Crescendo com os videogames: do amor ao colecionismo

Início do século XXI, um jovem estudante de jornalismo, apaixonado por videogames, volta às suas origens.

em 18/02/2018

No início dos anos 2000 eu ainda era um fifeiro convicto, estava na geração 32 bits com o meu Playstation fat e o 3DO velho de guerra. Final de semana chegava e os torneios de FIFA 98 tomavam sua continuidade. Eu e meu irmão, sempre disputando a ponta dos torneios, rodávamos todos os continentes, todos os campeonatos, para ver qual dos dois levava seu time à ponta do campeonato.


Quando não estava no FIFA com meu irmão, eu gostava de dar uns tiros com a Justifier no Die Hard Trilogy junto com meu amigo Zequinha. Era um jogo fantástico e muito desafiador, que uniu perfeitamente a trilogia do filme, transformando três jogos excelentes num único CD. Foi um vício nosso que não conseguimos finalizar.


Porém, com o surgimento da 6ª geração, o meu Playstation estava ficando velho, meu irmão já havia comprado o Playstation 2 e as competições de FIFA migraram pra ele. No entanto, uma chama havia acendido em mim um pouco antes, antes mesmo da virada do século. Na faculdade de jornalismo, em 1999 havia ocorrido uma feira de tecnologia, um dos expositores era a Magic Games, uma tradicional loja no mercado de locação e vendas de jogos, e lá eles estavam expondo o que tinham de mais moderno: três televisões com o Sega Dreamcast. Quando vi o poder daquele console minha chama seguista reascendeu e aquela máquina logo passou a ser meu mais novo objetivo na escala de evolução gamer.

Voltando às raízes

No lançamento o Dreamcast era um console demasiadamente caro, ainda mais para um jovem estudante de jornalismo. Para mim, ficou muito difícil comprar um, então tive que esperar o momento certo para adquirir o meu; afinal, quem espera sempre alcança.


Apenas em 2002, perto da morte do console, pude concretizar esse sonho, mas para isso houve um sacrifício: o Playstation. Nesta época o Mercado Livre já existia, e como o 128 bits da Sega estava para ser descontinuado, consegui encontrar um no preço que cabia em meu bolso. Então coloquei meu Playstation à venda, completo com vários jogos, pistola Justifier, tudo na caixa e com seus manuais. Consegui um preço bom e com o mesmo valor peguei o tão sonhado Dreamcast com muitos jogos, 50, voltando derradeiramente para minhas origens com a Sega reinando em minhas jogatinas.

Com o Dreamcast em casa, recheado de jogos piratas, veio a necessidade de ter algum original. As lojas ainda vendiam os restos de estoque, então consegui verdadeiras pérolas originais em um preço excelente. Para se ter ideia, comprei o Resident Evil: Code Veronica por apenas R$ 47,00. Com o Mercado Livre, também consegui muitas jóias, dentre elas: Sonic Adventure, Crazy Taxi e a obra de arte chamada Shenmue.


Até hoje o Dreamcast é meu companheiro, tem uma biblioteca excelente e os melhores jogos de luta 2D da sexta geração. Com a aquisição do derradeiro console da Sega e o recém-adquirido conhecimento dos sites de compra e venda, nasceu uma vontade em mim, de conseguir todos os consoles de minha infância. Foi aí que descobri: o bichinho do colecionismo tinha me mordido.

A paixão pelo retro

O Dreamcast foi o último console que comprei como jogador, depois dele nasceu um outro sentimento em mim, o de recuperar todos aqueles videogames que tive desde a infância. Esse vício de colecionar já é um velho conhecido meu, pois desde o início dos anos 1990 eu colecionava os quadrinhos da Marvel, aqueles da Abril em formato pequeno (formatinho). Assim sendo, não seria a primeira vez que o bichinho do colecionismo teria chegado a mim.


O primeiro que procurei foi o que mais me marcou, o Mega Drive. Não podia ser qualquer um, tinha que ser exatamente igual ao que eu tive, o modelo japonês de 1989. Aqui em Natal existe um bairro famoso por ter tudo que a gente precisa, o Alecrim; existe até um slogan popular para ele que diz: “o que você não encontra no Google, você encontra no Alecrim”. Então o popular bairro natalense foi minha primeira opção para começar a coleção.

Chegando no famoso camelódromo, logo me indicam um quiosque, da Fox Games. Logo fiz amizade com os donos, Ricardo e Edilma. Falei o que viera procurar e logo ele puxou do balcão um lindo Mega Japonês, do jeito que eu queria. E não só isso: ele ainda me conseguiu a caixa original do 16 bits da Sega e, de tabela, me arrumou um Sega CD com a carcaça inteira. Pois é, o que você não achar no Google, você vai achar no Alecrim.

Depois de conseguir o Mega veio a segunda parte da missão, recuperar os jogos. A maioria dos meus jogos eu havia vendido ao meu primo Jason e por um milagre ele ainda os preservava na casa da minha avó Mariana. Aos poucos fui comprando de volta minhas fitas, e as últimas troquei pelo resto dos jogos prensados que ainda tinha do Playstation. Um detalhe nessa história é que minha tia Mércia, mãe de Jason, trabalhava na locadora do meu tio Marcelo, e, quando meu tio fechou a locadora, ela ficou com todas as fitas de Mega Drive que tinha lá. Ou seja: não só recuperei minhas fitas de infância como consegui um plus dos antigos cartuchos da locadora do meu tio.

Claro que a vontade de ter todos os meus consoles não cessou minha febre pelo colecionismo. Mesmo após readquirir todos os videogames que passaram em minha vida – Odyssey², Master System e Mega Drive (o 3DO eu não havia desfeito e continua comigo por mais de 20 anos) – veio a vontade de ter os outros clássicos, logo comprei um Nintendo 64 de um amigo, lindo (como ainda está), completo na caixa, com todos os seus manuais e um belíssimo Zelda: Ocarina of Time na caixa gigante. Também veio a curiosidade de conhecer os raros; foi quando adquiri o console que representa o maior erro da Nintendo: o Virtual Boy.

Doações dos amigos

Nessa febre ainda contei com a ajuda de meus amigos e, graças a eles, aumentei mais ainda minha coleção Nintendo. Ganhei um Super Nintendo e um Sega Genesis europeu do meu amigo Josinai Barbosa e, pouco depois, um lindo Bit System dos meus amigos Rodrigo e João Paulo. Detalhe: todos estavam na caixa e funcionando perfeitamente, mesmo após anos parados. Podemos ver que de fato não fazem mais videogames como antigamente.

Engajamento no Museu do Videogame Potiguar

O vício em retrogame me levou para um caminho que nem podia imaginar o de fazer parte de algo maior aqui no Estado, o Museu do Videogame potiguar. Em 2014, Glídio Márcio entrou em contato comigo, convidando-me para fazer parte de um evento que iria ocorrer naquela semana: o Natal Game Club. Topei de pronto. Aquele evento marcaria completamente meu envolvimento com o retrogame.


Aquela seria a primeira exposição do Museu do Videogame Potiguar, que estava tão no início que tinha cerca de 50 consoles à mostra, e, mesmo assim, já apresentando raridades como o Atari Pong (segundo console caseiro do mundo) e o Virtual Boy (da minha coleção). Este foi o dia que a semente do MVP foi plantada, pois hoje – pouco mais de três anos depois – o museu tem quase 200 consoles em seu acervo, sendo o 3º maior do Nordeste, e é uma das grandes atrações do Estado no que tange à cultura gamer.

Significação do passado

O que me levou a colecionar todos esses videogames foi a possibilidade de reviver parte das experiências que tive na infância, de relembrar cada momento vivido com meus amigos, primos, irmão junto a essas máquinas incríveis. Posso dizer que, ao ligar cada um desses consoles, sinto-me entrando em uma verdadeira máquina do tempo. Mesmo tendo zerado determinado jogo milhões de vezes, as lembranças que eles me trazem não tem preço.


Philips Odyssey: meu primeiro console

O colecionismo, em si, vai bem mais além que isso. É a história viva dos videogames concentrada num quarto, contando todo seu avanço tecnológico, suas vidas, suas guerras, seus fracassos. Cada console desses tem sua história, sua vida, e mantê-los aqui, funcionando, é primordial para que essa história não seja esquecida.

Revisão: Bruno Alves

Jornalista, advogado e músico, ofícios que exerço com paixão. O amor pelos videogames veio no mesmo período que me apaixonei pela música, quando ganhei meu primeiro console - o Philips Odyssey - foi amor a primeira vista, é uma relação eterna com o mundo dos games
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