GameBlast — O que vocês querem mostrar com GUTS?
Paulo Luis Santos — A gente viu uma oportunidade de fazer um jogo que trouxesse inovação para o gênero de luta, o qual a gente gosta, mas que também tivesse a nossa cara, sendo polêmico, bem humorado, engraçado e diferente, tendo potencial para ser um sucesso comercial, pois é um gênero do mercado que a gente acha que tem um potencial legal. No começo, o projeto era mais um brawler casual, com o tempo passamos para a luta mesmo. Demorou bastante para a gente ter a visão de que “não, esse é um jogo de desmembramento, não é jogo de combo", então voltamos a atenção para o design do jogo para ele ser todo focado em desmembramentos.
GameBlast — Vocês tiveram alguma inspiração em Monty Python para fazer o jogo?
Paulo Luis Santos — Sim, com certeza. No filme do cálice sagrado, a luta do Black Knight foi uma inspiração enorme, inclusive fizemos uma homenagem ao personagem em um dos cenários do jogo. A gente tentou entrar em contato com o pessoal do Monty Python para ter um personagem do Black Knight jogável, pois ia ser demais! Infelizmente o departamento legal deles foi bem curto e grosso e mandou um “não” com um tipo de “fica esperto” depois. Com isso fizemos só uma homenagem mesmo ao personagem. Mas falando ainda da inspiração, assim, pro GUTS, uma das chaves é o humor, ele é um jogo de comédia, então a gente fez um esforço bem grande ao longo do desenvolvimento dele para achar um tom de humor certo. Tem uma lista de filmes que a gente assistiu pra todo mundo ficar na mesma página, Monty Python é um deles, mas vai desde Doutor Fantástico, do Kubrick, vários South Parks, episódios e o filme, tem Kung Fury… Tem um tipo de humor mais escrachado bem característico.
GameBlast — E a construção dos personagens? Foi com base nessas inspirações também?
Paulo Luis Santos — Mais ou menos, a gente construiu o mundo primeiro e a partir dele os personagens. É até interessante observar isso, porque muitos pensam “ah, jogo de luta não tem história”, mas em GUTS tem história pra caramba! Pra criar toda a ambientação do jogo a gente precisava criar personagens fortes no sentido de propriedade intelectual, que sejam carismáticos e com coisas únicas. Isso tudo porque a nossa visão não é só o jogo, é além disso a propriedade intelectual para fazer quem sabe uma HQ ou um curta depois, mas pra isso era preciso que o jogo iniciasse um mundo rico. Com isso contratamos uma equipe especializada em narrativa para ajudar a construir o mundo do jogo e, a partir daí, começamos a pensar “esse lugar é interessante, vamos montar um personagem baseado nele?”.
GameBlast — A respeito do humor do jogo, vocês priorizaram que tipo de humor?
Paulo Luis Santos — Essa pergunta é até difícil de responder, porque eu acho que é um pouco de tudo. Como é uma equipe multidisciplinar e muito diferente, o meu humor acaba sendo muito diferente do seu, que é diferente do outro programador e assim acaba criando uma mistura de tudo. Depois que estabelecemos um norte pro jogo, ficou bem mais fácil organizar isso. Tem bastante humor negro principalmente no enredo, com algumas histórias um pouco ácidas. Já as animações tem um humor bem mais pastelão, com o exagero do sangue ou nas animações do cotoco andando, por exemplo. Além disso o GUTS tem um pouco de crítica também, dando algumas cutucadas em coisas que nós temos atualmente (o jogo se passa 50 anos no futuro), nada muito sério porque não é a proposta do jogo, mas de uma forma ou de outra o humor acaba passando por essa crítica. Mas é uma linha muito fina entre aquilo que é engraçado e aquilo que é de mal gosto, a gente tentou com muita força acertar essa linha, mas sabemos que tem gente que vai acabar se incomodando com alguns elementos do jogo.
GameBlast — Qual é a censura do jogo?
Paulo Luis Santos — A gente não fez a avaliação ainda, mas nas lojas de PC, onde o jogo vai sair primeiro, nós deixamos claro todo o conteúdo do jogo a respeito de mutilação, conteúdo sexual, aspectos gore e outros elementos. Inclusive no Steam deixamos claro que ele não é um jogo voltado para crianças, mesmo que algumas delas se divirtam bastante com ele. Mas com certeza quando levarmos o jogo para os consoles ele passará pela avaliação e sem dúvidas ficará entre 16 e 18 anos, não tem como ser menos. Nem tivemos a pretenção de ser menor essa censura.
GameBlast — Como que é, para um desenvolvedor brasileiro, precisar entrar em contato com as grandes empresas internacionais de console e precisar se mostrar no mercado?
Paulo Luis Santos — Precisa viajar. Você precisa se tornar conhecido de alguma maneira. Tem eventos, por exemplo a GDC (Game Developers Conference), para um desenvolvedor que quer ser reconhecido profissionalmente tem que ir num evento desses e apertar mãos, conversar, mostrar o jogo… Atualmente a porta está super aberta para os brasileiros, mas não no sentido de que qualquer um pode chegar lá e “oi, fiz um jogo aqui numa disciplina da graduação e quero lançar ele para PS4”. Na verdade eles fazem toda uma análise do jogo para montar um crivo de avaliação. Inclusive tem programas atualmente que ajudam as empresas a irem para o exterior com preço subsidiado, facilitando esses contatos. Além disso, a Sony e a Microsoft já sabem que o Brasil está virando um pólo de comércio e desenvolvimento de jogos, então fica um pouco mais fácil. Claro que tem alguns problemas, principalmente com o kit de desenvolvimento que às vezes para na Alfândega e algumas empresas acabam não mandando direto para cá e temos que buscar lá em San Francisco a mala com os materiais para começar a trabalhar. Mas o importante é que você consegue, se seu jogo for bom e sua empresa for competente você consegue sim um contato para que seu jogo chegue até os consoles.
GameBlast — Você então acha que o Brasil está conseguindo um espaço no mercado internacional de games?
Paulo Luis Santos — Tá sim. A gente tá vivendo um momento muito positivo por alguns motivos. Primeiro a gente está com uma safra de empresas e jogos muito boa, nem pretendo falar do GUTS, mesmo acreditando que ele entre nessa leva, mas podemos citar até outros jogos que estão sendo apresentados aqui no SBGames como o Keen, Valgard e outros que são excelentes. Além disso, temos os diversos financiamentos do governo que inserem mais dinheiro no mercado de games, por exemplo, serão lançados 23 jogos no ano que vem financiados de alguma forma pelo governo. Claro que não estou dizendo que os 23 são excelentes, mas dentre esses 23 tem coisas muito boas também. Então eu vejo que estamos num momento muito positivo de crescimento da indústria. O que a gente precisa agora é que esses jogos que estão saindo acabem fazendo sucesso, para que ao invés de pensarem “caramba! Um jogo brasileiro!” os jogadores passem a pensar “legal, mais um jogo brasileiro”.
GameBlast — Qual a sua opinião sobre a importância dos sites de análises de games para os jogos brasileiros?
Paulo Luis Santos — Olha, vou poder te responder isso melhor depois de lançar de fato o GUTS, mas a gente tá fazendo um trabalho bem forte de lançamento com a imprensa do Brasil. Nós temos uma dificuldade ainda que é o brasileiro aceitar de fato o jogo independente. Tem uma tendência de haters que só querem jogos AAA e tudo mais. Com isso, se os desenvolvedores tiverem uma ajuda da imprensa, é muito bom. Porque se tem um review positivo do jogo, claro que sendo verdadeiro, ele influencia o público na hora. Então a gente precisa realmente é de espaço, de visibilidade. O brasileiro tá muito preso ainda aos jogos AAA ou então aos free to play. Agora aqueles jogos independentes de dez reais, eles passam direto. Quando um site dá espaço para notícias, reviews, lives e etc é muito importante, pois, com isso, ele começa a colocar o jogo na boca da galera. A pessoa não pode ter o primeiro contato com o jogo na loja, ela tem que ter ouvido falar antes. Então é super importante pro desenvolvedor essa via de mão dupla, a gente traz conteúdo relevante para vocês e vocês trazem visibilidade pra gente.
GameBlast — Vocês pensam em fazer mais personagens ou pacotes de expansão para o GUTS?
Paulo Luis Santos — A gente tá programando algumas DLC para o jogo, tanto gratuitas como pagas pra atualizar o jogo sempre. Vai ter update na versão do PC e as futuras versões de console terão também algumas coisas diferentes. Isso principalmente porque a gente tem uma intenção de manter o GUTS como jogo competitivo, então para isso, manter o jogo em constante atualização e adequação é essencial.Já fizemos alguns campeonatos, como o do Big Festival em São Paulo, onde o vencedor foi o Chuchu, famoso jogador brasileiro de Street Fighter que inclusive chegou a ir para a Capcom Cup. É muito legal ver que o cara que foi do TOP 30 mundial de Street Fighter foi campeão do primeiro torneio de GUTS que fizemos. Por isso, com uma cena competitiva na mira, é mais um motivo para ter o jogo em constante atualização. Lançar o jogo é só um passo, manter ele interessante é que é uma maratona.
E vocês leitores? Gostaram da entrevista com o desenvolvedor de GUTS? Ficaram curiosos com o game? O que acham dos jogos brasileiros? Não deixem de comentar!