormond uma espécie de purgatório. Para tanto, deve-se explorar os cenários para encontrar textos e documentos que expliquem a história de vida de cada um desses indivíduos, suas relações com Annika e os motivos que os levaram a cometer certas ações contra a menina.


Pode até parecer estranho que o protagonista, que apenas queria pôr fim a uma das mentiras de sua vida, de repente se veja em meio à solução do caso da morte de uma adolescente enquanto tenta se manter longe de entidades que espreitam na escuridão. Porém, o encerramento da trama traz uma boa explicação do porquê ele segue este caminho e faz uma ótima analogia sobre temas como o nosso tempo neste mundo, humanidade, ética e o impacto das nossas ações sobre a vida das demais pessoas.

Fique na luz!

Those Who Remain é recheado de quebra-cabeças, em sua grande maioria com dificuldade quase inexistente, e apenas os últimos desafios do jogo gastam poucos minutos a mais para serem desvendados. Os puzzles são sempre focados em liberar o caminho utilizando pontos de luz, como postes, lâmpadas e veículos, ou na busca por textos para ter o máximo de informações das pessoas a serem julgadas.

Quem assistiu Stranger Things vai reparar que a série é uma das principais inspirações para um elemento bastante utilizado no jogo: o Mundo Invertido. Este mundo, que é acessado por meio de determinadas portas, funciona como uma dimensão paralela, na qual suas ações acontecem também no mundo real. Por exemplo, se você mover uma tábua no Mundo Invertido, a mesma tábua é movida no Mundo Real. Tal mecânica é utilizada na resolução de diversos puzzles.


Assim como em Stranger Things, o Mundo Invertido de Those Who Remain também tem seus próprios "Demogorgons", criaturas bizarras que vagam em certos cenários procurando por intrusos e protegendo seu território. Os quebra-cabeças que misturam ambas as realidades são muito bem feitos e criativos, apesar de, ainda assim, serem muito fáceis.

Terror comprometido por uma péssima jogabilidade

Apesar de simples e bastante intuitiva, a jogabilidade de Those Who Remain te faz sofrer mais que o "terror" do título. A movimentação do personagem e da câmera é muito travada, ao menos jogando no controle. Mesmo aumentando a sensibilidade da câmera, o movimento continua lento e pouco fluido, atrapalhando na interação com objetos no cenário.

Falando em interação, a deste jogo faz quase nenhum sentido. Nos cenários, há centenas de objetos que podem ser levantados sem nenhuma necessidade, e os mesmos objetos em outros cenários não sequer permitem interações. Os elementos sobrevoam em sua frente e todos parecem ter o mesmo peso, permitindo até que dê uma volta completa pelo objeto ao invés de rotacioná-lo na sua frente.


O design dos cenários é interessante e rico em detalhes, mas por diversas vezes nos vemos entrando em ambientes que não têm nenhuma utilidade, mesmo após fazer algum mini puzzle para poder acender uma luz e adentrá-lo. As quase quatro horas de jogatina poderiam ser reduzidas se não houvesse tantas salas e áreas que exploramos sem a menor necessidade.

Os comandos resumem-se ao botão de interação/agarrar itens, arremessá-los e correr. Você pode correr o quanto quiser e nunca ficará cansado, mas durante uma perseguição em específico, o personagem fica ofegante e exausto. Não é possível pular ou agachar, o que seria muito útil (e praticamente obrigatório) em sequências de perseguição ou nas quais devemos nos esconder.


Já nas questões gráficas, Those Who Remain não possui a qualidade de grandes títulos, mas também não desaponta. Foram poucos os bugs gráficos que aconteceram, com destaque negativo para os braços do protagonista ficando presos em uma escada, quando nem ao menos nós podemos ver seus braços, já que o game tem visão em primeira pessoa. A qualidade de áudio também é boa, com a música se intensificando adequadamente nos momentos mais tensos.


Para encerrar, o que mais você deveria temer durante o jogo, que são as entidades de olhos brilhantes e os monstros do Mundo Invertido, não dão mais tanto medo após você presenciar sua primeira morte, na qual a tela apenas fica preta e recarrega o último checkpoint. Não há uma animação de morte ou sequer alguns jumpscares, reduzindo pela metade o fator de terror do game, que acaba sendo sustentado apenas pela parte psicológica.


Vale a pena jogar Those Who Remain?

Those Who Remain apresenta um terror psicológico envolvente e tenso, com um enredo muito bem desenvolvido, mas que deixa algumas questões em aberto. O desenrolar e conclusão da trama trazem uma ótima analogia sobre nossas ações durante o tempo que temos neste mundo.

Infelizmente, muitos pontos comprometem o potencial que o jogo manifesta. Várias falhas de jogabilidade e repetitividade de cenários e ações reduzem pela metade a real experiência que o título queria ter mantido por toda a jogatina.


Prós

  • Enredo tenso e envolvente;
  • Ótima fluidez no desenvolvimento da campanha;
  • Puzzles criativos;
  • Bom tempo total de jogo;
  • Comandos simples.

Contras

  • Jogabilidade travada;
  • Interação com objetos que não segue um padrão;
  • Excesso de cenários inúteis;
  • Repetitividade que torna o jogo previsível;
  • Desafios com baixíssima dificuldade;


Those Who Remain — PC/PS4/XBO/Switch — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: PS4

Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Wired Productions

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