Análise: Pirates Outlaws (PC) — comandando um navio pirata em um ótimo roguelike de cartas

Tente sobreviver aos perigos do oceano neste estiloso roguelike de conteúdo extenso e variado.

em 23/04/2020

Corsários em busca de fama e riqueza é o foco de Pirates Outlaws, jogo que combina cartas e estratégia em uma experiência com elementos de roguelike. As mecânicas são simples de entender, mas muitas nuances e diferentes tipos de conteúdo oferecem possibilidades estratégicas e alto grau de rejogabilidade. O título é fortemente inspirado em outros jogos do gênero, como Slay the Spire, no entanto ele consegue se destacar com várias características interessante. Lançado anteriormente para dispositivos móveis, o jogo chega ao PC em uma versão mais completa.

Desbravando mares perigosos

O conceito principal de Pirates Outlaws é bem simples: escolha um capitão e explore um oceano a bordo de um navio pirata. Cada aventura se passa em um mapa com espaços contendo atividades diversas, como batalhas, eventos aleatórios ou lojas, sendo o objetivo final derrotar o chefe no fim do percurso. O mapa é apresentado de antemão, o que permite planejar com cuidado a rota — algo essencial, pois cada movimento consome parte da energia do barco, e caso ela chegue a zero ele pode afundar, o que termina prematuramente a partida. Cada partida conta com três áreas e chegar vivo até o final é um grande desafio.

Em muitos momentos, o capitão precisa enfrentar inimigos em combates por turnos. As ações são definidas por cartas, como atacar, atirar com uma pistola ou executar técnicas especiais. Um elemento importante dos embates é a munição: armas de fogo e algumas habilidades consomem esse recurso limitado, que é mantido entre os turnos. Sendo assim, é importante gerenciá-lo com cuidado, afinal nem sempre aparecem cartas para recarregá-la. Algumas cartas, como os ataques físicos, não necessitam de munição para ativar os seus efeitos, mas normalmente há alguma condição envolvida, como alcance limitado. As próximas ações dos inimigos são explicitadas na interface, o que permite pensar com cuidado os próximos movimentos.


A evolução do capitão durante as partidas se dá na forma de novas cartas adquiridas durante a jornada, que conta com montagem dinâmica de baralho. Os diferentes tipos de cartas expandem as opções de estratégia e muitas delas apresentam sinergias entre si. Além disso, é possível adquirir relíquias que ativam efeitos passivos diversos, como aumentar tipos específicos de ataque, permitir comprar mais cartas em um turno ou receber descontos de mercadores. Por fim, os efeitos das cartas podem ser melhorados em forjas espalhadas pelo mundo.

Como qualquer outro roguelike, Pirates Outlaws conta com morte permanente e aventuras com mapas montados de forma procedural. Há progressão entre as partidas: a pontuação acumulada entre as tentativas desbloqueia conteúdo que pode ser encontrado em partidas futuras, como novas cartas, personagens, mapas e pequenas melhorias. A quantidade de itens a serem liberados é extensa, com mais de 500 cartas e 150 relíquias. Fora as aventuras da modalidade Explore, existe também a Arena, que é focada unicamente em combates em sequência — aqui o objetivo é chegar o mais longe possível.


Um visual colorido, estilizado e simples traz personalidade ao mundo do jogo. A direção de arte usa formas geométricas e cores contrastantes para trazer interpretações interessantes de temas clássicos de piratas. Os diferentes personagens se destacam com sua criatividade, como um imenso marujo que segura um tubarão como arma, uma garota acompanhada de um urso, uma vidente e suas cartas mágicas, um capitão com pinças de caranguejo no lugar dos braços e assim vai. As aventuras também exploram diferentes temas: oceanos amaldiçoados, mares do Oriente com seu tom laranja, águas congelantes do norte. Uma trilha sonora com composições com tom de aventura, mistério e ação complementam a ambientação. As animações praticamente inexistentes denunciam as origens de título para dispositivos móveis, mas o resultado final é competente.

As dificuldades de uma vida de pirataria

As aventuras em Pirates Outlaws são complicadas, sendo que a graça está justamente em superar as dificuldades e avançar. Os maiores perigos estão nos combates, pois os inimigos são letais e bastam alguns poucos erros para acabar repousando no fundo do oceano. Sendo assim, é importante entender as nuances do sistema de batalha, que tem regras básicas fáceis de entender, mas inúmeros detalhes e mecânicas o torna denso e interessante. Há muito o que dominar: o gerenciamento de munição; os diferentes estados positivos e negativos; as sinergias entre as cartas, relíquias e personagens; os padrões de ataques dos oponentes; a montagem de baralho e mais.


Mesmo já habituado a jogos desse estilo, tive dificuldade em avançar em Pirates Outlaws em um primeiro momento por causa de suas batalhas brutais e jornada punitiva. Porém, aos poucos, com tentativa e erro, consegui entender as regras nas entrelinhas, o que me permitiu chegar cada vez mais longe. A mecânica de munição é uma substituição inventiva à energia utilizada em outros jogos com cartas, pois sua escassez nos força a pensar também nas ações dos turnos futuros. É interessante também a questão da evolução do personagem por meio do baralho e relíquias. Aqui, somos forçados constantemente a colocar novas cartas na nossa coleção, o que pode atrapalhar a execução de estratégias — por exemplo, cartas de munição são raras, logo, é difícil recarregá-las em um baralho inchado. Precisei aprender a lidar com essa questão, tentando eliminar cartas sempre que possível ou então aumentando seus efeitos.

A variedade é característica que mais apreciei no jogo. A grande quantidade de cartas permite montar inúmeras estratégias, e a cada partida eu tentei algo diferente. Em uma delas meu foco foi aumentar meu poder de ataque em combinação com habilidades que criavam golpes físicos temporários. Já em outra jornada, me especializei em armas de fogo em combinação com cartas de munição. Também já consegui montar um baralho capaz de debilitar os inimigos continuamente enquanto eu os derrotava com cartas básicas. Desbloqueio constante de novas cartas expande as opções, o que me fez voltar frequentemente ao jogo para tentar coisas novas.


Porém, existem alguns problemas nestes oceanos perigosos. A próxima ação dos inimigos é exibida explicitamente na interface e ela é essencial para agir da melhor maneira possível. No entanto, nem sempre as informações são exibidas em sua totalidade. Uma vez, por exemplo, meu personagem morreu depois de atacar um oponente, pois este tinha uma habilidade que dava dano de contato — não havia indicação alguma desse detalhe importante. Já outros inimigos têm características especiais que dependem da ação do herói para serem ativadas ou não, mas tais detalhes não são aparentes. Claro, com tentativa e erro — e um pouco de memorização — é possível contornar isso, mas outros títulos provaram que exibir tudo é perfeitamente viável (como em Slay the Spire). Eu fiquei com a sensação que foi alguma limitação de interface herdada da versão mobile do jogo.

Outra questão é o balanceamento da dificuldade, um ponto constantemente discutido em roguelikes e não é diferente em Pirates Outlaws. Claramente alguns inimigos e chefes são bastante poderosos, exigindo estratégias muito específicas para serem superados com moderada tranquilidade. Como o baralho é construído dinamicamente e de acordo com opções aleatórias, nem sempre há tempo hábil montar um personagem capaz de sobreviver, o que pode ser um pouco frustrante. Torço para que atualizações futuras busquem deixar mais justos alguns aspectos da dificuldade.


Vastos oceanos, mas pouca agilidade

Além das cartas, personagens mecanicamente únicos ajudam a trazer ainda mais diversidade a Pirates Outlaws. Alguns são bem básicos, como Gunner, que recarrega uma unidade de munição automaticamente a cada turno, embora a grande maioria ofereça possibilidades interessantes. A guerreira Swordmaster tem muitas cartas de ataque físico, porém sua única maneira de defesa é uma habilidade que aumenta sua esquiva (mas não garante evitar o dano). O Curse Captain fica mais forte conforme adiciona maldições ao seu baralho. Jogar com Vigilante é bem inusitado: a acurácia seus ataques dependem de sorte e azar, características que podem ser manipuladas durante o combate. 13 heróis estão disponíveis, e dominá-los é parte da diversão.


Há também diferentes aventuras conteúdo distinto, sendo que cada episódio de exploração apresenta mapa, inimigos, eventos e cartas únicos, o que altera sensivelmente a experiência. Em Skulls Island, por exemplo, enfrentamos mortos-vivos que retornam caso seus cadáveres não sejam eliminados rapidamente — cartas de purificação ajudam na tarefa. Já Eastern Seas se passa nos mares do Oriente, com inimigos focados em dano e efeitos negativos. Por causa dessas particularidades, precisamos adaptar as estratégias de acordo com a aventura. A Arena é um desafio à parte: oponentes de todas as aventuras podem aparecer nos confrontos, o que torna esse modo bem imprevisível. Por fim, estão disponíveis inúmeras missões que exigem executar tarefas específicas dentro das aventuras, como achar tesouros ou derrotar certos chefes.

É fácil perceber que há grande quantidade de conteúdo em Pirates Outlaws, porém a experiência é comprometida pelo ritmo lento de desbloqueio. Cada novo item, como personagem ou campanha, exige obter uma quantidade específica de pontos de Repute. O problema é que tudo exige muitos pontos e essa moeda de troca é disponibilizada em pequenas quantidades: por volta de 300 Repute são obtidos ao completar uma aventura (algo que pode levar quase duas horas), e o primeiro conteúdo é liberado ao acumular 1000 pontos. Sendo assim, é necessário jogar várias vezes as mesmas coisas para liberar aspectos interessantes do jogo, como campanhas mais avançadas ou personagens diferentes. A versão para dispositivos móveis tinha microtransações e me parece que a adaptação para PC herdou os mesmos valores, o que traz um pouco de grind.


Uma aventura viciante

Pirates Outlaws usa conceitos consagrados para oferecer uma experiência sólida e diversificada. A mistura de RPG e cartas é bem aplicada em jornadas com muitas possibilidades, sendo o combate brutal o destaque: mecânicas repletas de nuances e uma grande variedade de cartas e itens que permitem montar inúmeras estratégias. As características de roguelike fazem com que cada partida seja única, e há muito conteúdo interessante a ser explorado, como heróis mecanicamente únicos e diferentes campanhas. Problemas de balanceamento, ritmo e interface atrapalham em alguns momentos, no entanto eles podem ser contornados. No mais, Pirates Outlaws é um roguelike notável e muito divertido.

Prós

  • Mecânicas de combate sólidas e fáceis de entender, mas com complexidade implícita;
  • Grande variedade de cartas e personagens distintos oferecem muitas opções estratégicas;
  • Conteúdo extenso espalhado em diferentes campanhas, modos e missões;
  • Atmosfera bem construída com visual geométrico e trilha sonora com tom de aventura.

Contras

  • Conteúdo é desbloqueado de forma lenta, exigindo jogar várias vezes as mesmas aventuras para avançar;
  • Interface simplista nem sempre mostra as informações necessárias para fazer escolhas conscientes;
  • Alguns problemas de balanceamento de dificuldade.
Pirates Outlaws — PC — Nota: 8.5
Revisão: João Pedro Boaventura
Análise produzida com cópia digital cedida pela Fabled Game

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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