Análise: DAEMON X MACHINA (PC/Switch) — em um mundo onde mechas são a última esperança

O jogo faz um excelente trabalho como port, entrega um bom gameplay e narrativa, mas sofre com a repetitividade em certos momentos.

em 19/02/2020
Minha experiência com o universo dos Mechas não é tão vasta, mas ainda na época do Playstation 2 uma das obras mais distintas de Hideo Kojima, Zone Of The Enders, me conquistou. Com essa referência na cabeça fui jogar DAEMON X MACHINA, jogo que trata dessa temática ao nos colocar dentro de um futuro pós-apocalíptico em que após uma catástrofe global, temos que lutar contra inteligências artificiais corrompidas que agora atacam a humanidade. E assim como na obra de Kojima, a história é muito importante nesse título lançado em 2019 para Nintendo Switch e que agora também está disponível para os donos de PC.


Relações Mercenárias

O jogo se passa em um universo no qual parte da Lua colidiu com a Terra, e isso trouxe para o planeta um tipo de energia chamada Femto. Essa partícula foi responsável por corromper várias inteligências artificiais, que começaram a atacar a humanidade. Em contrapartida, um grupo de seres humanos chamados Outers, ao absorverem a energia, desenvolveram habilidades especiais.
Os Outers formaram grupos independentes que a bordo de seus robôs, os Arsenals, trabalhavam como mercenários para consórcios que têm como missão defender a Terra e suas propriedades. No centro de tudo está a Orbital, um grupo central independente dos consórcios,  e a inteligência artificial Four, mediando as relações entre as facções de mercenários e aqueles que contratam seus serviços.

O ponto de partida da trama não é tão original e passa a impressão que servirá apenas como pano de fundo para justificar as missões. Porém a história evolui e vai crescendo a cada missão completada, expandindo seus conceitos e criando boas motivações para os personagens, exceto para o protagonista que, infelizmente, é criado pelo jogador e segue a linha do herói calado. Essa evolução da narrativa é bem oscilante e o bom ritmo não é mantido o tempo todo, intercalando momentos em que história avança muito rápido com outros em que ela se arrasta apenas reforçando pontos mostrados em outras etapas.

Falando em personagens, os desenvolvedores não pouparam esforços em criar vários deles. Chega a ser difícil de lembrar quem é quem, pois durante toda a primeira metade do jogo são inseridos novos atores a cada missão. Se por um lado isso faz a história não oferecer tempo suficiente para o desenvolvimento individual, por outro, a forma como ela agrupa os mercenários em facções facilita o acompanhamento da narrativa, pois cada um desses grupos possui sua própria personalidade que dita a de seus integrantes.

A relação entre os mercenários é o ponto alto da narrativa e o jogo sabe disso. Ao invés de apostar em cutscenes, que apesar de existirem não são muitas, a maioria dos diálogos é apresentada como em uma visual novel, só que aqui a parte “visual” lembra um aplicativo de mensagens. Essa decisão me agradou pois compreende suas limitações na parte gráfica, e aposta no que tem de melhor, que é o texto.

Beleza que enfatiza repetição

Como um todo, a identidade visual apresentada em DAEMON X MACHINA é muito legal. O design do mundo, dos inimigos, das interfaces e principalmente dos Arsenals demonstram personalidade e esmero em sua construção. Indo na contramão de outras obras que trabalham o mundo pós-apocalíptico com cores sóbrias, tons de cinzas e baixo contraste, a direção de arte aposta em cores vibrantes que coloca os elementos visuais em lados opostos do círculo cromático, criando cenas de forte impacto visual. Essa escolha também é aplicada na interface, com seus fortes tons vermelhos. Faltou aplicar essa originalidade nos personagens, que por seguirem certos estereótipos comuns, não apresentam nada marcante e diferente do que já foi visto em outras obras similares.

O trabalho de dublagem americano reforça as personalidade estereotipadas, mas de forma geral é bem executado e consegue passar a emoção (mesmo em momentos clichês) adequada. Ainda na parte sonora, a trilha merece somente elogios. O jogo aposta em uma mistura entre músicas épicas orquestradas e melodias de rock, que em momentos-chave onde a tensão aumenta ao enfrentar um chefe ou um grupo de outros mercenários, canções com vocais entram em cena e corroboram a dramaticidade do combate.


Os cenários do jogo inicialmente me surpreenderam positivamente por sua variedade. Minha expectativa inicial era que o mesmo ambiente seria reaproveitado várias vezes em missões diversas, mas isso não ocorre até pouco mais da metade da aventura. De fato quando a repetição começa ela só acaba perto do final, e isso incomoda bastante, pois contribui (junto com a narrativa) para tornar a campanha arrastada.

Temos que dar um devido destaque para os efeitos visuais, que aqui tornam todas as batalhas um show de explosões, partículas, fumaças, ajudando a criar o ambiente caótico que uma batalha de robôs gigantes deve ser.

O caos a serviço da jogabilidade

Podemos dividir a estrutura do gameplay em três partes. Na primeira você controla seu personagem na central da Orbital, que serve como um hub para acesso às missões da campanha, aos modos online e também à customização do seu Arsenal. Infelizmente esse cenário não oferece muito mais do que isso: não há NPCs para conversar, segredos para explorar, apenas acesso as opções, tornando essa parte algo desnecessário e mal aproveitado.

A segunda parte é a customização do seu robô gigante. Antes de partir para qualquer missão é importante montar a sua build. Aqui é possível trocar todas as peças, dos pés a cabeça, e cada alteração deve ser feita com cuidado, pois modifica uma série de atributos diferentes, e dificilmente terá aquela peça mágica que trará só benefícios. Também é possível escolher as armas equipadas, uma para cada mão, uma auxiliar, uma no ombro e duas reservas. O “arsenal” de armas é bem variado e vai de espadas de energia a lança-mísseis gigantescos. Realmente dá para perder um bom tempo achando a melhor configuração para o robô, e como toda modificação também altera o visual, a experimentação se torna um processo ainda mais interessante.



A terceira e última parte é de fato o combate dentro das missões. Divididas entre principais e secundárias, elas variam entre arenas de combate, missões de proteção, coleta de informações, entre outras. Na maioria delas você estará controlando seu Arsenal e deverá destruir tudo o que estiver na frente, e para isso praticamente todo o controle vai ser utilizado.

Cada botão tem a sua devida ação, como usar arma da mão esquerda, atirar com a arma no ombro, usar o dash, criar uma cópia sua, entre outras. O que eu quero dizer é que são muitas opções e mesmo criando um pouco de dificuldade nos controles, isso passa a impressão de controle total sobre o robô. Essa impressão é reforçada pela boa responsividade dos comandos, algo que é essencial em meio ao caos dos combates.


Quando eu falo sobre o caos que o combate se torna, é no melhor sentido possível. Mesmo quando não há vários inimigos na tela, a luta é bem movimentada e o principal desafio é se localizar na bagunça, e isso também é o mais divertido. Mesmo com esquema de controle um pouco complexo em quantidade de ações possíveis, o jogo utiliza alguns artifícios, como a mira automática a partir de uma certa distância, para que o jogador foque na escolha da arma e principalmente em se movimentar bem no caos da batalha.


Para aqueles que forem se aprofundar em seus sistemas, DAEMON X MACHINA oferece uma camada a mais. Cada arma possui uma distância ótima de uso, assim ela irá causar mais dano ao inimigo se for utilizada de forma correta. Existem modos de ataque e defesa em que ao se optar por um o outro irá ficar prejudicado.É possível passar o jogo todo sem se aprofundar, já que ele é fácil até mesmo perto do final, mas para os mais aficionados existe uma boa dose de especificidades.

Existem alguns modos multiplayer online. Um que se resume ao PVP (Player versus Player), e o de exploração, que funciona como um cooperativo. É interessante notar como a estrutura, mesmo no single player, é voltada para um jogo online com a presença de um chat constantemente disponível, atalhos para falas pré-definidas e o conceito de realizar as missões em sua maioria acompanhado — essas características preparam o terreno para os modos online.

O gameplay em geral é bem gostoso e as missões em sua maioria conseguem criar boas situações que forçam o uso das habilidades. Mas o problema da repetitividade voltar a aparecer por aqui também, e ao longo da jornada os objetivos e a estrutura das missões vão cair cada vez mais em um lugar comum. Existem boas tentativas de variar, como as fases que devem ser executadas controlando o protagonista fora do seu robô, mas não são suficientes para quebrar a monotonia de certos pedaços do jogo.

A toda velocidade 

Falando agora do port para o PC, na maioria dos aspectos ele é bem executado. Joguei ele no com quase tudo no máximo, apenas as texturas e sombras que deixei no alto e o anti-aliasing que estava usando o TAA. E utilizando uma RTX 2060 e um Ryzen 5 1600 o jogo se manteve estável o tempo todo a 60 fps, sem nenhuma queda de frames, stuttering e nenhum problema de dar crash no jogo. A boa performance nesse tipo de jogo, altas taxas de quadro e estabilidade, faz muito bem a jogabilidade e isso fica evidente ao observar que o limitador interno de fps chega à casa dos 200 quadros por segundo, demonstrando que os desenvolvedores se preocuparam em entregar um port otimizado.


Se na parte da performance está tudo ok, na parte gráfica tenho um pequeno problema para apontar. Em elementos que estão um pouco distantes, é nítido o problema do serrilhado. Isso fica um pouco mais visível devido à estética cel shading utilizada.

Eu não joguei a versão lançada para o Switch e por isso não posso fazer uma comparação direta, mas as altas taxas de quadro e uma boa resolução caíram muito bem e parecem fazer parte do local natural do título, dando a chance dele ser executado em sua melhor performance.

Um robô com algumas peças a trocar

DAEMON X MACHINA traz uma boa proposta para quem gosta desse universo de Mechas, e apesar de ter alguns momentos arrastados, a campanha entrega uma boa história. O gameplay é bem divertido, com espaço para quem quiser se aprofundar, mas com portas abertas para quem estiver afim só de curtir. O maior problema do título é a repetitividade em vários campos, que é amenizada pelo esforço em variar um pouco as situações durante as missões. Para aqueles que forem jogar a versão de PC, irão encontrar um port decente que deve rodar sem dor de cabeça em uma configuração mediana.


Prós

  • Muitas opções de customização do robô do protagonista;
  • História que surpreende em sua conclusão;
  • Batalhas caóticas na medida certa;
  • Escolha das músicas da trilha sonora e o uso delas para criar o clima;
  • Port para o PC bem executado;

Contras

  • O jogo cria muitas situações repetidas;
  • Muitos personagens sem espaço para aprofundamento;
  • Hub central do jogo vazia e desnecessária; 
Daemon X Machina — PC/Switch — Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Farley Santos
Análise produzida com cópia digital cedida pela XSEED Games
 

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