Vários gêneros de videogames já passaram por ciclos de popularidade, nos quais um jogo reinventa diversas regras do gênero e dúzias de outros vêm atrás seguindo naqueles passos. Na segunda metade da década passada, Gears of War (360) fez isso para os third-person shooters, que então passaram a ser centrados em coberturas, rifles de assalto, hordas de robôs e/ou alienígenas e combate populado por NPCs aliados. Uma parte essencial desses ciclos é quando outros jogos subvertem aquelas regras, trazendo uma experiência familiar mas original.
É aí que entra Vanquish, um cult classic da PlatinumGames lançado em 2010 para Xbox 360 e PlayStation 3. Após o foco em combate corpo-a-corpo de MadWorld (Wii) e Bayonetta (Multi), o estúdio se aventurou no mundo dos shooters sob a liderança de Shinji Mikami — sim, o diretor do lendário Resident Evil (PS) deixou de lado suas raízes de terror para trabalhar em um jogo de ação pura. À primeira vista, Vanquish pode parecer muito similar a Gears of War e seus contemporâneos, mas, com a incorporação de filosofias de design derivadas de Hideki Kamiya, Mikami conseguiu fazer um jogo de tiro fundamentalmente Platinum.
Diga adeus aos limites
Esta análise é centrada na versão de PC de Vanquish, lançada pela Sega em maio, então vamos começar falando dos aspectos técnicos deste relançamento. Os jogos da Platinum sempre foram pensados para rodar em 60 quadros por segundo mas, nos consoles da geração passada, isso raramente era atingido. Vanquish, em particular, rodava abaixo de 30 quadros por segundo na maior parte do tempo (como visto em "Vanquish PS3/360 Framerate Analysis", do DigitalFoundry). Além disso, a resolução inferior a 720p e as texturas limitadas pela pequena quantidade de memória dos consoles fazia todo o visual do game ser borrado, como se tivesse um filtro em cima da imagem. Eu joguei Vanquish no PS3 no começo de 2013 e, apesar de ter poucas lembranças claras dele, lembro como o jogo parecia visualmente poluído graças a essas limitações.Sem querer dar ao texto o ar de superioridade frequentemente associado ao PC, é impossível não observar que esses problemas são resolvidos na nova versão. No meu computador, que conta com uma configuração boa de alguns anos atrás, pude optar por jogar em 1440p com framerate instável (na casa de 45 a 55fps), ou em 1080p com raríssimas quedas abaixo de 60fps, ambos com configurações de texturas, sombras e anti-serrilhamento altas. Como taxa de quadros é o aspecto mais importante para mim, optei por reduzir a resolução, mas ainda pude jogar com muito mais nitidez que a versão original. Mesmo em cenas de ação frenética, tudo passa a ser mais fácil de acompanhar com essas melhorias (como visto em "Vanquish PC vs PS3 Comparison", do DigitalFoundry).
Alguns elementos entregam que este relançamento é um port, não um remaster. Toda a interface permanece renderizada em 720p, parecendo pixelada quando o jogo está em uma resolução mais baixa. Além disso, o HUD é um pouco grande demais durante a jogatina, poluindo a interface como um todo. É possível desabilitar o HUD pressionando a tecla F8, mas com a consequência de perder algumas informações importantes. As texturas do jogo são mais nítidas como um todo graças à resolução melhorada, mas não são retrabalhadas e frequentemente entregam a idade do game.
Talvez a novidade mais importante esteja nos controles. Eu sou um console gamer desde sempre e, mesmo em jogos de tiro, geralmente prefiro jogar com um controle. Vanquish foi feito para controles e continua perfeitamente aceitável jogá-lo assim hoje, mas devo admitir que ele fica excepcional com teclado e mouse. Este é um jogo feito para o jogador se sentir no centro de um espetáculo visual de balas e explosões e, com a velocidade proporcionada pelo mouse, isso torna-se ainda mais real. Se você, como eu, ainda prefere sentar em um sofá, ainda há a possibilidade de usar os giroscópios do DualShock 4 ou do Steam Controller para tentar replicar essa precisão nos tiroteios, graças à poderosa customização de controles do Steam.
Um clássico fora de seu contexto
Além das melhorias técnicas do relançamento, é inevitável associar Vanquish a seu contexto original e refletir sobre como o jogo envelheceu e amadureceu nos últimos sete anos (recomendação: "How the Meaning of Vanquish Changed", do Writing on Games). Em retrospecto, talvez seja óbvio por que Vanquish não vendeu tão bem quanto outros third-person shooters da época. À primeira vista, é muito fácil enxergá-lo como apenas mais um jogo de um gênero cansado, ao invés da disrupção que ele é. Também é um jogo de tiro com campanha curta, narrativa medíocre e sem modo multiplayer: pecados considerados (por outros, não necessariamente por mim) gravíssimos na cultura gamer contemporânea.Marcus Fenix, é você? |
Como é característico da Platinum, a profundidade das mecânicas não é imediatamente aparente (recomendação: "Depth, Mastery, and Vanquish", Game Maker’s Toolkit). É possível, em geral, jogar Vanquish apenas atirando de locais seguros e usando os joelhos-foguete para ir de uma mureta para outra. No entanto, isso rapidamente torna-se repetitivo e é natural que o jogador queira explorar o que mais o jogo tem a oferecer, e é aí que a jogabilidade começa a brilhar. O legal de Vanquish é tentar ser ofensivo em vez de defensivo. Em várias situações, o jogador vai morrer e, na próxima vez, jogará um pouco melhor. Eventualmente, o objetivo deixa de ser apenas sobreviver a cada confronto, mas sim derrotar todos os inimigos de maneiras estilosas ou divertidas, da forma que o jogador preferir. São essas características que dão aos jogos da Platinum um nicho de fãs tão fiel, e Vanquish não foge disso.
A campanha, infelizmente, ainda tem seus problemas. Alguns inimigos têm ataques irritantes que matam com apenas um golpe, a seção do monotrilho é contrária a toda a filosofia do jogo e cutscenes desinteressantes interrompem o tiroteio frequentemente demais. Ou seja, Vanquish sofre da "síndrome Platinum": assim como Bayonetta, Metal Gear Rising (Multi) e The Wonderful 101 (Wii U), ele é repleto de ideias bacanas, mas merecia uma continuação para aperfeiçoar a fórmula. Infelizmente, Bayonetta foi a única franquia a continuar, mas Bayonetta 2 (Wii U) prova justamente esse ponto.
No fim, meu modo favorito continua sendo os desafios, que são similares ao Horde Mode de Gears of War: o jogador deve sobreviver pela maior quantidade possível de tempo enquanto ondas de inimigos aparecem. Nesse modo, é possível experimentar a diversidade de armas do jogo melhor do que na campanha, além de dar espaço para experimentar técnicas, aprimorar habilidades e conseguir uma pontuação melhor.
É inevitável imaginar como seria um modo multiplayer de Vanquish, mas, ao mesmo tempo, parece impossível adaptar uma mecânica como o AR Mode para multiplayer. Sem dúvida, a ausência deste modo foi um sério problema para as vendas do game em 2010, mas, em 2017, acho que já há uma diversidade grande o suficiente de jogos assim. Por outro lado, os jogadores mais empolgados podem rejogá-lo em dificuldades cada vez mais altas (até "God Hard") e buscando pontuações melhores, outra característica inerente dos jogos da Platinum.
Depois de jogar diversos jogos longos este ano, foi satisfatório completar Vanquish sem tanto compromisso. O jogo pode ter alguns problemas e não ter mais o valor disruptivo que tinha em 2010 mas, com as melhorias técnicas e a quantidade de ideias únicas presentes no título, não deixa de ser um jogo de ação obrigatório para fãs de shooters e da Platinum. Um Vanquish 2 também seria muito bem-vindo.
Prós
- Versão de PC resolve problemas técnicos do jogo;
- Sete anos depois, várias mecânicas permanecem únicas;
- Profundidade das mecânicas incentiva jogar a campanha repetidas vezes;
- Modo de desafios permite que o jogador se aperfeiçoe no combate.
Contras
- Campanha é relativamente curta e conta com uma narrativa esquecível;
- Ausência de modo multiplayer pode afetar longevidade do jogo;
- Alguns aspectos da interface e dos visuais poderiam ter sido aprimorados.
Vanquish — PC — Nota: 8.0