Análise: Labyrinth of Refrain: Coven of Dusk (Multi) é um dungeon crawler cheio de altos e baixos

RPG dungeon crawler apresenta muitos sistemas interessantes, mas algumas de suas escolhas narrativas e mecânicas acabam atrapalhando a experiência proposta pelo jogo.

em 13/10/2018
Desenvolvido pela Nippon Ichi Software (NIS), Labyrinth of Refrain: Coven of Dusk é um RPG dungeon crawler estilo Etrian Odyssey e Wizardry. Com diversas opções de criação e customização da equipe de personagens jogáveis, a exploração das dungeons é sólida e engajante. No entanto, o game demora a oferecer ao jogador muitas das habilidades que poderão ser usadas no labirinto, apresentando primeiramente muitos tutoriais. A exploração, principalmente no início, também é travada por isso.


É importante destacar que Labyrinth of Refrain é um experimento interessante em relação ao que pode ser feito no gênero, com erros e acertos que podem tornar a experiência frustrante ou especial. Mas vamos por partes, é necessário analisar o elemento que considero o de qualidade mais controversa: a história.

Descompasso entre história e exploração

Quem já jogou um jogo desenvolvido pela NIS como Disgaea ou The Witch and the Hundred Knights, sabe que o humor é um elemento fundamental dos títulos da empresa. Em Labyrinth of Refrain, não é diferente, sendo os diálogos pincelados com humor negro e situações cômicas, apesar do tom, em geral, mais sóbrio das dungeons.

A história começa com a chegada da bruxa Dronya e sua assistente Luca ao vilarejo isolado de Refrain. Contratada pelo prefeito da cidade para explorar um labirinto misterioso que lá existe, a bruxa aproveita a oportunidade para investigar a área e obter relíquias mágicas com a ajuda do livro Tractatus de Monstrum. Como o labirinto é tóxico para humanos, o jogador assume o papel do livro em questão e para se defender utiliza Mananias, bonecos com alma criados pelo jogador.


Em termos de personalidades, os personagens são intencionalmente caricatos. Dronya é uma bruxa que na maior parte do tempo trata mal as outras personagens e está sempre tentando obter vantagem. Luca é uma garota boa e boba, usualmente alegre e que confia muito nas pessoas. Além das duas, temos o ambicioso prefeito Petrone, seu leal mordomo Klaus, a freira pervertida Marietta, o artesão silencioso Nemto, entre outros.

Os personagens são na maior parte do tempo unidimensionais, mas isso é ocasionalmente subvertido em alguns eventos. Em especial, a bruxa Dronya tem vários aspectos da sua personalidade questionados de forma natural durante a narrativa. Infelizmente, a qualidade do enredo de modo geral deixa a desejar, com oscilações entre momentos de mal gosto (como piadas envolvendo tanto a deficiência física de Dronya quanto tentativas de abuso sexual contra a personagem) e momentos que poderiam ter sido especiais caso não se prolongassem de forma a esvaziar o apelo emocional dos eventos (como as cutscenes sobre o passado de Dronya). Apesar da história se tornar mais séria ao longo do jogo, os problemas de ritmo e tom do roteiro continuam sendo um grande incômodo. Por sorte, o mesmo não pode ser dito para os eventos que acontecem dentro do labirinto, que mantêm qualidade do início ao fim.


O labirinto de Refrain na verdade é composto por uma variedade de dungeons interconectadas por portais. Cada um dos ambientes possui uma história única, separada das outras áreas. Nos eventos de história propriamente ditos, é possível algumas vezes tomar decisões como: responder honestamente, tentar enganar e obter vantagens, lutar contra os personagens ou ignorá-los completamente. Há implicações éticas interessantes nessas atitudes, mas infelizmente há pouco impacto real para o jogador, aumentando uma taxa de karma que pode ser facilmente manipulada a partir de um determinado ponto do jogo.

Mas além desses eventos de história, o próprio design dos ambientes, monstros e personagens não-jogáveis e alguns registros escritos são bastante detalhados e deixam claro que as áreas nem sempre foram hostis. Por exemplo, em uma área de ruínas em cavernas, há uma mensagem na parede que pergunta porque os trolls tinham se tornado criaturas violentas. Esses inimigos dominam a área, sendo extremamente fortes e agressivos, mas antes eles eram criaturas dóceis exploradas por uma raça atualmente extinta de criaturas.

Esse tipo de riqueza de detalhe também está presente nas outras áreas, dando bastante vida às dungeons, que também tem essa sensação atrelada às possibilidades de exploração oferecidas ao jogador.

Mais do que andar por um labirinto

Como um RPG dungeon crawler, Labyrinth of Refrain conta com a tradicional visão em primeira pessoa. Apesar de não ser possível observar os inimigos durante a primeira exploração, o jogo conta com inimigos visíveis no cenário, permitindo ao jogador escolher entre fugir e atacar e até mesmo analisar seus padrões de movimento para obter vantagem de iniciativa encostando neles antes de ser visto.

Entre as habilidades oferecidas pelo jogo, é possível quebrar paredes, ficar invisível ou criar portais temporários para saída e entrada nas dungeons. Elas podem ser compradas com mana (uma energia que pode ser coletada no labirinto) através de um sistema chamado Witch’s Petition. Nele também é possível pagar para alterar a dificuldade (junto com a probabilidade de obtenção de itens raros), obter itens e outras funcionalidades que vão sendo abertas ao longo do jogo.

Essas habilidades melhoram profundamente a experiência depois de um início desgastante marcado por muitos tutoriais que explicam mal alguns dos interessantes sistemas do jogo. É mais fácil aprendê-los de forma prática. Por exemplo, no início, o jogo aparenta ter batalhas aleatórias, mas uma das primeiras habilidades obtidas mostra que esse não é o caso, permitindo observar a localização deles nas áreas próximas e no minimapa.

Outra possibilidade interessante que é desbloqueada durante as horas iniciais é a possibilidade de acumular experiência entre as batalhas. A cada batalha, é possível gastar 1 ponto de Reinforcement (uma espécie de fonte de energia para a montagem da equipe e para o uso das habilidades) para guardar a experiência obtida em batalha em uma espécie de pool. Quanto mais batalhas são feitas, maiores os multiplicadores acrescidos a essa experiência, permitindo a obtenção de valores significativamente maiores.

No entanto, caso o jogador precise fugir de um inimigo ou sair da dungeon, os personagens não ganharão nada da experiência acumulada. Esse sistema de risco e recompensa adiciona uma dimensão estratégica muito interessante para o fluxo entre batalhas e exploração. Durante o stockpile também não é possível alterar a equipe de batalha (apenas suas posições e equipamentos), sendo necessário um bom planejamento.

Outro elemento importante da exploração é o Gore Hit, uma espécie de dano crítico que quebra uma parte do corpo dos personagens. É possível causar isso nos inimigos e também ter partes do corpo retiradas dos mananias. Quando isso acontece com os personagens jogáveis, o HP máximo deles é reduzido e os itens equipados nas partes quebradas passam a ter muito menos efeito.

Na minha experiência, meus personagens recebiam gore hits com muita frequência, não me recordo uma só vez de ter entrado em uma dungeon e saído ileso. E essa desvantagem não pode ser curada dentro da dungeon, forçando o jogador a escolher entre continuar com os personagens enfraquecidos ou retornar para a tenda de Dronya para restaurar suas partes, o que é pago com dinheiro ou itens. A mecânica é bastante adequada e caracteriza o principal elemento de tensão do labirinto, mas ao mesmo tempo é bastante incômodo por ser um fator mais definido pela sorte do que pelas decisões do jogador. É uma situação muito diferente perder por azar do que ter sua equipe eliminada por uma decisão estúpida.

Mananias e Covens

Assim como é característico do gênero, é possível criar seus próprios personagens para montar a equipe e explorar as dungeons. No início, é possível escolher entre 6 profissões para os mananias: Aster Knight (cavaleiro), Shinobushi (assassino), Theatrical Star (dançarino), Marginal Maze (mago), Peer Fortress (soldados de armadura) e Mad Raptor (arqueiro). Cada uma conta com habilidades únicas e maior proficiência com determinadas armas. Por exemplo, um Theatrical Star pode atacar um grupo inteiro com seu sino, enquanto uma Peer Fortress tem a chance de impedir que os ataques dos inimigos atinjam os outros personagens.

Além disso, é possível determinar a distribuição dos status dos personagens e a forma como eles crescem durante os aumentos de níveis. É possível fazer um Shinobushi focado em ser muito rápido (uma vantagem da classe) e outro focado em equilibrar os atributos reduzindo tanto vantagens quanto desvantagens da classe.

Após criar os mananias, é possível designá-los para os covens, grupos que obedecem a formações específicas e possuem certas vantagens. É possível utilizar 5 covens em batalha e, dependendo do coven, é possível ter no máximo 3 personagens (com mais 5 personagens-suporte) em cada um, totalizando uma equipe de 40 mananias. No entanto, cada coven tem um custo específico associado e suas especificidades. Por exemplo, o Blue Goat Pact só permite grupos com 2 mananias do sexo masculino, oferecendo em troca magias de dano com absorção de HP.

Apesar dos covens serem interessantes pelas possibilidades estratégicas, eles também se tornam grandes limitadores, já que as magias que cada personagem pode utilizar são definidas pelo coven em que ele está naquele momento. Em algumas situações é necessário escolher entre ter um coven de magos com habilidades de ataque ou cura, por exemplo. Apesar da intenção de adicionar estratégia ao jogo, esse tipo de limitação acaba sendo inconveniente, em especial pela restrição de magias.

Uma obra cheia de altos e baixos



É claro o esforço da NIS em criar um dungeon crawler único com vários sistemas interessantes. Apesar desta análise mencionar alguns deles, há muito mais coisas envolvidas na construção dos personagens, exploração das dungeons e batalhas contra os inimigos. Infelizmente o jogo é marcado por altos e baixos na qualidade, em especial no aspecto narrativo, que tenta mesclar o humor tradicional das obras da empresa com uma história mais densa e sombria. Apesar dos equívocos cometidos, o jogo é uma experiência bastante interessante com um gameplay diversificado e potencialmente viciante. Com certeza é recomendado para fãs do gênero dungeon crawler.

Prós

  • Sistemas variados tornam a exploração das dungeons e as batalhas mais dinâmicas;
  • Design de ambientes e personagens ricos em detalhes;
  • Criação de personagens tem muitas opções;
  • Muitas horas de conteúdo (o jogo pode durar facilmente 100 horas).

Contras

  • Tutoriais superficiais que não apresentam bem os sistemas de jogo;
  • Sistema de decisões apenas impacta de forma pouco significativa o progresso;
  • Sistema de covens é mais restritivo do que algo que adiciona valor estratégico ao jogo;
  • A principal dificuldade do jogo, os gore hits, é muito vinculada a sorte;
  • Ritmo e tom da narrativa muito ruins;
  • Algumas situações de mal gosto são tratadas como piada.
Labyrinth of Refrain: Coven of Dusk – PC/PS4/Switch – Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: PC

Revisão: Link Beoulve
Análise produzida com cópia digital cedida pela NIS America

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.